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2 CAMINHOS DA ESCOLARIZAÇÃO DO ALUNO COM DEFICIÊNCIA

2.2 PROPOSIÇÕES POLÍTICAS NA DÉCADA DE 1970

A década de 1970 pode ser considerada um dos marcos na Educação Especial, pois nela ocorreram alguns acontecimentos que lhe deram destaque. Foi, também e principalmente, a partir dessa época, por meio do discurso em defesa da normalização e da integração11 que as reformas educacionais passaram a considerar a referida área (JANNUZZI, 2004).

A maior valorização dessa área no contexto das políticas educacionais não pode ser desvinculada das intenções políticas e estratégias formuladas pelo Banco Mundial, que, principalmente a partir do final dos anos de 1980, deveriam ser incorporadas pelas políticas dos países devedores como os do continente latino-americano, nos quais houve aceleração na expansão da educação e aumento de matrícula. Silva (2002) atribui essa situação ao rápido crescimento econômico, ascensão dos governos autoritários, explosão demográfica e êxodo da população que vivia no campo para os centros urbanos, além da “[...] disseminação da melhoria do status social, vinculando-o à educação, e da concepção de que a educação geraria empregos e desenvolvimento econômico” (SILVA, 2002, p. 63).

Entre as estratégias e políticas formuladas pelo Banco Mundial e que deveriam ser incorporadas pelos países devedores, estavam:

11 “As ações que buscam a normalização têm consistido em propiciar às pessoas consideradas com deficiência

condições de vida, tanto quanto possível, similares às das outras pessoas. A integração é um processo que mobiliza esforços de diferentes segmentos sociais, para se estabelecer condições que permitam às pessoas consideradas ‘deficientes’ integrarem-se na sociedade” (CARMO, 2001, p. 93, destaque do autor).

[...] racionalizar os custos para a educação pública, propor reformas curriculares e nos planos de estudos, empregar equipamentos técnicos, desenvolver a instrução programada, além de explorar novas fontes de financiamentos, promover estudos de gestão para melhorar o planejamento e a fiscalização, buscar equilíbrio entre educação e mercado laboral [...] e adotar políticas de racionalização da pirâmide educacional” (SILVA, 2002, p. 64).

Nesse contexto, técnicos da AID juntamente com comissões nacionais, foram responsáveis também pela elaboração da Lei 5.692/71. Essa Lei fixou as Diretrizes e Bases para o ensino de 1° e 2º graus. Nela a Educação Especial foi tratada como um caso da escola regular, pois em seu Artigo nº 9 ficou determinado que:

Os alunos que apresentem deficiências físicas ou mentais, os que se encontrem em atraso considerável quanto à idade regular de matrícula e os superdotados deverão receber tratamento especial, de acôrdo com as normas fixadas pelos competentes Conselhos de Educação (BRASIL, 1971a). Para Jannuzzi (2004), esse artigo aponta para a descentralização administrativa no que diz respeito ao alunado da Educação Especial, que passaria a ser de responsabilidade dos Conselhos estaduais de educação.

Segundo considerações recentes do próprio Governo federal essa Lei, além de não promover a organização de um sistema de ensino capaz de atender as necessidades educacionais especiais, acabou reforçando o encaminhamento dos alunos às classes e escolas especiais (BRASIL, 2008).

Nessa época, no I Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) o governo elegeu a Educação Especial como área prioritária ao elaborar o Plano Setorial de Educação e Cultura (PSEC) para o triênio 1972/1974. Nele a educação foi considerada condição básica para o desenvolvimento auto-sustentado e requisito essencial de uma sociedade democrática, atendendo ao binômio “Segurança e Desenvolvimento” (BRASIL, 1971b).

No PSEC foram fixados objetivos e estratégias para a atuação na Educação Especial, quais sejam: expansão das oportunidades de atendimento aos excepcionais e apoio técnico que possibilitasse o desenvolvimento dessa modalidade de educação. Nele já se evidenciava que a iniciativa particular era a maior responsável pelo atendimento aos deficientes, e ressentia-se da falta de assistência técnica ou financeira para maior produtividade nessa tarefa (MAZZOTTA, 1996).

