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Portão aberto/portão fechado: regras implícitas na organização do parque

4 TEMPOS E ESPAÇOS PARA BRINCAR: UMA ORDEM INSTITUCIONAL

4.1 Uma manhã no parque com o Grupo IV

4.1.3 Portão aberto/portão fechado: regras implícitas na organização do parque

Mapear os diferentes espaços do parque do NEI, definindo-os pela descrição de seus materiais/objetos, não só facilita a leitura do conjunto de brincadeiras possíveis, mas também demonstra o quanto são sugestivos para que as crianças possam exercitar seu potencial criativo. O uso limitado ou não desses materiais/objetos permitem ou não as escolhas e a autogestão das brincadeiras, as quais desempenham um papel cognitivo importante, segundo Ferreira (2002), pois permitem às crianças apoiar-se nos objetos para organizar suas percepções e seu conhecimento dos espaços.

A organização dos espaços pela disposição de seus objetos/brinquedos está sutilmente carregada de regras, na medida em que explicitam pelo objeto/brinquedo o que se pode ou não fazer em cada local.

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Sempre que me referir a educadores, estou me referindo a todas as pessoas que fazem parte da instituição de educação, pois estou levando em conta que todos educamos e também impomos certas regras, sejam elas explicitas ou implícitas; e quando me referir a professoras estou entendendo-as como uma profissionais com formação específica para atuar na área da educação.

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Espaço Balanço Casinha Cavalo centopéia Área coberta Caminho de pneus Função prévia - Balançar - Tarefas domésticas. - Mamãe - Papai - Filhos - Escalar ou - Passar por baixo

- Proteger do sol - Guardar brinquedos pequenos - Equilibrar-se passando por cima Outras Funções

Como fogão ou mesa para fazer comidinha

Guardar Brinquedos

Como suporte para secar tapete

Como casinha para brincar de boneca Dançar capoeira na educação fisica Como banco para as crianças sentarem Regras implícitas

- Uma ou duas crianças em cada pneu

- Estar sentado - Balanço ocupado

procurar outra área - Partilhar

- Não balançar alto

- Casinha ocupada escolher outra área - Não pular a janela

- Brincar em baixo - Não subir

- Partilhar materiais - Tirar do lugar só o que

for brincar - Não danificar os brinquedos - Guardar brinquedos usados - Partilhar - Não empurrar

A presença de equipamentos de parque fixados em lugares estratégicos, espalhados pelo entorno dos muros e paredes, deixando o centro do mesmo livre, facilita a visão dos adultos sobre as crianças e das crianças entre si. Esse fato revela um certo controle dos adultos sobre os espaços e sobre as crianças, facilitadores ou inibidores das expressões da criança.

Da mesma forma, os objetos/brinquedos que se apresentam em áreas não estruturadas denunciam a possibilidade de mobilidade desses objetos para outros lugares do parque, como também se apresentam como alternativa de brincadeira.

As indicações fornecidas pelos objetos/brinquedos fixos, que limitam os participantes às respectivas áreas, contrapõem-se à idéia de que não há restrições – por parte dos adultos – a seu uso e de que as crianças podem brincar com o que quiserem, pois a quantidade de brinquedos existente denuncia restrições em relação ao acesso a eles.

TABELA 20 – EQUIPAMENTOS/BRINQUEDOS FIXOS EXISTENTES NO PARQUE DO NEI CARIANOS

Brinquedos de parque Quantidade

Casinha do tamanho da criança 2

Balanço 2

Cavalo centopéia 1

Caminho de pneus 1

As restrições de acesso evidenciam-se pela comparação da quantidade de objetos/brinquedos/equipamentos de parque (Tabela 18) com a quantidade de crianças (tabela 12, p.81) no parque; os resultados tanto indicam que é um limitado número de crianças que têm acesso a esses brinquedos, como desvelam uma regra de partilha. A existência de pouco objetos/brinquedos, em relação ao número de crianças a usa-lo, ao obrigar a criança a uma nova escolha dentro do espaço e materiais disponíveis, supõe uma regra de rotatividade que exige uma ordenação do coletivo.

