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CAPÍTULO 1 SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL

1.3 Princípios no Direito T rib u tário

1.3.1 Princípios

Sobre a ordem, integração e interpretação dos principais elementos diferenciados que fomentam um dado sistema normativo e suas repercussões como diretivas da ação do operador do Direito, é preciso ter presente que os valores jurídicos são idéias inteiramente abstratas (no plano da axiologia) que informam o ordenamento jurídico, sem se traduzirem em linguagem normativa; enquanto os princípios são enunciados genéricos que representam o primeiro estágio de concretização dos valores jurídicos a que se filiam (já, portanto, agregando, apesar das divergências a respeito, conteúdo normativo); depois, podem vir os subprincípios e, em seguida, as normas, atributivas de direitos e deveres 44.

Essa mesma lição é invocada por Luciano Amaro45, fortalecendo a convicção de que é absolutamente secundária e sem maior relevância a simples existência de uma lei e sua suposta incidência nos casos concretos quando se prioriza nessa verificação apenas e exclusivamente a superfície da base legal invocada pelo Fisco em sua prática cotidiana.

43 DINIZ, Maria Helena. Idem, p. 14, professa: “A Constituição tem por escopo, privilegiando o princípio da constitucionalidade e o da legalidade, controlar a ação do Poder Público, não podendo, portanto, outorgar competências incontroláveis, que desequilibrem o uso dos poderes, que sirvam à opressão, aos interesses dos governantes, que sejam instrumentos de desordem e anarquia.”

44 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de direito tributário efinanceiro. 5. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1998, p. 79. 45 Direito tributário brasileiro. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 108.

Há que se ir além, muito além, para só assim encontrar, desde suas raízes e principalmente nestas um conteúdo no qual os valores mais tarde nos enunciados lingüísticos juridicizados (e, portanto, convertidos em textos normativos) se mostrem vivos, pulsantes e, no que é decisivo, permeados da mais pura desigualdade nesse regramento em proveito e a favor somente de uma das partes: o Fisco. Posteriormente, em etapa subseqüente, este apenas age com base naquelas leis editadas no arbítrio e com arbítrio, e, o que é inacreditável, sob a indiferente alegação de que está agindo simplesmente de acordo com a lei e cumprindo-a inclusive com direito a sancionar duramente quem ousar discordar desse silogismo mambembe, desse simulacro, ou, como define mais claramente o Direito Penal, desse estelionato.

A sutil transposição do que seja legal para o ilegal, de fronteira nebulosa muitas vezes no âmbito fiscal, tem encontrado terreno fértil na postura do Fisco em incontáveis ocasiões, seja naquelas já reconhecidas pelo Judiciário, seja naquelas ofuscadas pela negação do óbvio, ou, ainda, nas que se ocultam no emaranhado incompreensível e interminável de leis ou atos infralegais editados pelo ente tributante, quando não dissipadas pelo tempo.

Detectar os deslizes da prática fiscal, antes mesmo de seu confronto com os princípios constitucionais, implica deter-se nos valores jurídicos que lhe precedem e informam, quando só então se terá uma noção mais precisa da extraordinária importância, que consagram no objetivo colimado. Os princípios exercem importante função limitadora da ação legislativa e nesse embrião revelam todo o direcionamento e respeito que qualquer edição de lei a eles primeiro deve observar como único meio hábil para não se expor à invalidade.

Esse aspecto nodal motiva especial consideração, já que pressuposto sine quan non para que a ação fiscal seja avaliada em toda a sua extensão e não, simplesmente, na lei ou nas normas infralegais, quando ambas, por si só, se em desacordo com os princípios a que devem inteira subordinação, manterão aquela (prática fiscal) como ilegítima, ou, ainda, ilegal, ou mesmo inconstitucional, conforme o caso. Essa advertência é perfilhada por Iso Chaitz Scherkerkewitz46 ao não olvidar: “Analisamos a influência dos princípios constitucionais na atividade legislativa, atividade capaz de criar, em abstrato, direitos e obrigações.”

Não apenas a instituição de tributos como também a dinâmica estatal que se sucede após na persecução do ingresso dessa arrecadação aos cofres públicos (que nada mais é do que ação fiscal) têm o dever de observar todo o sistema tributário tanto na prática cotidiana que lhes afeta como na veiculação dessa prática através das leis ou atos normativos que as disciplinam, pois, do contrário, estarão desviando-se da legalidade vinculada que as orienta e configurando-se no mais puro arbítrio, à margem da lei, ou em violência à Constituição Federal.

Essa condicionante de validade que perpassa pela observância dos princípios constitucionais, e tão solenemente ignorada na atuação fiscal, é apontada por Yoshiaki Ichihara47:

“Entretanto, ao instituir e exigir tributos, retira do contribuinte parte da disponibilidade ou do patrimônio, daí a necessidade de obediência não só às regras da Lei Maior, mas aos princípios constitucionais.

Por princípio constitucional deve se entender a diretriz, a determinação do norte magnético da Constituição e, portanto, a agressão de um princípio constitucional aparece como muito mais grave do que a agressão de uma simples regra constitucional.

Na realidade, os princípios constitucionais sobrepairam sobre as regras; além de mais abrangentes, ficam acima delas.”

São esses princípios em primeiro plano que orientam a produção legislativa e normativa, com prevalência inclusive dos princípios constitucionais sobre os demais princípios48, sejam expressos ou implícitos, sem, contudo, perderem a hierarquização que representam ainda no âmago do próprio Texto Constitucional49.

47 Princípio da legalidade tributária na constituição de 1988. São Paulo: Atlas, 1995, p. 47.

48 Apesar de importantes, por razões metodológicas e delimitação do objeto de estudo, não se examinam aqui os muitos princípios gerais de Direito Tributário, dentre esses competência privativa das pessoas políticas de direito constitucional interno para instituir impostos; competência geral para instituir taxas e contribuições de melhoria; indelegabilidade da competência tributária; isonomia recíproca entre as pessoas políticas; não- cumulatividade do ICMS e do IPI; territorialidade da tributação, etc. Conforme rol igualmente exemplificativo legado por Paulo de Barros Carvalhos. Curso de direito tributário, p. 73-74.

49 ICHIHARA, Yoshiaki. Op. cit., p. 47, ensina: “Ressalte-se que mesmo as normas constitucionais estão hierarquizadas, vistas sob a ótica da importância, existindo, inclusive, normas pétricas ou pétreas, que não podem ser emendadas (art. 60, § 4 o, itens I a IV, da Constituição Federal).

O mesmo ocorre com os princípios constitucionais que também são hierarquizados(...).Isto quer dizer

que um princípio é mais importante que o outro, no sentido de que é mais abrangente, ou um princípio existe como desdobramento de outro.”

No documento Legalidade tributária e prática fiscal (páginas 50-53)