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Os mentores da nova Proposta Curricular do estado de São Paulo lhe atribuem um caráter inovador. Mas o conceito de inovação é, por sua essência, polissêmico. Existe um grande universo de pesquisas que buscam dar conta desse conceito. Essa polissemia se faz presente entre as várias ciências que analisam esse conceito de inovação, bem como dentro de áreas específicas do conhecimento, ou seja, muitas teorias, muitos atores, cada um procura analisar e redesenhar, a cada época, o que é inovação. E essa questão torna-se ainda mais polêmica quando o foco passa a ser inovação educacional.

No Brasil, o tema inovação educacional passou a ser discutido após os estudos realizados nos anos de 1980 por Walter Garcia (“Inovação educacional no Brasil”) e por Maria Amélia Goldberg e Maria Laura Franco (“Inovação educacional: um projeto controlado por avaliação e pesquisa”).

Goldberg e Franco (1980 apud ABRAMOWICZ, 1989, p. 5) abordam o conceito de inovação educacional como “[...] um processo planejado e científico de desenvolver e implementar, no sistema educacional, uma mudança cujas possibilidades de ocorrer com frequência são poucas, mas cujos efeitos representam um real aperfeiçoamento para o sistema”. Em pesquisa desenvolvida para analisar o processo de implantação de um programa inovador, no quadro da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, Abramowicz (1989, p. 5) aponta a escolha dessa definição, alegando que: “[...] a inovação se justifica na medida em que pressupõe a existência de um sistema que propõe objetivos no contexto social”, um atributo que não está presente em outras definições pesquisadas a respeito de inovação educacional.

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Para Souza e Martins (2012, p. 7), “conhecer e compreender propostas e práticas apresentadas como inovadoras implica em se ter o crivo de alguns parâmetros previamente elencados”. As autoras colocam como centrais os seguintes pontos: “[...] caráter intencional, sistemático, planejado, processual, abrangente e participativo das iniciativas denominadas inovadoras [...]”, significando que uma proposta inovadora tem o perfil definido de acordo com o local em que é implantada.

Carbonell (2002, p. 19) coloca como definição aceitável para inovação: “[...] um conjunto de intervenções, decisões e processos, com certo grau de intencionalidade, que tratam de modificar atitudes, idéias, culturas, conteúdos, modelos e práticas pedagógicas”. Essas inovações apresentam, em uma linha renovada, projetos e programas, materiais curriculares, enfim, modificam a dinâmica da escola.

O conceito de inovação educacional, para Canário (2006), é a capacidade de empreender ações articuladas dentro da escola e para a escola, de forma integrada entre seus agentes (alunos, professores e comunidades). Ainda para esse autor, uma inovação que possa ser aplicada na escola deve estar centrada nas ações de mudança e intervenção; para tanto, o foco do fazer educacional precisa estar centrado no ato de aprender e não de ensinar.

Para Canário (2006), as políticas educativas das últimas três décadas foram conduzidas sob o signo da mudança deliberada, assumindo a feição de reformas e inovações. O autor aponta que o frequente insucesso dessas políticas tem a ver com a metodologia vertical e autoritária utilizada. Acredita, ainda, que, para a produção de mudanças qualitativas na escola, supõe-se a possibilidade de fazer dos professores produtores de inovações. Nesse sentido, a produção de uma inovação, em cada escola, assume a forma de um empreendimento coletivo. Carbonell (2002) aponta que as inovações curriculares são frutos de projetos de ensino-aprendizagem que se propõem a fugir de aspectos tradicionais da escola. Chegam mesmo a se tornar profundas mudanças ocorridas em dada instituição, em um determinado contexto, com determinadas finalidades. Para ele, as inovações curriculares são mudanças que, quando desenvolvidas em uma instituição, abrangem todos os níveis educativos, envolvem a comunidade escolar, propõem novas estratégias de ensino e aprendizagem, favorecem a pesquisa, incentivam o uso de novas tecnologias educacionais e proporcionam uma maior contextualização do aluno na sociedade em que vive.

Masetto (2011, p. 17), ao abordar a inovação no Ensino Superior, sustenta que, em um paradigma curricular inovador, qual seja a construção do processo de aprendizagem, é necessário se orientar por alguns princípios, tais como os “[...] da autoaprendizagem e da interaprendizagem, da aprendizagem colaborativa, da aprendizagem por descoberta com

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pesquisa e da aprendizagem significativa [...]”, princípios esses que são perfeitamente aplicáveis à Educação Básica.

