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1. INTRODUÇÃO

2.4. Práticas Educativas Parentais

2.4.1. Práticas Educativas Parentais e Funções Executivas

O estudo realizado por Bernier, Whipple e Carlson (2010) buscou investigar a relação prospectiva entre qualidade da interação mãe-filho e o desenvolvimento das funções executivas em amostra de crianças típicas. A amostra consistiu em 80 duplas mãe-filho, dos quais 44 eram meninas e 36, meninos. Foram realizadas quatro visitas: a primeira quando o filho tinha entre 12 e 13 meses, a segunda aos 15, a terceira aos 18 e a quarta quando a criança completava 26 meses de idade. Com relação às variáveis de interação mãe-filho, foram avaliadas nos dois primeiros encontros a sensibilidade materna, capacidade da mãe de se colocar no lugar do filho e entender suas necessidades, chamada de mind-mindedness, e suporte materno de autonomia. Já no que se refere às funções executivas da criança, tais habilidades foram avaliadas em dois momentos: aos 18 e aos 26 meses de idade. No primeiro encontro com a criança (18 meses), foi avaliada a memória operacional. Já no segundo (26 meses), além da memória operacional, também foram avaliados o controle inibitório e a flexibilidade cognitiva. Este estudo fornece uma das primeiras evidências longitudinais de que a qualidade da relação precoce mãe-filho pode ser útil na compreensão da origem e desenvolvimento de diferenças individuais de funções executivas em crianças, sendo que quanto melhor for a qualidade desta interação, melhor tende a ser o desempenho posterior em tarefas que exigem funções executivas. Este estudo evidenciou a influência das práticas parentais nos domínios cognitivo e comportamental da criança, principalmente no que se refere ao desenvolvimento das habilidades de autorregulação. Os resultados sugerem que o suporte para autonomia não somente parece se relacionar mais consistentemente com as funções executivas da criança do que a sensibilidade materna e capacidade da mãe de entender as necessidades do filho ao se colocar em seu lugar, como também o suporte para a autonomia parece ser o intermediador de tais funções. De acordo com estes autores, a criação de um ambiente encorajador da autonomia frequentemente está associada à também altos graus de sensibilidade materna e capacidade de entender as necessidades do filho, mas o contrário nem sempre é verdadeiro. Outro resultado importante, de acordo com as análises realizadas, é que

enquanto o suporte para autonomia foi responsável pela estabilidade do desempenho em funções executivas nos dois momentos da testagem, a capacidade para entender as necessidades do filho respondeu pelas alterações que ocorreram no desempenho em funções executivas de uma avaliação para outra.

Outro estudo de Bernier e colaboradores (2012) examinou a relação prospectiva entre qualidade do ambiente familiar até o segundo ano de vida e o desenvolvimento das funções executivas no terceiro ano de idade em crianças sem transtornos do desenvolvimento. Participaram da pesquisa 62 famílias compostas por pai, mãe e filho. Os critérios de exclusão consistiram em crianças nascidas pré-termo e presença de deficiência ou atraso no desenvolvimento. Foram realizados cinco encontros com a família: quando a criança tinha 12, 15 e 18 meses, bem como quando completou 2 e 3 anos de idade. Nestes encontros foram avaliadas a qualidade da interação comportamental entre pais e filhos, percepção de segurança no apego da criança e desempenho em funcionamento executivo da criança. Estes autores definem apego infantil como o resultado percebido pela criança dos comportamentos usados pelos pais na interação com ela, sendo inferido diretamente a partir do próprio comportamento da criança. Como resultados, foram encontrados que a qualidade da interação comportamental dos pais e a relação de apego entre pais e filhos estão associadas ao desempenho da criança em tarefas de funções executivas, principalmente contribuindo para o desenvolvimento de flexibilidade cognitiva e memória operacional. Já Schroeder e Kelley (2009) encontraram que níveis altos de conflitos familiares e desorganização no ambiente familiar foram relacionados a dificuldades de controle inibitório do comportamento e metacognição de crianças com idade entre 6 e 12 anos sem transtornos do desenvolvimento, de acordo com a percepção dos pais.

Para Cosenza e Guerra (2011), até as funções executivas se desenvolverem plenamente no final da adolescência e início da idade adulta, os pais ou cuidadores (principalmente) e a comunidade social são responsáveis por atuarem como provedores externos das funções executivas para a criança. Essa atuação envolve supervisionar o comportamento da criança, ajudá-la na resolução de problemas e raciocínio, como também corrigi-la quanto aos erros cometidos. Portanto, as práticas educativas parentais exercem forte influência na promoção e desenvolvimento de funções executivas nos filhos. Entretanto, nos dias atuais, de acordo com a percepção destes autores, há muitos pais que não podem mais estar tão próximos de seus filhos por conta de jornadas

extensas de trabalho, dificultando a atuação como provedores externos de tais funções. Em contrapartida, o estudo realizado por Martins (2014), que analisou a relação entre práticas parentais e ambiente familiar sobre o desempenho em tarefas que avaliam funções executivas de crianças pré-escolares de 3 a 6 anos com desenvolvimento típico, mostrou o efeito negativo ao controlar excessivamente os filhos, característico da prática educativa parental de monitoria negativa. A autora encontrou que quanto maior a responsividade emocional e verbal, ou seja, as verbalizações e interações de caráter afetivo do responsável com a criança, menor é a capacidade desta de atenção alternada. A hipótese da autora é a de que o controle externo demasiado pode dificultar o desenvolvimento da capacidade da criança em se autorregular, o que as torna dependentes de direcionamento externo. Com isso, destaco a importância dos pais de encontrarem um equilíbrio ao atuar como provedores externos de funções executivas para o filho, permitindo com que a criança participe ativamente deste processo e oferecendo oportunidades para que ela possa colocar em prática o que aprendeu por repetição de ações dos pais.

Apesar da forte influência das práticas parentais no desenvolvimento das funções executivas dos filhos, Bernier, Whipple e Carlson (2010) reforçam que o surgimento da habilidade de autorregulação na criança pode contribuir para a manutenção da interação harmoniosa entre pais e filhos, o que, por sua vez, propicia um ambiente favorável para o aprimoramento de tais habilidades. A relação, portanto, entre práticas parentais e funcionamento executivo não é causal, mas bidirecional, ou seja, um influencia o outro.

2.4.2. Práticas Educativas Parentais e Problemas de Ajustamento

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