TABELA 21 – OBJETOS/BRINQUEDOS NÃO FIXOS EXISTENTES NO PARQUE DO NEI CARIANOS

Outros brinquedos Total

Bichos de pelúcia 12 Carrinhos grande 9 Bonecas 16 Capacetes 13 Baldinhos de praia 14 Cestinhas de compras 12 Panelinhas 37 Bancada de maquiagem 8 Bancada de marcenaria 4 Fogão 6 Carrinhos menores 18 Carrinho caçamba 26 Carrinho de bebe 9 Bolas de plástico 13 Serrote plástico 4 Barraca 3 Banheira de boneca 11 Pneus 8

Pelas características dos objetos/brinquedos, subentende-se um tipo de atividade que indica uma maior individualização ou agrupamento, movimento ou imobilismo, concentração ou dispersão. Analisando os atributos referentes a quantidade ou qualidade, dos objetos/brinquedos que estão no parque (Tabela 18 e 19), podemos inferir em que concepções de educação, infância, criança e brincadeira os adultos, consciente ou inconscientemente, estão alicerçando seu trabalho pedagógico, assim como, que sentido e significado o parque tem no trabalho pedagógico desenvolvido na instituição.

Neste caso especificamente, levando em consideração todo o histórico dessa Instituição, percebe-se que o caminho da mudança, para a concretização dos objetivos e metas traçados pelas educadoras, para a consolidação de um trabalho pedagógico comprometido com a criança, conferindo as mesmas o estatuto de ator social de plenos direito, está sendo

trilhado. Por outro lado, as marcas advindas de uma formação onde os parâmetros pedagógicos são estabelecidos a partir da “infância em situação escolar”, estão sutilmente expostas, seja na forma de organização deste espaço, seja na qualidade e quantidade de objetos/brinquedos disponibilizados, seja na postura de distanciamento e vigilância da criança neste tempo/espaço, e que é ainda sobre esses parâmetros que os adultos, consciente ou inconscientemente, estão alicerçando seu trabalho pedagógico.

A partir dos cenários físicos onde se desenvolvem relações/interações/brincadeiras entre as crianças, adultos e objetos/brinquedos, evidenciam-se regras de ação diferenciadas e pré-estabelecidas nos diversos locais, regras que oscilam entre rigidez e maleabilidade e que as crianças infringem ou acatam. Isso pode ser percebido na instituição pesquisada por meio das indicações fornecidas pelo portão de entrada do parque. A existência de um portão interno entre o jardim/pátio da frente do NEI e o parque remete-nos a pensar que ele é apenas um limitador da entrada e saída das crianças. Entretanto, ao ficar aberto, convida-as a ultrapassar esse limite; ao ficar fechado interdita-lhes o uso do espaço externo ao parque.

Aproveitando que o portão não estava trancado, três crianças resolvem se aventurar a ultrapassá-lo. Elas ficam brincando, sentadas no chão embaixo da árvore, no canto do muro. A professora, que estava no parque, sentindo a falta das crianças, vem à procura delas. Passa por elas, não as vê. Antes que entre no prédio, chamo-a e aponto para a árvore. Ela olha, sorri e balança afirmativamente a cabeça, dizendo: Professora – O que é que vocês estão fazendo aqui? Vamos pra lá brincar com os outros amiguinhos, eu não consigo ver vocês aqui.

As crianças resistem, dizendo algo que não entendo, pois falam todos ao mesmo tempo. A professora convence-os dizendo:

Professora – Lá também é bem legal.

As crianças saem correndo em direção ao parque, enquanto ela se explica pra mim. Professora – É muito perigoso, por causa do portão (está se referindo ao portão de acesso à Istituiçao); se alguém passa e esquece de fechar, eu não vejo de lá ... (DIÁRIO DE CAMPO)95

Por outro lado, estar fechado indica também que houve uma preocupação da professora em relação à segurança das crianças, explicitada na sua fala. O fato de justificar sua atitude, parece significar que ela reconhece que às vezes ficar só, longe dos olhos dos adultos, pode ser prazeroso para elas, que isso é uma necessidade da criança e que cada criança tem suas singularidades, seu jeito de ser/estar no mundo. Demonstra também o quanto a questão do cuidado nas Instituições de Educação Infantil está atrelada à de vigilância; o

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adulto não abre mão de ver tudo e todos, ocupando os espaços mesmo onde seu corpo não vai, ocupando-o com seu olhar, com a projeção de sua presença.