O autor assinala que, na atualidade, vinculados ao conhecimento, temos a aprendizagem significativa e o construtivismo (MASETTO, 2011). Tais processos são responsáveis pela proposta na qual o conhecimento precisa ser construído pelo aluno, pois este lhe atribui também um significado pessoal.

A avaliação, nesse contexto, apresenta-se revestida de metodologias que valorizam e propõem a participação do aluno em seu processo de aprendizagem. Nesse sentido, tanto a avaliação como as práticas pedagógicas diferenciadas são fundamentais para que um processo pedagógico inovador possa se consolidar e alcançar seus objetivos.

Para Masetto (2011, p. 18), “os protagonistas de um currículo inovador por excelência são os professores e alunos. Seus papéis, atitudes e desempenho também devem ser modificados para se adaptarem a um currículo inovador”. Com certeza não é uma tarefa fácil, mas tem importância significativa dar continuidade e ampliar a pesquisa e a aplicação nesse campo de estudos.

Masetto (2011) assume que um projeto, para ser inovador, precisa estar centrado na prática docente. Para que essa prática seja trabalhada em conjunto, por todos os professores, é necessário que a escola tenha uma proposta pedagógica coerente, ou seja, que ela seja o registro do planejamento coletivo e de um amplo processo de negociação com todos os atores da escola (gestores, professores, pais, alunos e funcionários).

Nesse mesmo sentido, mas com foco na Educação Básica, Arroyo (2011b) destaca que, para uma proposta apresentar-se como inovadora, é necessário que se valorize o que os professores consideram como mais significativo em suas práticas. Embora o que seja decidido e formulado pelas políticas públicas, como a LDBEN nº 9.394/96, os PCNs e o FUNDEB, permita as inovações na escola, o principal papel nessas inovações escolares está destinado aos professores.

Arroyo (2011b, p. 142) defende que inovação educacional na tradição crítica: “[...] é aquela que nos remete a questões mais amplas, que superam a visão normativa relativa ao que fazer e ao como fazer na escola e na sala de aula”. O autor ainda acrescenta que essas inovações nos remetem “[...] às motivações e às determinações, aos interesses políticos e ideológicos que configuram a construção social da instituição escolar” (ARROYO, 2011b, p. 142). Dessa forma, supera a inocência das análises a respeito das escolas sobre o que transmite e das competências que ensina. Em síntese, supera a inocência do papel do conhecimento social e da cultura transmitida. Nessa perspectiva, o autor aponta que:

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Inovar não significa apresentar modelos curriculares, definir parâmetros e depois treinar professores para que melhor transmitam os conteúdos tidos como mais contemporâneos, como mais adequados às exigências sociais e econômicas. Inovar é, antes de tudo, redefinir os critérios de seleção e de organização dos saberes escolares, mudar concepções, desenvolver nos professores consciência crítica, para que possam questionar o conhecimento tido como oficialmente válido e recriar criticamente os conteúdos que transmitem (ARROYO, 2011b, p. 142).

Para Pacheco (2001, p. 151), “uma inovação curricular está ligada a mudanças que contribuem para a transformação e melhoria dos processos e práticas de ensino-aprendizagem e, consequentemente, para a confirmação do sucesso educativo dos alunos”. O autor coloca como central a seguinte questão: até que ponto as escolas, enquanto comunidades organizadas e educativas, têm autonomia para mudar? Pacheco (2001) ainda aponta a diferença entre o conceito de reforma, que é usado para mudanças estruturais, e o de inovação usual, empregado para as mudanças mais qualitativas.

Carbonell (2002, p. 19), no sentido de estabelecer diferenças conceituais, esclarece que “as diferenças entre inovação e reforma têm a ver com a magnitude da mudança que se quer empreender”, não obstante as inovações se localizem nas escolas e as mudanças digam respeito a um sistema de ensino em seu conjunto.

Em síntese, os conceitos de inovação apontados pelos autores estudados neste trabalho se interagem e se completam. Como o nosso propósito foi o de realizar uma análise do processo de implantação de uma nova Proposta Curricular no estado de São Paulo, identificando fatores facilitadores e dificultadores, a partir da ótica de uma supervisora de ensino, optamos pela concepção feita por Arroyo (2011b), tendo em vista seu pensamento vir ao encontro do nosso propósito de pesquisa, quando defende que a inovação na escola necessita estar muito mais centrada nas práticas educativas, na estrutura, nas relações escolares, nos tempos e espaços, nos rituais que dão concretude aos conteúdos intelectuais e formativos da escola, do que na reforma de conteúdos e programas.