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Capitulo 3 – Metodologia de Investigação

3.6. Procedimentos e técnicas de análise de dados

A análise de dados é o processo de busca e de organização de todo o material que foi sendo acumulado, com o objetivo de aumentar a sua compreensão e permitir apresentar aos outros aquilo que se encontrou (Bogdan & Biklen, 1994). É, acima de tudo, “um processo criativo, onde não há fórmulas como em estatística, mas um processo que exige rigor intelectual, um trabalho atento e difícil” (Patton, 1987, p. 147). Na perspetiva de Bogdan e Biklen (1994), a análise envolve o trabalho com os dados, a sua organização, divisão em unidades manipuláveis, síntese, procura de padrões, descoberta de factos importantes e do que deve ser aprendido e a decisão sobre o que vai ser transmitido aos outros. Analisar significa “na essência, fracionar” (Stake, 2007, p. 87), fracionar as nossas impressões e as nossas observações.

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Para Lüdke e André (1986) a análise de dados implica dois momentos: (i) a organização de todo o material dividido em partes; (ii) a procura de relações entre essas categorias. Os mesmos autores definem três processos analíticos para a análise de dados: (i) a análise durante a recolha de dados; (ii) a criação de categorias e (iii) a construção de teoria. Numa primeira abordagem, estes processos são importantes para se iniciar a análise, embora considerem que há vários níveis intermédios que são necessários para que análise seja mais profunda de forma a permitir maximizar os dados.

Outra autora, Merriam (1988), de modo semelhante aos autores referidos anteriormente, considera que a a análise se deve realizar a três níveis. Num primeiro nível, refere que a análise se deve fazer em simultâneo com a recolha de dados. O segundo nível envolve desenvolver categorias, temas e outras classes taxonómicas que interpretem o significado dos dados. Por fim, o terceiro nível, é aquele que transcende a estrutura das categorias, procurando ligá-las entre si, de modo a explicar o significado dos dados e como eles são relatados.

Uma perspetiva semelhante é apontada por Huberman e Miles (1994) que propõem um modelo interativo de análise de dados na investigação interpretativa composto por três componentes, todos eles relacionados e interligados como subprocessos de uma fase inicial que é a recolha de dados: (i) redução dos dados, em que num primeiro momento os dados são reduzidos de uma forma antecipatória, são avaliados, codificados, agrupados, descobrindo temas, e onde se evidencia a seleção e a condensação dos mesmos; (ii) apresentação dos dados que acontece num segundo momento de análise em que a informação é organizada, sintetizada e estruturada de modo a permitir a formulação das conclusões e, por último, (iii) a formulação das conclusões e verificação que envolvem o investigador na interpretação: extraindo significados através dos dados apresentados, observando regularidades, relações e possíveis explicações (Figura 3.1). Todo este processo procura dar ao estudo uma maior solidez e validade.

Figura 3.1 – Componentes da análise de dados: modelo interativo (Huberman & Miles, 1994, p. 429, adaptado).

Neste estudo, utilizo um modelo que é fundamentado nos autores referidos anteriormente, o qual funcionou como referência para a sua análise. Em cada um, procurei referentes que, por um lado, me ajudassem a interpretar o fenómeno em estudo, por outro lado, fossem facilitadores na procura de evidências relevantes dos dados. Assim, esta análise é, essencialmente, realizada em três fases.

Numa primeira fase, coincidente com o período de recolha de dados, tentei que a análise fosse simultânea com a sua recolha, desde o início da fase de diagnóstico deste estudo, permitindo, assim, fazer alterações ao processo de recolha de dados desde o primeiro dia. À medida que o estudo decorria, a análise tornou-se mais sistemática o que influenciou a recolha de dados subsequente. Após a transcrição dos registos vídeo das aulas, fazia o seu cruzamento com as notas de campo tomadas durante a realização das mesmas, facto que não só permitiu destacar aspetos mais relevantes, como também observar outros que necessitava de aprofundar, quer em relação à própria turma, quer ainda em relação aos alunos participantes neste estudo. Este processo contribuiu ainda para, gradualmente, reformular e reorientar as questões deste estudo.

