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Prova testemunhal

No documento Ana Sofia Matias Ferreira Baptista (páginas 31-35)

3.3. Fase de produção de prova e alegações finais e acompanhamento das

3.3.2. Prova testemunhal

Após os esclarecimentos dos peritos ou se não houver lugar a prova pericial, o processo segue com a produção de prova testemunhal. Na maioria dos processos que acompanhei no CAC, se utilizou um figurino semelhante ao do processo judicial, com a inquirição a ser efectuada pelos Mandatários da Parte que apresentou a testemunha e a instância pelo representante da contraparte, sendo ouvidas em primeiro lugar as testemunhas indicadas pela Demandante e, seguidamente, são ouvidas as testemunhas apresentadas pela Demandada. Como

os processos têm matéria de facto muito abundante, este método de produção de prova leva ao prolongamento das sessões de julgamento, que frequentemente duraram vários dias.

Nas arbitragens internacionais, a tendência verificada é para reduzir, na medida do possível, a fase oral do processo de prova, podendo contribuir para a redução do volume de prova a produzir na audiência arbitral. Assim, é muito comum a apresentação de depoimentos escritos pelas partes (witness statements)

27. Os depoimentos escritos poderão ser um substituto do depoimento directo da

testemunha, devendo ser exaustivos nos factos relatados ou poderão servir de preparação do depoimento oral, caso em que apenas deverá conter uma súmula dos factos a relatar28. Encontramos a codificação destas práticas no artigo 4.º das

IBA Rules.

Sendo apresentados depoimentos escritos, cada parte deverá indicar ao tribunal arbitral quais das testemunhas apresentadas pela parte contrária e que produziram depoimentos escritos pretendem contra-interrogar presencialmente. Igualmente, se assim o desejar, poderá o tribunal arbitral solicitar a presença de algum dos depoentes (4.4 IBA Rules).

Os depoimentos escritos deverão conter a identificação da testemunha, bem como a sua relação com as partes e, quando for relevante, uma breve descrição da sua formação e experiência profissional. Mais, deve a testemunha descrever os factos que teve conhecimento, e o modo de obtenção desse conhecimento. Por fim, deve a testemunha concluir afirmando que a informação prestada é verdadeira, assinando e datando o seu depoimento (4.5 IBA Rules).

Num processo institucional a correr termos no CAC, foi acordada a apresentação de depoimentos escritos. Em relação às testemunhas que os apresentassem, foi estabelecida a seguinte tramitação para a prestação de esclarecimentos em audiência: primeiro, o depoente é interrogado pelo apresentante, mas apenas para efeitos de confirmação da autoria e da linha geral do depoimento; de seguida, a contraparte procederá ao interrogatório para exercício do direito de contraditório; após o que o interrogatório é devolvido ao apresentante para esclarecimentos sobre o depoimento prestado em audiência.

27 Ver sobre o assunto Joaquim Shearman de Macedo, Organização do Processo Arbitral, 2013,

pp.25-26.

Regra geral, as testemunhas que apresentam depoimento escrito devem estar disponíveis para comparecerem em audiência do tribunal, especialmente havendo contestação a esse depoimento escrito. As partes podem estabelecer que as testemunhas cujos depoimentos que não tenham contestados pela contraparte não necessitarão de estar presentes em audiência. Salvo esta situação, se a testemunha cuja audição presencial foi requerida pela contraparte ou pelo tribunal arbitral (e havendo sido devidamente notificada para o efeito) não comparecer em tribunal sem apresentar uma justificação válida, o tribunal arbitral deverá desconsiderar o respectivo depoimento escrito (artigo 4.7 IBA Rules).

A contraparte não se encontra obrigada a requerer a presença de uma testemunha que apresentou depoimento escrito, uma vez que tal situação não implicará que o tribunal arbitral tenha de considerar que essa parte deu o seu acordo ou que sancionou o teor do depoimento dessa testemunha (4.9 IBA Rules).

São apontadas como vantagens dos depoimentos escritos a poupança de tempo e a visão mais completa do caso. Consiste, por isso, numa prática muito leal, na medida em que a parte adianta o teor dos depoimentos que sustentaram a sua argumentação do caso e possibilita que a contraparte se prepare melhor para as audiências29.

Num dos processos no CAC onde foram apresentados depoimentos escritos, foram requeridos esclarecimentos de todas as testemunhas que os apresentaram. Na verdade, em audiência as testemunhas não apresentaram apenas esclarecimentos quanto aos seus depoimentos (já de si bem extensos e completos), mas verificaram-se verdadeiras inquirições e instâncias, que perduraram bastantes sessões. Neste caso, os depoimentos acabaram por perder um pouco os efeitos pretendidos, de celeridade e eficácia.

Nos processos que correm termos no CAC é frequente estipular-se a limitação de tempo e/ou o número de audiências para a inquirição das testemunhas. Por exemplo, a limitação pode ser de um ou mais dias destinados para a audição de todas as testemunhas de uma parte e o mesmo número de dias para as testemunhas da outra. Num processo, foi acordado o limite máximo de 15 para as inquirições e instâncias de cada parte, distribuídas ao longo de quatro dias.

Outro método utilizado é estabelecer o número máximo de horas a utilizar por cada parte. Neste caso, cabe ao Secretariado efectuar esse controlo de tempo, cronometrando o tempo utilizado por cada parte nas inquirições e instâncias das testemunhas. Ao tempo dispendido pelas partes, dever-se-á descontar o tempo utilizado pelo tribunal arbitral para colocar as suas questões às testemunhas. No final de cada sessão é contabilizado o tempo utilizado nesse dia, qual o tempo total já despendido pelas partes, sendo que os valores apurados deverão ser incluídos numa tabela de controlo de tempos (que é, posteriormente, entregue às partes no início da sessão seguinte).

Quando as testemunhas se expressarem em língua diversa da do processo e que, salvo acordo em contrário, careçam de tradução, nalguns processos foi estipulado que as partes providenciariam pela respectiva tradução. Geralmente a tradução pode seguir uma de duas vias, a interpretação consecutiva (a única via que acabei por presenciar, em mais do que uma ocasião), onde o intérprete é um apoio o importante pois ouve o orador traduzindo sucessivamente tudo o que é dito ou a interpretação simultânea, onde os intérpretes traduzem simultaneamente o discurso da testemunha para a língua do processo. Para tal é necessário (um conjunto de) o apoio de equipamento áudio adequado, designadamente, cabinas insonorizadas e adequadamente equipadas para os intérpretes e auscultadores para a audiência.

Um outro exemplo, o Demandado num processo pretendia chamar a depor duas testemunhas inglesas. Uma delas não compareceu na sessão, por um motivo de força maior a si não imputável. Deste modo, requereu o Demandado que lhe fosse dada uma nova oportunidade para ouvir a testemunha, por se revelar muito importante para a sua defesa. Por acordo, foi estabelecido que o depoimento da testemunha seria prestado naquela sessão, através de vídeo-conferência por Skype. Contudo, notou o Demandante que a testemunha cuja audição foi requerida não constava do rol de testemunhas apresentado pelo Demandado, pelo que se opôs ao seu depoimento. O Demandado prescindiu, assim, do depoimento da testemunha via Skype.

Também num processo cujas audiências de produção de prova acompanhei, assisti à acareação entre duas testemunhas, a requerimento do Demandante, e cujos depoimentos haviam sido contraditórios quanto as três questões específicas.

No documento Ana Sofia Matias Ferreira Baptista (páginas 31-35)