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4. Debitagem

9.2. Pontas de seta

Entre os materiais retocados, as pontas de seta correspondem ao tipo mais representativos do conjunto de materiais arqueológicos em estudo, tal como acontece com as “colecções antigas”, preferencialmente recolhidas nos contextos calcolíticos na Estremadura. O caso da Ota não é excepção, todos os exemplares são provenientes da intervenção de Hipólito Cabaço e, a avaliar pelo número de exemplares (103), parece coincidir com o panorama detectado para o Penedo do Lexim (149), Zambujal (cerca de 900) e Outeiro de São Mamede (418). O conjunto integra 103 pontas de seta, das quais 79 se encontram completas, correspondendo a 77% do conjunto. Estes valores estão desenquadrados de outros contextos similares na Estremadura, exceptuando o caso do Outeiro de São Mamede (87%), podendo a causa deste fenómeno ser associada a uma “recolha direcionada apenas para peças inteiras” (Sousa, 2010, p.191). A categoria de “parcialmente fragmentado” foi incluída no grupo de peças inteiras, no qual as peças que, apesar de permitirem todas as mensurações, estão fragmentadas nas extremidades.

Face ao conjunto, optou-se por se adoptar o modelo de Forenbaher (1999), que tem sido amplamente utilizado na região em que a área em estudo se situa, privilegiando a normalização das designações e a regularidade dos dados.

A sistematização de Forenbaher (1999, p.77-79) que cruza a forma dos bordos das pontas de seta e a forma das suas bases, permitem configurar cinco tipos de pontas de seta, excepção para as pontas mitriformes. De acordo com esta proposta (Forenbaher, 1999,p.77-79) e sistematizadas por Ana Catarina Sousa (2010, p.193), os tipos configuram grupos amplos: • Tipo 1: pontas de base convexa (base arredondada, base triangular, pedúnculo);

• Tipo 2: ponta de base côncava ou plana;

• Tipo 3: pontas mitriformes (único caso em que o tipo de bordos e a extremidade da peça determina a classificação morfológica);

• Tipo 4: ponta de seta tipo Eiffel: base e bordos muito concâvos;

• Tipo 5: pontas de seta alcalarenses (base muito concava e aletas pronunciadas); • Tipo 6: pontas ovais foliáceas;

• Tipo 7: pontas modificadas.

Tal como se verifica na lista sistematizada, para além das evidentes particularizações, os tipos 1 e 2 integram uma grande diversidade de formas que seriam, tradicionalmente, individualizadas e, que no caso específico da Ota serão, mais à frente, aprofundadas por transportarem características morfológicas que lhe conferem atributos de “fóssil director”, como elementos de datação relativa.

59 Gráfico 13 – Estádios de produção das pontas de seta

No seguimento da proposta metodológica de análise de contextos de fabrico, sistematizada em Forenbaher (1999) e em Carvalho (1998), foi possível identificar o primeiro conjunto de produção de pontas de seta no actual território português (Sousa, 2010, p.194) - a abordagem ao conjunto em estudo teve em conta os diferentes estádios de produção, tendo sido essa a base através da qual se determinaram as 16 pré-formas - onde se incluíram cinco peças em estádio inicial – 85 pontas de seta em estádio final e duas que foram alvo de reparação.

Quanto aos tipos de suporte, muitas das vezes são de difícil identificação, devido ao facto de as superfícies se encontrarem largamente modificadas pelo retoque. Foi assim possível confirmar a utilização de lascas como suporte de 22 “projécteis”, sendo que 10 destes correspondem às fases iniciais da produção de pontas de seta, quanto aos restantes (81), o seu suporte foi entendido como indeterminado.

Quadro 3 – Tipos de Ponta de Seta representadas na Ota, quadro tipo Lexim (Sousa, 2010)

O segundo tipo de ponta de seta (base côncava/ plana) corresponde ao grupo maioritário, ascendendo a 55% do total do conjunto, domínio que aparenta confirmar-se genericamente em todos os povoados e em necrópoles (Forenbaher, 1999, p.101). Os restantes tipos de ponta de seta apresentam uma expressão residual no conjunto, destacando-se ligeiramente as de tipo convexa/triangular, neste caso unicamente de base triangulares, as de tipo modificas e a exclusiva de tipo torre Eiffel. Não foi detectada a presença de pontas de seta “alcalarense”, ou de qualquer outro tipo que seja indicador das redes de troca transregionais (Sousa, 2010, p. 197). No entanto, pode-se especular a proveniência de um exemplar (1685/8) do tipo 2 (base concava/plana), inteiro sem qualquer fractura, no seu

