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3 METODOLOGIA – HISTÓRIAS DE VIDA NA PERSPECTIVA NARRATIVA

3.5 NOSSAS COLABORADORAS – ESTUDANTES NORMALISTAS

3.5.1 Professora Macieira

Macieira, primeira entrevistada, 61 anos, Licenciada em Letras Português e Inglês, concluiu o Curso Normal no 2º Semestre de 2017. Recebeu o convite oficial para participar da pesquisa, no início do mês de dezembro de 2017 e sua primeira entrevista foi no dia 27 do mesmo mês, às 18 horas, na sala destinada ao Estágio Profissional no IEEOB. Era um entardecer muito quente e a entrevistada estava muito nervosa com o gravador. Era uma experiência nova para ambas. Nesta fase da pesquisa, em que escutamos os Relatos de Vida, lançamos a seguinte questão:

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Por que tu escolheste ser professora? Macieira olha, concentradamente, instigamos mais uma vez e começa a nossa trajetória.5

3.5.1.1 Relato de vida – Professora Macieira

Professora Macieira nasceu em 1956, na cidade de Taquara (RS). A mãe é dona de casa e o pai era trabalhador de serviços domésticos. Ambos estudaram apenas até a 4ª série. É a segunda de três irmãos. Começou a estudar em 1964. No primeiro ano, frequentou uma escola particular, mas depois em função da falta de recursos e, por serem três filhos, passou foi para uma escola pública.

Teve no pai o incentivo para estudar. Ele tinha pouca escolaridade e passou por muitas dificuldades, devido à origem humilde. Foi muito humilhado, trabalhando para uma família alemã (a dona da casa só falava alemão), o pai não entendia as ordens e era agredido.

Na sua narrativa, ela conta que o pai sentou numa pedra que tinha no caminho e fez um juramento:

[...] ele iria trabalhar e que, quando ele tivesse filhos, eles não iriam passar por isso. Cada vez que nós íamos para Taquara, ele sempre parava no Ponto X e dizia: ‘– Foi lá! Foi lá que eu sentei e jurei que os meus filhos não iriam passar o que eu passei’.

Macieira fez o exame de admissão6 para cursar o Ginásio. No Ensino Médio, passou por exame psicotécnico7 e foi encaminhada ao curso Técnico em Enfermagem, o qual não concluiu em função da escola não ter condições de contratar um técnico para dar aulas. “Eu não queria ser técnica em enfermagem, eu queria ser professora!” (MACIEIRA, 2017). Chegou a ingressar e cursar um ano da faculdade de Enfermagem, porém, mais uma vez, passou por uma avaliação psicotécnica e foi informada que não tinha perfil.

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5A transcrição de sua primeira entrevista foi enviada no dia 18 de janeiro de 2017. Nosso segundo

encontro ocorreu no dia 7 de fevereiro de 2017. E o terceiro encontro ocorreu no dia 21 de março de 2017.

6 Segundo a Lei Orgânica do Ensino Secundário: Decreto-Lei 4.244 de nove de abril de 1942. O

Exame de admissão era uma avaliação realizada para o ingresso no Ginasial, primeiro ciclo do Curso Secundário. O exame foi uma prática até o final da década de 1960.

7 Lei 5.692 de agosto de 1971 previa preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o

Começou o curso de Letras na Unisinos, mas por uma questão financeira mudou-se para Sapucaia e em função da necessidade de trabalhar cursou a faculdade na Universidade Regional Integrada (URI), em Santo Ângelo (RS). Ela concluiu o curso de Letras Português-Inglês em 1985. Trabalhou em escolas e cursos de Inglês em Santa Rosa e Santa Maria.

