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PORTFÓLIOS DE VIDEOARTISTAS DA INTERFACE DANÇA-CINEMA Artistas da videodança tem reunido seus experimentos em páginas especializadas na

É melhor não fazer nada que

COMO PODEM QUERER DISSOCIAR ISSO DE MIM?

3.3 ESTÉTICAS AMADORAS E TRÂNSITOS TRANSDISCIPLINARES EM DANÇA CINEMA NA INTERNET

3.3.2 PORTFÓLIOS DE VIDEOARTISTAS DA INTERFACE DANÇA-CINEMA Artistas da videodança tem reunido seus experimentos em páginas especializadas na

submissão de vídeo, como estratégia para inventariar suas obras em portfólios online. Na dinâmica dessas submissões, a autorreferência se mantém como eixo de análise nos processos criativos dos artistas (amadores/profissionais), pois estes também possuem controle total ou parcial de seus experimentos e se contaminam pelo jogo entre mimese e realidade. São corpos dançantes que dirigem seus filmes e os divulgam em suas páginas pessoais (nos casos analisados, especialmente na plataforma Vimeo). A complexidade deste segundo grupo se refere à lógica de representação a que se dispõem os realizadores. Apesar da perspectiva autorreferente, muitos experimentos reproduzem uma relação corpo-câmera que se baseia por um paradigma cênico da dança. E, por isso, suas páginas pessoais, reproduzem um regime mimético de realidade, na medida em que se tornam apenas o suporte de seus experimentos, sejam eles híbridos (pois se fundam na relação corpo-câmera), ou não (registros de dança). Ou

seja, criam uma disrupção entre o profissional ou artista amador que dança e suas páginas pessoais na web, como medida de fracionar o público e o privado.

Alguns experimentos se aproximam de uma perspectiva de videodança autorreferente, quando transbordam a ideia de representação e tensionam a expectativa cênica da dança ou mesmo narrativa do filme. Enquanto outros ainda demarcam os recursos de uma dançalidade e seus vínculos narrativos e/ou dramatúrgicos com a câmera e a montagem, quando encenam experiências de corpo e reproduzem no processo de finalização do filme a forma dança-cinema. Essas videodanças são facilmente exibidas em circuitos legitimadores fora da web, como festivais e afins (afinal, muitos ainda estão organizados sob o formato hegemônico que encena uma dança para a câmera e exige do filme determinados padrões de exibição). Sua publicidade nas páginas pessoais dos realizadores diz respeito mais ao suporte de divulgação oferecido pela internet do que um interesse na exclusividade dos experimentos para as plataformas online. Alguns artistas da videodança utilizam o ciberespaço como um ambiente para expor seus trabalhos, como costumam fazer cineastas que pretendem reunir filmes a partir de indexações numa função específica da produção, ou bailarinos que pretendem receber convites de grandes companhias, não exatamente considerando a web como um espaço de distribuição e exibição,

per si. Ou seja, as páginas pessoais acabam reunindo filmes como bibliotecas que acumulam

livros: tornam-se apenas mais uma informação indexada na internet e se distanciam do contexto autorreferente que produz contaminações entre vida e obra do artista.

Assim, esses vídeos se tornam apenas parte de um portfólio virtual, que pode até ser específico de artistas que trabalham com experimentos autorreferentes em videodança, mas não necessariamente confronta o sistema de representação que se estabelece na mise-en-scène. Prevalece, em alguns casos, a forma dança-cinema, na medida em que se aproximam dos processos de criação do cinema hegemônico (a forma cinema e os grandes sets de filmagem) e das grandes companhias de dança (o paradigma cênico que exige uma preparação prévia, e se caracterizou pelo uso disciplinar da coreografia em seu senso comum ou de processos dramatúrgicos oriundos das artes cênicas). Não se trata de um simples exercício distinguir experimentos em videodança autorreferente, porque isso depende mais da postura/interesse do artista em relação à sua obra do que simplesmente reduzi-la a uma análise qualitativa. Como esta pesquisa se dá no ciberespaço da web, não apenas a relação corpo-câmera é importante para fazer tais distinções, mas a maneira como esses vídeos se materializam em suas interfaces com a rede mundial de computadores. Afinal como eles chegam à internet e quais seus desdobramentos enquanto imagens virtuais? Se os hibridismos da relação corpo-câmera com o ambiente digital são ignorados em sua perspectiva autorreferente, ainda se mantém a encenação

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para um filme: o artista consegue separar o regime de imagem da videodança de sua experiência pessoal. Sob o mimetismo da forma cinema, separa sua vida “real” das imagens que produz.

