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Ponta Porã: as instituições, participantes e coleta de dados

3.2 Contexto de pesquisa e procedimentos de geração de dados

3.2.1 Ponta Porã: as instituições, participantes e coleta de dados

Conforme expus na introdução desta tese, Ponta Porã se destaca no cenário nacional pela particularidade de ser uma cidade-gêmea. Essa idiossincrasia suscita, como vimos, uma série de discursos que jamais seriam possíveis não fossem essas condições histórico-geográficas. Exatamente por isso é que busco investigar os dizeres que decorrem dessa formação ideológica que se esconde no rótulo ‘fronteira’.

Para isso, escolhi como sujeitos desta pesquisa universitários de uma instituição relativamente nova no contexto, da qual eu faço parte, o Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia de Mato Grosso do Sul, o IFMS, bem como de outra instituição federal, a Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.

O IFMS iniciou seus trabalhos em 2010, tendo como único câmpus instalado na cidade de Nova Andradina e com reitoria na capital do estado. Em 2011, iniciaram-se atividades em mais seis unidades: Coxim, Aquidauana, Três Lagoas, Corumbá, Campo Grande e, dentre esses, Ponta Porã, o qual não é o único localizado na fronteira, o mesmo acontece com o câmpus de Corumbá,

que se localiza na fronteira com a Bolívia, na região do Pantanal sul-mato- grossense. Em 2014, mais três unidades entraram em funcionamento em sede provisória, localizadas nos municípios de Dourados, Jardim e Naviraí.

O objetivo dos Institutos Federais é a oferta de qualificação técnica por meio de atividades de ensino, pesquisa e extensão. A retomada das políticas públicas para o ensino profissionalizante é decorrência da revogação do 2.208/1997, por meio do decreto 5.154/2004. O primeiro do governo FHC fragmentava o ensino técnico, separando-o da educação básica; já o segundo, do governo Lula buscava a reintegração desses dois níveis, muito embora isso não tenha saído a contento, reproduzindo o caráter compensatório e de diferenciação de classes (FRIGOTTO et al., 2005). Não obstante essa discussão, que não é objeto desta tese, ainda que seja interessante mencionar a polêmica, os institutos federais pipocaram-se pelo país. Em Mato Grosso do Sul, não foi diferente. Em 2015, temos o seguinte cenário:

Figura 11 – Campus do IFMS

Fonte: Calendário do Estudante 2015 (IFMS, 2015)

O câmpus Ponta Porã, número 9 no mapa, fica a menos de 2 quilômetros da linha da fronteira. Oferece curso de ensino médio técnico integrado em Agricultura e em Informática, no nível da educação básica; em educação

superior, são oferecidos os cursos de tecnologia em Agronegócio, de 7 semestres, e bacharelado em Agronomia, de 10 semestres. Além desses, são oferecidos cursos na modalidade a distância, de nível técnico, na cidade sede e em outras da região, em parcerias com as prefeituras e com o Instituto Federal do Paraná (IFPR). Qualificações profissionais de curto e médio prazos de duração também são ofertadas à comunidade local, por meio de programas como o PRONATEC (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego).

Os cursos superiores, onde estão matriculados os sujeitos da pesquisa, de tecnologia em Agronegócio e bacharelado em Agronomia são oferecidos, respectivamente, no período noturno em período integral (vespertino e noturno). A faixa etária dos estudantes varia entre recém-saídos do ensino médio, com 17 anos a já graduados, na faixa dos 50 anos.

Já a UFMS trabalha com multicampi com vistas a antender às especificidades das regiões que atende. O campus de Ponta Porã tem cursos em sua maioria na área de Extas: Ciência da Computação, Sistemas de Informação e licenciatura em Matemática. Em 2014, teve início o curso de Pedagogia, que tem buscado dialogar com a cultura fronteiriça no processo de formação de professores de educação básica.

