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4 DCN PARA O CURSO DE PEDAGOGIA E A POLÍTICA DE SENTIDO

4.4 Política de sentido da formação nas DCN

O estudo do contexto histórico da criação das DCN para o curso de Pedagogia nos ajuda a compreender que a política de sentido implícita na formação do pedagogo está atravessada diretamente pela tentativa de mediação entre os interesses e desejos de grupos que compreendem a função e o sentido do pedagogo de maneiras absolutamente diferentes, em alguns casos, opostos. Desses grupos, dois se destacam pela força da argumentação que põe em evidência não só uma identidade, mas um status da profissão. De um lado, há aqueles que pensam o pedagogo como o cientista da Educação – logo planeja e formula políticas de educação e de ensino – cuja docência pode vir a ser um desdobramento dessa função com atuação dentro e fora da escola; do outro, há quem pensa que o pedagogo é um professor e sua função além da docência, é periférica.

Nesse sentido, na formação do pedagogo, prevista nas DCN, destaca-se o caráter da dubiedade, mas também do apaziguamento que parece querer contemplar os desejos e os interesses dos grupos com mais “força de argumentação”. Isto entendido não só pela qualidade e profundidade do argumento, mas também pelo poder de alcance e pela legitimidade que a posição desses grupos lhe confere no campo, no sentido impresso por Bourdieu (2016), da Educação.

Art. 4º O curso de Licenciatura em Pedagogia destina-se à formação de professores para exercer funções de magistério na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, de Educação Profissional na área de serviços e apoio escolar e em outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos.

Parágrafo único. As atividades docentes também compreendem participação na organização e gestão de sistemas e instituições de ensino, englobando:

I - planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de tarefas próprias do setor da Educação;

II - planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de projetos e experiências educativas não-escolares; III - produção e difusão do conhecimento científico-tecnológico do campo educacional, em contextos escolares e não-escolares. (grifos meus).

Destarte, ao tempo em que a lei abre a possibilidade de opção do caráter do curso, também, realça o elemento central da formação: a docência.

O projeto pedagógico de cada instituição deverá circunscrever áreas ou modalidades de ensino que proporcionem aprofundamento de estudos, sempre a partir da formação comum da docência na Educação Básica e com objetivos próprios do curso de Pedagogia. (RES.CNE/CP 005/2005, p. 10).

Mesmo que o projeto pedagógico do curso opte por se concentrar em qualquer viés diferente do ensino formal, ainda assim, o caráter da formação do currículo está implicado com a formação do professor, necessariamente.

Art. 2º As Diretrizes Curriculares para o curso de Pedagogia aplicam- se à formação inicial para o exercício da docência na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, e em cursos de Educação Profissional na área de serviços e apoio escolar, bem como em outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos. ... § 2º O curso de Pedagogia, por meio de estudos teórico-práticos, investigação e reflexão crítica, propiciará:

I - o planejamento, execução e avaliação de atividades educativas; II - a aplicação ao campo da educação, de contribuições, entre outras, de conhecimentos como o filosófico, o histórico, o antropológico, o ambiental-ecológico, o psicológico, o linguístico, o sociológico, o político, o econômico, o cultural. (grifos meus).

Nesse contexto, a lei ainda reconhece o limite do tempo institucional da formação, dada a amplitude das informações fundantes, pertinentes e relevantes necessárias à formação docente quando, no seu Art 3º já citado acima, afirma que a sua consolidação “[...] será proporcionada no exercício da profissão”. Assim, também deixa claro que a formação se estenderá ao campo profissional. O que não fica claro é quem a proporcionará, deixando abertura para diversas e diferentes interpretações, inclusive a de que pareça como se fosse algo “natural” ao fazer profissional.

De outro modo, Nóvoa (no prelo), defende “[...] cinco posições para uma formação profissional dos professores [...] disposição pessoal, interposição profissional, composição pedagógica, recomposição investigativa e exposição pública”, todas apoiadas institucionalmente pela universidade e pela escola (contexto da práxis profissional), desde o ingresso no curso.

Nessa perspectiva, o sentido da formação do pedagogo proposto nas DCN traduz um caráter ampliado; para alguns, excessivamente abrangente. Entretanto, traduz também o caráter contextual, histórico, cultural, político e provisório do currículo. Assume as incompletudes, os movimentos, os desvios e as ambivalências do fazer humano, bem como as possibilidades de criação de novos espaços de atuação profissional, contudo a formação aparece como externa ao sujeito, sempre.

No texto da lei, como também nos Pareceres 005/2005 e 003/2006, não há em qualquer lugar, explicitamente, uma referência na qual se discuta sobre a condição irredutível de que a formação se passa no sujeito e de que este irá, inevitavelmente, contestar, deslocar, trair, transgredir e compor currículo. Nos últimos parágrafos do texto, fala-se em autoavaliação dos estudantes, referente à atividade de estágio e, no último parágrafo do item conclusão, diz que

Um curso desta envergadura exige dos formadores disposição para efetivo trabalho conjunto e articulado, incentivando, inclusive, a

participação dos estudantes no planejamento e avaliação da execução do projeto pedagógico [...] (p.16). (grifo meu).

Destaca-se, na intenção “politicamente correta” da lei, que, se alguém precisa de incentivo para participar, a priori, não participa, está fora. Não foi pensado, compreendido como parte inerente ao processo de constituição da formação desde sua concepção, por isso acaba ocupando o lugar do receptor, o lugar de quem, em algum momento, precisa dar feedback.

Apesar de ser evidente a lei considerar o caráter complexo, dialético e multirreferencial da formação docente, parece também entender o acesso à quantidade de informação, sistematizada, temporalizada, dialogada, necessária e suficiente para a formação do pedagogo. Fica realçada a ausência, como informação necessária, das experiências formativas (anteriormente construídas e as

do/no processo do curso) dos atores e atrizes sociais, compositores do currículo formativo.