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Capítulo 7. O Discurso

7.1. O conceito Presença no Teatro

7.1.1. Presença do Actor

Verificámos anteriormente (cf. Cap. 2) a impossibilidade de definição única da presença do actor, pelo que se torna mais pertinente remetermo-nos às possíveis acepções desta dimensão do trabalho em Teatro.

Ao considerarmos as diferentes definições de presença do actor (BARBA, 2004; BROOK, 2008; PAVIS, 1999; SCHECHNER, 1985), encontramos um denominador

122 Dois anexos especificos (H,I) - Resumo dos achados empíricos – apresentam os diferentes recortes dos

sujeitos empíricos expressos nos dois grupos focais. Ainda a referência a uma terceira fonte de colheita de dados empíricos – um anexo já referido, o diário de bordo do investigador.

123 A título de exemplo, GF1: E1: 3-9, refere-se ao primeiro grupo focal, um dos enfermeiros e as linhas

em que se encontra o respectivo conteúdo no documento que consta em anexo resumo dos achados empíricos. GF2: P2: 22-41, refere-se ao segundo grupo focal, um dos psicólogos Psicólogos. GF1: M1: 33- 49, refere-se ao primeiro grupo focal, a um dos Médicos Pedopsiquiatras.

94 comum, que se encontra claramente associado à capacidade de atribuir uma densidade particular à cena, e ao ambiente que se constrói na relação com o espectador/ público.

Num primeiro momento (1ºgrupo focal), os profissionais de saúde valorizam a Presença do Actor vinculado à possibilidade de vivência e transmissão de uma emoção:

“Começaria por dizer, que é como aqueles professores que só estão a debitar matéria, e os outros que encarnam paixão e respiram a matéria na forma de se exprimirem…que nos transporta para conhecimento que nos quer dar a conhecer…transpondo para o actor com presença, este é o que nos faz sentir aquilo que ele está a sentir e que nos quer transmitir (…) ”

(GF1: M1:1-8).

“ (…) aquele que transmite emoções (…)” (GF1: P2:9).

“ (…) ele próprio está a viver tudo aquilo que nos quer transmitir (…)”(GF1: E1: 16-17). Neste primeiro momento, uma outra característica associada à definição da Presença do Actor, a possibilidade de ligação entre actor e espectador:

“ (…) Acho que é aquele que pode estar uma sala cheia, e nós achamos que ele está a fazer aquilo só para nós, há ali uma comunicação directa independentemente das filas de cadeiras

que nos separam (…)”(GF1:M1:10-14).

“(…)Eu também acho que esta ideia de contágio, de querer estar mais próximo ainda, de querer estar ao lado desse actor no palco…quando penso num actor com presença penso sem

duvida na ideia de encher por muito que o palco seja grande, cheio de sentimentos e dos próprios pensamentos que ele vai navegando, mas ao mesmo tempo, falando por mim, esta

ideia de contágio…do tipo quem me dera (…)”(GF1:E2:27-28).

Verifica-se ainda uma última característica da Presença do Actor na amostra discursiva do primeiro grupo focal, que está relacionado com o conceito presença na epistemologia e no teatro, a presença do corpo imanente (GIL, 2001; GROTOWSKI, 1975; BARBA, 1994)124. Os diferentes profissionais de saúde referiram-se a esta

dimensão da Presença, como capacidade de tornar o espaço cénico vivo: “ (…) Presença é também encher o espaço (…)” (GF1:P2:18).

“ (…) Para mim, a presença também está relacionado com encher o espaço. Para mim também há a diferença entre presença e ser impositivo. Acho que alguém com presença consegue encher o espaço todo, permitindo também dar luz ao outro. Ás vezes há actores com uma Presença desagradável, parece que não há ali espaço para mais nada…isso para mim é o

limite da minha noção de presença (…)” (GF1:M2:28-35).

124 No capítulo seguinte - Entrelinhas do Dircurso - , será esboçado uma interpretação crítica do discurso

95 “ (…) Encher o espaço não significa tirar o espaço aos outros, antes pelo contrário, para mim aquele espaço torna-se vivo…alguém pode entrar sem que o actor perca a presença (…)”

(GF1:P1:43-46).

Num segundo momento – segundo grupo focal – a amostra discursiva assume outros contornos no que concerne à definição da Presença do actor. Ainda que se reconheçam características comuns ao primeiro grupo focal, como ligação entre actor e espectador, e a capacidade de tornar o espaço cénico vivo:

“ (…) Um actor com presença é genuíno naquilo que transmite, dá a sensação que não está a fingir, ainda que esteja a encarnar um outro personagem ou uma outra coisa que não é ele,

podia ser ele…que é espontâneo, não no sentido que não trabalha aquilo que deve fazer mas que sai sincero, que sai genuíno (…)” (GF2:P1:1-6).

“ (…) Um actor com presença, é um actor que enche o espaço, ou seja, é um actor que de alguma forma capta as pessoas que o estão a observar, e que nós sentimos que é um espaço que

está cheio, que está redondo, é difícil ter presença quando não se ocupa isso (…)” (GF2:M2:7- 11).

A vivência do processo de criação teatral imprime um discurso necessariamente diferente, quando se reconhecem outras características associadas à Presença do Actor. Os discursos dos Profissionais de Saúde mostram também a relação profunda entre pessoa actor e personagem, de significativa ressonância com muitas metodologias de desenvolvimento das ferramentas teatrais, aquilo a que Stanislavski cunhou como construção psicológica do personagem:

“ (…) Eu acho que aquilo que fizemos durante o espectáculo influencia a minha resposta. Eu acho que o actor com presença, é quem leva as características dele que estão no papel…Que encontra naquele personagem características dele, do próprio (…)” (GF2:P2:12-

16)

“ (…) é aquele actor que põe aquilo que é seu, da sua história de vida naquele personagem…Acho que isso vai muito de encontro aquilo que fizemos, todo o processo foi feito,

grande parte do processo foi feito, a partir das nossas diferenças individuais, mas depois quando se construiu o texto colectivo, e os textos foram divididos por todos, nem sempre falamos daquilo que é nosso directamente, mas integramos aquela experiência como se tivesse dentro de nós. Portanto, quando representamos aquele papel assumimos como se de facto fosse nosso, com aquilo que vem de nós, com aquilo que vinha do outro. Foi isso que facto tocou as

pessoas que estavam sentadas, e o feedback que eu fui tendo foi…era tudo tão real e tão sentido, via-se que vinha de dentro de vocês, e a pessoa percebe que não se esteve ali apenas a

debitar texto (…)”

Os primeiros decalques da amostra discursiva manifestam desde logo, uma transformação no discurso produzido face à vivência do processo de criação teatral. O pensamento sobre a presença do actor evidencia novas nuances valorativas, que importa destacar sob a forma de quadro resumo apresentado em seguida.

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Grupo Focal Primeiro Segundo

Tópico discursivo Presença do Actor Presença do Actor

Micro-estrutura

- Vivência e transmissão de emoção

- Ligação entre actor e espectador

- Tornar o espaço cénico vivo

- Ligação entre actor e espectador - Tornar o espaço cénico

vivo

- Relação profunda entre

Pessoa Actor e Pesonagem

Quadro 2 - Resumo da evolução dos discursos produzidos relativamente ao tópico discursivo “Presença do Actor”