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O município de Galinhos fica situado no litoral setentrional do estado do Rio Grande do Norte, distante 174 km de Natal, a capital. Foi criado e desmembrado do município de São Bento do Norte, em 27 de março de 1963, e é limitado ao norte pelo Oceano Atlântico, ao sul pelo município de Jandaíra, a leste pelo município de Caiçara do Norte e a oeste pelo município de Guamaré.

As características naturais que se destacam no município são diversas, com mangues, praias, dunas, lagoas, recifes, além de uma intensidade de ventos muito grande. Isso leva a cidade a ser uma paisagem atrativa para o turismo, mas também para a instalação dos parques eólicos. Essa última é uma característica do litoral norte do estado.

São 2.159 os residentes no município de Galinhos, sendo 60% residentes na sede municipal, 25% em Galos e 15% no Assentamento Pirangi-Barrocão, segundo o censo de 2010. A estimativa do mesmo censo era de uma população de 2.446 em 2013 (IBGE, 2010). A comunidade de Galos fica a 4 km da sede municipal e é composta por uma vila de pescadores e um conjunto habitacional.

A formação da população local teve unida aos nativos a vinda de pessoas dos municípios de Jandaíra, Caiçara do Norte, Touros, Guamaré, João Câmara, Pedra Grande, Praia do Marco, São Bento do Norte, Ceará-Mirim, Maxaranguape, Natal, dos estados do Sul

e Sudeste do país. Somaram-se a esses, estrangeiros vindos especialmente de Portugal, França e Espanha, atuantes principalmente no setor hoteleiro e de alimentação.

O turismo é um aspecto importante da economia e da composição urbana do município, representando quase 40% a mais de sua população residente nos finais de semana, além dos feriados e festividades como as culturais (carnavalescas), religiosas (Semana Santa e Festa da Padroeira Nossa Senhora dos Navegantes) e política (Festa da Emancipação do Município) (Rocha, 2008). Atualmente, o município tem como principais atividades econômicas os setores de turismo, pesca e salina, mas o setor turístico ainda é o mais central nesse aspecto. Cerca de 300 famílias tiram o seu sustento diretamente do turismo.

Pela característica geográfica local, para alcançar a sede municipal e o povoado de Galos, envoltos por água, é preciso atingir Pratagil, um porto municipal, e pegar alguma embarcação, que pode ser privada ou da prefeitura. Por terra, o acesso se dá pela areia da praia. Um destaque - esse negativo – a ser dado é o fato de Galinhos estar entre os quinze piores índices de desenvolvimento humano (IDH) do estado (IBGE, 2010).

Como dito anteriormente, a minha inserção nesse contexto se deu a partir do interesse pelas relações afetivas entre os moradores e a cidade e, também, de como essas relações poderiam ter participado na mobilização contrária à implementação do parque eólico, como norteadores do estudo. Contudo, o turismo já era indicado, no contato com alguns moradores, como elemento importante na realidade local, uma atividade que ajudava a significar os demais elementos do cotidiano local. Assim, me interessou entender as transformações pelas quais a cidade havia passado nos últimos anos, uma vez que era de recente criação, mas seu crescimento vinha acompanhado dessa atividade. Com isso em mente, iniciei a pesquisa por meio de uma inserção etnográfica no campo.

O intuito dessa inserção foi a aproximação do contexto com a ajuda de informantes locais. Ainda que a expressão seja inadequada, pelo caráter policialesco que sugere (Alverga,

2011), na abordagem etnográfica, um papel fundamental é desempenhado por esses, “que, mais do que pessoas do local, comportam-se como auxiliares do pesquisador, distanciando-se do papel desempenhado no local e, por isso, adotando uma postura de co-pesquisador” (Sato & Souza, 2001, pp. 37-38). As experiências, observações e reflexões foram registradas em diários de campo (APÊNDICE A), contudo, nesse momento, a observação ainda era de caráter exploratório aberto e não acontecia de forma sistemática, justamente para compreender ao máximo a dinâmica local. A escrita dos diários acompanhou todo o processo de pesquisa e, num primeiro momento, buscou registrar descrições sobre o contexto e impressões mais gerais que pudessem ser retomadas mais adiante, quando estivesse mais familiarizado com o contexto.

