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CAPÍTULO II PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE NO DIREITO PENAL

2.3 Proporcionalidade em sentido estrito

Além da idoneidade e da necessidade da medida, o princípio da proporcionalidade exige ainda que os resultados positivos obtidos superem as desvantagens decorrentes da restrição de um ou outro direito. Deve haver um equilíbrio entre o grau de restrição e o grau de realização do direito contraposto.

Com base no subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito realiza-se uma comparação entre a importância da afetação negativa que a intervenção causa no direito fundamental e a importância da afetação positiva que dita intervenção gera no fim pretendido,

211

GOMES, O princípio da proporcionalidade no Direito Penal, p. 83.

212

GOMES, O princípio da proporcionalidade no Direito Penal, p. 83.

213

GOMES, Luiz Flávio. Direito Penal: parte geral. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, v.2, p. 574.

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MIR PUIG, El principio de proporcionalidad como fundamento constitucional de límites materiales del Derecho penal, p. 1364. In: MATEU, J. C.; CUSSAC, J. J. González; BERENGUER, Orts (directores). Constitución, derechos fundamentales y sistema penal. Valencia: Librería Tirant la Blanch, 2009

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GOMES, O princípio da proporcionalidade no Direito Penal, p. 85.

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Tradução livre do original: “(…) tanto el hecho de recurrir a la amenaza a través de la conminación penal como en su caso la gravedad de la pena ha de justificarse en la necesidad de protección de bienes jurídicos” (AGUADO CORREA, Teresa. Análisis del contenido del principio de proporcionalidad en sentido amplio en Derecho Penal, p. 05. In: El principio de proporcionalidad en Derecho penal. Madrid: Edersa, 1999. Disponível em:<http://vlex.com/vid/298554>. Acesso em: 15 de maio de 2012).

e isto com o objetivo de fundamentar uma relação de precedência entre aquele direito e esse fim217.

E, entre os subprincípios da proporcionalidade, é ao redor do subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito que giram as maiores imprecisões terminológicas na doutrina, e isto por duas razões principais.

Primeiramente porque, embora a doutrina majoritária o considere como um subprincípio da proporcionalidade, parcela minoritária diverge quando à localização da proporcionalidade em sentido estrito.

Alguns autores – por exemplo, Bacigalupo, Jaén Vallejo e Gárcia Rivas - defendem que a proporcionalidade em sentido estrito nada mais é do que uma consequência de raiz constitucional do princípio da culpabilidade. Outros autores – por exemplo, Bustos Ramírez - consideram que a proporcionalidade em sentido estrito integra o princípio da necessidade da intervenção, juntamente com o caráter de ultima ratio e com o caráter fragmentário. Há ainda autores – como Muñoz Conde e García Arán - que afirmam que a proporcionalidade entre delito e pena é uma consequência do princípio da intervenção mínima, bem como há quem o estude – por exemplo, Zugaldía Espinar - dentro da proibição das penas desumanas e degradantes, como limite ao jus puniendi. Por fim, outro grupo de autores – por exemplo, Morillas Cueva e Lópes Garrido - entende a proporcionalidade em sentido estrito como um limite independente218.

Segundo, porque por diversas vezes é apontada a existência de uma superposição entre o princípio da proporcionalidade em sentido estrito e os demais subprincípios da proporcionalidade, principalmente a necessidade, pois todos estão relacionados com a finalidade do Direito Penal. Diante disto, é preciso apontar algumas características da proporcionalidade em sentido estrito que a diferenciam dos demais subprincípios.

Inicialmente, pode-se mencionar que o juízo da proporcionalidade em sentido estrito reveste a forma de ponderação, que é o procedimento adotado para resolver conflitos normativos que não podem ser resolvidos pelos critérios tradicionais (hierarquia, cronologia e especialidade), conflitos estes que ocorrem, por exemplo, quando se está diante de dois ou mais valores constitucionais219.

217

BERNAL PULIDO, El principio de proporcionalidad y los derechos fundamentales, p. 764-766.

218

Correntes de pensamento apresentadas por Aguado Correa (AGUADO CORREA, Análisis del contenido del principio de proporcionalidad en sentido amplio en Derecho Penal, p. 52).

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A atividade ponderativa realizada pelo subprincípio da proporcionalidade pode, segundo Bernal Pulido, ser apresentada por meio de uma estrutura de análise dividida em três etapas. Primeiro é preciso determinar as magnitudes que devem ser ponderadas, isto é, o grau da intervenção no direito fundamental e a importância da realização do fim perseguido. Segundo, é preciso comparar essas magnitudes com o objetivo de verificar se o grau da realização do fim perseguido pela intervenção é maior do que o grau de intervenção no direito fundamental. E, terceiro, é necessário construir uma relação de precedência condicionada entre o direito fundamental e o fim perseguido, e isso com base na comparação efetuada no passo anterior. Quanto maior o grau de não satisfação ou de afetação de um princípio, tanto maior tem que ser a importância de satisfação do outro220.

