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II. ADOECIMENTO PROFISSIONAL: ESTUDO DE CASO DA

2.1 O mundo do trabalho

2.1.6 Qualidade de vida no trabalho docente

Durante muito tempo, os ativos tangíveis foram objetos de preocupações das organizações. A competitividade estava associada à estrutura física e ao tamanho da empresa. Entretanto, o conhecimento desenvolvido e mantido pelas

instituições tornou-se o diferencial competitivo. A preocupação com as pessoas passou a ser objeto de estudos, para promover o desenvolvimento do capital humano, além da necessidade de se transformar o ambiente de trabalho em um local mais agradável.

A visão humanista, na Teoria da Administração, teve seus primórdios como os estudos de Mary Parker Follet e ganhou força a partir dos experimentos da

Western Electric, com Elton Mayo (1927 a 1932) e do Tavistock Institute, com Eric

Trist (a partir de 1949), configurando, assim, a origem da escola sociotécnica. Para Follet, a unidade da sociedade não se encontrava nos indivíduos, mas nos grupos sociais dos quais pertencem, formam a identidade e desenvolvem o potencial humano (MOTTA; VASCONCELOS, 1996).

Destacam-se, também, os estudos, realizados por: Herzberg, em 1968, (satisfação no trabalho e motivação); Mc Gregor, em 1980, (teorias X e Y) e Argyris (maturidade - imaturidade). Esses autores, em geral, partiram dos conflitos instaurados nas relações de trabalho da administração científica, em direção a humanização nas organizações (VELOSO; SCHIRRMEISTER; LIMONGI-FRANÇA, 2007).

O termo Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) foi introduzido por Louis Davis, (UCLA, Los Angeles), no início da década de 1970, em contribuição à escola sociotécnica. Para Veloso, Schirrmeister e Limongi-França (2007), mesmo não sendo consenso conceitual, a QVT nasce da abordagem comportamental e surge como uma resposta ao taylorismo, com o objetivo de equilibrar as relações de trabalho e proporcionar bem-estar e participação dos funcionários no processo decisório.

Contudo, a concepção de QVT data da década de 1950, com o surgimento da abordagem sociotécnica. Tida como uma variável era compreendida como uma reação do indivíduo ao labor, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida no trabalho. Na década de 1960, foi compreendida como uma abordagem, buscando uma melhor organização de trabalho e a minimização dos efeitos negativos do emprego na saúde do trabalhador. Passou a ser um método até meados da década de 1970, ao conceber técnicas para melhoria do ambiente organizacional, para torná-lo mais produtivo e satisfatório (CYRINO, 2014; MORETTI, 2008). Transformou-se um movimento, a partir da “preocupação com a competitividade internacional e o grande sucesso dos estilos e técnicas gerenciais

dos programas de produtividade japonesa, centrado nos empregados” (MORETTI, 2008, p. 3).

A QVT evoluiu das questões legislativas para as estratégicas envolvendo qualidade pessoal, qualificações profissional e cultural, planejamento, trabalho voluntário, cidadania, significado do trabalho, comunicação, produção e mercado. Na maioria destes caminhos verifica-se a discussão das condições de vida e bem-estar de pessoas, grupos, comunidade e até

do próprio planeta em sua inserção no universo. (VELOSO;

SCHIRRMEISTER; LIMONGI-FRANÇA, 2007, 4).

A evolução conceitual da QVT apresentada pelos autores Veloso, Schirrmeister e Limongi-França (2007), encerra uma percepção na totalidade, em que empregadores e empregados compõem um todo social. É a criação de um ambiente no qual as pessoas se sintam bem entre seus pares, com seus gestores e consigo mesmas. O foco centra no bem-estar e no que pode ser feito para atender as expectativas de todos os atores envolvidos no processo produtivo, pois a qualidade de vida no trabalho impacta na produtividade das pessoas e nos resultados das organizações.

Várias são as definições de QVT. Os conceitos variam da medicina (ausência de doenças) à solicitação de recursos (equipamentos e procedimentos)33 para atendimento das diversas demandas do coletivo. Albuquerque e Limongi- França (1998) a definem como:

um conjunto de ações de uma empresa que envolve diagnóstico e implantação de melhorias e inovações gerenciais, tecnológicas e estruturais dentro e fora do ambiente de trabalho, visando propiciar condições plenas de desenvolvimento humano para e durante a realização do trabalho. (ALBUQUERQUE; LIMONGI-FRANÇA, 1998, p. 41).

