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plificar realida realidade de irredut irredutivelme ivelme lexa lexa reduzind reduzind

No documento a Necessidade Da Arte (páginas 111-125)

 plificar

realidarealidade de irredutirredutivelmeivelme

lexalexa reduzindreduzind

ao essencial, e o desejo de apresentar os seres humanos ligados ao essencial, e o desejo de apresentar os seres humanos ligados  por

 por relaçrelações ões humanas humanas elemenelementares tares mamais is do do que que por por relaçõrelações es mama teriais levaram, ambos, ao

teriais levaram, ambos, ao mito na arte.mito na arte.  O uso pelo classicismo  O uso pelo classicismo de antigos mitos era puramente formal. O romantismo, em sua de antigos mitos era puramente formal. O romantismo, em sua rebelião contra a sociedade burguesa “prosaica”, recorreu aos rebelião contra a sociedade burguesa “prosaica”, recorreu aos mitos como meio de pintar a “paixão pura” e tudo o que era mitos como meio de pintar a “paixão pura” e tudo o que era excessivo, original, exótico. O perigo do método — que cm si é excessivo, original, exótico. O perigo do método — que cm si é legítimo — era o de que ele exteriormente opunha uma “essên legítimo — era o de que ele exteriormente opunha uma “essên cia humana” não-histórica ao homem em desenvolvimento no cia humana” não-histórica ao homem em desenvolvimento no interior da sociedade; opunha o “eterno” ao tcmporalmente interior da sociedade; opunha o “eterno” ao tcmporalmente condicionado.

condicionado.

A mistificação e a confecção de mitos no derradeiro mun A mistificação e a confecção de mitos no derradeiro mun do burguês oferecem, ambas, meios de escamotear as decisões do burguês oferecem, ambas, meios de escamotear as decisões sociais, mantendo uma consciência razoavelmente clara. As sociais, mantendo uma consciência razoavelmente clara. As condições sociais, bem como os fenômenos e conflitos do nosso condições sociais, bem como os fenômenos e conflitos do nosso tempo, são transpostos para uma realidade não-temporal, que tempo, são transpostos para uma realidade não-temporal, que não muda, uma realidade mítica que aparece como “estado ori não muda, uma realidade mítica que aparece como “estado ori ginal do Ser”. A idéia geral de “Ser” serve para falsificar a es ginal do Ser”. A idéia geral de “Ser” serve para falsificar a es  pecific

 pecificidade idade do do momento momento históhistórico. rico. O O mundo mundo sociasocialmenlmente te concon dicionado c apresentado como mundo cósmico, sem condiciona dicionado c apresentado como mundo cósmico, sem condiciona mentos. Desse modo, o

mentos. Desse modo, o oittsider oittsider   (o “estrangeiro”, o “marginal”)  (o “estrangeiro”, o “marginal”) não só se escusa ao dever de tomar parte nos processos sociais não só se escusa ao dever de tomar parte nos processos sociais como também se eleva acima do mundo dos “comuns”, alçan como também se eleva acima do mundo dos “comuns”, alçan do-se à seleta companhia dos seus “pares”, de onde pode olhar do-se à seleta companhia dos seus “pares”, de onde pode olhar  par

 para a baixo baixo com com sarcástica sarcástica superioridade, superioridade, sorrinsorrindo do ante ante os os tolostolos esforços dos seus irmãos “engajados”.

esforços dos seus irmãos “engajados”. Em seu livro

Em seu livro The Oittsider,The Oittsider,  com absurda grandiloqüência,  com absurda grandiloqüência, Colin Wilson concita seus colegas artistas a uma recusa a tudo, Colin Wilson concita seus colegas artistas a uma recusa a tudo, a manterem-se livres da “praga” de quaisquer obrigações soci a manterem-se livres da “praga” de quaisquer obrigações soci ais e a procurarem dedicar-se exclusivamcnte à redenção exis ais e a procurarem dedicar-se exclusivamcnte à redenção exis tencial do “Eu” de cada um deles. Uma “nova época anti-huma tencial do “Eu” de cada um deles. Uma “nova época anti-huma nista” precisa ser instaurada, de vez que a nossa atual civiliza nista” precisa ser instaurada, de vez que a nossa atual civiliza ção já se acha demasiado dominada pelo comportamento mar ção já se acha demasiado dominada pelo comportamento mar xista. O livro termina com uma espécie de profecia: “O indiví xista. O livro termina com uma espécie de profecia: “O indiví duo começa a sua longa luta

