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3. Sistemas Processuais e Inquérito Policial

3.1 Princípios informadores do Inquérito Policial

Para fins de adequação do Inquérito Policial ao contexto constitucional vigente, é necessário que o instituto seja enxergado sob as lentes de alguns princípios jurídicos. Neste ponto, não se pode perder de vista o conceito de princípio147, desenvolvido por Robert Alexy148, segundo o qual:

[...] os princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes. Portanto, os princípios são mandados de otimização que estão caracterizados pelo fato de que podem ser cumpridos em diferentes graus e que a medida devida de seu cumprimento não só depende das possibilidades reais, mas também das possibilidades jurídicas.149

Considera-se, portanto, que a análise de institutos jurídicos a luz de princípios exige a avaliação das possibilidades fáticas e jurídicas, de forma que esta categoria de norma jurídica não veicula comandos definitivos, mas variáveis a depender do caso concreto.

Ao abordar a teoria dos princípios, Norberto Bobbio150 contribui, afirmando que:

[...] os princípios são apenas, a meu ver, normas fundamentais ou generalíssimas do sistema, as normas mais gerais. A palavra princípios leva a engano, tanto que é velha a questão entre os juristas se os princípios gerais

147 A ideia de princípio jurídico também é abordada por Ronald Dworking, o qual aponta que “Podemos tratar os princípios jurídicos da mesma maneira que tratamos as regras jurídicas e dizer que alguns princípios possuem obrigatoriedade de lei e devem ser levados em conta por juízes e juristas que tomam decisões sobre obrigações jurídicas. Se seguirmos essa orientação, deveremos dizer que nos Estados Unidos ‘o direito’ inclui, pelo menos, tanto princípios como regras”. DWORKING, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução: Nelson Boeira. 2ª edição. São Paulo: Martin Fontes. 2007, p.46/47. Comentando o conceito de princípios desenvolvido por Dworking, Emerson Garcia afirma que o filósofo do direito compreende que “os princípios têm caráter normativo, mas estão fora do direito positivo, que seria integrado unicamente pelas normas.” Além disso “os princípios terminam por indicar determinada direção, mas não impõem uma solução particular.” GARCIA, Emerson. Conflito entre Normas Constitucionais: esboço de uma Teoria Geral. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 181.

148 ALEXY, Robert. Teoria de losderechosfundamentales. Centro de Estudos Constitucionales. Madri: 1993. p. 86.

149

Texto original em espanhol. Tradução livre.

150BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico, 10ª ed. Brasília:Editora Universidade de Brasília. P.158/159.

são normas. Para mim, não há dúvida: os princípios gerais são normas como todas as outras. E esta é também a tese sustentada por Crisafulli. Para sustentar que os princípios gerais são normas, os argumentos são dois, e ambos válidos: antes de mais nada, se são normas aquelas das quais os princípios são extraídos, através de um procedimento de generalização sucessiva, não se vê porque não devam ser normas também eles: se abstraio da espécie animal obtenho sempre animais, e não flores ou estrelas. Em segundo lugar, a função para qual são extraídos e empregados é a mesma cumprida por todas as normas, isto é, a função de regular um caso. E com que finalidade são extraídos em caso de lacuna? Para regular um comportamento não-regulamentado: mas então servem ao mesmo escopo a que servem as normas expressas. E por que não deveriam ser normas?

Assim, considerando o inquestionável caráter normativo dos princípios, cumpre registrar que a sua relevância no contexto contemporâneo fez nascer a noção de juridicidade151segundo a qual a atuação do Estado deve estar em harmonia com o Direito, afastando a noção de legalidade estrita, e compreendendo regras e princípios. Observa-se, desta forma, que tão importante quanto conhecer as leis que regulam os institutos é analisar seus princípios informadores.

O primeiro princípio que deve nortear o Inquérito Policial é a dignidade da pessoa humana, adequando-se à concepção de que “o respeito ao ser humano deve ocupar o epicentro de toda e qualquer atividade desenvolvida pelas estruturas sociais de poder”152

.