Limongi-França (1997) situa que o conceito da QVT advém da medicina psicossomática, pois o ser humano é um complexo biopsicossocial, ou seja, possui potencialidades biológicas, psicológicas e sociais que reagem às condições de vida. Essa compreensão do homem revela a concepção holística do ser humano, em contraposição à visão compartimentada. Tal conceito constitui o elo fundamental da Qualidade de Vida no Trabalho, pois homem é um todo harmônico (ALBUQUERQUE; LIMONGI-FRANÇA, 1998).

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Diversas Ciências têm dado contribuições para o desenvolvimento da Qualidade de Vida no Trabalho. Dentre elas se destacam: Saúde, Ecologia, Ergonomia, Psicologia, Sociologia, Economia, Administração e Engenharia.

Veloso, Schirrmeister e Limongi-França (2007), apontam os trabalhos de Walton (1973), Westley (1979) e Lippit (1978) como os mais modernos e abrangentes.

Walton (1973) estabeleceu oito categorias conceituais, para avaliar a qualidade de vida no trabalho. Esses são os critérios elencados pelo autor: compensação justa e adequada; segurança e saúde nas condições de trabalho; oportunidade imediata para uso e desenvolvimento da capacidade humana; oportunidade futura para o crescimento e segurança continuados; integração social na organização do trabalho; constitucionalismo na organização do trabalho; trabalho e o espaço total de vida; e a relevância social do trabalho na vida (WALTON, 1973 apud CYRINO, 2014).

Westley (1979) apud Veloso, Schirrmeister e Limongi-França (2007) agrupou em quatro os obstáculos que interferem na QVT a saber:

Políticos: sentimento de insegurança no emprego;

Econômicos: sentimento de injustiça no sistema de recompensas; Psicológicos: ausência de auto-realização, levando à alienação;

Sociológicos: ausência de participação nas decisões, gerando anomia. (WESTLEY, 1979 apud VELOSO; SCHIRRMEISTER; LIMONGI-FRANÇA, 2007, p. 6).

Por sua vez, Lippit (1978) apud Veloso, Schirrmeister e Limongi-França (2007) reagrupou os oitos critérios de Walton (1973) em trabalho em si; indivíduo; produção do trabalho; funções e estrutura da organização.

Em geral, a QVT é um instrumental que busca conceder atratividade aos cargos, para aumentar os níveis de motivação e bem-estar dos trabalhadores.

No cenário educacional, não poderia ser diferente. Como os demais trabalhadores, o professor vive os paradigmas dos novos modos de vida e demanda por qualidade de vida no trabalho, pois a atividade docente sofreu os reflexos das transformações ocorridas no mundo do trabalho, a partir dos estudos de Taylor. Tais transformações influenciaram reformas educacionais e modelos pedagógicos propostos pelas políticas estatais.

Novas demandas foram incorporadas ao processo de ensino- aprendizagem e, gradativamente, o professor assumiu outras funções inerentes à sua profissão. Podem ser citados, como plus às funções docente, a construção de hábitos de saúde, o assessoramento psicológico, e o envolvimento com os problemas sociais e familiares dos alunos. Somam-se ainda o excesso de tarefas

burocráticas, falta de autonomia e infraestrutura do ambiente escolar e a baixa remuneração.

Para Rocha e Fernandes (2008), efeitos adversos emergem do contexto no qual os docentes se encontram, proporcionando-lhes um conjunto de mal-estares e influenciando na qualidade de vida dos trabalhadores em educação. Para os autores, dois são os aspectos relevantes dentro do conceito de qualidade de vida: a subjetividade e a multidimensionalidade. Essa se refere ao reconhecimento de que o construto é composto por diferentes dimensões. Enquanto que aquela considera a percepção da pessoa sobre o seu estado de saúde e sobre os aspectos não médicos do seu contexto de vida.

Nessa perspectiva, a saúde do professor deve ser trabalhada coletivamente, no ambiente escolar, sem, contudo, perder a noção de saúde individual.

O professor, portanto, deve ser capacitado a cuidar de si e agir em grupo na defesa da promoção de qualidade de vida, devendo perceber a escola como espaço de humanização e promoção de saúde, onde as práticas educativas não devam se limitar às tradicionais ações pedagógicas, e, sim, a possibilitar também as transformações individuais e sociais. (ROCHA; FERNANDES, 2008, p. 24).

Nesse contexto, além de se adaptar às características dos processos laborativos, o professor passou a preocupar-se não só com as funções docentes, mas com sua carreira, com segurança, com salário. Assim, a redução do mal-estar e do excessivo esforço no trabalho passou a incorporar as reivindicações dos profissionais da educação e a compor a rotina de preocupação dos gestores da educação.