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A qualificação profissional das pessoas com deficiência intelectual: o reconhecimento das Inteligências Múltiplas e da Capacidade Plena

2. A PESSOA COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL E SUA QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL

2.2. A qualificação profissional das pessoas com deficiência intelectual: o reconhecimento das Inteligências Múltiplas e da Capacidade Plena

Constata-se que um aumento na inclusão laboral das pessoas com deficiência vem ocorrendo nos últimos anos, apesar do elevado número de pessoas com deficiência intelectual no Brasil e da menor contratação de pessoas com deficiência desse tipo para o trabalho.

Como visto, a crescente contratação deve-se muito à fiscalização da Lei de Cotas pelo MTE. Entretanto, a falta de qualificação profissional e a baixa escolaridade das pessoas com deficiência assomam como principais argumentos empresariais a favor do descumprimento da lei.

Entre outros argumentos, talvez menos frequentes, destaca-se a polêmica notícia divulgada pela Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais - FIEMG. Polêmica, dentre outros motivos, por afirmar que muitas pessoas com deficiência não se interessam por ingressar no mercado de trabalho devido ao cancelamento do BPC/LOAS e, mais, por fazerem apologia da flexibilização da Lei de Cotas, apresentando propostas como a diminuição dos percentuais atuais e a acumulação da cota aprendiz com a de deficiente:

Igualmente, entendemos que a legislação de proteção aos trabalhadores com deficiência é absolutamente necessária e deve ser preservada. No entanto, para que efetivamente produza os resultados a que se propõe, deve ser revista para se adequar à realidade do mercado de trabalho. Ao estabelecer os percentuais de vagas a serem reservadas aos trabalhadores com deficiência, o legislador considerou a existência de um contingente de aproximadamente 10% da população brasileira, com base em estudos da Organização Mundial da Saúde (OMS), respaldados pelo censo demográfico do IBGE de 2000, que dimensionou em 24,6 milhões o número de pessoas com estas características. [...] Porém, ao considerar as pessoas com deficiência em idade ativa para o trabalho, entre 15 e 59 anos, este número cai para 15 milhões de pessoas - uma redução de aproximadamente 40%. Indo além e considerando-se apenas aqueles que preenchem os critérios estabelecidos pela Lei 8213, o número reduz-se,

drasticamente, para 3,2 milhões, o que significa 1,47% da população, de acordo com estudos da Federação das Indústrias de Minas Gerais/Instituto Euvaldo Lodi. Deste percentual, já reduzido, uma grande parcela não se interessa em ingressar no mercado de trabalho, optando pelos programas sociais governamentais, entre eles o Benefício de Prestação Continuada - o BPC, que lhes assegura renda mensal de um salário mínimo - e também pelas aposentadorias por invalidez concedidas pelo INSS. [...] Diante da importância do tema, o Instituto Euvaldo Lodi (IEL), instituição integrante do Sistema Fiemg, acaba de concluir um exaustivo estudo que, desde já, colocamos à disposição das autoridades. Elaborado com o objetivo de contribuir para o aprimoramento da Lei 8213 e dos demais instrumentos legais que a regulamentam, o estudo Fiemg/IEL explicita a necessidade de adequações na legislação e apresenta propostas dentre as quais se destacam as seguintes: revisão dos percentuais de cotas estabelecidos pela legislação; alteração do conceito de pessoas com deficiência, de forma a ampliar o número de trabalhadores potenciais; inclusão do aprendiz com deficiência na cota legal, assegurando-se a preferência de contratação daqueles que se destacarem; estabelecer critérios de regionalização para facilitar a contratação nas proximidades das empresas; mapear as áreas de risco nas quais a contratação de pessoas com deficiência não é recomendada, utilizando-se metodologia do próprio Ministério do Trabalho; manter os dispositivos incluídos em projeto atualmente em tramitação no Congresso Nacional, de autoria do senador José Sarney, especialmente nos aspectos ligados à terceirização, programas de profissionalização e contratação das chamadas oficinas protegidas.132

Interessante notar que, a despeito desses argumentos, há aumento de contratações. Assim, as perguntas que se colocam são: quais as razões desse aumento e a que custo estão ocorrendo essas contratações?

Quanto à resposta da primeira pergunta, há exemplos de diversas medidas que estão sendo adotadas para efetivar a legislação.