A segunda fase de análise de dados decorreu após a sua recolha, e foi feita de forma mais profunda e detalhada. Inicialmente, comecei por uma leitura profunda de todo o material documental disponível para, de uma forma cuidada, fazer a redução dos dados. Nesta fase,

Os dados

Redução de dados Apresentação de dados Formulação das conclusões e verificação

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tentando fazer uma pré-interpretação dos seus significados, tendo em atenção as questões do estudo e o enquadramento teórico que o norteou.

Antes do início da escrita de cada caso, procedi à revisão de todo o material recolhido, identificando aspetos relevantes sobre cada um - o seu modo de participação nos vários momentos da aula, dando relevo ao primeiro momento da aula, registos feitos na realização dos problemas, e à fase de discussão final da aula – assinalando com cores diferentes, quer as suas intervenções, quer pontos assinalados aquando das transcrições realizadas. Não foi uma tarefa fácil. Como afirma Merriam (1988) “analisar os dados recolhidos numa investigação de estudo de caso é um trabalho complexo que exige tempo” (p. 145).

Apesar das categorias de análise das estratégias e procedimentos estarem definidas e identificadas à priori, o mesmo não se verificava relativamente às componentes do sentido de número a analisar. Estas só ficaram definidas nesta fase e após recurso a novas leituras sobre o tema e a uma releitura do enquadramento teórico realizado.

Depois desta fase inicial, optei por estruturar a análise de cada caso seguindo uma ordem cronológica dos factos e assente em dois pontos: um relativo às estratégias e procedimentos usados na resolução dos problemas de adição e subtração e outro relativo ao desenvolvimento do sentido de número. No final da análise de cada caso é feita uma síntese dos aspetos mais relevantes relativos ao primeiro ponto, bem como uma análise relativa às componentes do sentido de número evidenciadas.

A escrita de cada caso é feita de forma essencialmente descritiva, que se inicia com a apresentação do aluno participante e a descrição do trabalho realizado durante o seu percurso - inclui os problemas propostos, a atividade por si desenvolvida, excertos das transcrições das aulas gravadas em vídeo, das notas de campo tomadas e de excertos das transcrições das entrevistas gravadas em áudio.

Para analisar os procedimentos de cálculo de adição e subtração utilizados pelos alunos durante a realização dos problemas, defini um grupo de categorias prévias de análise para cada aluno participante (Tabela 3.5). O modelo apresentado por Beishuizen (1997) constituiu a base para a construção das categorias que permitem analisar esses aspetos.

Tabela 3.5 – Procedimentos de cálculo mental (Adaptado de Beishuizen, 1997), já referidos na página 78

O primeiro grupo de categorias de análise inclui dois tipos de procedimentos:

(i) método dos saltos, uma vez que as dezenas são adicionadas ou subtraídas

a partir do primeiro número em causa. Estes procedimentos são referidos por Beishuizen (1993; 1997) pelos acrónimos N10, N10C e A10 (ver exemplos na tabela 1);

(ii) método da decomposição, uma vez que as dezenas e as unidades são

separadas e tratadas isoladamente. Estes procedimentos são referidos por Beishuizen (1993;1997) pelos acrónimos 1010 e 10s (ver exemplos na tabela 1).

(iii) Método da compensação que pode estar incluído nos outros dois tipos

(N10C).

Estas categorias emergem da literatura. A partir da análise dos dados surgem outras, eventualmente, mais detalhadas. No final do estudo, no capítulo relativo à discussão do percurso de aprendizagem dos alunos, elaborei também um quadro síntese para mais facilmente analisar e compreender as estratégias e procedimentos dos alunos usados na resolução dos problemas durante o seu percurso.

A outra dimensão relaciona-se com a análise das componentes do sentido de número. Nesta, recorri ao modelo proposto por McIntosh et al. (1992); McIntosh et al. (1997), as características do sentido de número descritas por Reys (1994) e as componentes do sentido de número presentes em estudos realizados por vários autores (Yang, 2003; Yang et al., 2004; Yang et al., 2008a; Yang et al., 2008b; Li & Yang, 2010). Estas constituíram a Adição (com agrupamento): 45 + 39

Sequência dos procedimentos:

N10: 45 + 30 = 75; 75 + 5 = 80; 80 + 4 = 84 N10C: 45 + 40 = 85; 85 – 1 = 84 A10: 45 + 5 = 50; 50 + 34 = 84 Procedimentos de decomposição: 1010: 40 + 30 = 70; 5 + 9 = 14; 70 + 14 = 84 10s: 40 + 30 = 70; 70 + 5 = 75; 75 + 9 = 84

Subtração (com agrupamento): 65 – 49, 51 – 49

Sequência dos procedimentos:

N10: 65 – 40 = 25; 25 – 5 = 20; 20 – 4 = 16 N10C: 65 – 50 = 15; 15 + 1 = 16 A10: 65 – 5 = 60; 60 – 40 = 20; 20 – 4 = 16 Procedimentos de decomposição: 1010: 60 – 40 = 20; 5 – 9 = 4 (falso inverso) 20 + 4 = 24 (solução falsa) 10s: 60 – 40 = 20; 20 + 5 = 25; 25 – 9 = 16

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base para a construção das componentes que selecionei, permitindo, assim, analisar os aspetos do sentido de número que passo a descrever:

(1) Compreensão do significado dos números e operações

Implica a compreensão do sistema de numeração decimal com números inteiros, incluindo o valor de posição, identificação de padrões numéricos que, uma vez identificados proporcionam um suporte importante para o aumento da sequência de contagem. A compreensão desta componente implica contar para a frente de 2 em 2, de 5 em 5 e de 10 em 10, bem como a sua aplicação. É importante também que os alunos compreendam os números em termos da sua natureza multiplicativa do sistema de numeração (por exemplo, 100 é 10 dezenas e uma dezena são 10 unidades), em vez de unicamente o valor de posição, centenas, dezenas e unidades.

Relativamente à compreensão das operações, implica compreensão do efeito das operações, isto é, compreender a relação entre o contexto do problema e os cálculos a realizar, reflexão da interação entre as operações, compreensão das propriedades matemáticas e compreensão das relações entre operações, nomeadamente, compreender a relação inversa entre operações e o efeito da operação sobre o número.

(2) Uso de múltiplas representações dos números

Significa compreender que os números surgem em diferentes contextos e podem ser expressos numa grande variedade de representações, orais, gráficas e/ou simbólicas. Inclui o reconhecimento de que os números podem ser pensados e manipulados de diferentes maneiras. Esta manipulação exige a compreensão de decomposição (por exemplo, 34 = 3 dezenas + 4 unidades, 2 dezenas + 14 unidades ou 34 + 21 = 44, 54, 55).

(3) Reconhecimento da grandeza relativa dos números

Inclui a capacidade para sentir a grandeza geral de um dado número em relação a outro bem como a capacidade para comparar e ordenar números nas suas diferentes representações. Reconhecer a a grandeza relativa dos números envolve ainda identificar que dois números estão próximos em relação a um terceiro e encontrar ou identificar números entre dois números dados.

(4) Reconhecimento da razoabilidade dos resultados

Implica o uso de estratégias e procedimentos adequados para resolver problemas e avaliar a razoabilidade dos resultados à luz do problema original e da questão formulada. Este

reconhecimento envolve a reflexão sobre as estratégias e procedimentos a usar e a opção pela mais adequada, tendo em atenção o contexto do problema e aplicar mentalmente procedimentos de estimação aos problemas sem utilizar cálculo escrito ou com poucos passos intermédios.

(5) Uso adequado do sistema de referências

Fornece referentes mentais essenciais para pensar acerca dos números, tais como, múltiplos de 10, 100, como também reconhecer que a soma de dois dígitos é inferior a 200. O seu uso é útil para avaliar uma resposta ou arredondar um número para facilitar processos de cálculo.

Finalmente, após a análise dos casos, efetuei uma terceira fase de análise, onde procurei fazer a discussão do percurso de aprendizagem dos quatros alunos participantes e das conclusões. É uma fase mais global e transversal, tendo como referência as questões do estudo e articulando-a com o enquadramento teórico realizado. Nesta fase, para melhor analisar os casos e os cruzar, construi grelhas com os registos das categorias em análise, enquadrando as produções dos alunos nessa grelha, de modo a proporcionar uma melhor compreensão do que lhes era comum e o que os distinguia neste percurso, e que conduziu às conclusões do estudo.