Apesar da proximidade com um outro país, ainda penamos no que se refere à integração regional. Os alunos das instituições quase todos têm nacionalidade brasileira, raras exceções possuem dupla nacionalidade. Entraves diplomáticos não garantem aos exclusivamente paraguaios o direito de estudar em terras brasileiras, ainda que essas terras estejam a menos de dois quilômetros. Promover esse diálogo intercultural é um potencial para o qual a instituição ainda parece não ter despertado.

Para esta pesquisa, foram selecionados 3 estudantes dos cursos superiores, sendo 2 do curso superior de tecnologia em Agronegócio e 1 do curso de Ciência da Computação, da UFMS. O critério de escolha pautou-se no fato de terem tido toda a formação básica em uma das cidades-gêmeas, além de vivenciarem situações familiares de bi/multilinguismo. Foram utilizados

nomes fictícios para garantir o anonimato dos sujeitos. Segue a tabela que sintetiza seus perfis:

Nome fictício Idade Curso Declara-se

bilíngue?

Lídia 24 anos Agronegócio Sim

José 28 anos Agronegócio Sim

Lúcio 20 anos Ciência da

Computação

Não

Tabela 4 – Universitários brasileiros.

As entrevistas ocorreram entre setembro e outubro de 2014, nas dependências das instituições envolvidas. A seguir, apresento uma breve biografia dos sujeitos entrevistados.

Lídia tem 24 anos e é estudante do quinto semestre do curso superior tecnológico em Agronegócio, no IFMS. Ela tem mãe paraguaia e pai brasileiro. Seu repertório linguístico e de sua família transita entre três línguas: majoritamente o português com o pai e irmãos, além das práticas linguísticas no trabalho e nos estudos, do lado brasileiro; o contato com parentes paraguaios, ao longo de sua vida, a colocou em contato frequente com o espanhol e o guarani. Ainda que não se reconheça como falante dessa última, relatou práticas desde a infância como escuta de histórias pelo avô, conversas com as tias e primas. Já quanto ao espanhol, relatou ter tido contato com a disciplina durante o ensino médio no Brasil, embora suas práticas linguísticas tenham precedido contato com a língua escolarizada.

José tem 28 anos, é aluno do mesmo curso de Lídia, porém, matriculado no semestre anterior. É filho de pai paraguaio e mãe brasileira, gaúcha, como ele salienta. Embora tenha vivido grande parte de sua vida, infância e

adolescência, em território paraguaio, sempre estudou em solos brasileiros e, cotidianamente, atravessava a fronteira seca. Relatou, também, que serviu o exército brasileiro, mesmo morando no Paraguai. Naquela ocasião, tinha de retirar a farda para passar para o outro lado da fronteira, já que não era permitido transitar fardado no país vizinho. Teve oportunidade de viver por dois anos no estado de Minas Gerais, para estudar gastronomia em uma ONG, onde teve contato com pessoas de outros países da América Latina. Na ocasião, a professora era inglesa, o que possibilitou-lhe conhecer, também, o inglês. Em 2013, aprovado no curso de Agronegócio, via SISU, retornou à fronteira, onde vivem os pais, desta vez no Brasil. Trabalha em um restaurante japonês, como

sushiman.

O repertório linguístico de José conta com as três línguas mais faladas na fronteira, além do inglês. Com o pai e o irmão, que é casado com uma paraguaia, fala guarani e espanhol, majoritariamente. Com a mãe e demais irmãos, usa mais o português.

Lúcio estuda Ciência da Computação na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, que fica a menos de um quilômetro da linha da fronteira. Ele tem 20 anos e se declara monolíngue. Estudou em escolas públicas municipal, durante o ensino fundamental, e estadual, durante o ensino médio. Tem avós paternos paraguaios. O pai fala português, espanhol e guarani. A mãe e irmãos, somente o português. Embora tenha relatado que os primos falem espanhol e guarani, e tenha frequentado, com eles, a casa da avó, disse não saber falar essas línguas. Diz que seu contato com o espanhol somente se deu durante a escolarização, no ensino fundamental e em um ano do ensino médio.

Passo, agora, a apresentar o contexto de coleta de dados da universidade paraguaia.

3.2.2 Pedro Juan Caballero: a instituição, os participantes e a coleta de