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9. AVALIAÇÃO AMBIENTAL DE PROJETOS HIDROVIÁRIOS

9.1. Planejamento

Tão importante e talvez ainda mais efetivo do que definir critérios e procedimentos para o licenciamento ambiental é promover uma evolução no processo de planejamento do setor hidroviário, desde a definição das políticas à execução dos projetos. Alguns estudos já abordaram a necessidade de realizar o planejamento integrado dos projetos e destacaram as vantagens dessa abordagem em relação ao método tradicional de desenvolvimento de projetos, dentre os quais, podemos destacar os seguintes: ECMT (2006), PIANC (2008b), ICPDR (2010) e European Commission (2012).

A Conferência Europeia dos Ministros de Transportes (European Conference

of Ministers of Transport – ECMT) elaborou o documento “Inland Waterways & Environmental Protection” (ECMT, 2006) que reúne práticas e experiências

adotadas em alguns países selecionados, entre outros itens, sobre as questões ambientais relacionadas ao transporte hidroviário interior. O documento ressalta que o planejamento estratégico para o desenvolvimento de bacias hidrográficas que integre os aspectos econômicos, sociais e ambientais poderia facilitar a construção de consensos sobre projetos desenvolvidos individualmente.

Já a Associação Mundial para a Infraestrutura de Transporte Aquaviário - PIANC emitiu um documento intitulado "Working with Nature" (PIANC, 2008b), que

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propõe uma importante mudança na abordagem para o desenvolvimento da navegação buscando maximizar as oportunidade e reduzir as frustrações por meio do planejamento integrado do projeto.

Também a fim de proporcionar mais orientações sobre como aplicar os

princípios de planejamento integrado, foi elaborado, no âmbito do projeto PLATINA9,

o "Manual on Good Practices in Sustainable Waterway Planning” (ICPDR, 2010). Publicado em 2010, o manual fornece um guia prático para os planejadores da navegação fluvial em toda a Europa sobre a forma de organizar e implementar um processo de planejamento equilibrado e integrado para as atividades da navegação fluvial.

Por sua vez, o “Guidance document on inland waterway transport and Natura

2000” (EUROPEAN COMMISSION, 2012) tem foco na relação dos projetos com o

Natura 200010, mas aborda de forma ampla o planejamento dos projetos para

infraestrutura hidroviária. O documento enfatiza as vantagens do planejamento integrado no desenvolvimento desses projetos.

Essas abordagens focam principalmente no planejamento e desenvolvimento do projeto. Cabe destacar ainda que esses estudos foram desenvolvidos na Europa, onde o transporte hidroviário interior já vem sendo desenvolvido há muito tempo e as políticas e diretrizes para o THI já estão consolidadas.

No atual cenário brasileiro, observa-se a necessidade de desenvolver, além do planejamento integrado dos projetos, um planejamento estratégico que considere todas as dimensões (social, econômica, técnica e ambiental) antes da própria definição de cada projeto. Nesse sentido, sugere-se uma proposta mais adaptada à realidade brasileira para auxiliar o planejamento do setor hidroviário.

Trata-se de uma proposta inicial, adaptada ao atual contexto brasileiro, com o objetivo de contribuir para a melhora do planejamento do setor hidroviário no País,

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O consórcio PLATINA é uma plataforma para a implementação do programa de ação NAIADES UE financiado no âmbito do Programa FP7. O projeto visa promover e fortalecer um transporte interior ambientalmente amigável na Europa em 5 áreas: mercado, frota, empregos e qualificações, imagem e infra-estrutura.

O plano de ação NAIADES é uma iniciativa para aumentar o uso da navegação interior como parte de soluções intermodais de carga, a fim de criar uma rede de transportes competitiva sustentável e ambientalmente amigável no países Europeus.

O consórcio núcleo é formado por via Donau (Áustria) como coordenador, Voies navigables de France (França), Bundesverband der Deutschen Binnenschiffahrt (Alemanha), Promotie Binnenvaart Vlaanderen (Bélgica) e do Rijkswaterstaat Centre for Transport and Navigation (Holanda).

