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Plano Nacional de Educação (2001-2011)

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3 POLÍTICAS DE FORMAÇÃO DOCENTE (1988-2016): HISTORICIZAÇÃO

3.3 Plano Nacional de Educação (2001-2011)

Como parte da política educacional brasileira as questões referentes ao planejamento também foram marcadas por grandes impasses e reviravoltas. A iniciativa mais expressiva nesta área através da qual se buscou elaborar ações estratégias para apresentar respostas às demandas educacionais em todos os níveis e modalidades, foram os planos nacionais de educação. Na legislação os dispositivos que serviram de base para elaboração dos planos foram as Constituições e as Leis de Diretrizes e Bases da Educação.

O Plano Nacional de Educação variou em graus de importância e diferença de significado que teve ao longo da história da educação brasileira e no cenário político de cada período. O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova de 1932 foi a expressão inicial da preocupação com um projeto nacional de educação. Este documento diagnosticou que os esforços educacionais em 43 anos de República se deram de modo isolado, desarticulado e fragmentando, sem visão global, sem unidade e espírito de continuidade, o que dificultou o encaminhamento de ações com impactos reais nos problemas educacionais. Isto é, não havia um planejamento sistemático e bem organizado nos aspectos filosófico, social e técnico (BORDIGNON et al., 2011).

De início ainda muito incipiente, a primeira referência oficial ao Plano Nacional de Educação em um dispositivo legal foi na Constituição de 1934 na forma de uma competência da União (art.150). Neste mesmo artigo também foram estabelecidos o prazo para sua renovação e as normas que deveria obedecer. Competia precipuamente ao Conselho Nacional de Educação a elaboração do PNE indicando as medidas que julgasse necessárias para melhorar a educação e distribuir os fundos existentes. Tendo em vista que a Constituição de 1934 não chegou a ser implementada dado o advento do Golpe do Estado Novo, os prazos não foram efetivados.

80 Daí em diante não foi feita nenhuma referência ao plano nas Constituições de 1937 e de 1946. Depois de anos, mesmo com a tentativa de elaboração do PNE pelo Ministério da Educação e Cultura em 1962, documento aprovado pelo Conselho Federal de Educação, só em 2001 foi aprovado o primeiro PNE com força de lei nacional na história brasileira.

Só na Constituição de 1967 que a ideia de plano ressurge. Nesta ocasião competia a União elaboração os planos nacionais de educação e saúde, temáticas que permaneceram vinculadas mesmo com a criação do Ministério da Saúde em 1953, quando a saúde ganhou autonomia. Com a Emenda Constitucional nº1/69 foi mantida a mesma redação anterior com acréscimo na competência da União sobre os planos de estabelecer também planos regionais de desenvolvimento, uma expressão da perspectiva de educação vinculada ao desenvolvimento econômico e social presente na ditadura militar, período em que a educação pública ficou paralisada.

Na Constituição de 1988 a aplicação da receita resultante de impostos e transferência na manutenção e desenvolvimento do ensino deveria priorizar a universalização, a garantia de padrão de qualidade e equidade do ensino obrigatório nos termos do plano nacional de educação. Este, com a redação dada pela EC 59/09, pela primeira vez teve sua duração definida oficialmente para um período decenal, com objetivo de articular o SNE, definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias para asseugurar a manutenção e o desenvolvimento do ensino em todos os níveis, etapas e modalidades, com articulação do Poder Público na erradicação do analfabetismo, universalização do atendimento escolar, melhoria na qualidade do ensino, formação para o trabalho, promoção humanística, científica, tecnológica e definição da aplicação da parcela do produto interno bruto em educação.

Sobre a duração do Plano Nacional de Educação, a redação original da CF 88 determinou que fosse plurianual. Na EC 59/09 o PNE passou a ter duração decenal. Decerto o legislador foi omisso ao não acrescentar a expressão de duração decenal “a contar da data de promulgação da lei que aprovar o respectivo plano”. Sendo otimista, considerando o atraso no PNE que só foi aprovado em 2001 e do plano em vigor que só foi aprovado em 2014, o atraso na aprovação diminuiu. Sendo pessimista, se tivesse existido o plano esperado no período subsequente a promulgação da Constituição de 1988 talvez os impactos nas desigualdades educacionais pudessem ser mais bem avaliados nos dias atuais, já que estaria em vigor o terceiro plano nacional de educação da história brasileira.

