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No que toca ao maneio da doença uterina, é tendência entre os diferentes autores considerar-se também a prevenção e o controlo individual de cada animal e também ao nível da exploração e não só medidas terapêuticas (Foldi 2006). O médico veterinário e produtor devem estar focados na implementação de programas de controlo nas explorações que tenham como objetivo, sempre, a menor perda possível de animais devido a doença reprodutiva, produção ótima de leite e o maior número de animais gestantes possível (Leblanc 2007).

Apesar da eliminação completa da contaminação bacteriana uterina ser impossível, tendo em conta o que sabemos hoje em dia sobre a patofisiologia das doenças uterinas, existem diferentes estratégias que podem ser adotadas para combater o problema, sendo que essas devem estar focadas principalmente no conforto dos animais, ingestão de matéria seca, prevenção de abortos com programas de vacinação, uso de sémen sexado, prevenção de hipocalcemia e cetose e por fim prevenir deficiências vitamínicas e minerais (Galvão 2012).

Para este mesmo fim, algumas estratégias podem basear-se nas seguintes medidas: -Evitar a superlotação de animais nos parques reservados para as vacas no período seco; -Evitar tanto quanto possível que as vacas gestantes realizem mudanças entre parques, particularmente durante o último mês de gestação;

-Criação de um ambiente no parto com as melhores condições de higiene possível, limpo e seco;

-Disponibilizar maternidades suficientes, limpas e sem acumulação de fezes, para evitar a superlotação e a contaminação bacteriana;

-Implementar medidas higiénicas nos intervenientes do parto e no instrumental utilizado quando for necessária a realização de intervenções obstétricas;

-Durante o parto, evitar ao máximo intervenções obstétricas e realizá-las somente quando estritamente necessário;

-Criação de um parque para vacas recém-paridas, onde as vacas devem permanecer até aos 14 dias após parto;

-Implementação de programas de monitorização do peri-parto;

-Diagnosticar e prevenir atempadamente as patologias concomitantes consideradas como fatores predisponentes (hipocalcemia, RP, cetose);

-Separar as vacas, primíparas, das multíparas em parques distintos para diminuir a competição pelos alimentos;

-Oferecer alimentos de alta qualidade e palatibilidade no período de transição, e mais vezes ao dia, para estimular a alimentação (Huzzey et al. 2007; Galhano 2011).

É de realçar que a ingestão de matéria seca é um dos pontos fundamentais na prevenção de doenças uterinas, sendo que a sua relação está documentada na literatura (Galvão 2012). Animais que desenvolvem metrite e endometrite, têm claramente um decréscimo de ingestão de matéria seca, começando esta diminuição de ingestão, no período de transição, isto é, de 2 a 3 semanas antes do parto até 4 a 5 semanas pós-parto (Hammon et al. 2006; Huzzey et al. 2007). Este fator é essencial para os animais iniciarem esta fase com boa condição corporal, uma vez que uma má condição corporal está relacionada um sistema imunitário debilitado, tornando-as mais vulneráveis a doenças no pós-parto. Animais com uma condição corporal acima do normal exibem uma incidência alta de problemas no parto, tais como distócias com aumento do risco de infeção uterina e animais com condição corporal abaixo da média têm só por si um risco bastante aumentado de vir a desenvolver infeção uterina (Onyango 2014).

Segundo um estudo de 2007, foi encontrada uma incidência aumentada de doença uterina no pós-parto em animais com diminuição da ingestão de matéria seca e água alguns dias antecedendo o parto, concluindo assim, que uma das maiores medidas preventivas para evitar doenças uterinas, é assegurar uma ingestão adequada de matéria seca (Huzzey et al. 2007). Nos últimos anos, outros parâmetros têm sido utilizados como ferramentas integrantes de alguns programas de monitorização na deteção de várias doenças clínicas ou subclínicas. Esses parâmetros são, entre outros, a análise sanguínea aos níveis de cálcio e AGNEs e a testes, na urina ou leite, ao BHBA, que servem para predizer o risco de incidência de doenças no pós-parto. Estes testes são ferramentas rápidas, relativamente baratas e que podem estar disponíveis para realização nas explorações leiteiras (Leblanc et al. 2006)