Cada um traz escrito, em seu corpo, uma memória de vida, uma história, um contexto familiar. Saber olhar estes corpos com a peculiaridade de cada um é o fundamento de uma didática cuidadosa, que valoriza a subjetividade, estimula potencialidades (VIANNA, 2002, p.24).

Max e Junior estão correndo pelo parque chutando uma bola e descobrem que o portão está fechado, mas não está trancado. No instante seguinte já estão chutando a bola do outro lado. Ao vê-los, mais crianças – dos outros grupos e do próprio Grupo IV também se aventuram na travessia. Percebo que a professora da sala do Grupo IV espicha seu olhar em direção a esse espaço do parque; percebendo que não havia nenhum adulto do outro lado, ela se desloca para lá. Pensei que iria colocar todos de volta ao parque, mas, ao invés disso, ela monta sentinela, discretamente se acomoda em uma cadeira perto do portão, estrategicamente, de maneira que pudesse ver também o lado do parque e fica a observar as crianças (DIÁRIO DE CAMPO)96

Foto 24 – Do outro lado do portão: 22/6/04

Assim sendo, essa estrutura que contribui para a definição de determinadas regras implícitas não implica necessariamente ações determinadas por elas nem determina integralmente os padrões de relação/interação sociais estabelecidos entre criança/criança, criança/adultos e também entre adultos/adultos.

O que essa estrutura tem em comum com todos os atores é o principio da coletividade: revelada a escassez de recursos, os objetos/brinquedos têm que ser conservados e compartilhados, pois pertencem a todos. Assim sendo, o que estrutura o parque do NEI como lugar não é apenas o que está presente, materializado em objetos e regras formais. A sua forma visível oculta relações/interações de distanciamentos e aproximações que afetam as ações de cada um individualmente e do grupo como um todo, que, entrelaçados em espaços e

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tempos, criam e recriam cotidianamente as bases para a recombinação da vida social nessa instituição de educação.

Articulando-se o contexto formal do parque com as práticas que se fazem nele e dele, que foram instituídas pelos adultos em presença –da professora e auxiliar de sala do Grupo IV ou de outros grupos –, e/ou do passado, percebe-se que as rotinas cotidianas o expandem na sua função prévia. É o caso de todos os espaços estruturados pelos adultos pensados para brincar, que, por iniciativa deles ou das crianças, funciona para outras coisas também. Essa polivalência de funções em espaços são observadas também nas áreas não pensadas para brincar pelos adultos. Esse fato se deve à mobilidade dos objetos/brinquedos, ou seja, não sendo fixos, podem ora estar em um lugar, ora em outro, de acordo com o desenrolar dos enredos desenvolvidos pelas crianças. A partir disso, podemos inferir que as regras formais não são capazes de engessar completamente a ação ou dar conta de todas as situações. Elas mesmas são únicas e particulares no contexto do cotidiano, pois não envolvem somente a compreensão e interpretação das situações, mas carregam consigo uma dose considerável de imprevistos.

O que aqui também se torna relevante destacar não são os usos que as crianças do NEI fizeram do espaço previamente estruturado, mas de ter sido muitas vezes o adulto a mudar a organização ou a função das coisas que ele próprio instituiu. Podemos constatar isto tanto em situações particulares referentes a determinados objetos, quanto em situações extremas, onde todo o cenário/espaço do parque foi modificado, como foi o caso da festa junina e do dia em que ocorreram as oficinas, em que as regras para uso desse lugar, implícitas até então, foram mudadas drasticamente.

Hoje é um dia especial no NEI. É dia das oficinas, onde todos os grupos de crianças têm a oportunidade de estarem juntas durante todo o período da manhã, realizando atividades diversificadas. A refeição, cada grupo faz em sua sala. O palco onde as crianças iriam contracenar foi modificado, retirando ou isolando alguns elementos do cenário anterior e acrescentando novos elementos indispensáveis para que o ato acontecesse. Ou seja, as oficinas foram montadas no espaço do parque. Oficina de pintura com guache, de confecção de instrumentos musicais, de objetos de argila, pintura de rosto, roupas para se fantasiarem, com música o tempo todo. Cada uma dessas oficinas foram estrategicamente montadas em espaços diferenciados do parque. O jardim/pátio em frente ao NEI não foi contemplado pelos adultos na organização das oficinas; por outro lado, as crianças deslocavam objetos/brinquedos para brincarem nesse espaço (DIÁRIO DE CAMPO)97