Dentre as imcubências da União na LDB está a de elaborar o Plano Nacional de Educação em colaboração com os entes federados (art.9º, inciso I). Sabendo que a CF data de 1988 a justificativa legal com base na definição do período plurianual do plano, que só passou para dez anos com a EC 59/09, e com base na inexistência da LDB, ocasionando a aprovação do plano só em 2001 (Lei nº10.172/01), poderia ser suficiente não fosse fato de que entre 2011 e 2014, momento em que o novo PNE era discutido nas CONAEs 2010 e 2014 e o período que separou o fim da vigência do 1º e o início do 2º PNE, aprovado em 2014, simplesmente não havia nenhum plano vigorando.

O atraso na aprovação do PNE 2014-2024 se repertiu como no PNE 2001-2011 talvez por pelo menos dois motivos. O primeiro é o fato do PNE, assim como boa parte dos dispositivos legais da educação brasileira, ser uma política de governo e não de Estado, o que diminui sua possibilidade de continuidade e aumenta sua fragilidade na troca de gestão. O segundo é a ausência de fiscalização e sanções quanto aos descumprimentos de leis e deveres da União, dos Estados e dos Municípios na área das políticas sociais como a educação, de

81 forma que o prazo decenal passar a ser contado da data da aprovação da lei do plano se torna completamente aceitável e normal, porque o termo “decenal” não foi especificado na Constituição (art.214) e a LDB 1996 garantiu apenas que o plano seria encaminhado ao Congresso Nacional (art.87, §1º).

A liberdade de ação política no sentido da falta de garantia da aprovação do plano no tempo definido em lei para haver continuidade nas ações educacionais tende a se repetir nos Estados e Municípios, tendo em vista que os artigos 10 e 11 da LDB pressupõem a sintonia com o plano nacional e sua regulamentação, sendo mantida a omissão e a imprecisão sobre a duração do plano inspirada na Constituição. Se o PNE fosse uma política de Estado poderia ser aprovada uma espécie de regulamento permanente em forma de decreto que certificasse a aprovação da lei do plano no período adequado.

A Lei de Diretrizes e Bases poderia, mesmo que correndo o risco de ser repetitiva, reproduzir a definição da CF 88 da duração decenal do plano nacional fazendo a transposição para os planos locais, o que poderia impor um período para pelo menos ocorrer o envio do projeto de lei aos órgãos responsáveis (Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais), como foi feito no artigo (art.87, §1º). No entanto, isto obrigaria os Estados e os Municípios a seguirem uma lógica da qual a União estava isenta, devido à imprecisão constitucional ao definir a duração do plano. Ou então simplesmente porque nem na Constituição, nem na LDB, isto foi considerado.

Só com a aprovação da Lei nº 10.172/01 é que foi determinada a elaboração dos planos decenais correspondentes pelos Estados, Distrito Federal e Municípios. Isto é, enquanto não existia legislação a respeito também não existia nem obrigação dos entes federativos elaborarem seus planos, nem definição da duração deles.

Como mencionado anteriormente, a partir da LDB o que se seguiu foi que em 1998 foram protocoladas duas propostas de PNE, uma resultante do I e do II Congresso Nacional de Educação organizado pelo Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, que ficou conhecida como Proposta da Sociedade Brasileira. A outra foi elaborada pelo Ministério da Educação exatamente depois da proposta anterior.

Assim, duas propostas de Plano Nacional de Educação chegaram ao Congresso Nacional em fevereiro de 1998: a primeira, “da Sociedade Brasileira” (PL nº 4.155/98), elaborado pelo Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública e apresentado ao Plenário da Câmara pelo Deputado Ivan Valente em 10/02/98, e a outra, “do Executivo ao Congresso Nacional” (Mensagem 180/98, de 11/02/98) de iniciativa do MEC (BORDIGNON et al., 2011, p.21).

A primeira, da Sociedade Brasileira, foi elaborada no I e II Congressos Nacionais de Educação que aconteceram em 1966 e 1997, respectivamente. Esta proposta foi o resultado de intensos debates nacionais e locais, dando origem a um documento referência que buscou a defesa de uma sociedade pautada nos princípios da justiça, da igualdade, a partir de uma educação pública e democrática. A segunda, do Governo, foi elaborada com participação restrita justificada pela proximidade do vencimento do prazo estabelecido pela LDB, cabendo ao Congresso Nacional ampliar o debate. A preocupação com o prazo parece não ter acontecido de fato considerando a data de aprovação da lei do plano só 4 anos depois (BORDIGNON et al., 2011).

82 As diferenças entre as duas propostas de Plano Nacional de Educação podem ser analisadas quanto à forma de participação da sociedade civil na elaboração, quanto aos objetivos de cada um, quanto à composição das forças dos sujeitos políticos envolvidos na elaboração e quanto ao conteúdo das propostas (NEVES, 2008).