12% 87% 1% Pré-forma Final Reparadas TIPO Nº % 1-Base convexa/ triangular 3 3% 2-Base côncava/ plana 57 55% 3-Mitriforme 0 0% 4-Eiffel 1 1% 5-Alcalarense 0 0% 6-Foliáceas 0 0% 7-Modificadas 2 2% 8-Indeterminadas 24 23% 9-Pré-forma 16 16% TOTAL 103 100%

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estádio final de produção, cuja matéria-prima sobre a qual foi talhado se reporta a um material xistoide, vulgo xisto jaspoide, sendo esta a única presença de outro tipo de matéria-prima, assinalando-se como o único exemplar com uma possível proveniência exógena – ainda que permaneça por descodificar se foi a peça a viajar ou um bloco de matéria-prima, se chegou pelas teorizadas “redes de troca transregionais” (idem, ibidem, p.197) ou se reflecte um acto de mobilidade populacional (Oelze, 2012, p.15).

A análise das características morfológicas - alongamento, espessamento, perfil, secção, retoque, tratamentos de superfície e geometria dos bordos – seguiram os critérios descritivos propostos por Carvalho, 1998 e Valera, 2006, sendo que, quanto aos índices alongamento e espessamento, optou-se por se seguir a relação proposta por Valera (2006, p. 768). O gráfico 14 permite identificar a relação alongamento/espessura das pontas de seta da Ota, sendo visível que as 59 peças analisadas apresentam uma tendência para um espessamento entre os 12 e os 16 e com um índice de alongamento médio a rondar os 70.

Gráfico 14 – Dispersão das pontas de seta

A matéria-prima não é um factor que possa ser destrinçado ou funcione como factor determinante, como aconteceu para o caso da Malhada (Valera, 2006, p.768), ainda assim é possível constatar, através da relevância dada pelo preenchimento a vermelho no gráfico 14, que a peça - 1685/8 – de xisto jaspoide, ainda que isolada, denota um tratamento similar ao identificável no conjunto de pontas de seta em estudo, ou seja com uma menor robustez (mais alongadas e menos espessas). O conjunto é, na sua grande maioria, pouco robusto, em que os quatro tipos de pontas de seta não se destacam, para além destes existem 10 exemplares – nove do tipo côncavo ou plano e um do tipo triangular – que apresentam um alongamento médio a elevado e uma espessura bastante significativa, acima dos 20. O gráfico de dispersão parece configurar um modo de fazer tendencialmente regular, com algumas excepções mencionadas anteriormente. 0 20 40 60 80 100 120 140 0 5 10 15 20 25 30 ÍN D ICE D E A LO N GA M EN TO ÍNDICE DE ESPESSAMENTO

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Em relação ao perfil, existe claramente uma dominância das peças de perfil simétrico/recto que perfazem na totalidade as peças no estádio final, as pré-formas (16) são distribuídas pelos perfis rectos (56%), rectos com a extremidade distal arqueada (25%) e sinuosos (19%). Não foi detectado qualquer perfil convexo que, segundo Ana Catarina Sousa (2010, p.199), poderia configurar um estádio inicial de produção, desta feita a relação não se encontra corroborada para o caso da Ota. No que se refere à secção, a predominância recai sobre as plano- convexas (47%) seguidas pelas biconvexas (25%), este destaque sobre estes dois tipos de secção também foi verificado para o Penedo do Lexim, mas em situação inversa, com o domínio das biconvexas (50%) a que se seguem as plano-convexas (42%). Contudo, no nosso caso, as secções triangulares e trapezoidais reflectem uma maior expressividade no conjunto, com 18%, podendo estar relacionadas com aproveitamento dos produtos alongados enquanto suporte.

Gráfico 15 – Extensão do retoque das pontas de seta

A totalidade do conjunto de pontas de seta apresenta retoque bifacial, ainda que a extensão do retoque não seja uniforme em abas as faces. O grupo maioritário das peças foi retocado em ambos os bordos (45%), sendo a extensão do retoque mais comum, a referente ao verso das pontas de seta. A superfície total é o segundo grupo com mais representatividade, com 35% do conjunto, tendo sido a extensão de retoque na face, a mais característica.

Num conjunto considerável de peças, a análise do tipo de retoque revelou a frequência preponderante do tipo rasante, que abrange 71% do conjunto, aparecendo ainda um grupo de peças com um tipo de retoque semi-abrupto (19%) e um número reduzido com retoque abrupto (10%). A serrilha também foi detectada em 16% do conjunto, registando-se uma clara tendência para a ausência deste tipo de acabamento. A explicação para a sua pouca expressividade é teorizada por Forenbaher (1999, p.76) como sendo um meio para o sangramento das presas, o que lhes atribui uma funcionalidade específica e por consequência uma menor expressão no registo arqueológico. Outra explicação, admitida pelo autor anteriormente referido, é a que assume que a presença de serrilhas possa indicar um tipo de “adorno” de natureza não funcional.