A estética da representação fecha as interpretações em si mesma, condicionando ou direcionando o espectador aos significados que estão atribuídos numa narrativa ou dramaturgia prévia. E, por mais que esse videomaker acumule as funções de realizador e performer, dirigindo sua própria experiência em videodança, nem sempre ele está interessado em reconfigurar o jogo de encenação para a câmera. Dessa forma, substitui-se o acontecimento na interface corpo-câmera e suas tecnologias digitais por uma dança cênica para a câmera, que se estabelece num regime de imagem pouco ambíguo para o conceito de autorreferência nas audiovisualidades. Caracterizando-se, então, como um experimento que serve ao modelo ainda legitimado pelos circuitos curatoriais hegemônicos. As experiências nas páginas pessoais desses artistas, entretanto, é variável: há experimentos em videodança autorreferente ao passo que também é comum se deparar com a reprodução da forma dança-cinema. Esse segundo grupo de obras analisadas demonstra, portanto, como os artistas que se dedicam à interface corpo-câmera na videodança autorreferente podem estar situados sob um regime de representação cênica e de sua narratividade, apesar de as experimentações nem sempre reproduzirem a totalidade dos esquemas hegemônicos de produção audiovisual na videodança – os grandes sets de filmagem e as companhias de dança –, pois muitos são artistas independentes e/ou amadores. Nesse sentido, observo o trabalho de quatro artistas- pesquisadoras cujos trânsitos híbridos em dança-cinema se aproximam da autorreferência, apesar de ainda se manterem sob a lógica do portfólio nas plataformas digitais.

A pesquisa da videoartista Concha Vidal de Valicourt, por exemplo, se situa nesse entrelugar. Seu canal na plataforma Vimeo reúne vídeos cuja direção e performance são suas, mas os gêneros audiovisuais variam. Há tanto experimentos em videodança quanto registros de suas performances e instalações, em museus, teatros e afins. Os vídeos são produzidos em alta resolução e por vezes se aproximam de um paradigma cênico-narrativo, baseando-se em arquétipos (como o mito de Sísifo, utilizado em um de seus trabalhos) ou nos papéis sociais da mulher, como nas imagens disponíveis a seguir. Existe uma nítida preferência da artista pela cor vermelha (seus vestidos e elementos cênicos), que é a palheta recorrente de suas criações, especialmente quando se volta a temas relacionados ao feminino. Seus experimentos são filmados em lugares ermos, como estaleiros, ambientes inóspitos e naturais, ao passo que os registros de suas performances adotam as espacialidades cênicas e institucionais dos circuitos curatoriais. Concha ainda se norteia por uma concepção que representa na videodança.

Apesar dos experimentos autorreferentes, pois o corpo da artista está diretamente implicado nas imagens que produz, Concha Vidal aborda temas que se repetem em suas provocações estéticas e circula entre as linguagens da dança, do teatro e do cinema 39. Suas

videodanças, por exemplo, podem se apresentar sob um tema específico ou trazerem questões espaciais, que se implicam na relação espaço-temporal do corpo em movimento. Além de dançar, Concha Vidal é a diretora de seus vídeos, o que faz com que administre a totalidade de sua obra, especialmente nas etapas processuais que relacionam corpo e câmera. No entanto, sua obra reproduz a cadeia produtiva da forma dança-cinema, quando integra diferentes profissionais, de música à fotografia, em suas especialidades de composição. A performer também divulga seu trabalho na internet e possui um site onde compila os vídeos publicados na plataforma Vimeo. A reunião desses vídeos se apresenta sob o formato de portfólio.

