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Projetos Demonstrativos dos Povos Indígenas (PDPI)

NEO-INDIGENISMOS NO EQUADOR E BRASIL

5.2.2. Projetos Demonstrativos dos Povos Indígenas (PDPI)

As articulações para a criação do PDPI foram iniciadas em 1997 como parte dos preparativos para a chamada Reunião dos Participantes do PPG7 realizada no final daquele ano. 95 As negociações e os arranjos institucionais se estenderam até meados de 1999 quase que exclusivamente no âmbito governamental e intergovernamental, envolvendo o governo brasileiro (PDA e PPTAL), as agências governamentais alemãs KfW e GTZ, o Banco Mundial e a COIAB. Como subsídios às discussões que foram sendo realizadas ao longo deste período, foram realizados seis estudos relacionados com: a promoção e a assistência a saúde indígena, a capacitação e educação formal indígena, o direito positivo referente aos indígenas no Brasil, a participação indígena nas políticas públicas, a economia indígena em contextos interétnicos e o desempenho dos projetos indígenas no PDA (ver Stibich 2005).

O PDPI apoia projetos de organizações indígenas na Amazônia Legal, que inclui os sete estados da Região Norte (Tocantins, Pará, Amapá, Amazonas, Roraima, Rondônia e Acre), a parcela ocidental do estado do Maranhão e o estado do Mato Grosso. São cerca de 193 povos. Segundo o Instituto Brasileiro de Estatística (IBGE), a população indígena nesta área territorial, em 2000, é de 242.639 pessoas. .

A presença de antropólogos foi uma constante nas diferentes fases de gestação do PDPI. No Ministério do Meio Ambiente, na Fundação Nacional do Índio, no Banco Mundial e na GTZ, os antropólogos foram os interlocutores institucionais. Além destes, também foram contratados antropólogos para desenvolver parte dos estudos mencionados; um levantamento e diagnóstico sobre organizacoes indígenas na Amazônia Legal (que resultou num banco de dados); uma avaliação de demandas no campo do “fortalecimento institucional” para organizações indígenas (subsídio para o componente “fortalecimento institucional” a ser financiado pela agência de cooperação britânica – DfID);

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Ver Mancin (2001), Pareschi (2002) e Verdum (2002).

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Ver Ribeiro & Little (1998).

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Participam da Reunião dos Participantes do PPG7 representantes dos países doadores de recursos financeiros e de cooperação técnica ao PPG7 e o Banco Mundial, os representantes dos Ministérios envolvidos diretamente com a implementação do Programa e do Ministério das Relações Exteriores, os responsáveis pela gestão dos Subprogramas e dos Projetos, e membros das redes de ONGs envolvidas na gestão e no acompanhamento do Programa.

e na avaliação dos projetos indígenas apoiados pelo PDA (avaliação apoiada pela GTZ); entre outros (ver Little 1998, 2003).

Os antropólogos também estiveram presentes no “corpo técnico” do PDPI, onde desempenharam uma posição de destaque na “mediação” entre os interesses e demandas indígenas e as exigências político administrativas do PDPI para o acesso aos recursos financeiros. Geralmente os antropólogos, pelo domínio do “discurso oficial” do meio indigenista – ora intercultural ora multicultural – e pela imagem social de que são autoridades em assuntos indígenas, são acionados para expor e se expor publicamente sobre assuntos relacionados com a gestão dos projetos, sobre o funcionamento ou mau funcionamento do “mecanismo de apoio aos projetos”, etc. A “contribuição” dos antropólogos é assim, ainda, de fundamental importância para o funcionamento de mecanismos financeiros de “integração das contribuições das populações indígenas para a promoção do desenvolvimento sustentável”.

Até meados de 1999, a “participação” indígena foi bastante tímida no processo de preparação do PD/I. Se restringiu a consulta e contatos informais promovidos pela GTZ que relutava em promover um debate mais amplo com as organizações indígenas, uma posição não compartilhada pela representação (antropóloga) do Banco Mundial nas negociações do “documento de projeto” do PD/I, e objeto de críticas, atritos e comentários maldosos (“fofocas”) em situações informais de relacionamento. Com as mudanças havidas na política da Secretaria de Coordenação da Amazônia, do Ministério do Meio Ambiente, no início de 1999, quando a antropóloga Mary Allegretti assumiu sua coordenação, fortaleceu- se a posição dos representantes (“negociadores”) do Banco Mundial que reivindicavam um maior protagonismo às organizações indígenas na elaboração do PDPI. A partir de então, a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), entidade de articulação de organizações indígenas da Amazônia brasileira criada em 1989 e filiada ao GTA, passou a ter uma posição de destaque nos arranjos institucionais e na implementação da preparação do “Projeto PDPI” - como passou a se chamar desde novembro de 1999 – tendo indicado o coordenador, Gersem Luciano Baniwa, originário da região do Alto Rio Negro (AM), que assumiu o processo de preparação do projeto no âmbito do MMA nos primeiros meses de 2000. No período de 18 a 22 de setembro de 1999, na cidade de

Manaus, foi realizada uma reunião entre representantes do MMA e da COIAB, com vistas a definir uma estratégia “efetivamente participativa”. A COIAB e as organizacoes indígenas apresentaram suas exigência e reivindicações para, em troca, dar apoio à proposta do PD/I. A principal foi “assumir a condução do Programa”, diz o ofício encaminhado pela COIAB ao MMA, em 23/09/99, e assinado por 26 lideranças indígenas. A representação do MMA mostrou-se amplamente favorável ao pleito. Posteriormente, em um seminário realizado em 19 a 21 de novembro, na cidade de Tefé (AM), foram definidos mais claramente em que termos se daria a “condução do processo” pela COIAB, os objetivos, e principais critérios e procedimentos a serem adotados pelo PDPI.

