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Antes de entrarmos na análise jurisprudencial, insta mencionar a questão de como a doutrina trata o assunto. Posteriormente, em capítulo próprio, traremos a análise dos julgados com as nossas conclusões acerca dos tribunais superiores e os seus posicionamentos sobre o estudo.

Dentre todos os autores pesquisados, poucos se arriscaram em comentar sobre este tipo de furto. A situação é de insegurança jurídica, uma vez que os Tribunais de Última instância não são uníssonos no tema. Igualmente, dos doutrinadores que falaram acerca do assunto, dois são a favor e três são contra a criminalização da conduta. O que torna salutar o estudo da matéria, visto que tanto a doutrina como a jurisprudência divergem acerca do assunto. Vejamos então as posições dos doutrinadores.

Segundo Gonçalves, (2014, p. 328), a jurisprudência tem reconhecido o crime de furto no recebimento do sinal de TV por assinatura. E ele se filia a esta posição, que mesmo sabendo que existem questionamentos técnicos acerca do reconhecimento do sinal de TV a cabo como forma de energia, considera o doutrinador que deve ser reconhecido como furto, explicando que ao menos deveria ser reconhecido como a figura prevista no caput do delito em análise, posto que se trata de bem móvel incorpóreo. Em seu escrito, comenta que é contra a posição do STF acerca do assunto, corroborando o entendimento do STJ, considerando-o mais adequado.

Nucci (2017, p. 561) considera que é valida a adequação da norma do furto de energia elétrica como furto de sinal de TV a cabo e de internet, considerando-os como forma de energia, mostrando em seu livro o julgado do STJ que embasa a sua discussão e o seu posicionamento. Julgado este que, não citaremos aqui, posto que será mostrado em capítulo próprio.

Diferentemente das posições anteriores, temos a de Bittencourt (2012, p. 175). Aduz que o art. 155, § 3º, do CP assemelha à coisa móvel a “energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico”. Logo, entende em um primeiro momento que sinal de TV por assinatura não é energia. Isso pelo fato de que, quando examinamos a expressão “qualquer outra”, temos que admitir que qualquer outra se equivale tão somente a energia, que pela redação ficou nela implícita.

Entende assim, que as energias que devem ser consideradas no texto legal são a atômica, sonora, mecânica, genérica dentre outras. Explica de outro modo, que o sinal de TV a cabo jamais será uma forma de energia.

Seu ponto de vista se baseia que a energia se consome e se finda, podendo até mesmo terminar, ao passo de que o sinal de televisão não se diminui, tampouco é fungível, citando como exemplo que mesmo se o Brasil todo estivesse utilizando ao mesmo tempo, o sinal de televisão, é tangível esta possibilidade. Já se fossemos utilizar a energia elétrica advinda de um lugar só e ao mesmo tempo, isto geraria um caos, pelo fato desta ser consumível. (BITTENCOURT, 2012, p. 175).

Convém ainda mencionar novamente o pensamento do autor anteriormente citado. Sua linha de pensamento conclui que, como o sinal de TV a cabo não se trata de energia propriamente dita, tampouco pode ser subtraído do patrimônio da vítima, porque o verbo nuclear do crime de furto, subtrair, indica que algo está sendo retirado, surrupiado, retirando então algo de alguém. Interpreta assim que, quem utiliza o sinal proveniente do “sinal televisivo”, dele não se apossa, nem retira nada, sendo inexistente a diminuição do patrimônio alheio que é exatamente o objeto jurídico do crime de furto (2012, BITTENCOURT, p. 176).

Na mesma linha de pensamento do autor anterior, entende Greco (2017, p. 805- 806), fazendo a menção do trecho do livro daquele e citando alguns dos julgados que serão o embate do nosso terceiro capítulo, que não colaremos aqui para evitar repetições.

No mesmo sentido dos autores anteriores, Fonseca (2001) ensina que não há prejuízo no patrimônio da empresa pela subtração do sinal da TV de canal fechado, mas, em verdade, ela deixa de receber, o que de fato não subsume na característica do verbo subtrair, núcleo do crime de furto simples.

Assim, vemos que a falta de um padrão que seja adotado pelos Tribunais de Última Instância gera para o entendimento não somente da sociedade, mas até mesmo dos doutrinadores criminalistas.

