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O RIO E O POVO: O PROCESSO DE

as investigações que requerem do tempo uma explicação lógica para a organização espacial. Há, portanto, um “tempo do espaço”

(SANTOS; SILVEIRA, 2001). Abreu (2006) também ressalta a im-portância de se periodizar. Para o autor, “pensar o passado do es-paço não significa fazer geografia antiquaria. Significa buscar em tempos já idos as chaves de interpretação do presente” (ABREU, 2006, p. 24). Não significa sublinhar esses “tempos congelados”

como se não houvesse participação atual, mas entender o movi-mento das relações socioespaciais de uma maneira interligada, e não isolada.

Nesse texto, a partir da geo-história, procuraremos anali-sar a conformação espacial, com ênfase nos diferentes usos de curto, médio ou longo período de tempo, a Geografia e a His-tória se unindo para compreender um fenômeno utilizando um recorte espacial e temporal. O objetivo dessa união é buscar no tempo uma explicação para a organização espacial. Após essas orientações analíticas, objetivamos analisar o processo de forma-ção espacial do arraial de Pilões, que teve como marco inicial de povoamento os recursos minerais encontrados nos rios Pilões e Claro, localizados na microrregião de Iporá. Pilões foi um arraial de mineração importante em Goiás no século XVIII. Atualmente (2018), o território que fora o arraial pertence à cidade de Israe-lândia-GO.

Formação Espacial de Pilões: elementos constitutivos da trans-formação da natureza

A título de exemplo, vários conjuntos populacionais foram formados às margens de rios, sendo a Mesopotâmia, formada en-tre os rios Tigres e Eufrates, um dos mais significativos. O povoa-mento do Brasil, apesar de ser predominante no litoral,

interio-rizou-se exatamente guiado pelos rios. As cidades mineiras que surgiram nas áreas de existência mineral, também foram erguidas às margens de rios, pelas características da mineração de aluvião.

No caso em análise no presente capítulo, o arraial de Pilões foi for-mado às margens dos rios Claro e Pilões, a partir do século XVIII.

Antes, porém, de especificar esse processo procederemos a uma breve contextualização.

O Brasil, desde o início da sua colonização, foi conhecido pelas inúmeras riquezas encontradas em seu território, ainda que pouco delimitado. Alguns autores retratam o processo da for-mação territorial de Goiás, dentre eles, destacamos Prado Junior (2011), ao explicar que o território brasileiro, nos primeiros anos de colonização, forneceu riquezas incontáveis a Portugal. Foi as-sim com o pau-brasil no século XV, com a cana-de-açúcar e o café no século XVI/VXII, e, no final do século XVII e início do século XVIII, com o ouro.

Segundo Teixeira Neto et al. (2004), a princípio, a coroa Portuguesa só queria proteger as terras da cobiça de outros países, porém,

[...] a apropriação do território brasileiro foi um projeto do Estado Português, que, incialmente, tinha como fi-nalidade preservar as terras do Brasil da cobiça estran-geira, e, posteriormente, durante três séculos, com a co-lonização portuguesa, acumular riquezas e fortalecer o Estado por meio da produção para o mercado europeu.

(TEIXEIRA NETO et al., 2004, p. 66).

Andriolo (1999, p. 7) relata que “Nos primeiros dois séculos de colonização portuguesa na América (XVI e XVII), os colonos concentraram-se no Nordeste brasileiro, de onde saíam

carrega-mento de açúcar rumo à Europa”. Ou seja, a produção se concen-trava ainda próxima ao litoral, justamente pelo fácil escoamento, que era feito por navios, para ser vendida no comércio interna-cional. Outro fator que justificava a produção próxima ao litoral decorria do conhecimento rarefeito do interior do Brasil.