Quanto à participação no plano do Governo, o MEC buscou preservar parcialmente o processo democrático na forma de consulta restrita a alguns interlocutores da áea educacional. O Plano da Sociedade Brasileira foi construído com ampla participação da sociedade civil nas diretrizes e metas sistematizadas a partir do II Congresso Nacional de Educação (NEVES, 2008).

Quanto aos objetivos, o Plano do Governo buscou dar continuidade às mudanças políticas já iniciadas, fortalecendo seu poder de definição das diretrizes da educação e conservando formalmente os aspectos democráticos do processo. O Plano da Sociedade pautou-se pelos pressupostos da educação, da qualidade, da democracia e procurou resgatar o conteúdo do projeto de LDB derotado em 1996 (NEVES, 2008). De certa forma, a intervenção da Proposta da Sociedade Brasileira queria evitar que como nos projetos de LDB em disputa, novamente prevalecesse a proposta do Governo (BORDIGNON et al., 2011).

Quanto à composição de forças nas propostas, o que as diferenciou, além da participação restrita no Plano do Governo em forma de consulta a alguns interlocutores da área educacional, foi a presença marcante de entidades empresariais do Plano do Governo, ao contrário do Plano da Sociedade Brasileira onde empresários estiveram totalmente ausentes. Além disso, a representação internacional foi garantida apenas no Plano do Governo através da UNESCO. No Plano da Sociedade a presença massiva foi das entidades dos trabalhadores em educação, entidades estudantis e em defesa da escola pública (NEVES, 2008).

Quanto ao conteúdo das propostas no PNE-Governo, entre outras questões, a gestão democrática é da unidade escolar pública, que supõe descentralização na operacionalização da política, mas depende da centralização na definição das políticas no âmbito do Executivo Central. O PNE da Sociedade na gestão democrática pressupõe participação autônoma de todos os interlocutores, entes federativos e segmentos da comunidade escolar (NEVES, 2008). Especificamente quanto à formação dos profissionais em educação o PNE da Sociedade Civil se opôs ao arcabouço jurídico-legal que sustenta a política educacional neoliberal presente no PNE do Governo e defendeu uma formação crítica, cidadã, com participação ativa e criativa no mundo do trabalho e na construção coletiva de uma sociedade justa, livre e igualitária. Sustentou a necessidade da formação permanente e continuada dos trabalhadores como integrante do seu trabalho (NEVES, 2008).

Embora o PNE que tramitou na Câmara dos Deputados tenha incluído as duas propostas, com suas virtudes e limitações, através da elaboração de um substitutivo, o texto final resultou do veto recomendado pela área econômica do governo de nove metas sobre financiamento propostos pela Sociedade Brasileira e pelo Governo. Das nove metas cinco partiram da Proposta da Sociedade, três da proposta governamental e uma de ambos (BORDIGNON et al., 2011). A aprovação das nove metas geraria um impacto exorbitante nas receitas públicas, mas o veto de todas elas mostrou novamente como a educação permaneceu subordinada aos interesses econômicos, até porque um investimento em educação naquelas proporções seria, no mínimo, incomcebível na política brasileira.

83 No PNE da Proposta da Sociedade Brasileira consolidado no II Congresso Nacional de Educação em 1997 estava explícito que não seria possível alcançar a qualidade social da educação sem investir com seriedade na formação básica e continuada dos profissionais da educação e de forma específica na formação do magistério para todos os níveis e modalidades de ensino.

Na Proposta do Governo aprovada em 2001 a valorização do magistério foi entendida como condição imprescindível para a melhoria da qualidade do ensino. Entretanto, esta qualidade foi pensada justamente na perspectiva que o Plano da Sociedade Brasileira buscou desconstruir, aquela onde o investimento, a possibilidade de progressão na carreira e o crescimento profissional estão condicionados à obtenção de resultados imediatos e atrelados à formação de mão-de-obra.

A Proposta do Governo foi mais extensa na parte sobre a formação docente e valorização do magistério, insistiu na responsabilização dos professores como decisivos no processo de ensino-aprendizagem e fez a defesa formal da ampliação e melhoria da formação, visando estendê-la a pós-graduação. Explicitou a necessidade de melhorar as escolas, oferecer melhores condições de trabalho e garantir planos de carreira. Foi uma proposta bem apresentada teoricamente, mas muito idealizada, diferente da Proposta da Sociedade Brasileira.

Nesta última proposta em uma redação mais concisa, novamente foi reforçada a necessidade de recursos financeiros para a formação dos profissionais da educação, concomitantemente com a garantia de afastamento para programas de aperfeiçoamento e formação continuada, tanto acadêmica e pedagógica como técnica, de forma a diminuir a taxa de docentes e demais profissionais em afastamento à medida que fosse ampliada a formação em nível superior.

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