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Para fazer frente ao desenvolvimento da tese, pareceu-nos adequado incluir alguns parágrafos para esclarecimentos sobre o processo de construção da pesquisa e de delimitação do esquema proposto anteriormente. Enfatizamos que essa construção não foi, ou melhor, não é, apenas uma construção lógica ou uma acumulação linear determinada a partir de uma linha isotrópica, mas sim, a incorporação de novos elementos teóricos e práticos que se somam na busca incessante do conhecimento, fazendo com que o curso de doutorado possa ter sido muito mais que a produção da tese em si, mas sim, um amadurecimento teórico, intelectual e social. Como afirma Severino (1996, p. 12), conhecer é uma prática humana - ainda que teórica -, é prática simbolizada que vamos desenvolvendo socialmente, na condição de sujeitos coletivos, integrantes de uma cultura, no decorrer do tempo e que se efetiva por meio da “práxis”.

Nesse sentido, os contornos até então não são muito precisos, os recortes e delimitações teóricas e empíricas de nossa pesquisa ganharam um salto qualitativo a partir das considerações e sugestões efetuadas pela banca examinadora do projeto na disciplina Organização do Trabalho Científico, durante a semana de colóquios e debates dos projetos de pesquisa, realizada no início do curso. Esta uma atividade fundamental no processo de organização dos fundamentos que nortearam a pesquisa.

Os nossos referenciais, de forma geral, constituíram-se a partir da sistematização do material bibliográfico, seja sobre a temática, sobre os aspectos teórico-metodológicos, ou ainda sobre a cidade de Guarapuava, nosso local de estudo; Utilizamo-nos de dados disponíveis no Arquivo Histórico e Biblioteca da Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO), Museu Municipal e da Biblioteca Municipal, principalmente no que diz respeito às referências sobre o processo histórico de produção e estruturação da cidade (livros, teses, dissertações e crônicas); informações disponíveis no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE); materiais fornecidos pela Companhia de Serviços de Urbanização de Guarapuava (SURG), como as bases digitais da cidade, planos de desenvolvimento urbano, transporte coletivo, dentre outras.

Efetuamos também uma pesquisa em jornais da cidade4

em diferentes períodos. Convém ressaltar que esse levantamento era almejado por nós desde o projeto da tese, no entanto não o tínhamos realizado até o exame de qualificação, justamente o momento em que a banca nos sugeriu a consecução do mesmo, com o intuito de complementar e qualificar nosso trabalho de tese. Como trabalhamos a estruturação da cidade considerando dois períodos distintos (1 do início do núcleo urbano até meados do século XX; e, 2 o relativo ao processo de urbanização recente de Guarapuava), optamos por levantar informações dos jornais em momentos diferentes e que contemplassem tais períodos, subsidiando nossa análise e proposição. Para tanto, nosso levantamento de matérias produzidas pela imprensa escrita local sobre a cidade e com olhar especial para as práticas ocorridas nos espaços públicos ficou assim dividida: o Jornal Folha do Oeste, notadamente as décadas de 1930 e 1940, com informações relativas ao primeiro período analisado; o Jornal Esquema Oeste durante a década de 1970; e, por fim, o Diário de Guarapuava, no período de 1998 até o ano de 2006, referentes ao processo de urbanização recente.

Além dessas atividades, representadas pela coleta e análise de material escrito, realizamos um importante levantamento de campo, visto que esse instrumental é o que mais se coaduna com nossa proposta de trabalhar com as práticas socioespaciais existentes na cidade, com o dia-a-dia dos seus habitantes. Enfatizamos que o trabalho de campo, ou seja, o “ir a campo”, assumiu papel fundamental no processo de nossa pesquisa, visto que constituiu-se como mediação para o exercício do diálogo entre os dois elementos da clássica relação: teoria e