No II PSEC elaborado no Ministério da Educação e Cultura para o quinquênio 1975/79, foi apresentada uma avaliação geral da situação escolar no País e explicitou-se que,

apesar da expansão do sistema educacional, havia um descompasso entre essa expansão e a demanda por escolarização, pois essa continuava em níveis bem baixos e sendo maior ainda a carência no meio rural. Esse plano colocou a educação como um dos fatores de transformação social, além de instrumento básico para a plena realização do ser humano. A Educação Especial aparece entre as suas prioridades e ações, tendo como objetivo geral garantir a igualdade de oportunidades aos educandos que apresentavam condições especiais de desenvolvimento biopsicológico ou físico. Como objetivo específico, esse plano determinou integrar o excepcional ao sistema regular de ensino, desde que isso fosse possível, oferecendo-lhe condições de acompanhar o processo educativo. Entre suas metas para a Educação Especial, ficaram previstas: a) a ampliação na capacidade de atendimento escolar aos excepcionais; b) a especialização, aperfeiçoamento e atualização dos técnicos e docentes e c) a implantação de cursos de licenciatura na área da educação especial (BRASIL, 1976).

A criação do Centro Nacional de Educação Especial (CENESP), vinculado administrativamente ao Ministério da Educação e Cultura (MEC), em 1973, pode ser considerado o primeiro passo do governo federal para traçar políticas nacionais para a área, tendo em vista que, até sua criação, o que ocorria eram eventos isolados e ações ocasionais no que se refere à educação das pessoas com deficiência (CARMO, 1994). Ele foi o primeiro órgão público, no âmbito federal, responsável pela regulamentação da política nacional relativa à educação dos considerados “excepcionais”.

A finalidade do CENESP era planejar, coordenar e promover o desenvolvimento da educação especial, do ensino pré-escolar ao superior, inclusive o ensino supletivo, para os diferentes tipos de deficiência, alunos com problemas de conduta e os superdotados (BRASIL, 1974).

Esse órgão viabilizou várias ações entre as quais pode ser destacada a formação de recursos humanos (técnicos e professores) das secretarias de educação, das unidades federadas, de instituições especializadas públicas e privadas, do sistema regular de ensino, em cursos de formação e atualização. Muitos professores titularam-se em cursos de mestrado no exterior. Por meio de convênios com universidades federais, foram elaboradas propostas curriculares específicas, com adaptação de conteúdos curriculares e métodos de ensino para os diferentes tipos de excepcionais no ensino de 1º grau, incluindo o aluno com deficiência mental (LIMA, 1998).

No CENESP foi elaborado I Plano Nacional de Educação Especial (I PLANESP) para o triênio 1977/79. Entre os objetivos desse plano estava a de ampliar as oportunidades de atendimento educacional aos excepcionais tanto na escola regular quanto nas instituições

especializadas, em todos os níveis de ensino (BRASIL, 1977). Para Jannuzzi (2004), apesar de esse Plano alegar que a educação dos deficientes se distinguia da regular só nos métodos e técnicas de ensino, em 1979 encomendaram-se “[...] propostas de currículos específicos a algumas universidades, com conteúdos atenuados em relação à educação regular” (JANNUZZI, 2004, p. 158). Além disso, foi recomendada a criação de classe especial em escola comum, salas de recursos, instituições especializadas, internamentos nos casos estritamente necessários, equipe itinerante, oficinas empresas e oficinas pedagógicas (JANNUZZI, 2004).

Nesse período, de fato, o poder público começou a direcionar seu olhar à área da educação especial, principalmente citando-a nos documentos oficiais, mas manteve a concepção de políticas especiais, com ações casuísticas, para tratar da educação de alunos com deficiência. Não se observa a efetivação de políticas públicas com vistas a garantir a universalização do acesso à educação, a qual, em termos de legislação, já havia sido prevista no PND.

Nessa década, apesar da criação de órgão específico para tratar das questões educacionais afetas às pessoas com deficiência, prevaleceu o processo de segregação das crianças e jovens com deficiência, o que com certeza foi fruto da continuidade na falta de compromisso das escolas comuns com a realidade que as cerca.