duo começa a sua longa luta outsider;outsider;  pode acabá-la como  pode acabá-la como santo”. Günther Blõker, escritor mais inteligente do que Colin santo”. Günther Blõker, escritor mais inteligente do que Colin Wilson, certamcnte aplaudiría tal conclusão como pertencente Wilson, certamcnte aplaudiría tal conclusão como pertencente

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1122 A NECESSIDADE DA ARTEA NECESSIDADE DA ARTE

à “autênti

à “autêntica consciência ca consciência mítica”mítica” . . No livro No livro dc dc Bloker Bloker ——  A As s NoNo vas Realidades

vas Realidades  — ele repreende os “imaturos” artistas “en  — ele repreende os “imaturos” artistas “en gajados” que querem mudar as condições sociais:

gajados” que querem mudar as condições sociais:

Enquanto o homem julgar que o mal na terra se origina dos erros Enquanto o homem julgar que o mal na terra se origina dos erros específicos e deficiências individuais das pessoas e instituições, perma específicos e deficiências individuais das pessoas e instituições, perma necerá no

necerá no estágio estágio intelectual da infâintelectual da infância. ncia. O momento O momento da maturda maturidadeidade só virá quando ele se tornar consciente da deficiência intrínseca do só virá quando ele se tornar consciente da deficiência intrínseca do mundo, uma deficiência que pode ser amenizada, mas jamais será in mundo, uma deficiência que pode ser amenizada, mas jamais será in teiramente removida.

teiramente removida.

Hermann Broch afirmou, certa feita, que toda a literatura Hermann Broch afirmou, certa feita, que toda a literatura tende par

tende para o mia o mito. to. Mas o Mas o que é que é o mito? o mito? Broch nBroch nunca se cansaunca se cansa de defini-lo:

de defini-lo:

O mito é o

O mito é o naivetênaivetê  do começo, é a linguagem das primeiras pa  do começo, é a linguagem das primeiras pa lavras, rios símbolos originais, que cada época precisa redescobrir por lavras, rios símbolos originais, que cada época precisa redescobrir por si

si mesma. mesma. É É o irraciono irracional, a val, a visão direta do mundoisão direta do mundo; é a image; é a imagem súbitam súbita que se vê pela primeira vez e jamais se esquece; é o mundo todo tor que se vê pela primeira vez e jamais se esquece; é o mundo todo tor nando-se uma imagem indivisível.

nando-se uma imagem indivisível.

Hoje em dia, tornou-se moda internacional procurar es Hoje em dia, tornou-se moda internacional procurar es crever na “linguagem das primeiras palavras” e, depois de uma crever na “linguagem das primeiras palavras” e, depois de uma rápida olhada em Heidegger, falar na “imagem súbita que se rápida olhada em Heidegger, falar na “imagem súbita que se vê pela primeira vez c jamais se esquece”. Em meio à confusão vê pela primeira vez c jamais se esquece”. Em meio à confusão desses pronunciamentos, há um refrão que se repete: o de que desses pronunciamentos, há um refrão que se repete: o de que é o “ser” e não o “fazer” que tem importância. “Os aconteci é o “ser” e não o “fazer” que tem importância. “Os aconteci mentos”, disse Gertrude Stcin em uma conferência, “perderam mentos”, disse Gertrude Stcin em uma conferência, “perderam o seu interesse para o povo; o povo está interessado é na exis o seu interesse para o povo; o povo está interessado é na exis tência”. O

tência”. O  jaze jazer r éé  dinâmico, o  dinâmico, o  ser  ser   é estático. Os que optam  é estático. Os que optam  pel

 pelo o “ser” “ser” em em lugar lugar do do “fazer”“fazer”, , os os que que optam optam pelo pelo mito mito emem lugar de representação da realidade social passível de mudan lugar de representação da realidade social passível de mudan ça, fazem-no — freqüentemente sem consciência de o estarem ça, fazem-no — freqüentemente sem consciência de o estarem fazendo — movidos pelo medo da revolução social. “Precisa fazendo — movidos pelo medo da revolução social. “Precisa mente porque as coisas estão como estão, elas assim não conti mente porque as coisas estão como estão, elas assim não conti nuarão”, disse Brccht. O mítico “ser” 6 invocado exatamente nuarão”, disse Brccht. O mítico “ser” 6 invocado exatamente com a finalidade de negar essa verdade.

com a finalidade de negar essa verdade.

