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1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

1.3. A Psicologia Ambiental e o projeto do edifício escolar

Embora o edifício escolar seja construído intencionalmente para abrigar os processos de ensino e aprendizagem de crianças e jovens, frequentemente o espaço de sala de aula é aceito sem discussão por aqueles que o planejam e por quem o usa. De um lado, os projetistas não têm critérios adequados para verificar a eficiência da sala de aula, devido à dificuldade de acesso a informação; do outro, alunos e professores tendem em adotar uma atitude fatalista com relação aos edifícios escolares (SOMMER, 1973).

No entanto, as pesquisas da Psicologia Ambiental - que têm como objeto de estudo o espaço físico escolar - podem mudar essa realidade, pois são detentoras de dados e informações valiosas para o projetista. Se aplicadas ao processo de projeto do edifício escolar, as informações relacionadas aos conceitos da Psicologia Ambiental são capazes de subsidiar mudanças que contribuam para a concepção de espaços escolares mais seguros, acolhedores e humanos, colaborando para tornar o aprendizado mais eficiente e prazeroso.

De acordo com Lawson (2001), o espaço físico exerce influência sob seus usuários por meio de uma linguagem não verbal, a linguagem do espaço. Esta é utilizada pelos usuários para indicar valores, estilo de vida, controlar a proximidade de outros ou promover aglomerações, demonstrar dominação ou submissão, bem como status social. Em outras palavras, o meio físico, atuando de modo não verbal, provoca impacto direto e simbólico sobre seus ocupantes, facilitando e/ou inibindo comportamentos (ELALI, 2003). Partindo desse pressuposto, é possível afirmar que os vários fatores que compõem o espaço escolar como ruído, luz, densidade humana, arranjos de layout e tamanho da edificação escolar podem influenciar positiva ou negativamente o ensino, a aprendizagem e o bem- estar de alunos e professores (GIFFORD, 1996, WALDEN, 2009).

Para tanto, é preciso ter consciência de que os estímulos requeridos pelos usuários podem variar de pessoa para pessoa, mudando, também, de acordo com o humor ou com a idade. Consequentemente, é praticamente impossível produzir um ambiente considerado ideal para todos (LAWSON, 2001; WALDEN, 2009; GIFFORD, 1996). O espaço escolar não foge a essa regra, pois é sabido que não existe um ambiente de aprendizagem ótimo; porém, é possível sugerir algumas orientações gerais que afetam positivamente o desempenho e a percepção do usuário em um ambiente de aprendizagem agradável. Esses direcionamentos incluem a geração de níveis médios de estímulos e a eliminação de fatores

causadores de estresse, distúrbios, distrações e fadiga. Todavia, é importante ressaltar que não é possível garantir um retorno integral no aprendizado, uma vez que esse depende, também, de outros fatores como a capacidade cognitiva do estudante, a motivação, a personalidade e as condições sociais da família (WALDEN, 2009).

As orientações da Psicologia Ambiental que podem contribuir para a concepção de espaços escolares com mais qualidade afetam o projeto logo no início, quando se busca a resposta para a pergunta: qual o tamanho ideal para uma escola? Investigações chegaram a um número de estudantes adequado para uma instituição escolar. Pesquisadores como Taylor (2009) e Moore & Lackney (1994) afirmam que o número de alunos deve variar entre 300 e 400 para o ensino fundamental e entre 400 e 800 para o ensino médio. Esse limite de estudantes permite que a escola personalize os espaços onde o aprendizado ocorre e desperte o sentimento de comunidade entre os usuários. Além do mais, outros estudos evidenciam pontos positivos que foram associados às escolas pequenas. Nestas, por exemplo, os alunos aprendem mais por meio da sua participação no processo de ensino e aprendizagem, pois possuem mais tempo para se envolver em atividades extracurriculares; enquanto os alunos de escolas grandes aprendem mais como ouvintes, pois, apesar de terem a sua disposição uma variedade maior de atividades extracurriculares, possuem tempo limitado (GIFFORD, 1996). Pesquisas têm associado, também, pequenas escolas às atitudes positivas de alunos, como baixa incidência de problemas de vandalismo, comportamento agressivo e gangues. (LIPPMAN, 2010; KOWALTOWSKI, 2011).