A insegurança jurídica trazida pela ausência de um entendimento fixo dos julgados mostra à temática e o caloroso debate acerca do assunto. A doutrina não é uníssona sobre o tema, talvez seja pela certeza e unicidade nos entendimentos e soluções trazidas pelas decisões judiciais. E é isto que mostraremos adiante no complexo debate relacionado nos Órgão de Instância Máxima.

4 A ANÁLISE DOS POSICIONAMENTOS DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Agora chegamos ao momento mais aguardado do trabalho. Iremos analisar a visão dos dois Tribunais de Última Instância da República Federativa do Brasil, acerca da análise do crime de furto do sinal de TV a cabo e da sua equiparação com o crime de furto de energia elétrica.

Conforme mencionado no escopo introdutório, nossa pesquisa será baseada no sistema de transmissão por TVC. Expliquemos, preliminarmente, então, as quatro espécies de TV por assinatura, presentes no Brasil atualmente, segundo a pesquisa feita.

O sistema TVC, segundo a ANATEL (2011, apud Rio, 2012), é “[...] o serviço de

telecomunicação que consiste na distribuição de sinais de vídeo e/ou áudio, a assinantes, mediante transporte de meios físicos". Desse modo, a distribuidora dos sinais recepciona os sinais via satélite na sua central e, posteriormente, envia aos usuários por sistema de cabeamento (fibra ótica ou coaxial).

Neste sistema é que reside a nossa pesquisa sobre a criminalização dos usuários que recepcionam esses sinais de modo não autorizado.

Ainda, o autor supracitado explica os outros três sistemas presentes e classificados pela ANATEL:

O sistema MMDS – Distribuição de Sinais Multiponto Multicanais –, de acordo com a Portaria n. 254/1997, da ANATEL, "é uma das modalidades de Serviços Especiais, regulamentados pelo Decreto n. 2.196, de 08 de abril de 1997, que utiliza de faixa de micro-ondas para transmitir sinais a serem recebidos em pontos determinados dentro da área de prestação do serviço". Nesse caso, o sinal é transmitido pela programadora até o headend da operadora via satélite, que em seguida envia a programação aos assinantes, que a recebe por meio duma antena de micro-ondas. O terceiro é o DHT – Serviço de Distribuição de Sinais de Televisão e de Áudio por Assinatura via Satélite –, definido como "uma modalidade de serviço especial, que tem como objetivo a distribuição de sinais de televisão ou de áudio, bem como de ambos, por meio de satélites, a assinantes localizados na área de prestação". A programadora, nesse caso, transmite o sinal via satélite diretamente às residências dos usuários.

Já o sistema TVA – Serviço Especial de Televisão por Assinatura –, é o serviço de "telecomunicações destinado a distribuir sons e imagens a assinantes, por sinais codificados, mediante a utilização de canais do espectro radioetétrico, sendo permitida, a critério do poder concedente, a utilização parcial sem codificação" (2011, apud RIO, 2012).

Portanto, estes são os quatro sistemas catalogados, hoje, na Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL).

Relembrando que, na nossa análise, conforme os entendimentos que serão mostrados adiante estarão sendo analisadas as ligações realizadas pelo sinal proveniente de forma clandestina nos postes, conhecidas como TVC.

Outrossim, conforme prometido, citaremos a legislação na qual existe a previsão típica do “furto”de sinal de TV a cabo. A Lei nº 8.977/1995 (BRASIL, 2017, disponível na íntegra no anexo C deste trabalho), em seu artigo 35, prevê, expressamente, que: “constitui ilícito penal a interceptação ou a recepção não autorizada dos sinais de TV a Cabo”.

Diante dessa Lei, iremos debatê-la dentro dos julgados, mostrando quais os posicionamentos são tomados pelas últimas instâncias brasileiras.

Após mostrarmos os posicionamentos dos Sodalícios STF e STJ, bem como escolhermos o que consideramos o mais coerente com a doutrina interdisciplinar e a legislação, demonstraremos projetos de leis que visam a suprir a lacuna ora discutida, debatendo os aspectos por eles trazidos e mostrando o que pode vir de novo para o âmbito penal.