0 10 20 30 40 50 60

Indeterminado Superficie total Ambos os bordos Apenas um dos bordos Ambos os bordos e base

Verso Face

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A questão da fracturação ou fragmentação destes artefactos leva-nos a proceder, em primeira instância, à associação entre a funcionalidade e a produção. Ainda que seja muito difícil identificar os tipos de fractura presentes nas ocorrências de pontas de seta, estes tipos podem ser reconhecidos pela dispersão de energia expressa nas morfologias das fracturas, exercício facilitado pela matéria-prima em questão (sílex). Se, por um lado, os constituintes do conjunto que apresentam fracturas, são representados, maioritariamente, pelas fracturas por flexão (57%) – associadas à sua funcionalidade que envolve a existência de um impacto (Sousa, 2010,p.210) registado através de um padrão comum de fractura: extremidade distal e extremidade da base – por outro lado, verifica-se no conjunto a presença de um grupo de peças que apresentam uma fractura acidental (26%), embora estivessem no seu estádio final, podendo estar atribuído a fenómenos pós-deposicionais. Ainda num grupo mais restrito (10%), foram identificados dois tipos de fractura – acidental e por flexão – que ocorrem na mesma peça, constituindo um desafio à interpretação das suas possíveis causas. Por fim, e quanto às ainda menos expressivas fracturas por retoque (6%), podem corresponder a múltiplas interpretações das quais destacamos a reparação, acidentes em fases finais de talhe e/ou por reconversão.

Num balanço final do conjunto, a questão cronológica parece ser a que tem maior preponderância e relevância. É nesse sentido que o extenso conjunto da Ota pode alcançar um enquadramento crono-tipológico baseado nas morfologias analisadas. A questão tipológica é sobrevalorizada neste capítulo devido à escassez de proveniência contextual, assim sendo, e a par dos estudos no Outeiro de São Mamede, Zambujal e Penedo do Lexim, a Ota parece adequar-se às cronologias contextuais do Zambujal e do Penedo do Lexim, com um conjunto na sua grande maioria (tipos côncavos, Torre Eiffel, Modificadas) enquadrável no 3º milénio a.n.e., excepção para as reduzidas (3) evidências (tipo triangular) enquadráveis nos finais do 4º milénio a.n.e., como verificado nos contextos arqueológicos nos sítios homólogos à Ota.

b. Pedra Polida

Quando falamos da pedra polida, na Estremadura portuguesa e, mais concretamente, no período entre o 4º e 3º milénio a.n.e., mencionamos um tipo de matéria-prima que possibilita uma leitura ampla sobre variadas temáticas, entre as quais podemos destacar as redes de troca e aprovisionamento a longa distância, as tecnologias de fabrico e as práticas desenvolvidas no quotidiano destas populações.

Foram contabilizadas um total de 46 peças entre utensílios, possíveis esboços e fragmentos de pedra polida, perfazendo um total de 9,216 Kg – um número relativamente reduzido quando comparado com outros contextos similares na mesma área geográfica (Sousa,

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2010, p. 217) mas que ganha grande expressão se tivermos em conta a escavação antiga e, mesmo assim, reduzida levada a cabo por Hipólito Cabaço.

Dentro do conjunto em estudo foi possível identificar alguma diversidade de matérias- primas, sendo elas o anfiboloxisto que corresponde a um total de 42 exemplares e 8,609 kg – é interessante verificar que esta matéria-prima, dominante no conjunto, tem uma proveniência mínima de 80 km em linha recta (Abrantes) – o calcário, a matéria-prima local com 2 exemplares, correspondendo a 338 gr e duas peças cuja matéria-prima é indeterminada. Assim sendo, o estabelecimento de comparações com os trabalhos recentes, levados a cabo em sítios arqueológicos como Leceia (Cardoso, 1999/2000), Penedo do Lexim (Sousa, 2010. P. 216) e Pedra d’Ouro (Branco, 2007. P.87) é difícil, cingindo-se a uma comparação mais tipológico- formal e quantitativa do que contextual.