Durante esta fase, há outro fator essencial para evitar doenças como hipocalcemia, muito comum no pós-parto com influência na infeção uterina, a homeostasia do cálcio, sendo que podem ser usados sais aniónicos para reduzir a sua incidência (Galvão 2012). No entanto, estes sais devem ser usados com alguma precaução uma vez que estes podem reduzir a ingestão de matéria seca, e devem ser dados aos animais apenas 3 semanas antes do parto (Galvão 2012). No entanto, mesmo com o uso destes sais aniónicos, cerca de 20 a 50% dos animais no pós-parto vai apresentar hipocalcemia, sendo que por este mesmo facto vão ter uma incidência aumentada de doença uterina nesse mesmo período (Martinez et al. 2012).

Um outro fator essencial neste período são as deficiências em vitamina E e selénio, que estão claramente associadas a uma maior incidência de doença uterina, presumivelmente pela alteração da função neutrófila (Galvão 2012). A vitamina E é um micronutriente que aumenta a eficiência funcional dos neutrófilos e os protege contra os danos oxidativos que

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ocorrem após a morte intracelular das bactérias ingeridas (Leblanc et al. 2002). A administração parental de vitamina E e selénio tem sido utilizada com a finalidade de diminuir as consequências reprodutivas que ocorrem no pós-parto e de melhorar a fertilidade do animal (Alonso et al. 2009).

Num estudo realizado em 2009, a administração conjunta de vitamina E e selénio reduziu a prevalência de infeções uterinas e melhorou a percentagem de animais gestantes ao dia 150 pós-parto. Neste estudo com resultados positivos, o tratamento preventivo foi realizado com base em quatro administrações parentais, aos 60 e 21 dias antes do parto e aos 30 e 90 dias pós-parto. Nos antigos tratamentos preventivos com uma única administração no pré- parto não tinham sido demonstrados resultados satisfatórios. Concluíram assim que são necessários novos protocolos na administração parental de vitamina E e selénio (Alonso et al. 2009).

Em explorações com uma história de deficiência de selénio e história de retenções placentárias, uma suplementação de vitamina E e selénio, poderia reduzir a incidência de RP. No entanto a evidência de efeitos positivos desta suplementação noutras doenças reprodutivas do pós-parto era limitada (Galvão 2012).

Como referido, devido á grande importância do balanço energético no período de transição na incidência de doença uterina, suplementos nutricionais que previnem a cetose podem ser dados aos animais neste período, como fator preventivo deste problema (Galvão 2012). Os dois suplementos mais usados são a monensina e colina, sendo que estes demonstraram bons resultados no que toca á regulação do balanço energético destes animais e ao metabolismo de ácidos gordos., apresentando assim vantagens na prevenção de doença uterina (Galvão 2012).

Na Alemanha, foi estudada a utilização de uma vacina autoimune no tratamento de metrite puerperal provocado pelo T. pyogenes em vacas de leite. Este tipo de vacina é produzida através dos microrganismos responsáveis pela infeção uterina e utilizado nos animais para o tratamento de infeções crónicas e recorrentes. Os resultados apresentados pelos autores demonstraram que, na maioria dos animais, houve uma remissão dos sinais clínicos e uma melhoria no desempenho reprodutivo. Estes autores concluíram que o uso de vacinas autoimunes provoca um aumento significativo na resposta de ativação imunitária, em particular das células T, e contribui para a melhoria dos animais afetados (Nolte et al 2001).

Pode ainda ser referida a utilização de fármacos de terapêutica para prevenção, tais como PGF2α, AINE’S, oxitocina, estradiol e oxitetraciclina, especialmente usados em vacas com RP

e distócia para prevenção de doença uterina subsequente. No entanto os benefícios das mesmas para este fim geram alguma controvérsia entre autores (Galvão 2012). Em duas revisões da literatura, os autores não recomendam o uso de PGF2α ou oxitocina para

prevenção de RP uma vez que estas hormonas não representam um papel importante na libertação da placenta e já estão naturalmente aumentadas em animais com RP (Frazer 2005; Beagley et al. 2010). No entanto outros estudos verificaram uma redução da incidência de RP quando foi aplicada PGF2α e oxitocina, e outros mostraram um efeito nulo (Mollo et al. 1997;

Galvão 2012).