Em sua narrativa ela relembra de muitos momentos de sua vida contextualizando a questão de ser mulher e negra:

Quando eu era criança, não gostava do meu cabelo pixaim. Eu chorava muito quando minha mãe penteava meu cabelo. Eu tinha raiva de ter o cabelo assim. [...] Hoje, sou professora, professora de língua portuguesa e língua inglesa, que terminou o Curso Normal e está cursando Pedagogia. Eu sou poderosa assim como sou e tenho força com 61 anos de idade. Hoje, me acho linda! (MACIEIRA, 2017)

Foi aos Estados Unidos pela primeira vez no ano de 1981. Fazia o curso de inglês no Yázigi, em São Leopoldo. A instituição realizou uma promoção de divulgação do curso. Ela participou no último instante porque não tinha a intenção de ganhar. A proposta era de realizar uma redação em inglês; versando sobre o tema “Como eu aplicaria a língua inglesa na minha vida?”. Macieira tirou o primeiro lugar.

Permaneceu 30 dias nos Estados Unidos, em Los Angeles. Hospedou na Universidade de São Francisco e estudava na Universidade da Califórnia, a UCLA. Ela frequentava a aulas pela manhã e à tarde fazia pesquisa de campo, entrevistava as pessoas. Ela relembra que chegou aos Estados Unidos em uma data importante para a nação, o dia de sua independência: “Peguei a festa do quatro de julho, chegamos lá nesse dia. Isso foi em 1981.” (MACIEIRA, 2017).

Morou em Campo Grande a convite de amigos, entre os anos de 1990 e 1996, onde trabalhou em uma escola particular e viveu a experiência da docência universitária como professora substituta, no curso de Letras, na Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS) nos anos de 1995 e 1996.

Quando eu cheguei à universidade, havia um cara todo pomposo, de terno e gravata, calhamaço na mão. E havia uma outra moça, com salto e com um vestido lindíssimo, maquiagem poderosa, um cabelo que brilhava como o sol e, também, com um calhamaço na mão. Eu pensei: ‘– Tá deu para mim, né? Não tenho chance!’. (MACIEIRA, 2017)

Passou por uma banca avaliadora, para qual apresentou um conteúdo de inglês que foi sorteado com pouca antecedência. Mesmo descrente da própria

capacidade frente aos concorrentes, ela foi selecionada e trabalhou na UFMT durante dois anos. Voltou para o sul, em 1998, em função da saúde da mãe. A intenção era ficar perto dela que reside em Taquara (RS). Macieira não conseguiu permanecer em Taquara (RS), pois achava que a cidade não tinha grandes opções para crescer profissional e intelectualmente. Em 2006, mudou-se para Santa Maria, ministrou aulas em um curso de inglês e também para alunos particulares. Em 2015, ingressou no Curso Normal, e também fazia Especialização em Direitos Humanos na Faculdade Palotina (FAPAS).

Durante a especialização, realizou um trabalho acadêmico no qual deveria entrevistar um professor da disciplina de Ensino Religioso. Foi ao Bilac pela proximidade da sua residência e por indicação de colegas. Ao chegar à escola para solicitar a entrevista, a secretária lhe perguntou se ela gostaria de entrevistar a professora do Ensino Médio ou a do Curso Normal.

Então eu disse: ‘– Como Curso Normal? Tem professor do Curso Normal? Não acredito que aqui tem Normal!’. Eu me matriculei antes mesmo de entrevistar a professora. Durante a entrevista, eu até contei para ela que o meu sonho era fazer o Normal quando era adolescente. (MACIEIRA, 2017)

Concluiu o Curso Normal no final do ano letivo de 2017. Leciona em uma escola bilíngue, localizada no bairro Camobi, desde março de 2018. Macieira trabalha com crianças de 3 e 4 anos. A escola a selecionou para fazer parte do seu quadro de professores por ser bilíngue e ter o Curso Normal, que a habilita para trabalhar com Educação Infantil e Anos Iniciais: “A dona da Escola, quando me apresentou para as outras professoras, disse: ‘– A Macieira vai ser professora da turma, porque ela é professora de Português e Inglês e tem o Curso Normal que habilita a trabalhar com as crianças’.” (MACIEIRA, 2017).

Atualmente, cursa Pedagogia na Faculdade Antônio Meneghetti (FAM), localizada no Distrito Recanto Maestro, em Restinga Sêca (RS). Macieira também reside nesse local.