A forte concorrência internacional pelos bens que eram produzidos no Brasil fez com que a Coroa Portuguesa abrisse os olhos para um novo processo econômico. Andriolo (1999) afirma que:

A partir de 1630, a produção açucareira do Nordeste da América portuguesa começou a enfrentar a concorrên-cia do açúcar produzido nas Antilhas pelos holandeses, franceses e ingleses. O preço do produto antilhano na Europa era mais convidativo que o da América portu-guesa. Isso porque a distância menor da Europa tornava o transporte mais rápido e barato. As Antilhas também passaram a importar mais escravos para suas lavouras, elevando o preço dessa mão de obra no mercado inter-nacional e dificultando ainda mais a situação de crise instaurada no Nordeste com a diminuição das vendas do açúcar. (ANDRIOLO, 1999, p. 8).

Esse fator fez com que a Coroa Portuguesa, sabendo dos recursos minerais que o interior da Colônia ofertava, criasse al-gumas políticas de interiorização em busca de índios e minerais, o que culminou mais tarde na descoberta e na fundação de Mato Grosso e Goiás.

O período entre os séculos XIV e XVIII foi marcado pelo mercantilismo, que tinha no comércio o seu centro econômico, e, para isso, o acúmulo de metais era fundamental, sendo o ouro e a prata encontrados em variadas longitudes e latitudes do planeta

Terra. Diferente da colonização espanhola que explorava as gran-des minas de prata em sua área de domínio, a Coroa portuguesa só passou a explorar o ouro em sua colônia a partir do final do sé-culo XVII, especialmente no sésé-culo XVIII, quando foram “desco-bertas” as minas de Minas Gerais, Mato Grosso e Goiás. A partir disso, o século XVIII marcou a intensificação do povoamento e a expansão para o interior do país. Esse processo ficou conheci-do como ocupação conheci-do Brasil Central. Nos séculos XVI e XVII já havia expedições a fim de procurar riquezas pelo território bra-sileiro, porém, no século XVIII houve a fixação de população no interior do país. Cada nova notícia de descobrimento de jazidas minerais atraía mais e mais pessoas com o objetivo de enriquecer.

As riquezas minerais existentes no que seria a província de Goiás foram a base constituinte do seu futuro território. Dessa forma, Goiás, em sua gênese constitutiva, é filho do processo de exploração mineral realizado no período colonial. Assim, a sua formação socioespacial provém da forma como essas riquezas foram apropriadas e das ações dos seus atores. A posição e a lo-calização das minas goianas compõem os primeiros fatores que influenciaram a formação do estado, pois, além de ficarem no ca-minho entre as minas de Cuiabá e São Paulo, para onde escoava a produção mineral, também eram banhadas por rios, possibili-tando o início da exploração do ouro de aluvião4. Cunha Mattos (1979) relata que poucas províncias do Brasil são regadas por tan-tos e tão caudalosos rios como é Goiás. Assim como o arraial de Sant’Anna, vários arraiais surgiram próximos às margens dos rios em que os minerais eram encontrados. Dessa forma, fica evidente

4 O ouro explorado era, geralmente, o de aluvião (depósito de cascalho, areia e argila que se forma junto às margens ou à foz dos rios, proveniente do trabalho de erosão), que se depo-sitava no leito dos rios, nas suas margens ou nas zonas próximas atingidas pelas enchentes.

Introduziu-se o emprego de alguns instrumentos toscos, como a chamada bateia, originária da África, e que ainda hoje é vista no interior do estado de Minas e Goiás, habilmente manejada pelos homens que vivem da extração de pequenas parcelas de ouro mineral. (FRANCO, 2007, p. 115).

um aspecto da formação socioespacial desse período: os núcleos de povoamento surgiram nas áreas de mineração, às margens dos cursos d’água.

O atual território de Goiás pertencia à província de São Paulo. Silva (2002, p. 37) aponta que “Goiás começou a se for-mar pelo lado de São Paulo, isto é, confins das terras paulistas, então conhecidas, para o interior que a coragem dos bandeiran-tes ia descobrindo e percorrendo”. As bandeiras eram expedições particulares, com permissão e financiamento por parte da Coroa portuguesa, que buscava riquezas no interior do país. Palacín e Moraes (1994) afirmam que as bandeiras tinham um papel im-portante, sendo que:

Goiás era conhecido e percorrido pelas bandeiras quase que desde os primeiros dias da colonização, mas seu po-voamento só se deu em decorrência do descobrimento das minas de ouro no século XVIII. Esse povoamento, como todo povoamento aurífero foi irregular e instável.