A recomendação de construção de escolas pequenas e médias está associada à necessidade de despertar no usuário o senso de identidade, pois todo indivíduo precisa se sentir pertencente e se identificar com lugares exclusivamente seu ou pelo menos associado (LAWSON, 2001). No espaço escolar, o sentimento de identidade tem um papel de extrema importância, uma vez que os estudantes passam boa parte do tempo na escola. A identificação com o lugar pode acontecer por meio de duas vias: positiva ou negativa. Quando a identificação é influenciada por ligações afetivas, a apropriação assume características positivas, refletindo-se em atitudes de respeito para com o ambiente. Mas, essas relações também podem envolver sensações como alienação e segregação, assumindo características negativas como invasões, vandalismo e abandono. No que diz respeito à escola, o vandalismo é uma forma negativa de apropriação do espaço institucional (FELIPPE, 2010; ELALI, 2011); por isso, os alunos devem se identificar com o espaço, sentir-se bem,

amar a escola como amam suas próprias casas (WALDEN, 2009). Dentro desse contexto, pesquisadores recomendam despertar no usuário o sentimento de pertencimento do lugar por meio da participação nas decisões importantes sobre os ambientes que utilizarão futuramente. Tal atitude promove a ratificação da identidade pessoal e de grupo, o senso de comunidade e de pertencimento do lugar e a motivação para cuidar do espaço (FELIPPE, 2010).

O conceito de territorialidade aplicado ao espaço escolar também pode trazer muitos benefícios para o planejamento do ambiente de aprendizagem. A territorialidade pode ser entendida como um modelo de comportamento e atitude que envolve um único indivíduo ou um grupo de pessoas e está relacionado ao controle efetivo de um espaço físico (GIFFORD, 1996). A ideia de territorialidade está vinculada a outros tipos de comportamento como personalização, dominação e controle que são, geralmente, comportamentos passivos. Vale ressaltar, também, que “o território não é algo estável, mas depende de acordos sociais entre o detentor de direito e os que respeitam, ou não, esses direitos” (GÜNTHER, 2003, p.278). Pesquisas indicam que indivíduos mais territoriais tendem a personalizar e ser mais apegados ao seu território. O ato de personalizar, por sua vez, define um espaço territorial por marcas pessoais que indicam pertencimento. É um mecanismo de regulação do contato social, a serviço da defesa da identidade pessoal (KUHNEN, et al., 2010). Assim, ao se proporcionar às pessoas a possibilidade de personalizar o ambiente que vivenciam, é possível aumentar os níveis de satisfação, o bem-estar, a autoestima e, também, auxiliar no controle do estresse, pois possibilita adaptar o espaço às características do usuário (FELIPPE, 2010). Tal atitude pode, ainda, conduzir ao aumento da responsabilidade, cuidado e preservação do espaço físico, diminuindo a ocorrência de vandalismo. (FELIPPE, 2010; ELALI, 2011; CABE, 2004).

Estudos sobre a densidade humana no ambiente escolar esclarecem e orientam quanto aos problemas relacionados à superlotação nas salas de aula. O conceito da densidade humana da Psicologia Ambiental pode ser entendido como uma experiência espacial de restrição causada por outra pessoa, envolvendo dimensões emocionais e comportamentais (GIFFORD, 1996). De acordo com Gifford (1996), a sensação de estar em um lugar aglomerado não se limita a um espaço lotado de pessoas. Pode ser uma questão pessoal ligada à personalidade de cada um, atitudes, expectativas, normas, humor, cultura e

gênero. Por exemplo, mulheres, geralmente, tem maior controle em lugares com alta densidade.

No que diz respeito ao edifício escolar, a Psicologia Ambiental já constatou que a superlotação na sala de aula, ou alta densidade humana, afeta negativamente a educação, por vários motivos (KOWALTOWSKI, 2011), entre eles:

 Reduz as possibilidades de atividades e experiências diversificadas entre os alunos

 Reduz as possibilidades de agrupamentos desejáveis para atividades educacionais específicas.

 Aumenta a probabilidade de problemas de comportamento agressivo.  Diminui a interação e o envolvimento entre os alunos.

Por outro lado, pesquisadores verificaram, também, que em salas de aula com poucos estudantes, os professores têm mais oportunidade de interagir com os alunos, podendo proporcionar ricas e diferenciadas interações, formar grupos de aprendizagem e variar as estratégias de ensino. Tudo isso, consequentemente, tende a aumentar a desempenho do aluno (MARTIN, 2004). Outros estudos que focaram na relação entre número de usuário por metro por quadrado, podem auxiliar o projetista a responder perguntas como: qual o número de alunos adequado para cada ambiente de aprendizagem? Scott-Webber (2009) organizou um quadro com a relação pessoa/m² de vários ambientes escolares mostrados na Figura 2. Conhecer tal informação contribui para o trabalho do arquiteto no que diz respeito ao dimensionamento dos espaços, evitando superlotação.

