• Nenhum resultado encontrado

PARTE II – ESTUDO EMPÍRICO

1. Procedimentos metodológicos na recolha de informação

Definida a área problemática e a questão de estudo, que aqui se relembra:

Sendo os pressupostos fundamentadores da importância das Expressões Artísticas, em particular da Expressão Plástica / Artes Plásticas, contemplados nos documentos enquadradores da Educação Pré-Escolar, de que forma é que os profissionais os mobilizam na sua prática educativa?,

o aprofundamento do quadro conceptual do estudo, manteve-se em constante construção durante todo o percurso. As leituras realizadas apoiaram-se em literatura da especialidade das Expressões Artísticas e da Educação e Cuidados para a Infância, sempre intencionalmente centradas na sustentação do trabalho de pesquisa. A análise crítica dos referenciais teóricos, como tarefa investigativa relevante, pretendeu fundamentar, aprofundar e situar ideias e construir perspectivas, que se espera venham a contribuir para a pertinência, inovação e credibilidade científica do estudo (Tuckman, 2005).

A opção de não se terem formulado hipóteses de estudo, prende-se com a perspectiva defendida por Bogdan (1994, p. 83), de que a estruturação da investigação deve ocorrer através do próprio processo de desenvolvimento do estudo, e não suportar- se em “ideias preconcebidas ou um plano prévio detalhado”. Este carácter de flexibilidade na elaboração do plano de investigação, inscreve-se também numa das características dos estudos qualitativos, que defendem a construção do plano ao longo de toda a investigação, assim como a análise de dados, embora esta última seja mais sistemática na fase final do estudo (op. cit., 1994).

A selecção do contexto e sujeitos do estudo emergiu dos critérios já enunciados no ponto 3 do capítulo anterior e procurou sustentar-se em princípios éticos e deontológicos, como aliás todas as etapas do estudo. Assim, imbuídos pelo carácter de anonimato e sigilo profissional, procurou-se cumprir normas éticas e deontológicas no desenvolvimento das diferentes etapas do estudo. Dada a relevância desta dimensão, Bogdan (1994) refere que têm vindo a surgir diversas propostas relativas à criação de um código deontológico para os investigadores qualitativos (Cassel, 1978; Cassel e

Wax, 1980; Punch, 1986; cit. por op. cit. 1994). No entanto, Punch (1986, op. cit. 1994) refere que mesmo não existindo esse código deontológico específico, os investigadores devem reger-se por convenções de ordem ética que se prendem com a protecção da identidade dos contextos e sujeitos, ou seja, não partilhar informação recolhida com outros; tratamento respeitoso dos sujeitos; e informar previamente sobre os objectivos e metodologias do estudo, e respeitar a autenticidade na redacção dos resultados.

Com base nos pressupostos anteriores, tentou-se sempre adequar a forma de interacção com as educadoras do estudo e de recolha da informação aos objectivos do estudo e às características do contexto. Considera-se, assim, que estes princípios estiveram sempre presentes e que foram percepcionados pelos sujeitos do estudo o que, em nosso entender, terá contribuído para a sua abertura e disponibilidade constantes.

Numa fase inicial, realizou-se a proposta às educadoras, explicitando os objectivos do estudo e todas as fases do processo. Após a aceitação das educadoras para nele participarem, foi então formulado um pedido de autorização formal à Direcção da instituição, que acedeu a que o estudo se realizasse naquele contexto. Esta tomada de decisão das educadoras e da direcção institucional foi consciente, na medida em que foram partilhadas e clarificadas as intenções e objectivos do estudo, assim como o período previsto para o efeito e o modo como se processaria a recolha de informação, através da observação directa e indirecta, no terreno das acções educativas.

Os procedimentos metodológicos para a recolha de informação, sobre os quais nos debruçaremos mais à frente, foram suportados na fundamentação metodológica da investigação de natureza qualitativa e interpretativa, visando a compreensão dos significados construídos pelas educadoras face à problemática em estudo.

Foi então desenhado um plano de observação indirecta e directa, para o qual se definiram os objectivos gerais e específicos, se delimitou o campo de observação, o número de observações, que traduzimos por episódios de educação73 (três na sala de cada educadora) e se definiram as estratégias a seguir.

73 Na concepção de Altet (1992) o episódio constitui uma unidade de interacções entre diversos actores num determinado contexto.

No procedimento da análise a definição dos episódios regeu-se pelo início e conclusão das práticas observadas, tendo sido definidos e observados três episódios nos contextos educativos de cada educadora.

1.1. Observação indirecta e naturalista em contexto da acção do educador de infância – entrevista

A observação indirecta e naturalista foi a primeira forma de recolha de informação, tendo sido utilizado como instrumento uma entrevista a cada uma das educadoras no início do ano lectivo. A justificação para esta primeira forma de observação decorreu dos próprios objectivos do estudo, ou seja, pretendeu-se recolher informação que, numa posterior análise, permitisse interpretar as concepções subjacentes ao discurso das educadoras quanto à temática em estudo. As entrevistas ocorreram nos dias 1, 2 e 3 de Outubro de 2007 com as educadoras A, B e C, respectivamente.