(PALACÍN, 1994, p. 5).

As primeiras bandeiras conduziam uma mensagem de es-perança para o povo. Por esse motivo, várias pessoas tentaram a sorte na Capitania de Goiás, seja em busca de riquezas mine-rais ou do aprisionamento de indígenas para o trabalho escravo.

A formação socioespacial de Goiás começa a se concretizar com a chegada dos bandeirantes. Nesse contexto, houve duas figuras importantes para o processo de formação espacial de Goiás, bem como do arraial de Pilões: Bartolomeu Bueno da Silva, pai e fi-lho. Conforme afirma Silva (2002), Bartolomeu Bueno da Silva não foi o primeiro a penetrar em território goiano. Porém, foi o primeiro com intenção de se fixar. Ainda de acordo com o autor,

Manoel Correia foi o primeiro a penetrar em terras goianas, ainda no século XVII. “É Manoel Correia, sertanista de conhecida fama, presume-se, o primeiro que, à busca do ouro, cuja quantidade se anunciava muito grande, rumou a Goiás, por onde, à procura do gentio, em serviço de catequese, em 1625, teriam andando os je-suítas” (SILVA, 2002, p. 110).

As narrativas são importantes para destacar a personifica-ção que os historiadores fazem em relapersonifica-ção a Bartolomeu Bueno da Silva. Ele não foi o primeiro a vir a Goiás, porém, foi o que mais recebeu destaque pelos minerais encontrados quando veio a Goiás numa expedição. Antes de detalharmos a chegada de Bueno a Goiás e ao que veio a ser o arraial de Pilões, ressalta-se que, no século XVIII, o Brasil foi marcado pela extração do ouro em gran-de quantidagran-de. Na verdagran-de, foi o terceiro grangran-de período autôno-mo da formação econômica brasileira. Alguns autores conside-ram o período do ouro como o de maior importância econômica para o país, é o caso de Salles (2002) e Franco (2007). Esse último autor relata que no início da colonização a Coroa Portuguesa ti-nha exclusividade na procura pelo mineral.

No Brasil, desde o século XVI, a atenção para o ouro e as pedras é praticamente exclusiva. A primeira expedição de reconhecimento, feita em 1501, já se atormentava com a descoberta das minas. Daí por diante, marchan-do de desilusões em desilusões, nada desanimaram os conquistadores. (FRANCO, 2007, p. 109).

E continua: “O ouro do Brasil teve uma grande importância na economia e nas finanças internacionais, contribuindo, de forma decisiva, para que se alterassem os quadros da civilização europeia no século de sua grande exportação”. (FRANCO, 2007, p. 112).

A Bandeira que marcou o início do povoamento e da explo-ração dos sertões goianos é a de Bartolomeu Bueno da Silva. Os cronistas e historiadores de Goiás relatam apenas um Bartolomeu Bueno da Silva em toda a história goiana, entretanto, no contexto histórico de Goiás há duas figuras importantes que carregam em si o mesmo nome (Bartolomeu Bueno da Silva “pai” e Bartolomeu Bueno da Silva “filho”). Bartolomeu Bueno da Silva é considerado o “descobridor” de Goiás. Quando veio a essa Capitania trouxe o filho de doze anos que também possuía o mesmo nome: Bartolo-meu Bueno da Silva. Dessa forma, temos em Goiás BartoloBartolo-meu Bueno da Silva (pai), que descobre as minas em Goiás ainda no século XVII, e o filho de mesmo nome, que retorna quarenta anos depois para explorar as minas encontradas pelo pai.