Muitas das pesquisas de Concha Vidal envolvem o tema do arquétipo feminino, mesmo em relação ao corpo e à paisagem, podendo resultar naquilo que chama de “visão incômoda”, em seu website. No trabalho intitulado Strange Fruit, por exemplo, Vidal está pendurada numa árvore, assim como o fruto proibido do mito de Adão e Eva. A performer está alçada como várias outras bonecas, vestidas de vermelho, todas à mesma maneira. A imagem reproduz a ideia de uma mulher-objeto. O corpo de Vidal, único dotado de movimento, centraliza a atenção quando o quadro é ampliado para um plano de conjunto (a câmera revela uma parte significativa do cenário) com as várias bonecas. O plano-sequência não apresenta imagens espetaculares, os movimentos, tanto de câmera como da artista são lentos, milimétricos. O trabalho é, então, de revelar, aos poucos, os elementos que compõem o espaço e suas variações de realidade.

39 “Em suas performances interdisciplinares confluem o teatro, a dança e a videoarte. Com uma linguagem muito pessoal. Concha tece um novo alfabeto na iconografia da arte, recuperando em suas ações poéticas o espírito dos anos 1960. Retoma o tema da mulher, do corpo e da paisagem, a partir de uma perspectiva nova e surpreendente, ao oferecer um olhar que às vezes pode ser desconfortável. Com performances por toda Europa Suíça, Croácia, Alemanha e Espanha, tem participado de numerosos festivais de dança e videodança”. Texto disponível no site oficial da artista. Tradução minha de texto disponível em espanhol no endereço: < http://www.conchavidal.com/>. Acesso em: 12/03/2018 Fig u ra 3 5 Fig u ra 3 6

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A segunda videoartista e performer analisada é a brasileira Iolanda de Lourdes, que também possui um canal na plataforma Vimeo. Seus vídeos estão inseridos na seguinte zona limítrofe: uns se caracterizam como videodança, outros como registro de performances e pesquisas de movimento. Os trabalhos de Iolanda de Lourdes chegaram até mim por meio das imagens compartilhadas no grupo Videodança – experimentações do movimento, na rede social

Facebook. Numa perspectiva mais experimental, a artista produz vídeos com uma resolução

menor e seus experimentos têm um caráter amador, porque são indisciplinados e não necessariamente reproduzem uma estética da representação cênica. Iolanda costuma filmar intervenções no espaço urbano e, sem uma predominância cênico-narrativa, suas experiências se dão nas relações entre corpo e câmera a partir de improvisações que acontecem na cidade (nesse caso, São João de Rei, em Minas Gerais). As danças que integram seus projetos híbridos, acontecem tanto em relação às pessoas que se aproximam, nas ruas, quanto ao espaço-tempo e elementos que integram o ambiente, como tráfego de carros, arquitetura, etc.

A performer dirige e dança em seus próprios vídeos, cujas imagens são captadas por um fotógrafo em parceria. O processo de criação se baseia nas relações espaço-temporais do corpo em movimento, com a arquitetura, os ambientes urbanos e corpos em jogo. Em Corpo

atravessado40, por exemplo, Iolanda de Lourdes dança em público, num espaço que se assimila a uma praça. Sua intervenção dançante brinca com as formas de uma escultura, que é captada frontalmente pela câmera. No vídeo, um homem que assiste à artista se afeta por seus movimentos e começa a repeti-los. Isso se dá em segundo plano (ao fundo), pois o anônimo não

40 O corpo se dá enquanto provocação central do processo criativo de Iolanda de Lourdes. Na descrição desse vídeo para a plataforma Youtube, por exemplo, a artista disponibiliza a seguinte reflexão: “A dança é o lugar possível de expressar toda carga que carregamos no “eu corpo” enquanto ser atravessado por experiências constantemente diversas. Ele não se engana. Ele apenas é o que se torna todos os dias. Na dança do corpo, tudo é possível. O eu corpo se move de acordo com as respostas que vem de dentro. Das marcas do tempo, do juízo domado, dos questionamentos que travam infinitas batalhas a fim de descobrir o que é e o que pode ser essa casa habitada que se modifica a cada instante. Assim, cada sopro de ação e movimento, são respostas de uma linguagem que define a si mesmo. Todo e qualquer desejo do pensamento, se torna cabível aos membros do ser. Afinal, só o corpo pode responder ao corpo. Logo, só um corpo pode entender outro corpo”. Texto disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=7guu-H-bu0g> Acesso em: 13/03/2018.

