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Kaio Trindade Mineiro Vale24 Cássia Beatriz Batista25

Como criar condições possibilitadoras de liberdade e reconhecimento para sujeitos historicamente silenciados e oprimidos no campo do gênero e da sexualidade? Para início de conversa, tomamos a escola como centro de nossa discussão, compreendendo-a como um espaço de tensões e contradições, mas também como um espaço potente de transformação crítica e que pode contribuir para o reconhecimento e liberdade de sujeitos. Somamos a essa discussão a perspectiva freiriana de educação e escola: uma educação possibilitadora da liberdade e que carrega um poder transformador de realidades desiguais e opressoras. A leitura freiriana da realidade é política e articula elementos que a sociedade insiste em separar (FREIRE, 2013). Compreendendo a escola como território de destino de sujeitos que vivenciam o processo de formação docente, dirigimo-nos à busca por diálogos e contribuições da perspectiva freiriana para (re)pensar tal processo frente à questões de gênero e sexualidade, buscando compreender como esse espaço pode contribuir para a manutenção de um sistema opressor dominante que silencia e subjuga sujeitos outros. “Somos sujeitos de muitas identidades” (LOURO, 2018, p. 13). Não podemos ter nossos professores e nossas professoras formados/as considerando os sujeitos envolvidos no processo de ensino e aprendizagem como iguais, universais, segundos as normas regulatórias predominantes. Enquanto isso acontecer, a escola continuará com o disciplinamento dos corpos e exercendo sua pedagogia das sexualidades e dos gêneros, negando formas que não

24 Doutora em Psicologia. Professora adjunta do Departamento de Psicologia da UFSJ. cassiabeatrizb@ufsj.edu.br

25 Graduado em Matemática. Mestrando em Educação/PPEDU-UFSJ. kaio-prados@hotmail.com

se encaixam em um padrão dominante e/ou heteronormativo. Como, então, como professores e professoras em formação, contribuir para a libertação e o não aprisionamento de “outros” sujeitos? Como nos posicionarmos como linhas de fuga e, dessa forma, contribuir para a construção de uma sociedade mais justa e cidadã para todos e todas? Diante dos discursos de igualdade, tolerância e de construção de uma sociedade justa que se faz presente em meio ao sistema educacional, quais os possíveis caminhos para o alcance de tais metas? Esses caminhos são coerentes com os discursos que o cerca? É possível objetivar a contribuição para a construção de uma sociedade mais justa, sem levar em conta sujeitos que são oprimidos e marginalizados pela sociedade? Ao objetivar a transformação por meio da educação, é necessária uma inserção crítica na realidade (FREIRE, 1987). Compreendendo o espaço de formação docente como um campo de poder, as classes dominantes concebem essa inserção crítica de sujeitos oprimidos na realidade opressora como um movimento que em nada a elas interessam (FREIRE, 1987), pelo contrário, seria uma ameaça à ordem das coisas: o que lhes interessam “é a permanência delas em seu estado de ‘imersão’ em que, de modo geral, se encontram impotentes em face da realidade opressora” (FREIRE, 1987, p. 23). No que depender do currículo como contribuinte para esse processo de inserção crítica de sujeitos oprimidos, esse se apresenta como um espaço de ambiguidade. Acabam reproduzindo e contribuindo para a manutenção de relações desiguais, opressoras e hierárquicas entre os sujeitos (SILVA, 2006), bem como sustentam e demarcam posições de sujeitos específicas – dominados versus dominantes. Propostas curriculares podem, também, se manifestar de acordo com o que, sob uma ótica outra, Freire (1987) denominou de falsa generosidade dos opressores. Nesse caso, na tentativa de “esconder” o papel de reprodutor de desigualdades e hierarquias, são criadas estratégias que sustentam a ideia de uma (pseudo)preocupação e de uma (pseudo)importância que acabam produzindo discursos superficiais de igualdades e inclusão no campo do gênero e da sexualidade. Está ali por estar; para o não enquadramento enquanto opressores. É nesse contexto que sujeitos

são silenciados e/ou violentados pelos que detém o poder e privados do reconhecimento, pertencimento e do direito de poder ser. Quando cientes dessa violência e opressão, os oprimidos, ao questionarem o sistema e reagirem à violência e à opressão, são tomados como os violentos, os bárbaros e os ferozes (FREIRE, 1987); os que fazem balbúrdia. São tomados também como os rebeldes, militantes travestidos de professores e professoras, aqueles e aquelas que buscam problematizar e modificar cenas de uma educação heteronormativa e excludente, seja por meio do incentivo ao pensamento crítico ou encorajando a liberdade de seus alunos e alunas. Junqueira (2014) nos permite refletir sobre o que poderia ser o ponto de partida para (re)pensar a inclusão e o reconhecimento da relevância e necessidade de uma formação que abra espaço para as discussões das temáticas. Parafraseando o autor, seria necessário compreender que uma formação docente pautada na luta contra a opressão de gênero e sexualidade – a dominação masculina e desconstrução de seu status como superior – torna-se um espaço de formação melhor não só para mulheres ou sujeitos LGBTQIA+, mas também para homens heterossexuais e cisgêneros. Enquanto não houver espaço para o tratamento e discussão de questões que constituem o sujeito e os enquadram como subalternos; enquanto o currículo for concebido segundo uma visão conservadora de cultura e conhecimento; enquanto o currículo expressar a epistemologia dominante (SILVA, 1999); “a hipocrisia arvorada em ética dos costumes, que vê imoralidade no corpo do homem ou da mulher, que fala de castigo divino” (FREIRE, 2015, p. 32) se fortalece e ganha cada vez mais espaço nos discursos e nas práticas educacionais.

PALAVRAS-CHAVE: Formação de professoras, Diversidade,

Gênero.

REFERÊNCIAS

FREIRE, P. Cartas a Cristina: reflexões sobre minha vida e minha práxis. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2013.

FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 17.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra: 1987.

JUNQUEIRA, R. Conceitos de diversidade. Diversidade e Educação, v.2, n.3, p. 4-11, jan./jun. 2014.

LOURO, G. L. O corpo educado: pedagogias da sexualidade. 4. ed. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2018.

SILVA, T. T. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 1999.

SILVA, T. T. O currículo como fetiche: a poética e a política do texto curricular. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.

REFLEXÕES EM TORNO DO ENSINO DA EDUCAÇÃO