Princípio fundamental153 do Estado Democrático de Direito154, a dignidade da pessoa humana é tida como um conceito jurídico indeterminado155 que admite diversas acepções. Uma delas, apresentada por Ingo Wolfgang Sarlet156 é no sentido de que:

151 GARCIA, Emerson. A moralidade administrativa e sua densificação. Revista de Direito Constitucional e Internacional. vol. 43/2003. p. 110 – 137. Abr – Jun/2003

152 GARCIA, Emerson. Conflito entre Normas Constitucionais: esboço de uma Teoria Geral. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p.125.

153 “Neste contexto, na sua qualidade de princípio fundamental, a dignidade da pessoa humana constitui valor- guia não apenas dos direitos fundamentais (embora com os direitos não se confunda, em toda sua extensão), mas de toda a ordem jurídica (constitucional e infraconstitucional), razão pela qual, para muitos, se justifica

plenamente sua caracterização como princípio constitucional de maior hierarquia axiológico-valorativa (höchsteswertsetzendes Verfassungsprinzip)”SARLET, Ingo Wolfgang. Notas sobre a dignidade da pessoa

humana, os direitos fundamentais e a assim chamada constitucionalização do direito penal e processual penal no Brasil. Revista Brasileira de Ciências Criminais. vol. 102/2013. p. 13 – 44. Maio – Jun/2013 154 CRFB/1988: Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:[...] III - a dignidade da pessoa humana;

155 “Diz-se que o conceito é indeterminado quando a estrutura normativa, em razão do emprego de expressões vagas ou de termos que exijam realização de uma operação valorativa para a sua integração, apresenta uma fluidez mais acentuada, do que resulta uma maior mobilidade para o operador do direito. Tal, longe de representar um elemento deflagrador de arbítrio, permite a célere adequação do padrão normativo dos valores subjacentes à coletividade no momento de sua aplicação.” GARCIA, Emerson. Conflito entre Normas

[...] a dignidade constitui uma qualidade inata (natural) do ser humano, como algo inerente à própria condição humana, parece correto afirmar, já em outro sentido, que a dignidade representa um valor especial e distintivo reconhecido em cada ser humano como sendo merecedor de igual respeito, proteção e promoção. Além disso, não se deverá olvidar que a dignidade constitui atributo reconhecido a qualquer ser humano, visto que, em princípio, todos são iguais em dignidade, no sentido de serem reconhecidos como pessoas integrantes da comunidade humana, ainda que não se portem de forma igualmente digna nas suas relações com seus semelhantes ou consigo mesmos. Que tal premissa é particularmente cara ao domínio do direito penal resulta evidente, pois implica, em linhas gerais e aqui sumariamente esboçadas, que mesmo alguém que pratique crimes que possam ser qualificados como cruéis e desumanos segue sendo pessoa e segue sendo titular de uma dignidade, sujeito, portanto, de um direito a não ser ele próprio tratado de forma indigna.

Tem-se, portanto, que o respeito à dignidade da pessoa é inafastável em qualquer atuação estatal, de modo de o investigado em Inquérito Policial não pode ser alijado deste direito sob o argumento de ter violado bens jurídicos tutelados pelo ordenamento jurídico, de forma que este vetor axiológico deve inspirar a interpretação de todas as normas processuais penais.

Igualmente, os princípios administrativos previstos no artigo 37 da CRFB157 devem ter ampla aplicabilidade na etapa pré-processual. Sob o ponto de vista administrativo, o Princípio da Legalidade é um limitador, determinando que a atuação do administrador público seja dirigida pelo que é prescrito na lei.

