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3.2 ANÁLISE TEXTUAL DOS DISCURSOS: PARA UMA ANÁLISE DE TEXTOS

3.3.1 Representação discursiva: a noção semântica do texto

3.3.1.1 Categorias semânticas das representações discursivas: um instrumento de

3.3.1.1.2 Predicação

Para entendermos a noção de predicação, recorremos à proposição de Neves (2013, p. 35), em que “[...] a predicação é um processo básico de constituição do enunciado”, o que significa dizer que, mesmo que existam as frases nominais, a comunicação entre os falantes raramente dispensa os verbos em seus enunciados. Para a autora, o propósito comunicativo do falante passa pela seleção da informação, depois pela codificação gramatical e finalmente pela articulação desses componentes.

Nesse sentido, para além do nível gramatical, a autora destaca a predicação a partir de pontos de vista semântico e informativo, ou seja,

Do ponto de vista semântico, no nível da oração (complexa) os processos (ou relações) e os argumentos (ou termos) se organizam pelo sistema de transitividade, enquanto que no nível que extrapola a organização sintática oracional – o nível do texto – esses mesmos componentes se organizam pela coesão. Do ponto de vista

informativo, no nível da oração se relacionam um tema (aquilo de que se fala; aquilo a que se predica) e um rema (o que se diz do tema; o que se predica ao tema), enquanto no nível do texto relacionam-se porções dadas (já apresentadas, acessíveis) e porções novas (não recuperáveis ou não acessíveis) (NEVES, 2013, p. 38).

Para a autora, a centralidade do verbo é outro ponto importante no desenvolvimento da organização textual. A partir de uma visão funcionalista, os verbos são considerados elementos centrais e todos os demais termos que se relacionam a ele (os argumentos) preenchem as lacunas ou os espaços vazios presentes na oração. Entre esses termos também se inclui o sujeito. No entanto, a autora assevera que “o sujeito é um argumento de diferente estatuto, no sentido de que ele é o escopo da predicação que se opera na oração (isto é, em referência a ele se estabelece a predicação) o que não se pode dizer de nenhum dos outros complementos” (NEVES, 2013, p. 40).

Para o processo de formação das predicações, de acordo com sua natureza semântica, a autora toma como ponto de partida a classificação proposta por Chafe (1979),

[...] ação, se o A1 (estruturalmente na função de sujeito) for agente;

processo, se o A1 (estruturalmente na função de sujeito) for afetado ou experimentador;

ação-processo, se o A1 (estruturalmente na função de sujeito) for agente/ causativo e houver um A2 afetado/ efetuado;

estado, se o A1 (estruturalmente na função de sujeito) não for nem agente nem causativo nem afetado (será ‘neutro’, ‘inativo’). (NEVES, 2013, p. 49-50).

Como se pode observar, a estrutura argumental da predicação é acionada a partir das relações entre o sujeito e o(s) complemento(s) que condicionam o valor significativo dos verbos. Como aponta Neves (2013, p. 59), nem todo verbo aciona uma estrutura argumental, ou seja, “[...] não são propriamente um rhêma, no sentido de que não são por si predicados, não constituem o núcleo, a matriz, para o preenchimento da estrutura argumental”, como é o caso dos verbos de ligação, verbos-suporte, verbos modais e os verbos auxiliares.

Os verbos de ligação, como o próprio nome diz, assumem a função de ligar o sujeito às suas características que podem expressar estado permanente, transitório, mutatório, de continuidade e aparente. De acordo com Neves (2013), os verbos “ser e estar” são os que mais caracteristicamente servem como “cópula” entre o sujeito e o predicativo. Apesar disso, o verbo de ligação não é vazio de significado, pois “continua o responsável pela expressão de todo o feixe de categorias gramaticais de que essa classe gramatical é suporte (tempo, modo, pessoa, número)” (NEVES, 2013, p. 60).

Exemplo 2:

[E23] Mas o quadro é ainda pior. A Operação Lava Jato jogou luz sobre a promíscua relação havida entre o ex- Presidente Lula e a maior empreiteira envolvida no escândalo, cujo presidente já está preso, há um bom tempo.

[E30] Ora, se a Presidente era (e é) indissociável de Lula, muito provavelmente, sabia que ele estava viajando o mundo por conta da Construtora Odebrecht, que coincidentemente sagrou-se vencedora para realizar muitas obras públicas, no Brasil e no exterior!

Os verbos-suporte classificam-se como um tipo de verbo auxiliar, verbo-suporte (+) sintagma nominal (SN) em que a força do significado desse termo recai no SN, ou seja, “mantêm seu estatuto verbal de suporte das categorias gramaticais que se expressam no verbo (tempo, modo, número e pessoa), mas não constituem sozinhos o núcleo do predicado” (NEVES, 2013, p. 63). A esse respeito, a autora salienta que pode ocorrer uma ligação tão intensa entre o verbo e o SN, uma espécie de “soldadura”, que funciona mais como uma expressão ou frase feita, de acordo com a estrutura argumental que esse termo carrega.

Os verbos-modais ou modalizadores têm como função mudar ou complementar o sentido do verbo principal e podem, assim, expressar sentidos diversos, como uma ideia de possibilidade, obrigação, vontade, dedução, desejo, proibição. São verbos “altamente relevantes pelo que representam como expressão da atitude do falante em relação ao que é dito” (NEVES, 2013, p. 65).

Exemplo 3:

[E400] “A moralidade precisa ser resgatada para que o cidadão que paga seus impostos, que luta para educar e alimentar seus filhos, não sinta vergonha de ser brasileiro.”

[E273] “Uma vez mais, cumpre lembrar que a Presidente entrega seu governo a um ex-Presidente, que precisa explicar à nação sua riqueza acumulada.”

Os verbos auxiliares são os verbos que auxiliam na conjugação de outros verbos que carregam uma maior carga semântica. Os principais auxiliares são os verbos ser, estar, haver e ter (+) verbos nas formas nominais (gerúndio, particípio e infinitivo).

Para Castilho (2012, p. 127), há a predicação “[...] quando um operador toma um termo por seu escopo transferindo-lhe propriedades de que o escopo não tinha antes”. Para deixar mais clara a definição, o autor traz o seguinte exemplo: “Aquele velhinho está lendo atentamente um livro divertido. Dá tanta risada que a qualquer hora destas ainda perde a dentadura”. De acordo com o autor, a interpretação de alguns termos do enunciado muda o seu sentido ou transfere seus traços semânticos quando estão acompanhados por outros termos

chamados de operadores, como podemos observar em, “lendo atentamente”, “livro divertido” e “tanta risada”. Conforme o autor, a transferência de sentido na predicação pode ser identificada a partir de três grandes mecanismos, a saber: de intenção, de extensão e de modalidade. Nesse sentido, “[...] a predicação pode ser definida como a relação entre um predicador e seu escopo, tal que o predicador atribui traços semânticos, papéis temáticos e casos gramaticais ao seu escopo” (CASTILHO, 2012, p. 129).

Assim, a partir das reflexões postas pelos autores, vale ressaltar que em nossa pesquisa, a predicação será analisada como uma operação de textualização com foco no verbo, como indicação dos processos de ação, estado e mudanças de estado que envolvem o referente no processo de construção das representações discursivas.