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As análises

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“O lugar é aqui, a hora é agora, e a jornada nas sombras que assistiremos poderia ser a nossa jornada”

Narração de abertura de “Where is Everybody?"

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Nos três subcapítulos a seguir analisaremos um grupo de 18 episódios de

The Twilight Zone divididos em três eixos temáticos. Esses eixos são (I) a solidão,

(II) a aventura e (III) a metamorfose. Eles são fruto de uma apreciação inicial da série mas também são um recorte. A série apresenta muito mais do que apenas três temáticas, por mais envolventes que esses três eixos possam ser. A caráter de esclarecimento, poderíamos ainda mencionar que ela apresenta um eixo especificamente místico, abordando reflexões puramente transcendentais sobre a natureza religiosa ou metafísica da existência e geralmente povoados por anjos ou figuras demoníacas que envolvem os humanos em desafios morais, e pelo menos mais um eixo, esse especificamente fantástico, repleto de histórias sobre fantasmas, feitiçaria e objetos e situações imbuídos de poderes mágicos. Também seria prudente esclarecer que alguns dos episódios apresentados aqui poderiam muito 24 bem fazer parte de mais de um eixo, mas, com o objetivo de trazer clareza à exposição optamos por recortá-los naquilo que lhes é mais significativo. Compreendemos que em certo sentido é a própria série, em seu contexto e caráter produtivo, que facilitam esse recorte.

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Escolhemos esses eixos pois chegam a nós como os que melhor e de maneira mais coerente articulam os tópicos que buscamos investigar e, também, são os que de maneira mais frontal se relacionam com a tradição da Ficção Científica e da ficção utópico-distópica. Desse modo podemos partir da série, deixar que ela mesma construa nosso caminho intelectual e permita que interpelemos os tópicos exteriores para dentro da análise e, por assim dizer, também para dentro da série. Conseguimos assim que a série fale por si mesma, ditando o rumo da investigação e a encadeação dos episódios, e permitimos que nossos

Como por exemplo “A World of His Own”, onde o escritor Gregory West possui um gravador

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questionamentos teóricos possam ser buscados enquanto balizas desse trajeto, fomentando a análise. A seleção de um conjunto de 6 episódios por eixo, ou 18 no total, é atípica e um tanto extensa, mas se justifica pela brevidade dos mesmos e 25 de sua exposição. O objetivo é expor as nuances que cada temática, em sua relação com os tópicos da utopia e da construção da identidade na modernidade tardia, desenvolve ao longo dos curtos mas extremamente influentes anos da série e para isso supomos que um corpo mais largo de episódio nos forneceria mais perspectivas sobre o conteúdo da série como um todo. Os episódios serão apresentados dentro de cada eixo de modo cronológico, partindo-se dos mais antigos, portanto das primeiras temporadas, até os mais recentes. Ao começo de outro eixo apresentaremos, então, novamente os episódios mais antigos e assim por diante. Esse método permite-nos encadear os episódios de forma a dar destaque para o desenvolvimento de cada temática ao longo do curso da exibição original da série entre os anos de 1959 e 1964, formando uma apresentação que é o mesmo tempo linear (os episódios dentro de cada eixo sendo apresentados cronologicamente) e não-linear (a apresentação cronológica se repete em cada eixo, retornando sempre ao início da série).

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As análises dos episódios dentro de cada eixo serão encaminhadas através de três movimentos distintos mas relacionados. De fato, através de três movimentos de hermenêutica dupla. O primeiro movimento consistirá numa exposição detalhada dos episódios, reproduzindo de maneira sucinta a narrativa deles, trechos de diálogos e narrações em off ou com a presença do apresentador, Rod Serling, em cena. Esse movimento exporá o episódio, recostando sua narrativa e contextualizando-o naquilo que percebemos como pertinente e terá o intuito de familiarizar o leitor com o objeto em questão, enquadrando-o na perspectiva propositva que é central ao tema específico de cada eixo e à série como um todo. Assim não será requisitado que o leitor tenha assistido ao episódio ou a série para que possa acompanhar os desdobramentos que serão encaminhados nos segundo e terceiro movimentos. Optamos por não reproduzir integralmente uma transcrição dos episódio devido a quantidade de episódios selecionados e o ônus de espaço que isso acarretaria no corpo geral do trabalho. Isso, a nosso ver, tiraria o foco do

terceiro movimento, o qual esclareceremos a seguir, e que é o mais relevante e essencial ao trabalho apresentado aqui.