A expedição (Bandeira) do primeiro Bartolomeu Bueno da Silva (pai) foi realizada no ano de 1682, conforme afirmam alguns historiadores. Silva e Souza (1967) relatam que:

Entre os aventureiros desta espécie se distinguiu Bartolo-meu Bueno da Silva, natural da vila de Paranaíba, que os seus conterrâneos contam entre os seus heróis. Este ho-mem naturalmente afoito, astucioso e avezado a trabalhos desta natureza, a quem o gentio deu o nome de Anhan-guera, que conservam os seus descendentes, que na lin-guagem do país quer dizer Diabo Velho pelo estratagema de acender aguardente em uma vasilha, com ameaça de abrasar todos os rios e todos os índios que se lhe não ren-dessem, seguido de um filho do mesmo nome, de idade de doze anos (que veio a ser o descobridor desta capitania), e outros agregados, chegou pouco mais ou menos em 1682 ao domicilio do pacífico gentio de Goiás, que agora habi-tamos: e demorando-se algum tempo no meio das suas correrias, que compreenderam grandes partes destes

ser-tões, a plantar roça que melhorasse a sua sustentação, re-conheceu a riqueza do lugar vendo folhetas de ouro bruto pendentes ao colo das índias, e com esta certeza, confir-mada de algumas indagações, regressou ao seu país natal, seguido de numerosas presas que tinha feito, a utilizar-se do fruto de seu trabalho. (SILVA E SOUZA, 1967, p. 7).

Segundo Palacín e Moraes (1994), Bueno preferiria morrer na expedição a voltar a São Paulo fracassado. Nessa expedição re-cebeu o apelido de Anhanguera, que significa “Diabo Velho”, pelo fato de ter ateado fogo num prato de aguardente para intimidar os índios Goyazes a lhe mostrarem onde ficavam as jazidas de ouro (pois os índios andavam com colares de ouro), caso contrário, co-locaria fogo em todos os rios. Os índios amedrontados correram e mostraram as jazidas a Bueno.

Bueno (pai) conseguiu encontrar riquezas minerais no rio Vermelho, onde hoje é a Cidade de Goiás – GO. A expedição, em-bora de caráter particular, teve que regressar a São Paulo para pedir autorização da Coroa Portuguesa para explorar as minas de ouro encontradas em Goiás. Mas, Bueno já velho não conseguiu retornar e explorar as minas em Goiás, sendo Bartolomeu Bueno da Silva (filho, que acompanhou o pai na primeira expedição) quem retorna para explorar as minas de ouro por volta de 1722. De acordo com esse contexto, Palacín e Moraes (1994) explicam que:

A bandeira saiu de São Paulo a 3 de julho de 1722.

O caminho já não era tão difícil como nos primeiros tempos. Até o rio Grande era bem conhecido dos pau-listas, com alguns moradores e com rotas, para além, o Anhanguera dizia possuir um roteiro até o lugar do ouro. (PALACÍN; MORAES, 1994, p. 9).

Ao mencionarmos Bartolomeu Bueno da Silva, no contexto de exploração, estamos referindo ao filho, que acompanhou o pai na primeira expedição de reconhecimento do lugar. Agora, Bueno (filho) retorna a Goiás com a intenção de se fixar, explorando os recursos minerais encontrados no leito dos rios.

A Bandeira saiu de São Paulo. Bueno era o cabo da tropa e foi acompanhado por grande comitiva. Os conflitos com os in-dígenas eram iminentes, visto que essa população autóctone já era aprisionada para a escravidão. Na medida em que a Bandeira adentrava o sertão goiano as transformações da natureza começa-vam a se materializar, efetivando a extração de ouro para abaste-cer a cobiça da metrópole portuguesa.

O objetivo de Bueno na expedição era chegar ao rio Verme-lho para explorar os minerais encontrados pelo pai na primeira expedição. Nesse momento histórico e geográfico é relevante fri-sarmos que as descobertas de ouro nos rios Claro e Pilões só se deram através de um erro no trajeto de Bueno. As descobertas datam de 1722/1723, mas, a exploração e o início do povoamento no arraial só aconteceram vinte anos depois. Vejamos.