No Inquérito Policial, este princípio manifesta-se na obrigatoriedade do Delegado de Polícia instaurar procedimento investigativo tão logo tome conhecimento da prática de um crime ou contravenção de ação penal pública, sendo o rol exemplificativo de diligências previsto na legislação processual158. Além disso, a legalidade impõe-se na medida o legislador 156SARLET,Ingo Wolfgang. Notas sobre a dignidade da pessoa humana, os direitos fundamentais e a assim chamada constitucionalização do direito penal e processual penal no Brasil. Revista Brasileira de Ciências

Criminais. vol. 102/2013. p. 13 – 44. Maio – Jun/2013

157 CRFB/1988: Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

158 CPP/1941: Art. 6o Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá: I - dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais; (Redação dada pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994) (Vide Lei nº 5.970, de 1973) II - apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais; (Redação dada pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994)

III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias; IV - ouvir o ofendido;

V - ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto no Capítulo III do Título Vll, deste Livro, devendo o respectivo termo ser assinado por duas testemunhas que Ihe tenham ouvido a leitura;

subordina a atuação policial ao estabelecer que determinados atos investigatórios (que restrinjam direitos fundamentais do investigado) dependem de autorização do Juiz 159 para serem praticados.

No tocante ao Princípio da Impessoalidade, tem-se que o Inquérito Policial não pode ser instrumento voltado a prejudicar ou beneficiar determinadas pessoas. Ao explicar o princípio na seara administrativa, Carvalho Filho160 aduz que

[...] para que haja verdadeira impessoalidade, deve a Administração voltar-se exclusivamente para o interesse público ressalta a necessidade de persecução do interesse público, e não para o privado, vedando-se, em consequência, sejam favorecidos alguns indivíduos em detrimento de outros e prejudicados alguns para favorecimento de outros.

Deve-se atentar, portanto, para o estrito cumprimento da finalidade da investigação policial, que é identificar a materialidade e autoria da prática delitiva.

Com relação ao Princípio da Moralidade, o mesmo determina que a atuação do administrador público seja pautada em determinados valores. Diferente não pode ser a atuação do Delegado de Polícia que, na condução do Inquérito Policial, deve agir guiado pela ética, boa-fé e probidade. Uma abordagem sobre o Princípio da Moralidade foi realizada por Emerson Garcia,161 segundo o qual:

O princípio da legalidade exige a adequação do ato à lei, enquanto o da moralidade torna obrigatório que o móvel do agente e o objetivo pretendido estejam em harmonia com o dever de bem administrar. Ainda que os

VI - proceder a reconhecimento de pessoas e coisas e a acareações;

VII - determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras perícias;

VIII - ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes;

IX - averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e social, sua condição econômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e durante ele, e quaisquer outros elementos que contribuírem para a apreciação do seu temperamento e caráter.

X - colher informações sobre a existência de filhos, respectivas idades e se possuem alguma deficiência e o nome e o contato de eventual responsável pelos cuidados dos filhos, indicado pela pessoa presa. (Incluído pela Lei nº 13.257, de 2016)

Art. 7o Para verificar a possibilidade de haver a infração sido praticada de determinado modo, a autoridade policial poderá proceder à reprodução simulada dos fatos, desde que esta não contrarie a moralidade ou a ordem pública.

159 Exemplificando, tem-se a interceptação telefônica, regida pela Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996; as prisões cautelares, exceto em fragrante, regulamentadas pelos artigos 311 a 316 do CPP (prisão preventiva) e Lei nº 7.960, de 21 de dezembro de 1989 (prisão cautelar); a busca e apreensão domiciliar, disciplinada nos artigos 240 a 250 do CPP.

160 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25ª edição, revista, ampliada e atualizada até a lei nº 12.587, de 3/01/2012. São Paulo: Editora Atlas. 2012, p. 20.

161 GARCIA, Emerson. A moralidade administrativa e sua densificação. Revista Jurídica Virtual - Brasília, vol. 3, n. 35, abr. 2002

contornos do ato estejam superpostos à lei, será ele inválido se resultar de caprichos pessoais do administrador, afastando-se do dever de bem administrar e da consecução do bem comum.

A moralidade limita e direciona a atividade administrativa, tornando imperativo que os atos dos agentes públicos não subjuguem os valores que defluam dos direitos fundamentais dos administrados, o que permitirá a valorização e o respeito à dignidade da pessoa humana. Além de restringir o arbítrio, preservando a manutenção dos valores essenciais a uma sociedade justa e solidária, a moralidade confere aos administrados o direito subjetivo de exigir do Estado uma eficiência máxima dos atos administrativos, fazendo que a atividade estatal seja impreterivelmente direcionada ao bem comum, buscando sempre a melhor solução para o caso.