Figura 37

se aproxima da artista para dançar com ela. Tal acontecimento demonstra como a perspectiva de criação da artista não exclui os elementos que se dão imprevisíveis durante a filmagem. Os corpos estão disponíveis para as relações que se estabelecem durante o processo de captação e, sem um roteiro prévio, distanciam-se da reprodução de um paradigma cênico. Os únicos vestígios de dançalidade que ficam são as marcas de técnicas disciplinares de dança.

Assim, as experiências em corpo-câmera de Iolanda de Lourdes se inscrevem na aparição/desaparição de corpos, cujas relações não planejadas desencadeiam afetações com os elementos no espaço. A videoartista compartilha seus vídeos tanto no Youtube quanto no Vimeo. Em sua página pessoal no Facebook também é possível encontrar alguns dos frames desses experimentos, visto que a artista não faz uma cisão objetiva entre sua vida e obra: as provocações se estendem na ambiguidade de um corpo que dança para a câmera sem considerar, necessariamente, este um regime cênico, de representação. No que tange aos seus experimentos, a maior parte dos vídeos publicados nas plataformas de visualização se circunscreve a um projeto maior, a que chama de Movas SE. O experimento Corpo Atravessado também integra esse conjunto. Observa-se, então, uma dupla possibilidade: essas experiências poderiam estar entre a estética híbrida da videodança e o registro de suas investigações artísticas para o projeto

Movas SE. De qualquer forma, não parece haver uma cisão objetiva, pois há acontecimentos no

vídeo que se desenvolvem a partir de sua relação espaço-temporal e de suas investigações em corpo-câmera. Iolanda se permite ser afetada e afetar os corpos, instaurando um regime de imagem que privilegia as atualizações do corpo em movimento diante das aparições nas ruas.

Figura 39 Figura 40 F ig u ra 41 Fig u ra 42

160 Fig u ra 43 Fig u ra 44

A terceira videoartista e performer que integra o grupo é a cineasta Erika Motta Cardoso. Em seu canal na plataforma Vimeo há apenas um vídeo disponível, E no abismo de nós havia

azul e cinza, experimento em que atua como realizadora e dançarina. Em trecho de sua biografia

no perfil do Vimeo, Erika Motta se diz interessada num trabalho autoral “na interface entre dança e cinema, tendo a interdisciplinaridade como uma de suas características marcantes”. A cineasta também se insere nesse contexto audiovisual autorreferente da videodança quando centraliza o processo criativo em seus experimentos em corpo-câmera. Afinal, Erika Motta é o corpo que dança num filme em que também é a diretora responsável pelo set de filmagem. O acúmulo de funções, entretanto, não se aparta de um complexo processo criativo, em que se inserem vários trabalhadores do audiovisual e da dança em colaboração. Trata-se de uma videodança que assume a lógica de produtividade hegemônica do cinema: divisões/hierarquias. Seu experimento E no abismo de nós havia azul e cinza se afasta de uma experiência cênico-narrativa para pensar as relações do corpo-câmera com a cidade, suas cores e espaços- tempo. O azul a que se remete no título é o céu de Brasília, e o cinza, seu concreto: a fotografia explora nos principais planos os espaços abertos da capital brasileira. E o corpo da performer, vestido de branco, move-se afetado pelas ausências exploradas na relação com o céu, quando é constantemente derrubado pelo fluxo de pessoas e carros. A videodança, então, demonstra uma montagem com muitas variações de planos (dos mais fechados aos mais abertos), numa estrita relação corpo-câmera que traz a artista andando, caindo e contemplando os espaços abertos da cidade. O vídeo circulou por alguns festivais do gênero e a artista exibe nos créditos uma vasta equipe por trás do trabalho41. Apesar de não adotar uma perspectiva necessariamente cênico- narrativa para o corpo dançante, seu formato audiovisual se aproxima da forma dança-cinema quando ainda se organiza sob o paradigma dos grandes sets de filmagem. Além disso, a montagem minuciosa da videodança abre algumas questões sobre o processo de decupagem, cuja relação com o corpo dançante evidencia uma orientação coreográfica.