O romantismo criou o culto da “paixão pura”. Os neo-ro O romantismo criou o culto da “paixão pura”. Os neo-ro mânticos fazedores de mitos só admitem a totalidade irracional mânticos fazedores de mitos só admitem a totalidade irracional

como o “ser” do homem e, com isso, sem estarem sempre pre como o “ser” do homem e, com isso, sem estarem sempre pre venidos do sentido do que estão fazendo, justificando a atual irra venidos do sentido do que estão fazendo, justificando a atual irra cionalidade da ordem social. O “ser” do homem — nas pala- cionalidade da ordem social. O “ser” do homem — nas pala-  bras

 bras de de Blõker Blõker — — é é comcomo o ““umuma a vasta vasta reverberação, reverberação, um um antianti go lamento, uma gagueira elementar na qual a essência humana, go lamento, uma gagueira elementar na qual a essência humana, literalmente, se faz ouvir antes de tomar forma”. Este queixu- literalmente, se faz ouvir antes de tomar forma”. Este queixu- me e este gaguejar da mítica moderna não dizem algo que já me e este gaguejar da mítica moderna não dizem algo que já foi dito antes e que foi dito até com admirável simplicidade? foi dito antes e que foi dito até com admirável simplicidade?

Recordemos: Recordemos:

Há tempo de nascer e tempo de morrer; tempo de plantar e de Há tempo de nascer e tempo de morrer; tempo de plantar e de arrancar o que se plantou; tempo de matar e tempo de curar; tempo arrancar o que se plantou; tempo de matar e tempo de curar; tempo de derrubar e tempo de edificar, tempo de chorar e tempo de rir... de derrubar e tempo de edificar, tempo de chorar e tempo de rir... Há tempo de espalhar pedras e tempo de ajuntar pedras; tempo de Há tempo de espalhar pedras e tempo de ajuntar pedras; tempo de abraçar e tempo de abster-se de abraçar; tempo de buscar e tempo de abraçar e tempo de abster-se de abraçar; tempo de buscar e tempo de  perde

 perder; r; tempo tempo de de guguardardar ar e e tempo tempo de de jogar jogar forfora; a; temptempo o de de rasgrasgar ar ee tempo de coser; tempo de calar e tempo de falar; tempo de amar e tempo de coser; tempo de calar e tempo de falar; tempo de amar e tempo de odiar; tempo de guerra e tempo de paz ... Tudo o que Deus tempo de odiar; tempo de guerra e tempo de paz ... Tudo o que Deus fez é apropriado ao seu tempo.

fez é apropriado ao seu tempo.

(Ecclesiastes, III) (Ecclesiastes, III)

Ou no livro de Jó; Ou no livro de Jó;

O homem nascido da mulher é de poucos dias e cheio de inquie O homem nascido da mulher é de poucos dias e cheio de inquie tação.

tação. Como flor Como flor nasce nasce e e murcha. murcha. Como sombra, Como sombra, foge foge e não e não permaperma nece. ... A esperança para a árvore, sendo cortada, é a de que nece. ... A esperança para a árvore, sendo cortada, é a de que torne a brot

torne a brotar e ar e não cenão cesse sse a sua a sua floração. floração. Ainda Ainda que a sua que a sua raiz enveraiz enve lheça a terra e seu tronco morra no pó, ao cheiro da água ela bro lheça a terra e seu tronco morra no pó, ao cheiro da água ela bro tar

tará á e e lançlançará ramos cará ramos como uma planta. omo uma planta. O O homem, porém, morre ehomem, porém, morre e fica

fica prostrado. prostrado. EnqEnquanuanto to existiexistirem rem os os céus, céus, não acordarnão acordará. á. Entrega aEntrega a alma e onde está?

alma e onde está?