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Foto 25 – Oficina de Artes Plásticas-2/ 07/04 Foto 26 – Oficina de Artes Plásticas –2/07/04

Foto 27 – Oficina Fantasias-2/07/04 Foto 28 – Oficina Marcenaria –2/07/04

Foto 29 – Festa junina Foto 30 – Festa Junina

4.1.4 “O que é que tu estás fazendo? Já estás inventando moda?” – o que se passa entre adultos e crianças no tempo/espaço do parque: regras explícitas

Os tempos da professora e da auxiliar decorrem da iniciativa explícita delas, formalizando suas relações com o grupo de crianças. Nessas circunstâncias, o adulto assume o

papel central e ativo, seja por sua presença direta com as crianças em momentos coletivos, regras explicitas, seja pelas regras implícitas que são comuns a todas as crianças, incluindo a regulamentação de tempos sociais maiores, como entradas e saídas da instituição. Ou seja, o adultrocentrismo é predominante nas relações estabelecidas com os grandes e pequenos grupos, pois transparece uma diferença entre o poder dos adultos e o das crianças. A ordem dos objetos e das crianças está subordinada à palavra do adulto, que a utiliza para chamar a atenção delas para o que está dizendo ou apresentando. Esta é uma temporalidade, que neste trabalho é considerada como sendo os tempos dos adultos, a outra, que consideramos os tempos das crianças, vista genericamente como os momentos de brincadeira livre, tem como característica a liberdade dada pelos adultos às crianças para fazerem suas escolhas e envolverem-se em diversas relações/interações com outras crianças ou objetos/brinquedos. As crianças passam a deter o papel central nas decisões, no que diz respeito tanto a escolher e iniciar uma determinada brincadeira ou a utilização de determinados objetos/brinquedos quanto a decidir manter-se ou não nelas.

Percebe-se que as relações estabelecidas entre as crianças do Grupo IV apresentam-se menos hierarquizadas, o que não quer dizer que não existam relações de poder entre elas.

Nesses momentos, a professora assume outros papéis, ficando mais como observadora e intervindo somente quando solicitada ou para intermediar algum conflito/disputa e/ou agressões. Mesmo quando a ordem repousa nas regras explicitadas pelos adultos, as crianças inventam moda e acabam transgredindo o estabelecido – em que o tempo de fuga, de contra- ordem, transforma-se em tempo de busca, busca do novo, da emoção, da descoberta, do prazer ... busca de si e do outro.

Assim, no Grupo IV, as relações de poder e contra-poder, entre adulto/adulto, adulto/criança e criança/criança são mescladas, alternadas e combinadas com uma boa dose de carinho, confiança e incentivo à autonomia.

As relações/interações nas quais o adulto está mais presente apresentam-se com menor freqüência na espacialidade do parque – que nos remete a um tempo, o tempo de estar fora da sala – e, por conseguinte, com maior constância na espacialidade da sala de referência – que nos remete a um tempo inverso, o tempo de ficar dentro da sala.

Pesquisadora – Qual é o tempo para o brincar livre? Em que momentos do dia ele acontece? É planejado?

Professora – Este tempo ainda é visto no momento do parque e geralmente não é planejado, exceto quando tem alguma atividade coletiva.

(DIÁRIO DE CAMPO)98

Diante desse esclarecimento da professora, podemos entender que os momentos em que as crianças brincam no espaço do parque, criado pelos adultos, é tido como o momento para as brincadeiras livres e, por serem livres, entende-se que não necessitam de planejamento ou organização diária.

Já a auxiliar de sala, ao refletir sobre a brincadeira livre, demonstra uma certa inquietação e dúvidas quanto à participação do adulto nesse momento em que as crianças estão no parque.