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A Natura 2000 é uma rede de áreas protegidas no território dos Estados-Membros da União Europeia.

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incorporando questões ambientais, que não exclui a possibilidade de uso das boas práticas internacionais, como as supracitadas. A abordagem proposta para ser utilizada no planejamento do setor hidroviário é ilustrada na Figura 9.1.

Análise do potencial hidroviário

Identificação de planos estratégicos para a bacia hidrográfica

Identificação das características básicas do transporte hidroviário (atual e potencial)

Identificação das características e necessidades socioambientais

Delimitação dos espaços territoriais especialmente protegidos

Elaboração dos estudos estratégicos para o corredor de transportes multimodal que compreende a hidrovia incluindo outras demandas de recursos hídricos

Consulta à sociedade e participação dos diversos atores

Análise dos posicionamentos (pertinência, conflitos entre si ou com políticas para a área) e incorporação às diretrizes

Definição de diretrizes para a proteção ambiental e desenvolvimento das hidrovias interiores em nível de bacia hidrográfica Id en tif ic aç ão e e n vo lv im en to d e a to re s r ele va n te s, in clu in d o d ife re n te s s et o re s g o ve rn am en ta is e d a s o cie d ad e

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Não se deve deixar iludir pela simplicidade da proposta, pois sua aplicação conta com variáveis complexas, como a participação social em vários momentos, a necessidade de informações e equipes intersetoriais, além da solução de conflitos de diversas ordens. A complexidade nesses casos deve diminuir com o tempo e com a aplicação, pois sua origem reside na falta de cultura de aplicação dessas práticas no Brasil. No entanto, com o uso e o desenvolvimento de novas técnicas, esses pontos poderão se incorporar à rotina e consequentemente, tornarem-se naturalmente aplicáveis.

A proposta apresentada se inicia com a análise do potencial hidroviário, pois só há sentido em evocar transporte hidroviário em locais onde há potencial para a utilização desse modo. Após a identificação de potencial para o transporte hidroviário, sugere-se identificar outros planos estratégicos para a bacia, tais como do setor elétrico, ambiental, agropecuário, entre outros. Esses podem influenciar ou serem influenciados, positiva ou negativamente, pelos projetos hidroviários.

Anteriormente ao projeto hidroviário e em paralelo ao levantamento das necessidades da infraestrutura de transportes, é muito importante identificar, em um

nível estratégico, necessidades e características ambientais relevantes,

especialmente áreas mais vulneráveis ou merecedoras de cuidados especiais. A partir desses dados, já seria possível elaborar estudos estratégicos para o corredor de transporte multimodal.

Uma etapa importante em processos de planejamento inclui a consulta participativa aos diversos setores da sociedade. Cabe ressaltar que o envolvimento de atores relevantes, incluindo diferentes setores governamentais e da sociedade, deve ser constante durante todo o processo, de acordo com a fase em que se encontra.

O desenvolvimento do procedimento de planejamento deve envolver a participação efetiva dos principais setores do Governo e da sociedade. Essa participação, bem como uma análise que integre o econômico, ambiental e social poderia facilitar a construção de consensos no desenvolvimento de projetos individuais. Em especial, é importante que os setores ambiental e hidroviário trabalhem juntos para produzir em nível de bacia hidrográfica, estratégias para a proteção ambiental e desenvolvimento das hidrovias interiores. Além desses dois setores, devem estar presentes os atores de outros setores usuários dos recursos

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hídricos. Cabe ressaltar novamente, que a navegação pode ser utilizada como uma estratégia de desenvolvimento e proteção ambiental da bacia.

Dessa forma, entende-se que é possível obter, satisfatoriamente, diretrizes, em nível de bacia hidrográfica, tanto para a proteção ambiental como para o desenvolvimento do transporte hidroviário interior.