Extrai-se, desta forma, que a aplicação do referido princípio às investigações policiais exige o respeito à juridicidade dos atos praticados e aos direitos fundamentais dos envolvidos na investigação.

O Princípio da Publicidade indica que os atos praticados pela Administração Pública devem merecer a mais ampla divulgação possível entre os administrados, possibilitando o controle da legitimidade da atuação dos agentes administrativos162.

A aplicação deste princípio ao Inquérito Policial é mitigada pelo caráter sigiloso163 da investigação policial, o qual somente deve ceder ao interesse público e ao direito de defesa do acusado. No mais, impõe-se o sigilo como meio de preservação da intimidade dos envolvidos e como forma de viabilizar o deslinde exitoso da investigação.

O Princípio da Eficiência está relacionado aspecto qualitativo do serviço prestado, com a produtividade e com a economicidade, impondo a execução de serviços públicos com presteza, perfeição e rendimento funcional164.

No Inquérito Policial, a aplicação deste princípio está relacionada com a adoção das diligências indispensáveis, em tempo hábil para elucidação do delito, bem como a observância dos prazos.

Importante destacar que, na condução do procedimento, o Delegado de Polícia deve rechaçar a pseudo-eficiência, sobretudo nos crimes em que o clamor social exige uma punição imediata dos eventuais suspeitos. A pressão midiática e da população não podem interferir no trabalho policial, que deve compatibilizar a identificação da materialidade e autoria do delito com a garantia dos direitos fundamentais do investigado.

162 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25ª edição, revista, ampliada e atualizada até a lei nº 12.587, de 3/01/2012. São Paulo: Editora Atlas. 2012, p.25.

163

Sobre sigilo do Inquérito Policial, ver item 1.3.

O Princípio da duração razoável do processo, previsto na Constituição Federal desde a Emenda de nº 45, tem aplicação em âmbito judicial e administrativo e determina a utilização de meios que garantam celeridade na atuação administrativa.

Há ainda o Princípio do Controle, que envolve um conjunto de mecanismos jurídicos e administrativos por meio dos quais se exerce o poder de fiscalização da atividade administrativa em qualquer das esferas de poder165. Tem-se por fiscalização o poder de verificação que incide sobre a atividade dos órgãos e agentes públicos, identificando desvios e perquirindo se a finalidade de sua atuação tem sido alcançada. Trata-se de uma garantia para o administrado e para a própria Administração Pública.

Em relação à atividade da Polícia no desenvolvimento do Inquérito Policial, observa- se a existência de um controle interno e um controle externo. O controle interno é exercido pela própria Polícia, por meio de suas Corregedorias Internas. Trata-se de controle amplo, que incide tanto as atividades administrativas e burocráticas exercidas pela Polícia, quanto sobre sua atividade-fim, sendo, em verdade, uma expressão da autotutela administrativa166.

Já o controle externo é exercido pelo Poder Judiciário e pelo Ministério Público. Pelo primeiro na medida em que também sobre o Inquérito Policial aplica-se o princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição167 e, havendo qualquer lesão ou ameaça a direito, o fato deverá ser apreciado pelo juiz competente. Além disso, o CPP prevê hipóteses de atuação judicial na fase de inquérito, sobretudo no tocante à fiscalização do cumprimento dos prazos168 e apreciação de medidas cautelares capazes de afetar direitos fundamentais do acusado.

Com relação ao controle externo da atividade policial exercido pelo Ministério Público, trata-se de função institucional daquele órgão, prevista no inciso VII, do art. 129 da

165 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25ª edição, revista, ampliada e atualizada até a lei nº 12.587, de 3/01/2012. São Paulo: Editora Atlas. 2012, p.929.