Auxiliar de sala – No parque é brincadeira livre. Eu acho assim... brincadeira livre é quando a criança ela se organiza... ela organiza sua própria brincadeira ... só que tem que ter a mediação, o material oferecido...sabe? Tem que ter a qualidade...(silêncio) aqui não tem ... as crianças pegam as coisas e brincam e quando a gente vai entrar pede pra eles ajudar a guardar...(DIÁRIO DE CAMPO)99

As brincadeiras são consideradas livres porque são as crianças que escolhem de que querem brincar, onde querem brincar, com o que vão brincar e por quanto tempo vão permanecer em uma brincadeira e noutra ou em várias simultaneamente. Ou seja, exercem determinados poderes na (re)criação e exploração do espaço, que na sala são enfraquecidos.

Dessa forma, é possível inferir que o parque é considerado pela professora e auxiliar como tempo e espaço das crianças e, por isso mesmo, há dúvida quanto à participação ativa do adulto nesses momentos. Para a professora e auxiliar, a criança, sabendo dos procedimentos que pode efetuar no espaço/tempo das crianças, em que o adulto não é o suporte da situação por excelência, passa a investir o controle da situação no processo de relações/interações com outras crianças; portanto, a presença do adulto nesse momento poderá constranger certas ações delas.

Conforme Ferreira (2002), na ordem institucional adulta se entrelaçam dois contratos sociais: o dos adultos com as crianças (brincar sem inventar moda) e o das crianças entre si (brincar com outras crianças). Esses contratos são construídos e identificados tanto no tempo/espaço interno (sala) quanto no tempo/espaço externo (parque). Nesta análise, acrescentamos um terceiro contrato social, o dos adultos entre si (cada professora e auxiliar é responsável pelas crianças de seu grupo). Esse contrato social, seja ele consciente, verbalizado ou não, parece permanecer de forma nebulosa entre as professoras e auxiliares no tempo/espaço externo. Ou seja, a lógica do agrupamento interno tende a permanecer no

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Registro do questionário realizado com a professora do Grupo IV em 20 de outubro de 2004.

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espaço externo, onde a professora e auxiliar do Grupo IV se sentem muito mais responsáveis por fazer valer o contrato social estabelecido com as crianças deste grupo, pois, oficialmente, é este grupo que está sob sua responsabilidade.

[...] tem todas as crianças no parque e daí se eu quero fazer uma brincadeira ou entrar numa brincadeira... ou oferecer alguma coisa pras minhas crianças do grupo... os outros, eles não vão ter esta oportunidade e também vão atrapalhar, acho que sim... (silêncio) porque se eu tenho um objetivo praquilo ali eu vou acabar, não... não sei? (DIÁRIO DE CAMPO)100.

O contrato social estabelecido entre adultos e crianças do Grupo IV, alicerçado em princípios unificadores e a partir dos quais se estabelecem negociações, traz consigo um conjunto de direitos e deveres que visam harmonizar as relações/interações que ocorrem dentro do grupo, É por isso que na instituição de Educação Infantil não se admite o conflito e a discussão entre as crianças e nem que as crianças fiquem sozinhas.

Faz quinze minutos que todas as crianças, de todos os grupos estão concentradas na parte do parque. As professoras e auxiliares também. Estranhei, pois, de certa forma, me parecia que as crianças já haviam conquistado o direito de ultrapassarem o portão sem pedir à sua professora ou auxiliar, uma vez que os adultos já não o trancavam mais, deixando-o por vezes totalmente aberto ou encostado. Neste dia, algumas crianças do Grupo IV e de outros grupos, mesmo estando o portão aberto, demoraram para ultrapassá-lo. Neste dia, depois de ultrapassar o portão, as crianças maiores escalam o muro lateral, tendo como apoio a casinha do gás, sentam-se em cima dele, colocando uma perna para cada lado, como se estivessem andando a cavalo. Já estão nessa brincadeira há mais ou menos dez minutos. Não tem nenhum adulto nesse espaço. Inclusive eu estou do outro lado do portão... A professora de Educação Física – professora comum a todos os grupos de crianças – sai de dentro da instituição e, vendo as crianças em cima do muro, deixa transparecer em sua expressão facial, que logo é verbalizada, sua preocupação. Primeiro conversa com as crianças, convencendo-as a descerem, depois vai em direção ao parque e ao portão, falando alto para que professoras e auxiliares escutassem, diz ser necessário que algumas fiquem deste lado também, para que as crianças não fiquem sozinhas. (DIÁRIO DE CAMPO)101.

Uma das regras mais explicitadas pela professora e auxiliar é a partilha dos