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Os conceitos de pobreza e de exclusão social têm vindo a suscitar um debate crescente não só entre os investigadores sociais, mas também entre os responsáveis pelos organismos internacionais, entre os políticos e entre os técnicos e os interventores que, no terreno, procuram minimizar tais situações14.

Os dois conceitos apontam para um conjunto de desvantagens sociais que alguns indivíduos detêm face a uma dada norma, estabelecida em termos de satisfação de determinadas necessidades consideradas básicas, ou relativamente a um padrão social dominante de bem-estar . São, pois, conceitos que se intersectam. A sua distinção envolve, a montante, a definição das causas que lhe estão subjacentes e, a jusante, a identificação das suas distintas formas de manifestação e efeitos, como sintetizamos no quadro que se segue:

Quadro 1.1

Diferenças entre os conceitos de pobreza e exclusão social

Aspectos de diferenciação Pobreza Exclusão social Situação: - é um estado; - é um processo. Carácter básico: - pessoal; - estrutural. Sujeitos afectados: - indivíduos; - grupos sociais.

Dimensões: - basicamente unidimensional - multidimensional (incluí (carências económicas); aspectos laborais, económicos,

sociais e culturais).

Contexto histórico: - sociedades industriais (ou, - sociedades pós-industriais e/ conforme o caso, tradicionais); ou tecnologicamente

avançadas.

Enfoque analítico aplicável: - sociologia do desvio; - sociologia do conflito. Principais variáveis: - culturais e económicas; - de emprego.

Tendências sociais - pauperização - desigualdade social. associadas:

Riscos acrescidos: - marginalização social; - crise dos ligames sociais. Dimensões pessoais: - fracasso, passividade; - desafíliação, ressentimento. Evolução: - residual, estática; - em expansão; dinâmica

"dentro-fora".

Variáveis político- - liberalismo não assistencial; - neoliberalismo desregulador. ideológicas que influenciam:

Fonte: Adaptado de Tezanos (2001: 167).

Vários relatórios das mais diversas organizações internacionais, como o Banco Mundial, a Comissão da União Europeia, a OCDE, a OIT, o PNUD, entre outras; assim como diversos estudos e obras científicas publicadas dão-nos conta desse debate.

Assim, e tendo por objectivo clarificar o significado dos conceitos de pobreza e de exclusão social, passamos a analisar as diferentes formulações dos mesmos e a sua recente evolução. Iniciamos esta análise com a definição do conceito de pobreza.

A pobreza manifesta-se através de um conjunto de carências ao nível da alimentação, da educação, da saúde, da habitação, do vestuário, da situação profissional e da participação na vida da sociedade, podendo essas carências ocorrer apenas num ou em vários dos diversos domínios apresentados. Trata-se de um fenómeno multidimensional e, por isso, complexo de conceptualizar.

O termo "pobreza" tem diversos significados e é frequente acompanhá-lo de qualificativos que alteram o seu sentido. Encontram-se, assim, expressões como pobreza absoluta (que nos remete para a ausência de capacidade para satisfazer as necessidades primárias da vida, isto é, a subsistência física), e pobreza relativa (que inclui os indivíduos que têm acesso aos bens e aos serviços que garantem a sobrevivência e respeitam os limites objectivos de uma vida digna, mas que vivem em circunstâncias e condições muito inferiores àqueles que estão no outro extremo da linha de riqueza); pobreza rural (uma pobreza crónica do passado, associada à situação do mundo rural), pobreza urbana (que reflecte situações relacionadas com baixos rendimentos, desemprego, falta de qualificações, precariedade de emprego, situações de doença e de problemáticas diversas tais como a toxicodependência, o alcoolismo e a deficiência; está igualmente associada a pressões inerentes aos processos de urbanização e a mecanismos de discriminação e segregação espacial), e nova pobreza (directamente relacionada com as reestruturações económicas e tecnológicas e com os seus efeitos nos sistemas produtivos, e que se manifestam pelo crescimento do desemprego estrutural e na precariedade dos vínculos laborais). Finalmente, pobreza temporária (associada a fluxos de saída e de entrada na pobreza, de carácter temporário, delimitados no tempo), e pobreza duradoura (que nos remete para a reprodução social e para o processo cíclico da reprodução de pobreza).