A nível do estado do conjunto é interessante constatar que o mesmo apresenta uma grande diversidade no tipo de conservação. Há um domínio das peças fragmentadas, representando um total de 26 fragmentos – esta leitura foi altamente dificultada pelas diversas reconstituições que o Museu Hipólito Cabaço levara a cabo em muitos destes fragmentos de machado, contudo a sua análise foi possível, sendo só de referenciar que as medidas retiradas podem sofrer ligeiras alterações. Deste total de 26 fragmentos foi possível criar 3 subcategorias que ilustram em que secção o fragmento se pode inserir: quatro exemplares de área mesial, que nos permitiu identificar tipos de polimento e matérias-primas, seis peças correspondentes á área proximal, ou talão, que foram analisados tendo como principal objectivo a procura de marcas de um uso complementar e, principalmente, marcas de encabamento, por último 16 peças que correspondem à área distal, mais comummente denominada de gume, que facilitaram as leituras referente a usos, simetrias e funcionalidades. Por último é de referir um total de 20 exemplares (44%) que se encontram completos e acabam por ser a categoria dominante no conjunto, realidade que é bastante rara em contextos homólogos na Estremadura Portuguesa, que apresentam um grau de fragmentação bastante elevado (Sousa, 2010, p.217) - no Penedo do Lexim, tendo em conta um conjunto de 48 peças, somente 16 se encontram completas, correspondendo a 33% (Sousa, 2010, p. 216), já no caso do “povoado vizinho” da Pedra de Ouro onde se verificam 97 peças, somente 24 (25%) correspondem a artefactos inteiros (Branco, 2007, p. 87). A realidade anteriormente referida muda a nível numérico quando analisamos os contextos de Leceia que, num total de 184 peças, aproximadamente 130 (71%) correspondem a materiais inteiros (Cardoso, 1999/2000, p. 241) - neste caso específico é de destacar que a área intervencionada é superior a 10 000 m², o que pode justificar o número avultado de peças completas. Para o contexto do Castro do Zambujal foi possível constatar que não existem dados compilados, o que vai impossibilitar as comparações. Novamente é de relembrar que o conjunto em estudo na presente dissertação resulta, na sua

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maioria, de uma escavação “arqueológica” antiga que pode, entre outras realidades, ter intervencionado contextos não só de ocupação.

1. Caracterização tipológica

No que toca aos “nomes das coisas”, neste caso à nomenclatura a atribuir a cada tipologia de materiais, foram utilizados termos como “machados”, “enxós” e “martelos” que tem uma conotação claramente funcional. Contudo, tendo em vista uma uniformização dos estudos e a possibilidade de estabelecer comparações que nos permitam leituras superiores, esta terminologia foi aqui também ela replicada.

Uma vez que o conjunto do “Castro” de Ota não se encontra significativamente fragmentado, foi possível ensaiar uma caracterização e inserção tipológico-funcional de 38 dos exemplares. Esta realidade só não foi possível de efectuar em oito casos, dois deles referentes a áreas mesiais, quatro de área proximal e dois da área distal – nestes oito fragmentos não foi possível entender o desenvolvimento da peça, tendo sido tomada a decisão de não os incluir em nenhuma categoria tipológica. Em oposição a esta realidade, conseguiu-se chegar á caracterização e inserção tipológica de 10 machados e oito enxós que, mesmo não se encontrando completos, permitiram ensaiar um desenvolvimento intrinsecamente ligado com o tipo de bisel do gume, com a secção longitudinal e evolução dos bordos do fragmento – estas opções metodológicas encontram-se em conformidade com as descrições metodológicas de Gertrudes Branco (2007, p. 88), António Fandos (1973, p. 203-208) e António Valera (2010, p. 763) que, neste caso, foram adaptadas para fragmentos e não somente para exemplares completos.

Tendo estes pressupostos como base metodológica, foram identificados então três tipos de categorias de materiais já referidas – machados, enxós e martelos.

No primeiro caso, os machados perfazem um total de 20 exemplares, dos quais 10 se encontram completos. A caracterização dos materiais completos foi feita a partir dos dados obtidos através do cálculo do índice de alongamento (largura/comprimento*100) – que varia entre os 35 e os 61 – e o índice de robustez (espessura/comprimento*100) - entre os 26 e 46 – em associação ao desenvolvimento formal da peça. A estes parâmetros foi adicionada a análise de secções, onde dominam, em 55% do conjunto, as secções rectangulares, seguidas pelas secções circulares com 20%, a análise do gume, onde se verifica uma grande homogeneidade no conjunto entre os gumes simples convexos (45%) e os simples planos (40%) e, por último, a análise do talão, no caso dos dez exemplares completos, que varia entre os talões truncados (40%), arredondados (30%) e pontiagudos (30%). Referimos que, nos valores de intervalo anteriormente referenciados, não foram incluídos três exemplares, tendo em conta o seu peso significativo, estando inclusive um deles fragmentado no talão, que claramente não se enquadram com os

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valores médios do restante conjunto – realidade mais acentuada quando apresentados os pesos das referidas peças – o artefacto nº 1696 com um total de 1,200 kg, o nº1323 com 2,210 kg (com um índice de alongamento de 19 e de robustez de 17) e o nº1311 com 1,400 kg, todos eles de anfibolito. Estas três peças representam 52% do peso total do grupo de pedra polida em estudo, o que lhes atribui um grande valor influenciador nas análises deste conjunto artefactual.