Como procedimento, a perspectiva etnográfica implica uma aproximação do contexto de forma a se inserir na dinâmica local. Assim, deve-se entender como um processo que envolve a totalidade da pesquisa, e o campo, por ser o lugar onde esse processo se dá,

não tem momento certo para começar e acabar. Esses momentos são arbitrários por definição e dependem, hoje que abandonamos as grandes travessias para ilhas isoladas e exóticas, da potencialidade de estranhamento, do insólito da experiência, da necessidade de examinar por que alguns eventos, vividos ou observados, nos surpreendem (Peirano, 2014, p. 379).

O envolvimento com o campo já se dá no momento em que se define a pesquisa, e a abordagem etnográfica pressupõe um afastamento relativo dos referenciais culturais, étnicos, morais, que acompanham o pesquisador e uma aproximação relativa da própria vida local. São relativos, pois nem nos afastamos completamente de nossas perspectivas e visões de mundo, nem tampouco nos tornamos “locais”. Não diz respeito, todavia, a um tratamento do contexto de forma isolada dos processos sociais mais amplos e globais.

Não se realizam estudos de caso, mas estudos sobre casos [...] o local e o particular são espaços possíveis para desenvolver o trabalho empírico, no qual processos mais gerais podem ser descritos e compreendidos, bem como conceitos e teorias podem ser construídos (Sato & Souza, 2001, p. 31).

Vale a ressalva de que também não se trata de um empirismo de cunho positivista ou mesmo um descritivismo, uma vez que adotei a perspectiva do realismo crítico, já mencionada.

Além do afastamento dos referenciais de origem do pesquisador, é uma abordagem que não se prende a uma suposta imparcialidade objetiva do pesquisador. O contato com o campo já transforma o pesquisador, bem como sua presença não é indiferente às pessoas e à dinâmica do contexto (Sato & Souza, 2001). Isso implica um diálogo constante com o processo de pesquisa, em que se está avaliando a todo o momento a inserção, os eventos, as transformações e as interferências no local.

Outro aspecto fundamental do processo de inserção em campo e que se destaca no presente estudo é a processualidade da construção do recorte do objeto, uma vez que “não temos como recortar a realidade do local previamente” (Sato & Souza, 2001, p. 40). Isso representa dois perigos opostos: o reducionismo que acaba por negar a complexidade do contexto e suas múltiplas determinações, ou uma sedução por essa mesma complexidade, o que pode levar a uma pesquisa inacabável.

No presente estudo, parti de perguntas iniciais, mas o diálogo com o campo ofertou reformulações em função daquilo que se apresentava como relevante, ainda que sem sair de uma linha de orientação de objetivos. Isso está de acordo com a orientação etnográfica, que preconiza a “não dicotomização entre as etapas de coleta e análise de ‘dados’, configurando- se o ‘estar no campo’ como um constante diálogo entre a natureza do objeto, as hipóteses de trabalho e o que o campo ‘fala’” (Sato & Souza, 2001, p. 42).

Destarte, nos primeiros momentos desse processo, o caráter exploratório de tais vozes do campo, a abertura para a totalidade dos processos locais, e para as vozes reflexivas acerca

do processo de pesquisa foram características marcantes. O primeiro contato com o local havia sido em 2014, apenas para uma familiarização inicial, conhecendo alguns de seus moradores. A partir de abril de 2015 iniciei o trabalho de campo mais extensivo. As primeiras visitas se deram principalmente buscando informações objetivas sobre a cidade: acerca da composição sociodemográfica, dispositivos de saúde, assistência, educação, informações sobre emprego e renda, etc. A busca por essas informações tinha por intuito tentar acompanhar o processo de mudança local a partir desses dados, comparando diferentes períodos.