Bogdan (1994) refere que no âmbito dos estudos qualitativos, a condução da entrevista deve privilegiar a proximidade da relação em detrimento do formalismo, fomentando, assim, a ocorrência de maior probabilidade de captar o discurso próprio do sujeito. No nosso caso, a existência de um guião de entrevista foi fundamental para a recolha de dados susceptíveis de serem compreendidas as concepções subjacentes às acções educativas no domínio das Expressão Plástica / Artes Plásticas. Procurou-se que a entrevista realizada, de carácter semi-estruturado, fosse suficientemente aberta, permitindo a cada educadora manifestar os seus entendimentos e percepções, que foram registados em suporte áudio74. A entrevista continha questões directas, indirectas e abertas (cf. Anexo I tipo A), tendo-se privilegiado o tipo de resposta não estruturada, de forma a permitir a cada educadora expressar as suas ideias, procurando não influenciar o seu teor (Bogdan, 1994; Tuckman, 2005).

1.2. Observação directa e naturalista em contexto da acção do educador de infância

A observação directa e naturalista em contexto das situações educativas ocorreu posteriormente, e assumiu as seguintes características: participante, porque, como foi já referido na contextualização do estudo, a observadora exerce também funções de Supervisão Pedagógica das estagiárias que se integravam nas equipas educativas das

74 Também no início da entrevista foram referidos aos sujeitos os seus objectivos e garantida a confidencialidade dos dados a

salas das educadoras, o que, de certa forma, fundamenta a sua presença mais assídua no quotidiano destes grupos; intencional, na medida em que os objectivos foram traçados previamente; espontânea, porque no decorrer da observações surgiram aspectos que não estavam inicialmente previstos, e que suscitaram a atenção da observadora / investigadora. Consciente do desconforto que estas situações de observação podem suscitar, a investigadora, procurou não ser intrusiva na recolha dos dados, assim como evidenciar uma postura de aprendizagem e conhecimento do contexto observado sem ter, em qualquer momento, a intenção de diminuir o valor do desempenho dos sujeitos observados. O conhecimento prévio das educadoras e das crianças foi também importante na adequação da postura da investigadora, de forma a minimizar o “efeito do observador” nos comportamentos dos observados (Bogdan,1994, p.68).

Os dados observados eram registados, contextualizados e datados, por forma a permitir compreender, numa fase posterior, por um lado, a coerência ou não entre as concepções de Expressão Plástica / Artes Plásticas e as práticas observadas; por outro lado, a ocorrência ou não de transformação de práticas, motivadas pelos resultados da reflexão das educadoras sobre o processo educativo.

1.3. Consulta de documentos sobre a prática: Projecto Curricular

Para além destas duas formas de recolha de informação, por observação naturalista directa e indirecta, recorreu-se ainda à consulta do Projecto Curricular e ao registo fotográfico de algumas situações educativas. A consulta dos Projectos Curriculares de Sala75 constituiu uma oportunidade de aceder ao que Bogdan (1994, p. 180) designa de “perspectiva oficial” e facilitou a compreensão do entendimento das educadoras quanto à forma de pensar e organizar as acções no domínio da Expressão

Plástica / Artes Plásticas. Relativamente ao uso da fotografia76 considera-se que

constituiu uma importante fonte de recolha de dados, dado que permite registar detalhes que de outra forma não seria possível. Assim, através da observação77 das fotografias,

75 De acordo com os sujeitos do estudo, os Projectos Curriculares de sala são de uso exclusivo da instituição e famílias, não podendo

sair da instituição. Pelo que o acesso a estes aconteceu através de suporte digital fornecido pelas educadoras.

76

Considera-se relevante ressalvar que as fotografias foram tiradas com o consentimento das educadoras que participaram no estudo.

77 O uso da fotografia gera controvérsia na comunidade de investigação. Sontag (1977) e Tagg (1988), cit. por Bogdan (1994)

consideram-na inútil como meio de conhecimento objectivo. No entanto, Becker (1986b) e Wagner (1979) cit. por op. cit., 1994, consideram-na um avanço na pesquisa, na medida em que constitui um meio específico de recolha de dados que não é possível recolher de outra forma.

pudemos analisar aspectos relativos à organização espacial, aos materiais, à decoração do espaço, à organização do grupo, ao conforto das crianças e às manifestações expressivas das crianças e educadoras. Além das fotografias tiradas pela investigadora, foram também observadas fotografias tiradas pelas próprias educadoras do estudo, e que integram os Projectos Curriculares.

Para esta etapa da recolha de dados consideramos ter sido fundamental o conhecimento prévio78 entre as educadoras, crianças e a investigadora, possibilitado pelos percursos de formação profissional colaborativos, no âmbito dos processos de Supervisão Pedagógica das estagiárias, tendo facilitado a criação de situações de observação, aparentemente menos constrangedoras e inibidoras79, para as educadoras observadas, para as crianças e para a investigadora80. A omissão das estagiárias neste conjunto de sujeitos no campo de observação deve-se ao facto de a recolha ter sido desenvolvida nos dias em que as estagiárias não permaneciam no contexto da prática. De facto, a aceitação da investigadora por parte dos sujeitos observados foi fundamental para a prossecução dos objectivos do estudo (Geertz, 1979, cit. por Bogdan, 1994).