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PSICOLOGIA EXPERIMENTAL E A PSICOMETRIA

No documento Tiago Lopes de Oliveira (páginas 79-83)

RACIONALIDADE TECNOLÓGICA

A) PSICOLOGIA EXPERIMENTAL E A PSICOMETRIA

De acordo com Goulart (1987), no início do século XX, o pensamento quantificador passou a constituir uma característica essencial da Psicologia. O modelo das ciências naturais, que inspirou o uso do controle na ciência do comportamento humano, sugeriu também o interesse pelas leis universais, aplicáveis a todos os sujeitos que experimentavam um fenômeno psicológico. Para Goulart (1987, p. 16):

Assim, enquanto a Psicologia Experimental tentava descobrir os padrões universais de realização (as uniformidades) e considerava as diferenças de resultados como “erros” do instrumento ou da situação, a função da Psicometria consistia na avaliação das diferenças entre os indivíduos ou entre as reações de um mesmo indivíduo em momentos diversos.

A autora enfatiza que os testes constituem os principais instrumentos da Psicologia e que seu amplo desenvolvimento está associado a três necessidades

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fundamentais: i) a caracterização da normalidade e a consequente identificação da excepcionalidade, no caso da inteligência, ou da identificação de algumas variáveis, no caso da psicopatologia; ii) o melhor aproveitamento dos recursos humanos durante a guerra, tendo em vista suas aptidões ou seu equilíbrio psicológico; iii) a divisão do trabalho na indústria e a consequente necessidade de se adequar o homem ao trabalho.

Goulart (1987) indica que, na Europa, foi a busca de um padrão de normalidade o elemento impulsionador do desenvolvimento dos testes. Já, nos Estados Unidos, se faz sentir a influência dos dois grandes conflitos mundiais sobre o desenvolvimento da Psicologia e dos testes psicológicos. A Primeira Grande Guerra (1914-1918) consagrou os testes de inteligência e de aptidões específicas, que se mostraram úteis à seleção e orientação de homens convocados pelas forças armadas. A Segunda Guerra (1940- 1944), devido a outros fatores, fez com que a preocupação se deslocasse da detecção de aptidões para aspectos relacionados à personalidade, às relações sociais, ao equilíbrio emocional ou ao moral dos combatentes. Assim, têm origem os testes projetivos, escalas de atitudes e outros recursos que abriram caminho para o estudo da personalidade. Outro importante fenômeno impulsionador do desenvolvimento da Psicometria foi a evolução da produção industrial. Goulart (1987, p. 19) assevera que:

Quando o processo de produção de mercadoria evolui da manufatura para a instalação da grande indústria, algumas consequências se tornaram bem evidentes; a primeira foi a nítida separação entre trabalho manual e trabalho intelectual, com evidente vantagem do segundo, já que a máquina contém na sua estrutura a definição de sua forma de utilização; a segunda, que decorre da primeira, é a instituição da figura do trabalhador coletivo em substituição ao trabalho individual, que devia ter todas as habilidades requeridas pela tarefa.

Goulart (1987) também descreve os cenários do aparecimento dos testes nos países que foram referência para sua evolução – Alemanha, Inglaterra, França e Estados

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Unidos. De tais cenários descritos, a seguir serão apresentados de forma sintética e ilustrativa as suas principais características com intuito, de ilustrar a história dos testes:

a) Alemanha (a psicologia experimental como suporte da psicometria): nascimento da Psicologia Experimental, 1879, no Laboratório de Leipzig; respeito pelo método experimental e a precisão da técnica certo número de delineamentos experimentais e técnicas estatísticas que puderam ser adaptadas aos problemas de medição psicológicos. No Laboratório de Leipzig formou-se toda uma geração de psicólogos e se desenvolveram centenas de trabalhos experimentais;

b) Inglaterra (a quantificação das avaliações): profunda preocupação pelo estudo das diferenças individuais e a invenção de técnicas estatísticas e instrumentos que possibilitaram quantificar a avaliação psicológica; a Psicologia Experimental viveu seu maior progresso na Inglaterra, graças a Francis Galton e Charles Darwin; ênfase nas teorias evolucionistas que postulavam a hereditariedade biológica e psicológica;

