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Pesquisar é uma atividade cognitiva (KINCHELOE, 1997), visto promover processos mentais em um nível mais aprofundado. Nesse sentido, desenvolver uma pesquisa requer organização, sistematização do pensar, articulação do conjunto de decisões para se adquirir mais conhecimento sobre o fenômeno a ser estudado. Para isso, é preciso o pesquisador delinear o caminho a ser percorrido, embora algumas vezes tenha que redimensionar os procedimentos pré-definidos para a operacionalização do trabalho (BARROS e LEHFELD, 2009), mas isso faz parte do processo de pesquisa, uma vez que a situação investigada é dinâmica e não estática.

O pesquisador deve munir-se de capacidade criadora, organizar racionalmente as possibilidades da ação e eleger os métodos mais adequados (CHIZZOTTI, 2005), a fim de subsidiar a investigação. Para Stubbs e Delamont (1976), citados por Ludke e André (1986, p. 15), é a natureza dos problemas que “determina o método, isto é, a escolha do método se faz em função do tipo de problema estudado”. O pesquisador precisa ter clareza dos pressupostos que sustentarão a investigação, pois um dos pontos fundamentais da pesquisa contemporânea é a necessidade de ir além da tradição de apresentar resultados aos pares, como forma de legitimá-los (MOITA LOPES, 2006). Para tanto, é mister embasar-se em teorizações que dialoguem com o mundo contemporâneo, com as práticas sociais experienciadas pelas participantes.

4.1.1 A pesquisa-ação crítica no paradigma da pesquisa qualitativa

Nesta pesquisa, fundamento-me na perspectiva de que existe uma “relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva entre o sujeito e o objeto, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito” (CHIZZOTTI,

2005, p. 79). Ela é embasada na pressuposição de que a situação estudada não é desvinculada da realidade nem neutra, como os cientistas e educadores cartesiano-newtonianos a concebem, ao contrário, está interligada à vida cotidiana dos participantes da pesquisa.

No paradigma qualitativo, os pesquisadores visam mais aos processos dos fenômenos sócio-histórico-culturais do que os que pressupõem uma realidade pesquisada como “uniforme, logicamente organizada e funcionalmente determinada” (CHIZZOTTI, 2005, p. 29). As mudanças epistemológicas têm causado impactos nas formas de se fazer pesquisa, uma vez que se concebia, há pouco tempo, a concepção positivista, como a única forma de se comprovar cientificamente uma dada realidade, mas hoje as formas tradicionais de conhecimento são questionadas em ciências sociais, o que possibilitam “desenhos de pesquisa de natureza interpretativista” (MOITA LOPES, 2006, p. 25). Nesse sentido, a realidade é concebida como dinâmica e as perspectivas do pesquisador e dos participantes são valorizadas, por essas razões, adoto tal paradigma.

Tendo em vista tais aspectos e o propósito deste estudo, apoio-me no paradigma interpretativista crítico, pois a intenção é ouvir a voz dos participantes nas práticas sociais de leitura investigadas, com intuito de obter a perspectiva deles, levando em conta o contexto social, onde os sentidos “são construídos pelo homem que interpreta e reinterpreta o mundo à sua volta e isto faz com que não haja uma realidade única, mas várias realidades” (MOITA LOPES, 1994, p. 331).

A opção metodológica se justifica, entre outras razões, porque a teoria crítica não se limita ao entendimento nem a descrição do problema investigado, busca problematizá-lo, visando à proposição de alternativas para o problema.

Além disso, a ação dos pesquisadores críticos

é consciente de seus próprios valores de compromisso, os valores de compromissos de outros e os valores promovidos pela cultura dominante. Em outras palavras, uma das principais preocupações da pesquisa-ação crítica envolve a exposição do relacionamento entre valores pessoais e prática(KINCHELOE, 1997, p. 179).

A decisão por desenvolver uma pesquisa-ação crítica (KINCHELOE, 1997) se deve ao fato de focar a prática de leitura em sala de aula, privilegiando a voz dos participantes na interação face a face, de forma reflexiva, por meio da prática do Pensar Alto em Grupo. Essa prática, por sua vez, coaduna com a pesquisa-ação crítica, na proporção em que objetiva uma ação democrática do ensino, valorizando a autorreflexão na construção do conhecimento e se

dá “na forma de experimentação em situação real, na qual os pesquisadores intervêm conscientemente” (THIOLLENT, 1994/2005, p. 21).

Para Kincheloe (1997, p. 180), a pesquisa-ação crítica é o “ato democrático consumado”, porque possibilita aos professores a oportunidade de estabelecer as condições de seu trabalho, o que pode significar a superação do tradicional distanciamento entre pesquisa científica e prática pedagógica. O autor argumenta, apoiado em Paulo Freire, que a pesquisa- ação é muito mais do que estímulo para o pensamento democrático, ela é uma poderosa ferramenta de ensino. Assim, é importante usá-la como estratégia pedagógica em sala de aula, com vista ao fortalecimento da prática docente como fonte de pesquisa e da autonomia do professor, o que se torna benéfico para o professor e o aluno. Para o professor, porque, ao ouvir e ao validar as vozes, possibilita aos alunos agirem de forma ativa, e para o aluno, porque se vê como participante valorizado pelo professor e pelo grupo nas interações ocorridas no ambiente escolar.

Greenwood e Levin (2006) denominam a pesquisa-ação como investigação co-

produtiva, porque implica um trabalho colaborativo entre pesquisadores e pesquisados. É um processo considerado fundamental, porque os pesquisadores experientes na organização da pesquisa partilham informações sobre outros casos e métodos relevantes e os pesquisados são os que mais têm conhecimento do problema, pois estão imersos nessa realidade, o que facilita a apropriação da situação investigada pelo pesquisador.

Esses estudiosos descrevem a pesquisa-ação como:

uma investigação na qual há uma co-produção de conhecimentos entre participantes e os pesquisadores por meio de processos comunicativos colaborativos nos quais todas as contribuições são levadas a sério. Os significados construídos no processo de investigação conduzem à ação social, ou ainda essas reflexões sobre a ação levam à construção de novos significados (p.102).

A pesquisa-ação visa à resolução de problemas reais, busca objetivamente resolvê-los em situações específicas. Nessa abordagem, os resultados devem ser tangíveis, para que os participantes tenham a oportunidade de avaliar se o proposto para solucionar o problema possibilita êxito ou não (GREENWOOD e LEVIN, 2006).

De qualquer forma, as discussões tecidas, nesta seção, visam mostrar, com mais detalhamento, as características da pesquisa de natureza qualitativo-interpretativista, do tipo pesquisa-ação, e promover a reflexão sobre a mudança da perspectiva de um ensino tradicional, cujas “pedagogias modernistas reduzem o ensino a um ato técnico de remeter informações certificadas por especialistas” (KINCHELOE, 1997, p. 181), para um ensino que

forneça “uma situação na qual a criação do conhecimento adquire realmente uma significação mais profunda” (KINCHELOE, 1997, p. 210).