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5. PRINCÍPIOS DO DIREITO DE FAMÍLIA

5.5 PRINCÍPIO DO PLURALISMO FAMILIAR

Ao romper com a égide familiar patriarcal, hierarquizada e que só considerava o casamento como única espécie de família a ser admitida na sociedade brasileira, a Constituição Federal de 1988 ocasionou verdadeira revolução no Direito de Família atual.

É cediço que o art. 226131 da CF/88 ao fazer a extensão conceitual das espécies de famílias admitidas, trouxe significativas inovações ao reconhecer e colocar sob a tutela constitucional outras formas familiares distintas do casamento. Tais inovações da CF/88 possibilitaram o despontar de novas diretrizes, e princípios fundamentais no Direito de Família contemporâneo, a exemplo, do princípio do pluralismo familiar, que surgem na ânsia de solucionar as lacunas e omissões existentes quanto à devida regulação constitucional das novas entidades familiares.

Ademais, diante de inúmeras espécies familiares existentes na sociedade brasileira, não se mostra sensato coadunar com o entendimento de certos doutrinadores que a lista de espécies familiares constante do art. 226 da CF/88 é taxativa, devendo ser interpretada como sendo uma “norma de clausura”.132

A realidade familiar mudou, não estando mais a família contemporânea a ser compreendida exclusivamente sob a égide patrimonial, com o objetivo de reprodução, revelando um novo perfil que leva em consideração novos valores, tais como, a repersonalização, a afetividade, a solidariedade, a pluralidade das entidades familiares, e a livre manifestação da autonomia da vontade com relação as escolhas sexuais, para que se possibilite o desenvolvimento da personalidade humana dos integrantes das novas entidades familiares.

Considerando o caráter exemplificativo do art. 226 da Constituição Federal, Paulo Luiz Netto Lôbo defende o respeito da pluralidade das formas familiares existentes na atualidade:

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Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

§3.º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. §4.º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.

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Os tipos de entidades familiares explicitados nos parágrafos do art. 226 da Constituição são meramente exemplificativos, sem embargo de serem os mais comuns, por isso mesmo merecendo referência expressa. As demais entidades familiares são tipos implícitos incluídos no âmbito de abrangência

do conceito amplo e indeterminado de família indicado no caput.133

O princípio do pluralismo familiar defende a proteção e regulamentação normativa das novas entidades familiares existentes, ressaltando que a lista das entidades familiares contidas na Constituição não deve ser considerada taxativamente, e sim de forma exemplificativa, e deste modo, deve ser assegurado respeito a todas as espécies de entidades familiares, que sejam pautadas no afeto e preencham os requisitos exigidos para os casais heterossexuais.

Em idêntico diapasão, Álvaro Villaça Azevedo se manifestou favoravelmente a realidade plural da família contemporânea:

(...) a Constituição de 1988, mencionando em seu caput que a família é a ‘base da sociedade’, tendo ‘especial proteção do Estado’, nada mais necessitava o art. 226 de dizer no tocante à formação familiar, podendo o legislador constituinte ter deixado de discriminar as formas de constituição da família. Sim porque ao legislador, ainda que constituinte, não cabe dizer ao povo como deve ele constituir sua família. O importante é proteger todas

as formas de constituição familiar, sem dizer o que é melhor.134

Oportunas as palavras de Álvaro Villaça Azevedo ao reafirmar o respeito pelas novas formas de famílias existentes na atualidade, entretanto, não se pode deixar de registrar que para tais relacionamentos sejam tutelados legalmente, os mesmos devem preencher os mesmos requisitos exigidos para configuração da união estável.

O respeito para com o pluralismo familiar se deve ao seu compromisso com o desenvolvimento da personalidade e dignidade humanas, voltando toda a atenção para a pessoa em detrimento de valores patrimoniais. E, para tal intento, importante se faz reconhecer o caráter plural da família atual, o que só será efetivado quando da regulamentação normativa feita pela Constituição Federal.

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LÔBO, Paulo Luiz Netto. Entidades familiares constitucionalizadas: para além do numerus clausus. http://jus.uol.com.br/revista/texto/2552/entidades-familiares-constitucionalizadas. Acesso em 17/09/2011.

134

AZEVEDO, Álvaro Villaça. Estatuto da Família de Fato, de acordo com o atual Código Civil, Lei nº

Assim sendo, o reconhecimento da pluralidade familiar é uma necessidade, pois não se cogita falar em dignidade da pessoa humana se somente um tipo de sujeito jurídico está tutelado socialmente, significando uma afronta ao Estado Democrático de Direito e as premissas constantes do art.3.º da CF/88, tal como se pode verificar:

Art.3º. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional;

III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Outra consideração que merece registro, é que o ensejo à aplicação do princípio da pluralidade das formas familiares tem origem com a própria Carta Magna, ao estabelecer em seus dispositivos o Estado Democrático, o respeito à liberdade, o bem-estar, a igualdade, e a não discriminação como valores absolutos a serem observados por todos na sociedade.

Como visto, diante das constatações inequívocas de mutações na estrutura organizacional familiar, se mostra inaceitável relegar a marginalização social as formas plurais de família existentes. Entretanto, o temor de que a aceitação das novas entidades familiares possam trazer prejuízos para as concepções familiares admitidas, representa uma das causas obstativas a entravar a aceitação da pluralidade das formas familiares.