41 “E no abismo de nós havia azul e cinza, seu trabalho autoral de maior destaque, teve reconhecimento nacional e internacional, participou de diferentes mostras e festivais, foi apreciado pela crítica e integrou a programação, por meio de curadoria, de canal de TV por assinatura”. Texto disponível em: <https://vimeo. com/user15792424/about >. Acesso: 13/03/2018

A quarta e última videoartista dos trânsitos em dança-cinema, cujo portfólio está disponível na web, é a fluminense Thainá Farias, que assina seus vídeos como Iná Uó em canal na plataforma Vimeo. Sua página pessoal reúne experimentos das artes performativas, registrados em vídeo, e processos de criação exclusivos na interface corpo-câmera. O teor de seus vídeos é, sobretudo, experimental, na medida em que a artista busca na relação com a montagem cinematográfica sentidos que desafiam o sistema de representação e a linearidade cênico-narrativa, oriundos tanto de um modelo hegemônico de cinema quanto de um paradigma encenado na dança. Alguns dos experimentos são gravados em ambientes fechados, como quartos e corredores, e suas intervenções se dão numa relação corpo-câmera que é transformada a partir da edição. Iná Uó dirige seus próprios vídeos, muitos com uma perspectiva mais amadora, e dança para a câmera, num hibridismo que explora a linguagem audiovisual autorreferente. Ela também monta os filmes, é uma artista multifuncional. Iná centraliza seu processo criativo e de distribuição, na medida em que também publica os experimentos na web, tanto por meio de sua página no Vimeo quanto nas redes sociais. Conheci o trabalho de Ina Uó por meio do grupo Videodança – experimentações do movimento, na plataforma Facebook.

O canal no Vimeo serve, entretanto, mais como uma espécie de portfólio para experimentos variados. A performer e videoartista desenvolve uma pesquisa específica que investiga os acontecimentos na interface corpo-câmera, estendo-os ao processo de montagem cinematográfica. Sua perspectiva amadora a faz intervir sobre todas as fazes do processo criativo. Ela dança, filma, monta e divulga seus próprios vídeos na internet. Com uma câmera na mão, uma ideia na cabeça e o corpo em movimento é possível fazer videodança, e isso se materializa em algumas experiências autorreferentes que manifesta em sua obra. Os vídeos de Ina Uó, entretanto, ainda não constituem objeto de análise no terceiro grupo desta pesquisa especialmente porque os experimentos ainda estão situados e organizados sob a demanda de uma “vitrine” que existe sobre os portfólios online. A artista reúne quaisquer obras em sua página no Vimeo sobre o pretexto da autoria, inclusive registros de trabalhos cênicos.

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Ainda que alguns de seus filmes estejam inseridos numa perspectiva autorreferente, tanto por dançar neles e dirigi-los quanto pelo processo criativo se distanciar da forma dança-

cinema, eles são apenas parte dos diversos experimentos em seu canal. Ao passo que apresenta

essas contaminações entre vida e obra da artista em alguns trabalhos, noutros há uma cisão completa por conta do regime de imagem que reitera a representação. Assim, Iná Uó compila no formato de um portfólio diferentes experiências, inclusive algumas em que apenas dirige ou colabora na montagem, sem dançar, não caracterizando aquilo que esta pesquisa nomeia como projeto de videodança autorreferente para o corpo em movimento. Pois a implicação do corpo- câmera nas imagens virtuais passa pela experiência dançante do realizador e isso é imprescindível para pensar o filme. A autorreferência, na videodança, faz parte dos trânsitos híbridos entre a dança e o cinema: o pensamento que vem dançando num corpo torna-se o pensamento fílmico e corresponde aos acontecimentos dessa interface. A reunião dos filmes de Iná Uó caracteriza muito mais uma investidura de cinema experimental do que um projeto contínuo em videodança autorreferente, como o é Une minute de danse par jour.

Entretanto, é possível observar uma perspectiva autorreferente em muitos dos experimentos da artista, como em #3 - corredor / exercíciode-emvideodança. Iná Uó dança no corredor de uma residência estudantil, acompanhada de um gato, com o qual interage para implicar seus movimentos e posições. A montagem valoriza cortes abruptos e sua relação direta com a câmera. Iná promove uma intervenção sobre o estado de realidade espaço-temporal no vídeo, quando a velocidade dos movimentos é reduzida, ganha dinâmicas mais lentas. A artista dança e filma, ao mesmo tempo. No experimento, uma música revertida entoa a aproximação movente entre Ina Uó e o gato preto que lhe acompanha no quadro.

3.3.3 TRANSBORDANÇA: TRÂNSITOS ESTÉTICO-POLÍTICOS DA VIDEODANÇA