Bueno já não se lembrava mais do trajeto que fizera há qua-renta anos, o que culminou em sua perda no dilatado território goiano. O desbravador fora enganado pelos descobertos de ouro, pois, essa primeira fase de exploração mineral em Goiás foi “anár-quica” em termos de exploração e fixação de população, confor-me salientam Palacín e Moraes (1994). A intenção de Bueno era chegar ao rio Vermelho, porém, perdendo o norte vagou mais a oeste da Capitania, a um rio de águas cristalinas no qual encontra-ram ouro e por ali permaneceencontra-ram por um tempo. Batizaencontra-ram o rio como Claro, justificando as águas cristalinas. Logo encontraram ouro em outro rio, que batizaram de Pilões, afluente do rio Claro.

A toponímia do rio Pilões é fruto de uma discussão entre os

histo-riadores goianos que, por um lado, acreditam que os bandeirantes deram tal nome em referência aos pilões encontrados no rio que os viajantes fizeram para fabricarem sua alimentação (D’ALIN-COURT, 2006), e, por outro, defendem que o próprio movimento das águas, atrelado ao processo de intemperismo, modificou as rochas, dando origens a empreendimentos côncavos (CUNHA MATTOS, 1979).

Por conseguinte, a conclusão mais próxima a que chegamos sobre a toponímia foi a de que o rio dos Pilões recebeu este nome pela fabricação de pilões para prepararem algum tipo de manti-mento para subsistência, seja o milho ou o fubá. Mas, também, pode ser discutido o batismo do rio devido às rochas côncavas observadas pela força da água junto com o processo de intempe-rismo.

Pohl (1976) detalha o erro no trajeto de Bueno.

Depois de peregrinarem por longo tempo, os aventu-reiros atingiram as proximidades do Arraial do Bom-fim, à margem do riacho que ainda hoje conserva o nome de Meia Ponte. Daqui seguiram em direção a Anicuns para descobrirem Bocaina Velha, onde o pai do chefe outrora fizera plantações, e, assim, perderam a direção do norte, pois estes ignorantes viajantes não dispunham de outro auxilio para se orientarem que não os próprios olhos e os picos das montanhas. As-sim, erraram por muito tempo sem acharem o que buscavam. Afinal chegaram a um rio a que deram o nome de Pilões, por causa dos pilões em que moíam o milho, ou por causa das depressões arredondadas ainda hoje reconhecíveis nas saliências rochosas do Rio Claro. Pesquisaram ouro no rio e acharam abun-dantes areias auríferas. Este resultado favorável levou

João Leite da Silva Ortiz a declarar que tinham achado o que buscavam, portanto deveriam ficar por aqui e fundar uma povoação. A isto opôs-se Bueno, dizendo que esta não era a região que ele saíra para descobrir e que, por isso, era necessário prosseguir. A discus-são inflamou-se e teria talvez terminado em sangue, se os dois sacerdotes que os acompanhavam não os tivesse reconciliado. Deram razão a Bueno. Levanta-ram acampamento e seguiLevanta-ram a viagem em direção a Oeste, entre constantes combates com os aborígines.

Nessas escaramuças fizeram mais prisioneiros, sobre-tudo mulheres índias. (POHL, 1976, p. 126-127).

O Mapa 1 ilustra o caminho percorrido pela bandeira de Bartolomeu Bueno da Silva, enfatizando a perda em seu trajeto.

Mapa 1 – Caminho percorrido pela Bandeira de Bartolomeu Bueno da Silva

Fonte: Organização: Alves (2014).

