• Nenhum resultado encontrado

Em cada parte do processo de análise das representações de justiça foram utilizados procedimentos analíticos específicos, mas todos eles têm algo em comum, que é o isolamento de elementos lingüísticos (que podem ser desde a palavra isolada até parágrafos inteiros) do todo do texto. Para tornar a tese mais “didática”, discutiremos os procedimentos analíticos em associação às teorias utilizadas.

No capítulo 1, cuja teoria predominante é a TE, os procedimentos analíticos dizem respeito à coleta de elementos lingüísticos que remetessem às regras e recursos componentes da estrutura (referências a objetos materiais, leis, valores morais, etc.), além daqueles elementos que denotavam/conotavam o uso das consciências prática e discursiva. Nessa parte do trabalho, não usamos os 470 acórdãos para análise. Selecionamos um texto de cada ministro, os mais curtos em extensão, e realizamos um mapeamento manual dos textos para a seleção de partes que fossem significativas à exemplificação dos conceitos da TE e à descrição do contexto de cultura. Já as cartas do leitor foram analisadas todas. Os 66 textos foram mapeados manualmente em busca dos mesmos elementos.

Não há categorização pré-definida a seguir, pois Giddens não propõe categorias a serem observadas, mas tentamos seguir as pistas que o autor foi fornecendo ao desenvolver os conceitos e princípios da TE. Um exemplo é quando

13

Giddens (2003) afirma que os recursos servem à estrutura da dominação. Então, se uma determinada decisão foi construída sob a dominância de uma determinada lei, essa lei é um recurso que o juiz usou para tornar dominante sua decisão. Com isso queremos dizer que essa parte da tese baseia-se na interpretação semântica das práticas lingüísticas e discursivas.

No capítulo 2, cujas teorias predominantes são a PS e os EC, que tem por objetivo desvelar as representações de justiça e seus modos de operação, foi preciso obter um mapa geral dos quatrocentos e setenta acórdãos e das sessenta e seis cartas do leitor. O objetivo desse mapeamento era encontrar a palavra justiça, e suas derivadas, e, a partir dela, estabelecer as suas relações contextuais dentro e fora dos textos. Como o corpus pode ser considerado grande, ele se presta ao processamento eletrônico de textos, e utilizamos para isso o programa WordSmith Tools, versão 4.0, licenciado, desenvolvido por Mike Scott, para processamento de dados lingüísticos. Segundo o desenvolvedor do software, WordSmith Tools é um conjunto de ferramentas que permite ao lingüista verificar “como as palavras se comportam em textos”14. São três as ferramentas principais: Wordlist, ferramenta utilizada para mapear palavras existentes em um único texto ou conjunto de textos, grupos de palavras (word-clusters) relacionadas, freqüência de ocorrência nos textos; Key-

words, responsável por separar aquelas palavras ou grupos de palavras mais

freqüentes nos textos; e Concord, utilizada para individualizar a pesquisa lexical ou de grupos de palavras, pois sua função é encontrar todas as ocorrências de uma palavra, grupo de palavra, ou raiz lexical nos textos selecionados.

Neste trabalho, a única ferramenta utilizada foi a Concord, que permitiu localizar o item lexical em estudo – a palavra ‘justiça’ – e ver quais relações essa palavra mantém com outras no contexto imediato no qual aparece. Também conseguimos ter um panorama geral de todas as ocorrências da palavra, podendo excluir aquelas que, por razões previamente determinadas, não fazem parte do

corpus. Neste trabalho, portanto, o programa tem uma função apenas exploratória,

permitindo a localização e a contagem de elementos lingüísticos específicos. Não substitui, então, nossa análise dos fatos lingüísticos encontrados.

14

Tradução minha para “Oxford WordSmith Tools is an integrated suite of programs for looking at how words behave in texts.”, informação conseguida no manual online do programa, disponível na página < http://www.lexically.net/downloads/version4/html/index.html>

Os dados analisados no capítulo 2 correspondem à raiz lexical -just- porque dela se formam as palavras [in]justiça[s], [in]justo[s], [in]justa[s], [in]justamente. O processamento da raiz -just- no Concord resultou na localização de outras palavras que contêm o elemento na sua formação (como justificadamente, justificativa, justificar), que foram descartadas porque não diziam respeito ao termo ‘justiça’. Finalmente, as ocorrências foram divididas em três grupos, de acordo com as três representações emergentes na fundamentação teórica, quais sejam: a justiça como um princípio social; a justiça como uma instituição; e a justiça como um bem. Tais representações são discutidas no capítulo 2. Como a palavra “justiça” pode ser retomada, ao longo dos textos, por outros termos, essas referências também são consideradas. Assim, alguns exemplares de acórdãos e cartas do leitor foram reproduzidos, no todo ou em partes, para comprovar a existência das várias representações de justiça e as maneiras pelas quais elas são expressas no texto.

E, no capítulo 3, último capítulo teórico e analítico da tese, a taxionomia de van Leeuwen foi aplicada ao conjunto de dados obtidos nos procedimentos descritos, como forma de análise formal/discursiva, em suas dimensões sintática e semiótica. A dimensão sintática foi desenvolvida através de uma breve descrição do sistema de transitividade dos textos, na perspectiva da Gramática Sistêmico-Funcional (GSF). A razão dessa descrição é entender a natureza da participação das representações de justiça dentro dos textos analisados. É a partir dessa descrição que, na dimensão semiótica, se torna possível discutir o papel das representações de justiça e suas implicações ideológicas.

Os procedimentos metodológicos apresentados fornecem argumentos para a interpretação/re-interpretação das representações de justiça e podermos, assim, discutir o potencial de mudança e/ou de estabilização dessas representações na sociedade, o que é feito nas Considerações Finais.