Pobreza e privação são, desde logo, conceitos bastante próximos, mas não exactamente sinónimos. Isto porque há uma distinção entre a "privação", nas suas diversas formas, consequências, sentimentos e sofrimentos com ela relacionados, e "pobreza" como um discurso construído, cuja forma lhe é dada pelas definições atribuídas. Assim, e como exemplo, a definição de uma linha de pobreza estabelece uma linha administrativa e oficial entre pobres e não-pobres.

Não obstante a proliferação de definições sobre a pobreza, num ponto todas estão de acordo - a pobreza significa um reduzido nível de bem-estar. Enquanto fenómeno social, surgem diferentes perspectivas teóricas, designadamente as que descrevem a pobreza a partir dos recursos (dimensão económica) e as que elegem a dimensão relacional como base dessa definição. A primeira, define a pobreza a partir dos recursos, privilegiando-se as variáveis que evidenciam a privação de recursos que se encontra na base de situações de carência e/ ou da precariedade. Nesta abordagem são enfatizados os conceitos de pobreza absoluta e de pobreza relativa (Costa, 2000), balizando, na óptica de Capucha (1998) a descrição de situações e de categorias mais vulneráveis à pobreza. A segunda perspectiva, para além da falta de recursos e da precariedade económica, percepciona a pobreza enquanto exclusão dos estilos de vida correntes e aceitáveis na sociedade. São privilegiadas as relações inter individuais, as representações e práticas sociais, as estratégias de vida, a organização familiar, os padrões de consumo e os sistemas de valores que enformam diferentes modos de vida. Incluem-se aqui as noções de pobreza objectiva e subjectiva (Costa, 2000), ambas contribuindo para a construção do estigma social e dos processos simbólicos condutores à marginalidade, ou ao limite da marginalidade social que é a exclusão social (Fernandes, 1991). Conceitos como desafiliação (Castel, 1995), risco de exclusão e desqualificação social (Paugam, 1991) e "ruptura da ligação social" (Paugam, 1996), são significativos neste quadro teórico.

Mas, se o termo "pobreza" pode ser construído a partir da definição que recebe, o termo mais recente "exclusão social" (ainda que com um significado

difuso e polimorfo), permite realçar o espaço social, jurídico e político perdido face ao estado de destituição de recursos de toda a espécie. Por outras palavras, a exclusão social significa, fundamentalmente, desintegração e desaliança a diferentes níveis- económico, social, jurídico e cultural. Repercute-se na vulnerabilidade dos laços familiares e sociais e na não participação na vida comunitária, culminando na "desafiliação" em relação à sociedade; por outras palavras, no não reconhecimento do lugar ocupado na sociedade (Castel, 1995). Como refere Bartoli (1999), o excluído não só é pobre do ponto de vista material, como também tem de viver com a incerteza do amanhã, com fracos meios de poder e de pressão e com o desprezo dos outros e de si próprio.

A destituição apresenta-se, deste modo, como um conjunto de tentáculos que aniquilam qualquer possibilidade de actuação no espaço social aos grupos particularmente vulneráveis aos processos de exclusão social (grupos que incluem as mulheres, os jovens com fraca escolaridade, os idosos, as crianças, os deficientes, os desempregados, uma franja considerável das famílias monoparentais com baixos rendimentos, os imigrantes e outras minorias étnicas, certas categorias da população nas zonas de reconversão industrial, pessoas com baixos níveis de literacia e sem qualificação profissional, entre outros) e a todos aqueles que não conseguem partilhar do controle do poder social. O estado de exclusão oblitera a tal ponto esse espaço que a capacidade de o indivíduo se insurgir e se organizar contra os mecanismos que o originam, é parca. Citando Fernandes (1991: 10), "é-se pobre porque não se tem poder e não se tem poder porque se é pobre".

