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4 PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E USO DE ALGEMAS

No documento Anais Completos (páginas 104-107)

PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA: ASPECTOS HISTÓRICOS Caroline Gheno Fontana

4 PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E USO DE ALGEMAS

Mostra-se como um assunto controverso a necessidade do uso de algemas pela polícia no momento da prisão de um acusado pela prática de uma infração penal. Esse debate tornou- se bastante acalorado em decorrência de episódios ocorridos no Brasil nos quais pessoas consideradas influentes foram submetidas a essa situação, em decorrência de serem presas sob acusação de cometimento de crimes.

O Código de Processo Penal já disciplina o uso de algemas em atuações policiais de forma implícita, em seu artigo 284, expressando situações nas quais se torna necessário o uso da força do Estado: “Art. 284 Não será permitido o emprego de força, salvo a indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso.”

Cabe ressaltar que o uso de algemas, além de colocar em xeque o princípio da inocência presumida, também pode ser perigoso a vários preceitos constitucionais, como o princípio da dignidade da pessoa humana elencado no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal. Ainda, deve-se mencionar a garantia fundamental assecuratória do respeito à integridade física e moral do preso prevista no artigo 5º, inciso XLIX, CF.

Nesse sentido, a Lei n. 11.689, de 09 de junho de 2008, trouxe profundas alterações no Código de Processo Penal relativos ao rito do Tribunal do Júri. O dispositivo legal, em seu artigo 474, §3º, disciplinou o uso de algemas no réu durante seu julgamento em plenário.

Art. 474 [...]

§ 3º.- Não se permitirá o uso de algemas no acusado durante o período em que permanecer no plenário do júri, salvo se absolutamente necessário à ordem dos trabalhos, à segurança das testemunhas ou à garantia da integridade física dos presentes. (Incluído pela Lei nº

11.689, de 2008).

Dessa forma, foi editada pelo Supremo Tribunal Federal e publicada no DJE n. 214 de 2008 a Súmula Vinculante de número 11 que disciplinou o uso de algemas. Pode-se afirmar que foi de grande valia à garantia de preservação do princípio constitucional da inocência presumida. Conforme se pode observar:

Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.

Em análise à matéria sumulada, Capez (2009, p. 261) explica:

Diante disso, muito embora a edição da Súmula vise garantir a excepcionalidade da utilização de algemas, na prática, dificilmente, lograr-se-á a segurança jurídica almejada, pois as situações nelas descritas conferem uma certa margem de discricionariedade à

Princípio da presunção de inocência: aspectos históricos autoridade policial, a fim de que esta avalie nas condições concretas a necessidade do seu emprego. Basta verificar que se admite o seu uso na hipótese de receio de fuga ou de perigo para a integridade física. Ora, a expressão “fundado receio” contém certa subjetividade, e não há como subtrair do policial essa avaliação acerca da conveniência ou oportunidade do ato. Tampouco é possível mediante lei ou súmula vinculante exaurir numa fórmula jurídica rígida e fechada todas as hipóteses em que é admissível o emprego de algemas.

Para aqueles que propugnam a proscrição desse juízo discricionário, pela insegurança jurídica causada, só há duas soluções: a vedação absoluta do uso de algemas ou a sua permissão integral em toda e qualquer hipótese como consectário natural da prisão. Já para aqueles que buscam uma situação intermediária, não há como abrir mão da discricionariedade do policial ou autoridade judiciária.

Ante o exposto, observa-se a preocupação do poder público em manter a legalidade do uso da força do Estado em acordo com os direitos e garantias previstos no ordenamento jurídico, pois a dignidade da pessoa humana e o estado de inocência não podem ser suprimidos pelo abuso de poder.

5 CONCLUSÃO

Atualmente se vive em um Estado Democrático de Direito no qual as garantias constitucionais são verdadeiras limitações constitucionais ao poder estatal. O poder público é regido por normas editadas e aprovadas pelo Poder Legislativo. Este, por sua vez, é eleito pelo povo, que o coloca como seus representantes através de seu exercício de cidadania: o voto. Essa situação fortalece a democracia, em que o poder emana do povo que é exercido por meio de seus representantes.

Entretanto, esse poder deve ser delimitado pelos princípios elencados no texto constitucional. As normas devem obedecer a esses fundamentos. E, por sua vez, os órgãos responsáveis por decidir questões de conflito são obrigados a seguir tais princípios. O exercício de uma justiça eficiente e eficaz depende do importante papel dos preceitos constitucionais distribuídos por todo o texto legal. Em especial o princípio da presunção de inocência, que garante o afastamento da existência de possíveis arbitrariedades do poder público em busca de uma reposta para a sociedade.

O Estado é o legítimo possuidor do direito ao uso da força. Esse poder deve ser utilizado em favor da sociedade, pois quando a força é praticada em desconformidade ao justo, ela torna- se violência. E, por sua vez, a violência é um ato ilícito, sendo prejudicial ao exercício do Estado Democrático de Direito.

A essência da justiça não é apoiar atitudes que desrespeitam os valores da dignidade da pessoa humana que, por muitas vezes, são perpetradas por semelhantes que buscam apenas seus objetivos em detrimento dos valores humanos. O direito existe para equilibrar as relações interpessoais e tornar agradável a vida de todos.

REFERÊNCIAS

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