(Jó, XIV  (Jó, XIV ))

Isso, em linguagem articulada, é a canção solene do nasci Isso, em linguagem articulada, é a canção solene do nasci mento e da morte, do assassinato e da cura, da descoberta e da mento e da morte, do assassinato e da cura, da descoberta e da  perd

 perda; a; o o que que havia havia papara ra ser ser dito dito sobre sobre o o “ser” “ser” do do homem, homem, soso  bre

 bre a a condição condição humana, humana, está está dito dito aqui aqui sem sem pretensão.pretensão.

Mas ainda há mais a ser dito acerca da plenitude de uma Mas ainda há mais a ser dito acerca da plenitude de uma realidade em permanente transformação. O homem é mais do realidade em permanente transformação. O homem é mais do que o eterno ciclo do nascimento c da morte, mais do que o de que o eterno ciclo do nascimento c da morte, mais do que o de sejo da reprodução e o enfastiamento da velhice: o homem é tim sejo da reprodução e o enfastiamento da velhice: o homem é tim ser imperfeito e incompleto, jamais acabado, mas sempre se ser imperfeito e incompleto, jamais acabado, mas sempre se

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 plasmando

 plasmando porque porque semsempre pre plasmando plasmando o o mundo mundo que que o o cerca.cerca. Existem numerosos romances, peças e filmes nos quais a ativi Existem numerosos romances, peças e filmes nos quais a ativi dade social do homem é esquematizada, ultra-simplificada, de dade social do homem é esquematizada, ultra-simplificada, de modo que os personagens aparecem como meras marionetes de modo que os personagens aparecem como meras marionetes de forças sociais, desprovidos de contradições

forças sociais, desprovidos de contradições interna ,interna ,  vazios de  vazios de sonhos e tristezas

sonhos e tristezas  pessoais. pessoais.  Toda objeção a essa maneira de  Toda objeção a essa maneira de apresentar os seres humanos como se fossem

apresentar os seres humanos como se fossem  soment somentee  seres so  seres so ciais é plenamente justificada. Porém a maior parte daqueles ciais é plenamente justificada. Porém a maior parte daqueles que preconizam um retorno ao “mito” não se compõe de artis que preconizam um retorno ao “mito” não se compõe de artis tas ou críticos realmente interessados na plenitude da realidade; tas ou críticos realmente interessados na plenitude da realidade; ao contrário, apenas gostariam de esvaziar a realidade de ou ao contrário, apenas gostariam de esvaziar a realidade de ou tra forma. Querem é divorciar o homem da sociedade, reduzi-lo tra forma. Querem é divorciar o homem da sociedade, reduzi-lo a um ser absolutamente solitário, a uma criatura isolada, sem es a um ser absolutamente solitário, a uma criatura isolada, sem es  perança,

 perança, submetida submetida ao ao poder poder de de um um destino destino cecegogo. . UmUma a criatucriatu ra assim jamais existiu.

ra assim jamais existiu.

O mergulho no “sono do mundo”, no arcaico, a volta ao O mergulho no “sono do mundo”, no arcaico, a volta ao começ

começo, o, /o ans/o anseio do inarticueio do inarticulado, lado, são geralmente um csão geralmente um compomporor tamento de fuga à responsabilidade. Ao mesmo tempo, entretan tamento de fuga à responsabilidade. Ao mesmo tempo, entretan to, a reação contra o naturalismo e a busca de novas formas to, a reação contra o naturalismo e a busca de novas formas de expressão deu origem ao método de Kafka, de