Aplicar os parâmetros de área no dimensionamento dos espaços colabora para preservar o espaço pessoal de cada indivíduo. Esse conceito da Psicologia Ambiental pode ser entendido como limite invisível, cercando o corpo de uma pessoa no qual intruso não é permitido (GÜNTHER, 2003). Dentro do contexto escolar, o espaço pessoal permite ao aprendiz definir seu espaço como, por exemplo, um lugar para guardar seus pertences ou trabalhos (LIPPMAN, 2010).

Figura 2 - Parâmetros de área de ambientes de aprendizagem

Fonte: baseado em SCOTT-WEBBER, 2009.

Preservar o espaço pessoal do aluno é, também, contribuir com a sua privacidade, geralmente esquecida nos ambientes escolares. Walden (2009) explica que crianças e jovens não só têm necessidade de privacidade como, também, a falta dela pode provocar comportamentos agressivos. Outro fato importante, é que a necessidade de privacidade aumenta em concordância com a idade do indivíduo (WALDEN, 2009). Ao conhecer tais informações, o projetista passa a ter consciência da importância - principalmente nos anos finais do ensino fundamental - em planejar espaços que permitam ao aluno ter privacidade dentro da escola. Por exemplo, ambientes para descanso dentro e fora da classe ou áreas dentro da sala de aula - onde um indivíduo - possa ter relativa privacidade (Nair et al., 2009).

Os elementos que compõem as condições espaciais de um cômodo - como iluminação, cor, temperatura ambiente, ventilação, acústica, objetos e equipamentos - também já foram objetos de estudo da Psicologia Ambiental. Tais pesquisas comprovaram que um planejamento adequado desses elementos proporciona bem-estar aos usuários e pode influenciar, significativamente, a disposição para aprender (WALDEN, 2009). Por exemplo:

 A luz natural proporciona aos usuários o bem-estar físico e mental, por isso é importante que ela seja sempre a principal fonte de luz na escola, sendo

complementada pela luz artificial (BARRETT e ZHANG, 2009, KOWALTOWSKI, 2011, NAIR et al., 2009);

 O planejamento incorreto envolvendo luz e cor pode acarretar nervosismo e irritação nos usuários (BARRETT e ZHANG, 2009);

 Uma sala de aula que não tem boa acústica - ou possui problemas com ruído de origem externa ao cômodo - pode interferir no desempenho do aluno. Uma percepção confortável e clara de uma sala de aula livre de ruído não só melhora a comunicação, mas, também, promove a eficiência do aprendizado (BARRETT e ZHANG, 2009; DUDEK, 2007).

 Equipamentos e móveis com dimensionamento adequado à faixa etária da criança são importantes para a sua segurança e desenvolvimento saudável; como, também, para promover o senso de independência (WALDEN, 2009). No que diz respeito aos móveis, além das qualidades ergonômicas, deve-se considerar a mobilidade, a funcionalidade e a estética. Gifford (1996) relata a importância de uma sala de aula ser atraente, confortável e com equipamentos interessantes, pois quando um estudante percebe seu ambiente de aprendizagem como o melhor, ele demonstra mais interesse pela ciência. Por outro lado, materiais ou equipamentos em número insuficiente - ou velhos - podem despertar entre os alunos mais novos o sentimento de competição e até agressão entre eles. Entre os estudantes com mais idade, tal condição pode provocar apatia ou falta de interesse (GIFFORD, 1996).

É importante, também, que o arquiteto tenha consciência de que alguns arranjos de layouts podem incentivar as interações sociais - os arranjos sociopetais - enquanto outros podem inibir - os arranjos sociofugais. A Figura 3 apresenta uma matriz, de autoria de Scott- Webber (2009), com configurações para ambientes com vários níveis de interação adequados às diferentes necessidades e objetivos da atividade. Ao conhecer os conceitos de arranjos sociopetal e sociofugal - e a sua importância para planejar layouts adequados às atividades -, o projetista agrega qualidade ao espaço escolar. De acordo com Gifford (1996), uma boa sala de aula constrói-se em congruência com o tipo de matéria que será ensinada, com os objetivos da classe e das características do aprendiz.

Figura 3 - Matriz: Colaboração X Ambiente de aprendizagem

Fonte: baseado em SCOTT-WEBBER, 2009.