Ademais, além de ser um subprincípio ponderativo, a proporcionalidade em sentido estrito é também um subprincípio valorativo e de conteúdo material. É um subprincípio valorativo, pois, apesar de pressupor o estudo da relação empírica medida- finalidade que abordam os subprincípios da idoneidade e da necessidade, possui seu campo de aplicação no terreno dos valores, analisando a relação de tensão existente entre os interesses estatais e individuais. E é um subprincípio material porque tem um conteúdo formado por um conjunto de valores e interesses constitucionalmente protegidos que entram em jogo no momento da ponderação, bem como em razão de estabelecer critérios de medição e advertir quais são os valores preferenciais221.

Todavia, quanto a esse aspecto, para Mata Barranco, assim como na idoneidade e na necessidade, também no subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito há a necessidade de atender a considerações utilitaristas e fáticas, bem como é difícil negar os pressupostos axiológicos de que se parte para valorar a idoneidade ou necessidade da medida. Sendo assim, não há como defender uma rígida separação baseada na ideia de que a idoneidade e a necessidade são princípios eminentemente empíricos, enquanto que a proporcionalidade em sentido estrito seria um princípio apenas valorativo/normativo222.

E quando se fala no conceito do subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito em comparação aos demais subprincípios que lhe precederam (idoneidade e necessidade), não é que haja uma distinção de modo confuso na doutrina, mas simplesmente é difícil desvincular totalmente esses três subprincípios. Mais importante do que tentar uma

220

BERNAL PULIDO, El principio de proporcionalidad y los derechos fundamentales, p. 497.

221

GONZALEZ-CUELLAR SERRANO, Proporcionalidad y derechos fundamentales en el proceso penal, p.226.

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distinção exata é estudar esses subprincípios em conjunto, pois só assim se favorece a acepção de um princípio da proporcionalidade em sentido amplo223.

Feitas essas considerações terminológicas do subprincípio da proporcionalidade, cabe agora inserir a análise desse princípio no âmbito penal. Pela proporcionalidade em sentido estrito, entende-se que a violência estatal presente na previsão, na aplicação e na execução da sanção penal não pode ser mais danosa à sociedade do que a conduta que se pretende coibir. O Direito Penal, conforme já mencionado, é a forma mais violenta de intervenção do Estado, e quanto maior é a intervenção maior deverá ser o valor do bem jurídico a ser protegido por esse ramo do Direito.

No âmbito penal o subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito faz referência a uma ponderação entre a privação ou restrição de direitos provocada pela pena e o fim perseguido com a incriminação e com as penas previstas ou impostas224. Uma vez comprovada a idoneidade e a necessidade da medida interventiva, deve-se ainda comprovar o custo da intervenção penal, custo este que não pode apresentar uma limitação de direitos maior do que o benefício que com ela se consegue225.

Assim, no momento de elaboração das normas penais, deverá o legislador penal “ponderar o valor do bem jurídico a ser protegido criminalmente, assim como o desvalor da conduta a ele afrontosa (interesse geral), com o valor da liberdade ameaçada pela previsão legal de pena à prática da conduta (interesse individual)”226

. Feita essa ponderação, cabe a ele estabelecer o quanto se pode restringir de um interesse individual em prol de um interesse geral. Destaque-se que o que se analisa nesse momento da proporcionalidade em sentido estrito não é a possibilidade de sacrificar um direito, mais o quantum desse direito se pode sacrificar227. E, no momento de fixação da pena em concreto, deve o magistrado analisar as peculiaridades do caso concreto, devendo a pena cominada ser proporcional à gravidade do fato praticado.

223

MATA BARRANCO, El principio de proporcionalidad penal, p. 174.

224

MATA BARRANCO, El principio de proporcionalidad penal, p. 167.

225

MIR PUIG, El principio de proporcionalidad como fundamento constitucional de límites materiales del Derecho Penal, p. 1364.

226

GOMES, O princípio da proporcionalidade no Direito Penal, p. 171.

227

3 Relação entre o princípio da proporcionalidade penal e outros princípios próximos

Como já exposto, o princípio da proporcionalidade desempenha importante função no Direito Penal, impondo limites às ações do Estado que afetem direitos fundamentais. Nesse sentido, o princípio da proporcionalidade agrupa as seguintes garantias: a norma penal deve se mostrar idônea à proteção do bem jurídico; a intervenção penal deve ser restringida apenas ao imprescindível, eis que com o seu caráter estigmatizante mostra-se como instrumento capaz de agredir direitos fundamentais; e, em se mostrando realmente necessária a intervenção penal, a sanção prevista e aplicada deve ser escolhida dentre a mínima necessária para a obtenção do fim de proteção do bem jurídico, de modo que a violência estatal aplicada não seja mais prejudicial à sociedade do que a conduta que se pune.

Ocorre que para o alcance dessas garantias é necessário que o conceito e o conteúdo do princípio da proporcionalidade estejam bem delimitados, de modo a não acontecerem confusões no momento de sua aplicação.

Para tanto, para a total concretização do significado da proporcionalidade, torna-se imperativa ainda a análise da relação desse princípio com outros princípios, com destaque para o princípio da igualdade, o princípio da razoabilidade e o princípio da culpabilidade.