c) França (o nascimento dos testes de inteligência): Alfred Binet (1857- 1911) é considerado o principal representante da Psicometria na Europa; a Psicologia Experimental deveria estudar os processos superiores, como o pensamento e a inteligência; sugestão de que fosse medido o nível mental por meio de testes, com o intuito de avaliar a inteligência e classificar os indivíduos, o que é a base dos métodos quantitativos;

d) Estados Unidos (formalização dos testes): fusão da Psicologia Experimental com o uso dos testes psicológicos; diferenciação entre experimentação e teste, sendo a primeira aquela que permite a descoberta da natureza de uma função psíquica, seus mecanismos e as leis que a regem, e o segundo, o instrumento que permite calcular em que medida um sujeito possui uma função em relação à média do grupo de indivíduos submetidos ao mesmo teste; criação dos testes para recrutamento

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de homens para a guerra; utilização dos testes de inteligência em pesquisas comparativas10.

No entanto, para Goulart (1987) é imprescindível uma visão crítica sobre a influência da Psicometria e da Psicologia na Educação. Para a autora, a avaliação psicológica não é somente um problema técnico, uma vez que os padrões de estimativa e pressuposições a seu respeito depende de pressuposições mais amplas acerca do comportamento e propósitos humanos. A maioria das críticas aos testes derivam do uso que deles é feito ou das limitações impostas à quantificação de seus resultados. Segundo Goulart (1987), no contexto em que são aplicados e analisados os testes, a influência do meio social, da instrução e de outros fatores aos quais se submete a pessoa é incorporada ao conceito de inteligência. Desse modo, a influência de variáveis como fatores socioeconômicos, a alimentação, a habitação, as oportunidades de receber instrução ou o fato de pertencer a grupos minoritários, é escamoteada, e os resultados são atributos naturais e individuais de cada um. O uso de testes abre caminho, portanto, para a localização dos marginais do sistema. A autora destaca ainda que os testes, no que diz respeito aos objetivos para orientação e seleção de pessoas (guerra, trabalho, etc.), obedecem a raciocínio similar, ao localizar o lugar ocupado por um indivíduo na estrutura das ocupações em função da avaliação de seu desempenho, tomando como referência o padrão de distribuição de resultados estatísticos. E, dessa forma, os testes têm recebido críticas pelo seu papel de legitimadores da organização social. Além disso, os procedimentos padronizados de medição psicológica têm fomentado atitudes e métodos discriminativos.

Goulart (1987), ao pensar sobre a apropriação da Psicologia Experimental pela Psicologia da Educação, observa que esse fato se deu de maneira artificial e imprópria.

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A autora alerta que a Psicologia Experimental está ligada à evolução da Biologia e utiliza como método os mesmos procedimentos utilizados nas ciências biológicas. Além disso, enfatiza o caráter fisiológico dos elementos que investiga. Já a Psicometria exerceu de modo mais marcante sua influência sobre a educação, e vale lembrar que os testes de inteligência surgiram exatamente de uma necessidade educacional e ofereceram uma explicação “científica” para o insucesso escolar. Ainda conforme a autora, deve-se descortinar o caráter ideológico da apropriação da Psicometria pela escola, ao reconhecermos que ela veio para justificar a divisão de classes, ao evidenciar que os mais bem dotados eram realmente os que pertenciam aos grupos socioeconômicos mais elevados (classe dominante). Com isso, a Psicometria contribuiu não só para reproduzir na escola a estrutura social mais ampla, mas, sobretudo, para perpetuar essa estrutura. E ela, ao apregoar a objetividade da medida psicológica e supervalorizar a Estatística aplicada às ciências humanas, abriu espaço para as medidas educacionais na escola. Assim, a avaliação educacional, visando o máximo de objetividade, tem também um sentido oculto, que é o controle do comportamento.

Por fim, Goulart (1987, p. 34) observa que:

Respeitadas as limitações da Psicologia Experimental e da Psicometria, principalmente quando se analisa seu caráter ideológico, ambas as tendências e, de modo singular, a Psicometria, tiveram lugar de destaque na educação, despertaram para as diferenças individuais e grupais e ainda constituíram, durante certo período, o que se convencionou chamar Psicologia da Educação.

B) O COMPORTAMENTISMO E A PSICOLOGIA FISIOLÓGICA

Para entendermos a influência das teorias psicológicas comportamentais na educação, faz-se necessário um resgate do percurso histórico da própria ciência

No documento Tiago Lopes de Oliveira (páginas 79-83)