de expressão deu origem ao método de Kafka, de aparenteaparente

transformação da realidade social em um mito. O mundo tem transformação da realidade social em um mito. O mundo tem uma tremenda dívida de gratidão para com Max Brod, por ter uma tremenda dívida de gratidão para com Max Brod, por ter este salvado da destruição os manuscritos de seu amigo Franz este salvado da destruição os manuscritos de seu amigo Franz Kàfka; porém é um fato igualmente o de que muitos se deixa Kàfka; porém é um fato igualmente o de que muitos se deixa ram confundir pela interpretação errônea dos trabalhos de ram confundir pela interpretação errônea dos trabalhos de Kafka por Brod. Kafka não escreveu sobre a angústia “cósmica” Kafka por Brod. Kafka não escreveu sobre a angústia “cósmica” dos homens, sobre uma angústia situada na “origem das coisas”, dos homens, sobre uma angústia situada na “origem das coisas”, e sim a respeito de uma determinada, particular situação social. e sim a respeito de uma determinada, particular situação social. Inventou uma forma maravilhosa de sátira fantástica — o so Inventou uma forma maravilhosa de sátira fantástica — o so nho misturado à realidade — para apresentar a revolta de um nho misturado à realidade — para apresentar a revolta de um indivíduo isolado e sem esperança que, não obstante, luta con indivíduo isolado e sem esperança que, não obstante, luta con tra os poderes obscuros de um mundo alienado e anseia por al tra os poderes obscuros de um mundo alienado e anseia por al guma forma,,de comunidade, ainda que seja a ambígua comuni guma forma,,de comunidade, ainda que seja a ambígua comuni dade de

dade de O Castelo.O Castelo.  Brod interpretou essas imagens das condi  Brod interpretou essas imagens das condi ções “eternas”. Chegou a elaborar uma visão mística, utilizan ções “eternas”. Chegou a elaborar uma visão mística, utilizan do os elementos de misticismo espalhados na obra de Kafka, do os elementos de misticismo espalhados na obra de Kafka, que apresentava os novos meios empregados por Kafka para que apresentava os novos meios empregados por Kafka para descrever a vida sob a monarquia dos Habsburgos — uma vida descrever a vida sob a monarquia dos Habsburgos — uma vida

real um tanto fantasmagórica — como uma espécie de cabala, o registro cifrado e misterioso da experiência religiosa e da ilu minação. Essa interpretação errônea de Kafka causou muitos danos e encorajou numerosos mistificadores.

O método brechtiano de apresentar os conflitos sociais através da forma simplificada de parábolas possui muita coisa em comum com o método de Kafka. Mas Brecht e Kafka —

dois grandes escritores — tinham atitudes bastante diversas. A atitude de Kafka era de indecisão. Ele estava do lado dos humi lhados e ofendidos, contra os aproveitadores do poder. Mas lhe

faltava confiança na capacidade do povo junto ao qual se colo cara para modificar o mundo. Na extremidade de cada nova es  perança, no seu espírito, encontrava-se um novo medo; e, ao fim de cada resposta, encontrava-se uma nova pergunta. Brecht teve a coragem de responder. Suas parábolas eram peças didá ticas. Sua convicção de que o mundo podia ser mudado, podia tornar-se melhor e mais racional, era uma convicção inabalável. É claro que Brecht também sabia que cada nova resposta con duz a uma nova pergunta e que nada no mundo é definitivo e acabado. Mas, ao contrário de Kafka, não se sentia deprimido e sim encorajado por tal compreensão. Kafka, solitário, deses  perado, não acreditava fundamentalmente em progresso: julga va que as mesmas coisas sempre se repetem. Brecht acreditava que novas coisas estão sempre aparecendo, em luta contra as velhas.

Tanto Kafka como Brecht fixaram a realidade social em suas parábolas. Procuraram uma representação “alienada” dessa realidade. E, tal como os antigos mitos representaram a quin tessência do passado histórico, as obras de Kafka e Brecht fo ram tentativas de obter uma representação destilada do presente histórico. Este não é o caso de escritores — de Camus a Beckett  — que agem no sentido de divorciar o homem da sociedade,

no sentido de dissolver a identidade humana concreta, procuran do mergulhá-la no mistério, encarado o mistério como o agente do “ser eterno” e das “informes forças originais”. Todo homem é sempre mais do que a mera máscara representativa de um ca ráter social. Porém a tendência para transformá-lo em hierógli

1 1 6 A  n e c e s s id a d e da  ARTE fo num drama de mistérios cósmicos, substituindo-lhe a fisiono

mia individual e social pelo espectro dissolvido em um nevoeiro arcaico, é uma tendência que não conduz a coisa alguma. Um homem que não pertence a qualquer sociedade perde necessa riamente a sua identidade, vira um réptil a se arrastar do nada

No documento a Necessidade Da Arte (páginas 111-125)