166 Ao discorrer sobre a autotutela administrativa, José dos Santos Carvalho Filho explica que, no exercício desta, a própria administração pode rever os atos eivados de desvio “para restaurar a situação de regularidade. Não se trata apenas de uma faculdade, mas também de um dever, pois que não se pode admitir que, diante de situações irregulares, permaneça inerte e desinteressada. Na verdade, só restaurando a situação de regularidade é que a Administração observa o princípio da legalidade, do qual a autotutela é um dos mais importantes

corolários.” CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25ª edição, revista, ampliada e atualizada até a lei nº 12.587, de 3/01/2012. São Paulo: Editora Atlas. 2012, p. 33.

167

CRFB/1988: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;

168

CPP/1941: Art. 10. [...] § 3o Quando o fato for de difícil elucidação, e o indiciado estiver solto, a autoridade poderá requerer ao juiz a devolução dos autos, para ulteriores diligências, que serão realizadas no prazo marcado pelo juiz.

CRFB e disciplinado pela Lei Complementar nº 75, de 20 de maio de 1993169. É controle finalístico, ou seja, restrito à atividade investigativa, logo não deve ocupar-se de questões organizacionais, estas atinentes ao controle interno. Neste sentido, Paulo Roberto Decomain170 salienta que:

[...] o termo “controle” tem aqui sentido de acompanhamento, observação, orientação, não subordinação hierárquica. Cuida-se de possibilitar o acesso do Ministério Público a todas as atividades-fim exercidas pela polícia, em especial as de polícia judiciária, na medida em que antes de tudo são para ele voltadas. [...]

No que pertine ao Princípio da Busca da Verdade, na seara processual penal tradicionalmente chamada de verdade real, é definida por Marcelo Lessa como uma

[...] verdade substancial, a verdade do que realmente teria acontecido, a exigir um juiz pesquisador dos fatos trazidos pelas partes, por iniciativa própria, com vistas a esclarecer o que efetivamente teria ocorrido171

Com efeito, haja vista que o Inquérito Policial é o principal instrumento que subsidia a ação penal, deve ocupar-se, de forma ampla e profunda, em colher elementos que sejam capazes de identificar a materialidade e autoria da infração penal investigada. Entretanto, qualificar esta verdade como “real” além de redundante pode induzir que esta tarefa seja desenvolvida a qualquer custo, o que não é correto. A busca da verdade, seja na fase pré- processual, seja no processo, é limitada pela lei e pelos princípios jurídicos. Neste sentido, reforça Marcelo Lessa172:

É evidente, pois que não se fala mais em “verdade real” para legitimar procedimentos ilegais de busca de prova, como provas ilícitas ou mesmo a tortura para obter confissão. Isto porque se reconhece, como dito acima, que o Legislador pode e deve, por questão de política legislativa, pautar a investigação processual nos parâmetros que melhor lhe convier, de

169 LC 75/1993: Art. 9º O Ministério Público da União exercerá o controle externo da atividade policial por meio de medidas judiciais e extrajudiciais podendo:

I - ter livre ingresso em estabelecimentos policiais ou prisionais; II - ter acesso a quaisquer documentos relativos à atividade-fim policial;

III - representar à autoridade competente pela adoção de providências para sanar a omissão indevida, ou para prevenir ou corrigir ilegalidade ou abuso de poder;

IV - requisitar à autoridade competente para instauração de inquérito policial sobre a omissão ou fato ilícito ocorrido no exercício da atividade policial;

V - promover a ação penal por abuso de poder.

170 DECOMAIN, Paulo Roberto. Comentários à Lei Orgânica Nacional do Ministério Público. Santa Catarina: Editora Obra Jurídica. 1996, p. 184.

171

BASTOS, Marcelo Lessa. Processo Penal e Gestão da Prova: a questão da iniciativa instrutória do juiz em face do sistema acusatório e da natureza da ação penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris.2011, p. 55.

preferência afinados com o modelo de Estado em que se vive. Dentro desses parâmetros, há de ser lícita a busca da verdade [...]

Nesta linha de pensamento, a atuação policial deve ser objetivar desvendar os fatos na forma mais próxima como ocorreram, sem descuidar das limitações impostas pelo ordenamento jurídico173.

Ponto que aguça controvérsias diz respeito à aplicação do Princípio do devido