São vários os autores que relatam a perda no trajeto de Bueno, destacando que a expedição ficou perdida por cerca de três anos na Capitania, como Pohl (1976), Eschwege (1979), Palacín e Moraes (1994), Cunha Matos (1979) e Alencastre (1863). Esses autores construíram itinerários sobre a Capitania de Goiás. Como Bueno teria encontrado riquezas minerais nos rios Claro e Pilões, muitos da tropa disseram que o local era o mesmo em que o Bueno (pai) teria encontrado os minerais, porém, Bueno (filho) insistiu que não era naquele lugar. Sen-do assim, várias pessoas da expedição voltaram a São Paulo e o restante continuou acompanhando Bueno, que, após um período, reorganizou o seu trajeto e conseguiu chegar ao rio Vermelho, fundando o arraial de Sant’Anna em 1726, e inician-do o processo de povoamento inician-dos bandeirantes na Capitania de Goiás.

A região dos rios Claro e Pilões já ficou conhecida no erro do trajeto de Bueno. Em 1746, após um período de (re)descobri-mento de alguns rios auríferos em Goiás, a região começou a ser explorada novamente, agora com a construção de um arraial que fora batizado de Bom Fim, em 1746. No mesmo ano, os índios Ca-yapós, numa tentativa de retaliação, destruíram o arraial, pondo fim à exploração.

Nesse período, Goiás já se destacava pela quantidade de ouro extraído. A Coroa Portuguesa, almejando uma produção maior, decide intervir e autorizar a formação de um arraial no mesmo lugar de Bom Fim (destruído pelos índios), juntamente com uma guarnição da Polícia Real. O novo arraial, agora com o nome de Pilões (jus ao rio Pilões), ganha materialidade, trans-formando o espaço de primeira natureza em segunda natureza a partir da necessidade humana, resultando numa formação espa-cial. Logo, Pilões passou a ser um lugar estratégico interligando a

capital da Capitania de Goiás (Vila Boa, atual Cidade de Goiás) às minas de Cuiabá.

A população sempre se apropriou de espaços próximos aos recursos hídricos justamente por atenderem as suas necessidades básicas. No caso do povoamento de Pilões, há uma junção entre esses elementos constitutivos de necessidades atrelados aos recur-sos minerais encontrados em seu leito. Dessa forma, tal população resultou, anos após, em algumas cidades que compõem o urbano nacional, fruto do processo de apropriação da natureza ainda no século XVIII, seja por condições de melhorias econômicas ou por necessidades de sobrevivência.

Considerações Finais

A formação espacial é o resultado das relações socioespa-ciais. A interação do homem, transformando a natureza, ilustra a produção do espaço material, em que há uma transformação de primeira para segunda natureza. No caso de Goiás, através da mineração, a partir das descobertas de ouro e diamante, os ban-deirantes fixaram população e transformaram a natureza.

As formações espaciais decorrentes das descobertas de Províncias Minerais, especialmente de ouro e diamante, decor-riam da sua existência e possibilidade de exploração, conside-rando que no início da colonização as técnicas de extrações eram baseadas na mineração de superfície, a exemplo do garimpo de ouro de aluvião e monchões secos, mais próximos aos veios d’água. Assim, além do espaço herdado da primeira natureza (a existência das Províncias Minerais), que condicionava a locali-zação do surgimento dos povoados, o seu domínio territorial, na maioria das vezes, significou destruir formações socioespaciais anteriores, como no exemplo de Pilões, quando os exploradores

expulsaram ou mataram os habitantes autóctones, nesse perío-do, os Caiapós.

O arraial de Pilões foi um dos principais arraiais de minera-ção em Goiás no século XVIII. O seu início de formaminera-ção remete à perda no trajeto de Bueno a fim de chegar ao rio Vermelho. No século XVIII, a população da Província de Goiás atraía mineiros de todos os lados do país, acompanhados pela fase anárquica de povoamento, instalando-se onde houvesse ouro e diamante. No local em que se encontravam tais minerais se formava um núcleo urbano, que poderia ser esvaziado pela falta de recursos minerais e iniciado um novo onde houvesse vestígios de ouro e diamante.

Sendo assim, essa fase é bastante anárquica em termos de fixação de população. Pilões não deixou de ser povoado, principalmente pelos recursos minerais encontrados no leito dos rios Claro e Pi-lões e por praticar a agricultura baseada na pecuária e na produ-ção de alimentos quando esses minerais ficaram escassos.

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