A compreensão e leitura destas três peças é, de forma clara, bastante difícil de ensaiar, em especial pela falta de proveniências contextuais. Duas destas peças podem ser assumidas como similares a nível formal, tecnológico e do tamanho – peças nº1269 e 1311 – sendo que ambas apresentam marcas de uso nos gumes, podendo ser conjecturada uma funcionalidade mais “efectiva” no quotidiano destas comunidades, ainda que apresentem, como referido anteriormente, valores que extravasam as médias do conjunto. No terceiro exemplar não foi detectada qualquer marca de uso, podendo ser assumido como um machado votivo – votivo no sentido de não apresentar uma funcionalidade aparente. Este espécime apresenta características morfológicas semelhantes às peças das áreas de Benavila e Ervedal, Redondo, Mafra, Alpiarça, Várzea do Lírio, Vila Velha do Rodão e Castelo Branco que, curiosamente, apresentam uma dimensão média de 35 cm com corpo “afuselado” com matérias-primas similares (Andrade, 2014, p. 100-101; Gonçalves, 1982-83).

As justificações funcionais e cronológicas destes machados são diversificadas e pouco claras, tendo de estar necessariamente relacionas com a existência de vestígios de uso e o contexto da sua descoberta. No caso específico da Ota, como sublinhado várias vezes ao longo do presente trabalho, não nos é possível aceder ao contexto original da recolha deste machado de grandes dimensões, contudo, tendo em conta a já referida inexistência de marcas de uso, podemo-nos inclinar para uma funcionalidade/significado mais relacionado com um âmbito votivo, na senda do que Victor S. Gonçalves avança em 1983/1984 (p. 198). O carácter votivo, neste contexto, não pode ser desassociado do seu poder representativo de uma possível relha de arado (Andrade, 2014, p. 101), que ganharia um peso extra a nível cultural e simbólico, num período em que surgem novos métodos e paradigmas associados a uma “revolução” dos produtos secundários (Sherratt, 1995, p. 61-76).

Passando já ao caso específico das enxós, de um total de 17 exemplares identificados, nove encontram-se completos. Novamente foram usados os índices de alongamento, para os exemplares completos – onde se verificaram intervalos entre 30 e os 48 mostrando assim o seu diminuto alongamento – e ainda o índice de robustez – com valores entre os 10 e os 31, indicando uma robustez média. Foram também aqui analisadas as secções, dando-se destaque às secções rectângulares (65%), procedidas pelas de tipo quadrangular (24%), em associação a uma análise das tipologias do gume, onde domina o gume simples plano (82%). Quando olhámos para os tipos

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de talão, foi-nos possível constatar que há uma tendência similar á já verificada para os Machados – talões truncados (33%), arredondados (22%) e pontiagudos (22%), sendo que o único dado a adicionar é o aparecimento de dois talões planos (22%). No caso desta categoria tipológica foi detectado um exemplar que extravasa a tendência geral do conjunto – uma peça de pequenas dimensões, cuja matéria-prima é indeterminada, tendo sido integrada neste conjunto sabendo-se, à partida, que não entroncava com as cronologias em estudo. Mais adiantamos que esta peça teria uma cronologia que pende entre dois períodos cronológicos distintos - o Neolítico Antigo, onde é possível identificar paralelos como o sítio dos Cortiçóis (Cardoso et al, 2013, p. 44), o Neolítico médio, com 1 registo similar no Algar do Bom Santo (Carvalho, 2015, p. 8) e o Bronze Final, onde se detecta uma enxó, também ela de pequenas dimensões, em Basalto, no sítio da Quinta Nova de Santo António (Neto et al, 2013, p. 38). O caracter votivo que os artefactos referidos assumem nos contextos apresentados, podem reforçar, uma vez mais, a mescla de contextos associados às intervenções de Hipólito Cabaço na década de 30. O seu simbolismo parece também estar patente na sua matéria-prima sendo esta, nos casos apresentados, sempre minoritária (Cardoso et al, 2013, p.59), algo que, no caso da Ota, também se verifica, permanecendo por

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