O termo "exclusão social" surgiu na década de sessenta, mas foi a partir dos anos oitenta que passou a ser utilizado de forma mais intensa, fazendo, inclusive, parte dos discursos oficiais para designar os novos aspectos da pobreza emergentes nas últimas décadas. A expressão, dado ser relativamente recente, está longe de ser unívoca, mas encontra-se, isso sim, sempre relacionada com as concepções de cidadania e de integração social. O seu significado é mais amplo que o do termo "pobreza", na medida em que abrange a ideia de direitos

perdidos, não acessíveis ou exercidos, pelo menos nos mesmos moldes e extensão das outras pessoas consideradas "incluídas". Produz-se exclusão social porque a sociedade não oferece a todos os seus membros a possibilidade de beneficiar de todos os direitos, nem de cumprir alguns deveres que lhe estão associados. A exclusão constitui, desta forma, uma perda de cidadania plena, isto é, impossibilita os indivíduos de participarem nos padrões de vida tidos como aceitáveis na sociedade em que vivem (Capucha, 1998).

Equacionar as relações que determinam a exclusão social permite-nos afastar definitivamente, por um lado, da ideia de que a pobreza e a exclusão social decorrem naturalmente da vida em sociedade ou do inevitável progresso; por outro, da ideia de que algumas pessoas não são capazes de se ambientarem favoravelmente no seio das relações capitalistas por razões biológicas ou psicológicas. Perante este "naturalismo" fatalista (que se estende ao carácter das leis económicas), a exclusão passaria a ser vista como algo inerente à própria sociedade, sob uma racionalidade instrumental que faz das pessoas, assim como do meio ambiental, nada mais do que recursos ou meios para a obtenção do maior lucro, à margem das escolhas políticas e sociais.

Pobreza e exclusão social referenciam, pois, situações distintas apesar de, na maioria dos casos, se verificarem conjuntamente. Quer isto dizer que a exclusão social radica sobretudo na pobreza, embora não se resuma a esta - há pobres que não são excluídos socialmente dos seus contextos comunitários e há excluídos que não são pobres do ponto de vista material.

Deste modo, inclusão/ exclusão e pobreza/ riqueza são dicotomias que se relacionam com as desigualdades e, consequentemente, com a problemática da igualdade de oportunidades. Assim, o combate à pobreza e à exclusão social, como formas de desigualdade que se repercutem em todas as dimensões da vida do sujeito, constituem imperativos éticos e são parte fundamental da questão social actual. Tornaram-se, por conseguinte, um dos principais desafios ao desenvolvimento social sustentado.

Ao nível mundial, a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, ao estabelecer que os direitos económicos, sociais e culturais são fundamentais para a dignidade da pessoa e para o livre desenvolvimento da personalidade, bem como que a sua realização constitui um direito de todos os membros da sociedade, prevê os direitos ao trabalho, ao lazer e ao repouso, à saúde e à educação, sempre contextualizados pelo livre desenvolvimento da personalidade dos indivíduos.

O Pacto Internacional dos Direitos Económicos, Sociais e Culturais16 e o

Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos17, ambos de 1966, explicitam no

seu preâmbulo a relação entre a privação no domínio económico e o gozo dos direitos económicos, sociais e culturais, ao dispor dos Estados-signatários, reconhecendo:

"(..-) que, de acordo com a Declaração Universal dos Direitos do Homem, não é possível realizar-se o ideal do ser humano livre, liberto do medo e da miséria, a menos que se criem condições que permitam a cada pessoa gozar os seus direitos económicos, sociais e culturais, bem como os seus direitos civis e políticos".

Na nossa opinião, os dois Pactos complementam-se. Ou seja, não é possível conceber o pleno exercício dos direitos civis e políticos se os direitos

económicos, sociais e culturais não estiverem garantidos e se não se efectivarem. Como vem escrito no preâmbulo de ambos os Pactos, enquanto o ser humano não estiver liberto do medo e da miséria, permanecerá subjugado, não será livre e não terá ao seu dispor meios para desenvolver livremente a sua personalidade. Por outras palavras, não será pessoa.

Pacto adoptado e aberto à assinatura, ratificação e adesão pela Assembleia Geral das Nações Unidas na sua Resolução n.° 2200-A (XXI), de 16 de Dezembro de 1966. Entrou em vigor a 3 de Janeiro de 1976, em conformidade com o artigo 27 do referido Pacto.

Pacto adoptado e aberto à assinatura, ratificação e adesão pela Assembleia Geral das Nações Unidas pela Resolução n.° 2200-A (XXI), de 16 de Dezembro de 1966. Entrou em vigor em 23 de Março de 1976, em conformidade com o artigo 49°.