Em relação aos AINEs, sabe-se que o seu uso como medida preventiva para doença uterina diminui a ingestão de matéria seca e um aumento do balanço energético negativo, e assim uma predisposição maior para RP e doença uterina, logo não devem ser usados (Galvão 2012).

O único fármaco que se sabe ter algum efeito positivo na libertação da placenta e consequente prevenção de doença uterina é a colagenase. Verificou-se que uma administração de 20.000-200.000 UI de colagenase bacteriana na artéria umbilical previne RP ajudando na libertação da placenta (Eiler et al 1997; Thiebault et al. 2004).

A higiene das instalações onde estão os animais é importante na prevenção de infeção uterina, tais como maternidades e camas, uma vez que estes locais são muitas vezes focos de contaminação bacteriana para o animal (Lewis 1997). Assim, é essencial ter padrões de higiene elevados nas explorações, principalmente nas maternidades, de forma a poder eliminar ao máximo fatores que possam predispor o animal a infeções uterinas (Onyango 2014). No entanto há estudos que dizem o contrário e onde não foram encontradas evidências de que a higiene das instalações pudesse estar de alguma forma ligada á prevenção de doença uterina no pós-parto (Potter et al. 2010).

Está também bem documentado na literatura, que o tanto o efeito genético paternal como maternal afetam a probabilidade de um animal vir a ter complicações uterinas no pós-parto (Onyango 2014). Esses efeitos genéticos podem ser controlados através de seleção genética adequada, na medida em que pode ser feita uma escolha de mães que tenham facilidade ao parto, que virá a reduzir a incidência de partos distócicos, e consequentemente de doença uterina (Potter et al. 2010).

Está também reportado, que cruzar raças diferentes, comparado com o cruzamento de vacas da raça Holstein, demonstrou uma incidência diminuída em casos de partos distócicos nestes animais, assim, podemos concluir que cruzamentos entre raças podem vir a diminuir a incidência de doença uterina no pós-parto (Maltecca et al. 2006).

Além de todos estes fatores, cada exploração deve implementar um programa de monitorização no pre-parto. Nesse sentido, os programas de monitorização durante o puerpério permitem observar precocemente um maior número de vacas de leite afetadas, providenciando atempadamente o diagnóstico e tratamento. De igual maneira, podem funcionar como um meio preventivo no desenvolvimento de outras doenças características do

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pós-parto como a cetose, hipocalcemia, RP, enterite, pneumonia, mamite, laminite e deslocamento do abomaso. Pode ainda funcionar como um meio de supervisionar a alimentação durante o período crítico da vaca recém-parida, e fazer regressar a vaca a um balanço energético positivo nos primeiros 45 dias após o parto (Galhano 2011).

PARTE II

1) OBJETIVOS

O principal objetivo deste trabalho foi o estudo da influência da ocorrência de doença uterina no pós-parto na alteração dos seguintes parâmetros reprodutivos:

a) Intervalo Parto-Conceção b) Intervalo Parto-primeira IA c) Taxa de gestação

d) Intervalo primeira IA - IA fecundante e) Número de IA

Os dados foram recolhidos na Cooperativa Agrícola de Vila do Conde, durante o período de estágio realizado na mesma, e foram escolhidas 11 explorações ao acaso de entre todas as que foram realizadas visitas de âmbito reprodutivo durante esse período de tempo mencionado.

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2) MATERIAL E MÉTODOS

Para a realização deste estudo foram selecionadas 11 explorações de Bovinos Leiteiros na região de Vila do Conde, a maior bacia leiteira de Portugal.

Essas explorações foram escolhidas com base na melhor disponibilidade de registos, de entre cerca de 67 possíveis. Nessas 11 explorações contabilizou-se um efetivo de 445 animais existentes, da raça Holstein-Frísia com idades entre os 1,8 e 9,0 anos e com pelo menos o registo de um parto no ano de 2015.

Este estudo define-se como um estudo retrospetivo, uma vez que todos os dados que estão apresentados ao longo deste trabalho, são referentes ao ano de 2015 e foram recolhidos através de uma base de dados, e não durante o estágio propriamente dito, no trabalho de campo.

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