As negociações para sua criação do PDPI estenderam-se até 2000, quando foi finalmente aprovado o documento de projeto pela COIAB, o Governo Brasileiro, o Banco Mundial, e o Governo da Alemanha - principal financiador. Ver Ministério do Meio Ambiente 2000.

Como parte da fase de divulgação e coleta de “contribuições” para a fase de implementação do PDPI, em 2000 e 2001 foi organizado pela “unidade gestora” do PDPI um conjunto de dezesseis “oficinas”, em diferentes pontos da Amazônia Legal, contando para isso com uma doação do Fundo Fiduciário Policy and Human Resources Development Trust Fund - PHRD. Essas oficinas contaram com a presença de representantes das principais organizações indígenas na Amazônia brasileira. Além de divulgarem os propósitos e as características gerais do mecanismo PDPI, elas serviam para promover a coleta de subsídios à elaboração dos manuais, formulários e outros instrumentos utilizados na fase de implementação (sobre as oficinas, ver lista anexa). 96

Inicialmente o PDPI contava com recursos unicamente para apoiar os projetos apresentados pelas organizações indígenas com um ano de existência legal, que deviam enquadrar suas propostas em pelo menos uma das “áreas temáticas”: (i) “valorização cultural”, (ii) “atividades econômicas sustentáveis” e (iii) “proteção de territórios”. A partir de 2001, o PDPI passou a contar também com o apoio do Department for International Development (DFID), agência britânica de cooperação, que concentrou sua ação no chamado “fortalecimento institucional” das organizações indígenas na Amazônia

e da própria COIAB, apoiando a contratação de assessorias especiais, a promoção de oficinas e cursos de capacitação gerencial, técnica e em avaliação de infra-estrutura. O componente de “fortalecimento institucional” incluía a criação de uma rede descentralizada de “grupos de referência” ligados às organizações indígenas de “segundo grau” em todos os estados da Amazônia. Estes “grupos de referência” seriam formados por indígenas qualificados para assessorar os executores de projetos locais, se constituindo na base político-administrativa regional do PDPI. Este componente do PDPI, que poderia ser um efetivo “empoderador” das organizacoes indígenas, inclusive para assumirem a gestão do PDPI, teve seu potencial reduzido devido a problemas político-administrativos não esclarecidos satisfatoriamente. Sua ação ficou reduzida a ajudas pontuais a algumas entidades indígenas e à formação de trinta gestores de projetos indígenas. 97

Tomando como referência o Manual do Parecerista do PDPI (2003), documento elaborado pela “unidade de gestão” e utilizado pelos consultores (pareceristas) para analisar as propostas das organizações indígenas, é possível perceber que ali são tratadas de questões relacionadas com a idéia de “capital social”. No item “Aspectos Sócio-Culturais: Participação dos Beneficiários, Impactos e Sustentabilidade Sócio-Culturais” do Manual, a primeira informação ao parecerista é a centralidade que os indígenas têm no PDPI, mencionando que o seu “objetivo central” é: “estimular, garantir e reforçar a capacidade das comunidades, povos e organizações indígenas para que elas próprias – e onde seja preciso ou útil em parceria com entidades do governo, empresas privadas e/ou ONGs - desenvolvam, testem, apliquem e disseminem iniciativas inovadoras e demonstrativas nas três áreas temáticas”.

Por “sustentabilidade sócio-cultural” define-se “que, após a execução do projeto, a comunidade deve estar consciente da importância da preservação de suas relações sociais, tradições e/ou ritos culturais, e apta e disposta a manter a infra-estrutura, o sistema ou os benefícios introduzidos pela intervenção. Mudanças auto-sustentáveis realçam e reforçam a autonomia e a autoconfiança dos(as) envolvidos(as)”.

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Duas antropólogas ligadas ao Centro de Trabalho Indigenista (CTI) participaram, como consultoras, da elaboração do manual de operações e do formulário para apresentação de projetos ao PDPI.

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Até janeiro de 2006, o PDPI contava com 76 projetos aprovados, sendo que mais de 70% se destinam prioritariamente para o desenvolvimento de “atividades econômicas sustentáveis”. Há uma predominância por

Em relação à “participação”, outro conceito chave valorizado no PDPI, é informado ao parecerista que este termo deve ser entendido como “um esforço organizado de um grupo determinado de homens e mulheres para aumentar seu controle sobre recursos, estruturas e organizações”, que ela é, ao mesmo tempo, “um meio para melhorar a eficiência e a eficácia de um processo, e um fim em si mesma, enquanto fortalece a auto-estima e a autonomia da população, ao proporcionar-lhe controle sobre os eventos no contexto no qual se desenvolvem”. Ao parecerista é solicitado que avalie o nível de participação dos beneficiários nas diferentes fases do projeto (elaboração, execução, distribuição dos benefícios e avaliação), considerando as seguintes questões:

• Quem participa na tomada de decisões sobre as políticas do projeto?

• Por quem e como são definidas as posições e as funções desenhadas por homens e mulheres no gerenciamento do projeto e na implementação das atividades?

• Quem contribuiu com trabalho (pago/voluntário), com finanças e com materiais?

• Qual o impacto das atividades do projeto sobre homens e mulheres e diferentes atores sociais do grupo beneficiário (por exemplo, jovens ou velhos)?

• Quem se beneficiará com os recursos advindos do projeto?

• Os mecanismos propostos são culturalmente adequados e aceitáveis?

• Quanto à sustentabilidade, quem se responsabilizará pela continuação das atividades do projeto após a sua conclusão formal?