A Declaração e o Programa de Acção de Viena , de 1993, por seu turno, referem explicitamente que a "existência de uma pobreza extrema generalizada obsta ao gozo pleno e efectivo de Direitos Humanos" (ponto 14). Mencionam, também:

"(...) que a pobreza extrema e a exclusão social constituem uma violação da dignidade humana e que são necessárias medidas urgentes para alcançar um melhor conhecimento sobre a pobreza extrema e as suas causas, incluindo aquelas relacionadas com o problema do desenvolvimento, com vista a promover os Direitos Humanos dos mais pobres, a pôr fim à pobreza extrema e à exclusão social e a promover o gozo dos frutos do progresso social. E essencial que os Estados estimulem a participação das pessoas mais pobres no processo decisório da comunidade em que vivem, bem como a promoção de Direitos Humanos e os esforços para combater a pobreza extrema". (Declaração e Programa de Acção de Viena, 1993: ponto 25). Além dos itens já referidos, acrescentam-se outros que fazem alusão a situações de desigualdade jurídica, social, económica e política quer relativamente às minorias étnicas e religiosas, quer às mulheres, aos idosos, às crianças ou a outras pessoas e grupos mais vulneráveis.

Registe-se que ao abordarmos, embora de uma forma muita sucinta, a questão dos Direitos Humanos, procuramos chamar a atenção para o hiato que existe entre o ser e o dever ser no que concerne à prática efectiva dos direitos nas sociedades contemporâneas. De facto, e como já foi mencionado, o estado de destituição que decorre da desigualdade económica implica necessariamente desigualdades que se estendem aos níveis social, cultural e político. A desigualdade económica conduz a outras desigualdades dada a racionalidade consumista vigente nos espaços sociais actuais. Essa racionalidade é individualista e competitiva, em nada contribuindo para os ligames de integração social que permitem o agir construtivo de cada um em sociedade.

Importa sublinhar que a desigualdade económica grave, a par da destituição que lhe está associada, cerceiam o acesso material aos direitos

fundamentais da pessoa, garantidos formalmente pelos instrumentos nacionais e internacionais de protecção dos direitos humanos. Significa isto que a situação de pobreza viola, simultaneamente, os direitos civis e os direitos políticos, bem como os económicos, os sociais e os culturais. A pessoa destituída de recursos, além do seu estado de vulnerabilidade e de precariedade, não tem, geralmente, conhecimentos e meios para fazer valer os seus direitos fundamentais e, muitas vezes, nem sequer sabe da sua existência enquanto tal.

A exclusão social é, desde logo, um fenómeno complexo e heterogéneo, podendo mesmo serem identificados diferentes tipos de exclusão. Alguns autores falam, inclusive, de "exclusões sociais" (Costa, 2000: 21-25), assumindo vários tipos: a económica (situação de privação múltipla, por falta de recursos; este tipo de exclusão caracteriza-se, sobretudo, pelas más condições de vida, baixos níveis de escolaridade e de qualificação profissional, emprego precário, entre outras; no seu extremo poderá conduzir à situação de "sem-abrigo"); a social (situação de privação relacional, que se situa ao nível dos laços sociais; caracteriza-se pelo isolamento, aliado à falta de auto-suficiência e de autonomia pessoal; como exemplos deste tipo de exclusão encontram-se os idosos sós, os doentes crónicos ou dependentes e os deficientes que não têm quem os apoie); a cultural (reporta- nos para fenómenos como o racismo e a xenofobia; este tipo de exclusão pode também incluir a dificuldade de integração social dos ex-reclusos); a exclusão de origem patológica (nomeadamente de natureza psicológica ou mental); a exclusão decorrente de comportamentos auto-destrutivos (incluem-se aqui comportamentos relacionados com a toxicodependência, o alcoolismo e a prostituição) (Costa, 2000: 21-25).

Estes tipos de exclusão social, não raras vezes sobrepõem-se na prática, produzindo uma série de consequências para o indivíduo. Exemplo disso é a exclusão do mercado de trabalho que implica o não acesso a bens e a serviços socio-económicos, uma vez que os escassos rendimentos monetários não o permitem. Esta exclusão pode ser também, como já referimos, a exclusão de um

conjunto de redes de sociabilidade e de relacionamento que intensificam os requisitos de um processo de marginalização.