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A esse primeiro movimento, expositivo e de contextualização, se seguirá um segundo movimento, esse de natureza interpretativa e argumentativa e que será uma espécie de segunda leitura e segunda exposição do episódio. Novamente

duplo, nesse movimento buscaremos uma interpretação de cada episódio através de

uma apreciação ao mesmo tempo da narrativa visual e dos tópicos e situações apresentadas no episódio. O objetivo é ler os episódios através de um exercício hermenêutico que consiga desencobrir as múltiplas articulações presentes nas situações, personagens e falas que constituem a narrativa e assim construir uma chave de leitura, uma ponte que conecte a inserção do episódio no eixo temático com sua elaboração dos tópicos que fazem falar o momento histórico e as questões que queremos problematizar. Ou seja, este movimento interpretativo constituirá a ligação do episódio específico com o eixo temático com o qual se identifica, seja ele solidão, aventura, ou metamorfose, assim como os tópicos (a utopia e a construção da identidade) que se revelam em sua narrativa. Ele será o movimento que nos possibilitará ligar exposição à análise propriamente dita e será uma operação de destaque de pontos fundamentais dentro da narrativa, de apresentação de informações adicionais sobre a série, sobre o episódio específico e sobre o contexto histórico-ideológico no qual ela se insere.

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Isto levará-nos a um terceiro movimento, este centralmente crítico, no qual desenvolveremos análises a respeito de cada episódio. Estas análises verterão portanto conclusões e essas poderão ser exclusivas de cada episódio analisado, derivadas de uma conjugação entre dois ou mais episódios que sejam

companheiros, específica do eixo no qual esse ou esses episódios estejam inseridos

ou ainda pistas mais gerais acerca da coerência temática da série e de sua abordagem dos tópicos que trazemos à baila. Este terceiro movimento consistirá basicamente em delimitar aonde a ponte que percebemos no primeiro movimento e delimitamos no segundo encontra-se com os tópicos da utopia (e seu tópico paralelo, a ideologia) e da construção da identidade na modernidade tardia. Este movimento interpela o nosso arcabouço teórico e nossa recuperação bibliográfica

acerca dos tópicos em questão, acionando-os como dispositivos de complementação dos outros dois movimentos. Este movimento permitirá-nos conectar o que a série nos fala, que vem à tona através do primeiro movimento, e o que percebemos nisso ser importante ou relevante, uma demarcação feita através do segundo movimento, com aquilo que se apresenta dentro do episódio como uma articulação da tradição do gênero da Ficção Científica e utópico mas, mais central do que isso, como a série medeia essas questões.

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Esses movimentos, entretanto, não seguirão uma ordenação pontual. Eles serão em vezes concomitantes, sobrepondo exposição, interpretação e crítica e seguindo os rastros que a própria série pontuará e que serão tornados claros, então, pelos primeiro e segundo movimentos. Ao início de cada eixo retomaremos a demarcação conceitual de cada um, recuperando seus pontos principais e suas características mais gerais e ao início da exposição de cada episódio demarcaremos seu título e tradução. Os dados técnicos, como data de transmissão original, roteiro, direção e atores estarão contidos na própria exposição. Essas duas estratégias nos possibilitarão sempre guiar a leitura e compreensão das análises a fim de contextualizar as interpretações apresentadas e balizar as conclusões. Ao final do encadeamento da exposição, interpretação e análise crítica de todos os episódios pertencentes a um eixo apresentaremos um panorama geral e um conjunto de conclusões preliminares acerca do tema. Essas conclusões terão caráter provisório e servirão como pano de fundo para a formulação de um capítulo final conclusório que, esse sim, abarque as conclusões mais definitivas da análise de The Twilight

Zone nesse recorte de eixos temáticos e episódios que os compõem. Teremos,

assim, dois movimentos introdutórios, um presente no capítulo anterior e embasado na exposição e análise do episódio-piloto da série, “Where is Everybody?”, enquanto vetor que nos apresenta aos eixos temáticos da série e interpela os tópicos conceituais que balizarão a análise e um segundo, presente ao início de cada eixo, que servirá para demarcar a temática em questão e problematizar a leitura, exposição, interpretação e análise crítica dos episódios.

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Também teremos, portanto, dois movimentos conclusórios, um preliminar, parcial e que resume cada um dos eixos, e um segundo capaz de articular todas

essas disposições preliminares de forma a capacitar um capítulo coeso, conclusivo e que resgate o que de mais pertinente foi averiguado em cada episódio, cada eixo e no panorama geral que esses capítulos e eixos desenham sobre a série. Essa simetria permitirá que o leitor acompanhe a exposição, a formação de uma chave de leitura, a crítica e a construção de um enfoque provisioriamente conclusivo de maneira organizada e na qual sempre estará disponível uma pontuação que indique os caminhos tomados e as questões expostas. Guiando e pontuando eixos, episódios, movimentos expositivos e críticos, introdutórios e conclusivos, acreditamos que a leitura seja mais fluida, as discussões mais inteligíveis e os resultados finais mais mapeáveis.

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Partiremos agora para as análises, começando pelo que denominamos Eixo I - Solidão.

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3.1 O último homem na Terra

Eixo 1 - Solidão

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- The lonely (1959)

- Time enough at last (1959) - A world of his own (1960) - Shadow play (1961)

- The mind and the matter (1961) - It’s a good life (1961)

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"Com todos os seus defeitos pode muito ser que esse seja o melhor de todos os mundos possíveis"

Narração final de “The Mind and the Matter"

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