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Nossa análise dos jornais esteve pautada na identificação dos fatos ocorridos no espaço público, buscando analisar como estes eram apresentados pela imprensa local em diferentes períodos, enfatizando, de certa forma, a capacidade desses meios de comunicação, ora enquanto instrumentos de poder e legitimação de significados hegemônicos, ora como meios de representação e expressão da complexidade das dimensões sociais e culturais. Observamos, nesse sentido, que Góes (1998), fundamentada na idéia habermasiana, destaca a transformação dos jornais em “empreendimentos capitalistas” com grande eficácia publicitária, o que resultou num movimento que redimensionou a esfera pública e a esfera privada, notadamente a partir da segunda metade do século XIX. Para a autora, “num movimento contraditório, possibilitaram uma expansão da esfera pública e foram paulatinamente excluídos dessa esfera e reinseridos na esfera privada do intercâmbio de mercadorias, em função das pressões dos interesses privados dos quais tornaram-se dependentes (GÓES, 1998, p. 11).” Ainda, segundo a autora, sobretudo nas sociedades atuais, os jornais transformaram-se em “instrumentos de utilidade pública”, supondo uma ilusão de acesso à esfera pública, por meio da cunhagem de campanhas de interesse público. No entanto, em relação a uma análise mais aprofundada sobre a imprensa escrita em Guarapuava existem outros trabalhos importantes versando sobre essa questão como a tese de Silva (2005) que trata dos territórios conservadores de poder na região centro-sul do Estado paranaense, aprofundando essa análise crítica da imprensa escrita guarapuavana; além, da dissertação de Kobelinski (1994), que efetuou uma análise da imprensa, enfatizando o marketing urbano a partir de matérias veiculadas pela

prática, ou o teórico e a realidade concreta, como queiram. Embora sejam dois elementos distintos, intermediam-se e se articulam. Desta forma, são e devem ser, tratados enquanto partes fundamentais no processo de construção do conhecimento e na compreensão dos processos geográficos a serem estudados.

Nosso trabalho de campo foi subdividido em três momentos distintos: a princípio, analisamos a mobilidade socioespacial dos guarapuavanos por meio da utilização do transporte coletivo, com o intuito de estudar as formas de acesso à cidade e seus respectivos espaços públicos; num segundo momento, trabalhamos com uma enquete de opinião com o objetivo de subsidiar nossa análise de como a população percebe e faz uso na prática dos espaços públicos da cidade por meio dos elementos de produção ou de representação dos mesmos; e, por fim, utilizamo- nos da observação direta (observação e comparação) nos espaços públicos (caderneta de campo) com o intuito de contrapor nossas evidências enquanto pesquisador com a opinião geral da população e as práticas socioespaciais que ocorrem efetivamente nesses locais.

Essa última atividade também nos possibilitou o registro de parte das práticas que se apresentam diariamente no cotidiano dos espaços públicos da cidade. Mais de duzentas fotos registradas durante nossas idas a campo permitiram- nos uma iconografia (selecionada na tese) que fundamenta nossa proposta e nossas argumentações, enquanto imagens da cidade, de representações denotativas das diferentes formas de uso e apropriação da cidade e de seus espaços públicos. Corroboramos com a perspectiva de Ferrara (2000, p. 118) de que a imagem corresponde à informação solidamente relacionada a um significado que se constrói numa síntese de contornos claros. Para essa autora, a imagem “é um código urbano e impõe uma leitura e fruição que estão claramente inscritos na cidade enquanto espaço construído”. Nesse caso, mesmo enquanto representação de determinado olhar, e nesse caso, do pesquisador, são expressões de ações em determinados tempos e locais, caracterizados por sua complexidade e diversidade, enfim, pelos diferentes modos de vida na cidade.

No entanto, queremos ressaltar aqui também alguns aspectos atrelados a determinados limites que a própria pesquisa nos impôs.

A princípio, enfatizamos a necessidade de produzir um conhecimento teórico-conceitual que dê conta de evidenciar as práticas socioespaciais que se

estabelecem na cidade para, a partir delas, compreendermos as formas, funções e os sentidos do espaço público na cidade contemporânea.

Fazemos referências, também, às dificuldades na busca e sistematização de informações, que segundo nossa proposição, estão basicamente ancoradas no empírico, ou seja, nos levantamentos de campo.

Outra preocupação é a desatualização de determinadas informações, principalmente no que tange aos aspectos populacionais e de renda. Por exemplo, as informações apresentadas na tese são as levantadas pelo IBGE (2000), com algumas projeções nos casos em que isso é possível.

E, por fim, mas nem por isso menos importante no processo de pesquisa, o tempo relativamente curto de contato com o local de estudo e os sujeitos pesquisados, períodos esses restritos aos nossos levantamentos de campo, atrelados à nossa vivência enquanto pesquisador morador da cidade estudada.