Trata-se, pois, de um processo dinâmico de carácter multidimensional. Os indivíduos encontram-se excluídos não só economicamente, mas também social e simbolicamente. Coexistem fenómenos sociais diferenciados, tais como o desemprego, a marginalidade, a discriminação, as rupturas familiares e o isolamento social, entre outros. Estes aspectos estão profundamente relacionados com constrangimentos de índole pessoal, associados à ideia de inutilidade, de culpabilidade e de vergonha pela situação experienciada. A exclusão abrange, então, situações de precariedade, de risco e de desintegração do tecido social. É um fenómeno que afecta cada vez mais vastos segmentos da população, isto é, um leque cada vez mais amplo de grupos sociais.

A tendência das sociedades actuais para a globalização, sobretudo na sua dimensão económica, é apontada como sendo um dos principais factores do agravamento e do surgimento de novas formas de pobreza e de exclusão social. Esta situação resulta da transformação global das sociedades desenvolvidas contemporâneas que tende a desqualificar socialmente (Paugam, 1991) todos aqueles que não entram na lógica das competências inerente às necessidades de flexibilização e de competitividade da economia, causando novas formas de desafiliação (Castel, 1995), de acordo com o modo como se combina a relação do indivíduo face ao emprego19 (ou expulsão do emprego) e a dissolução das

relações sociais (ou a impossibilidade de as (re)construir).

Com efeito, um novo modelo de organização do trabalho, sustentado pelas premissas de flexibilidade e precariedade laboral; competitividade e capacidade individual de adaptação, de iniciativa e de autonomia, nas condições individuais de empregabilidade, tem vindo a sobrepor-se, com especial incidência nos países

Importa sublinhar que do conjunto dos factores geradores de exclusão, a posição perante o trabalho é decisiva, uma vez que ao acesso ao emprego está associado, por um lado, o acesso a uma fonte de rendimento capaz de suprir as necessidades básicas dos indivíduos; por outro, o acesso a um dos elementos centrais na formação de identidades e de prestígio social, assim como a redes de relacionamentos social e de pertença institucional (Capucha, 1998a).

europeus desenvolvidos, ao paradigma do trabalho estável e para toda a vida. As formas de contratação atípicas e precárias de emprego proliferam (os "falsos" trabalhadores independentes, os contratos de trabalho não permanentes, o emprego a tempo parcial involuntário, o trabalho domiciliário, o trabalho clandestino em que se integra o trabalho infantil, o trabalho temporário, além do trabalho familiar não remunerado), a par da manutenção de taxas de desemprego significativas do ponto de vista social.

Já não são apenas os desempregados que estão sujeitos a formas de contratação precárias, ou aqueles que por doença ou incapacidade não podem exercer uma profissão, os que vivem sentimentos de insegurança, mas também os trabalhadores que, em virtude da desvalorização das suas profissões e do não reconhecimento das suas competências, se sentem inúteis. Sob o efeito conjugado daquilo que Paugam (1991) considera ser a precariedade no trabalho (isto é, a desqualificação das competências daqueles que ainda beneficiam de um emprego assalariado), e a precariedade no emprego (ou seja aqueles cujo contrato de trabalho é de duração determinada e que correm o risco de se verem desempregados, sendo nesta óptica sujeitos a uma grande vulnerabilidade económica e a uma restrição, pelo menos potencial, dos direitos sociais dado que estes são fundados em larga medida pela estabilidade do emprego), somos da opinião de que ambas as dimensões devem ser analisadas em simultâneo, as quais conduzem a evoluções estruturais na organização do trabalho, bem como a importantes transformações no mercado de emprego20.

Todavia, a persistência de bolsas de pobreza e de situações de exclusão nos países desenvolvidos, em especial no contexto da Europa comunitária, impede-nos de falar de inclusão social de modo generalizado, conceito que nos remete para o processo que caracteriza a passagem das pessoas, famílias ou grupos das situações de exclusão para as de participação social e cidadania. O termo inclusão aparece também associado à ideia de que a sociedade constitui Quanto às mudanças ocorridas na organização do trabalho, e das transformações no mercado

um todo, em que as diferentes partes e indivíduos se devem articular, e participar de um conjunto mínimo de benefícios que definem a qualidade de membro de pleno direito dessa sociedade.

Apesar das diferenças, das clivagens e dos conflitos constatados,