Nesse sentido, podem-se citar os casos como os de: governos que estão premiando empresas inclusivas133 e ofertando cursos de qualificação profissional134; empresas que publicam anúncios, em jornais, de vagas para pessoas com deficiência e oferecem cursos gratuitos para especialização profissional135; pressão dos movimentos sociais para realização de audiências públicas referentes aos projetos de lei em trâmite sobre a pauta da deficiência136; pessoas com deficiência preparadas para o ingresso no mercado de trabalho por escolas especializadas ou por sindicatos, os quais apresentam

132 Notícia na íntegra disponível em:

<http://www.deficiente.com.br/forum?func=view&catid=114&id=5943>. Acesso: 10.07.08. 133 Notícia disponível em: <http://www.msnoticias.com.br/?p=ler&id=270644>. Acesso: 10.07.08. 134 Notícia disponível em: <http://www.odocumento.com.br/noticia.php?id=258287>. Acesso: 10.07.08. 135 Notícia disponível em: <http://www.maisdiferencas.org.br/web/noticias_view.asp?id=1151>. Acesso:

10.07.08.

136 Segundo trâmite do Estatuto do Portador de Deficiência disponível em: <http://www2.camara.gov.br/proposicoes/loadFrame.html?link=http://www.camara.gov.br/internet/sileg/pr op_lista.asp?fMode=1&btnPesquisar=OK&Ano=2006&Numero=7699&sigla=PL>. Acesso: 10.07.08.

ultimamente meta específica nesse sentido137; pactos sociais entre sindicatos da categoria profissional, sindicatos da categoria econômica e o tem, com objetivo de estudo, divulgação e promoção da inclusão138; TAC‟s, elaborados pelo MPT, que oferecem prazos para que as empresas se ajustem à Lei de Cotas, ou TAC‟s que aplicam multa pelo não cumprimento da lei, multa essa que pode ser destinada à realização de cursos de capacitação profissional139 ou ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), sobre o que há projeto de lei prevendo a destinação de 5% do Fundo para programas de qualificação140; Ações Civis Públicas (ACP‟s141) movidas pelo MPT para condenar empresas, que estão descumprindo as cotas legais obrigatórias, em multas, danos morais coletivos e em reservas dos postos de trabalho, que vagam, para outras pessoas com deficiência142; Tribunais que estão criando programas e comissões especializados para melhor se adaptarem às regras de acessibilidade143.

Uma das medidas atualmente mais adotadas é a da capacitação profissional por meio de cursos gratuitos oferecidos por instituições especializadas, o que vem tentando sanar a problemática da falta de qualificação e da baixa escolaridade, aumentando assim a oportunidade de contratação. As empresas estão selecionando pessoas com deficiência a partir do contato com essas instituições ou por meio de seus bancos de dados:

Uma das pontes para o mercado de trabalho são os cursos de capacitação de profissionais. É por meio das instituições que ministram esses treinamentos que muitas empresas selecionam seus colaboradores. Em algumas delas, o índice de absorção desses trabalhadores após a qualificação chega a 85%, a exemplo da Avape. Em 2008, foram 889 pessoas capacitadas e recolocadas. No caso do IBDD (Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência), é mantido um banco de dados para encaminhar os 4.000 egressos dos cursos para o mercado. „Recebemos, em média, três pedidos de empresas diferentes por dia - uma oferta de 150 vagas por mês‟, diz a superintendente da organização, Teresa

137 Notícias disponíveis em: <http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=515095> e <http://jc.uol.com.br/2008/02/25/not_161805.php>. Acessos: 10.07.08.

138 Dados do pacto realizado pelo setor farmacêutico disponíveis em: <http://www.sindusfarma.org.br/eventos080512.shtml>. Acesso: 10.07.08.

139 Notícia divulgada em 10.01.2008, às 9 horas, no portal: <http://www.pgt.mpt.gov.br/pgtgc/>. Acesso: 10.07.08.

140 Projeto disponível em: <http://www2.camara.gov.br/internet/homeagencia/materias.html?pk=113013>. Acesso: 10.07.08.

141 A ACP está prevista no artigo 3º da Lei 7853/89: “As ações civis públicas destinadas à proteção de interesses coletivos ou difusos das pessoas portadoras de deficiência poderão ser propostas pelo Ministério Público, pela União, Estados, Municípios e Distrito Federal; por associação constituída há mais de 1 (um) ano, nos termos da lei civil, autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista que inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção das pessoas portadoras de deficiência”.

142 Notícias disponíveis em: <http://ultimainstancia.uol.com.br/colunas/ler_noticia.php?idNoticia=47071> e <http://ultimainstancia.uol.com.br/noticia/45669.shtml>. Acessos: 10.07.08.

143 Setor de qualidade do TRT2: <http://www.trt02.gov.br/html/tribunal/qualidade/acessibilidade.htm>. Acesso: 10.07.08.

d'Amaral. Dos profissionais encaminhados às firmas, complementa ela, 35% foram contratados.144

Além de cursos oferecidos pelas instituições, há casos de TAC‟s que autorizam a empresa a pagar pelo treinamento de pessoas com deficiência em um programa de capacitação profissional. Geralmente, a empresa é obrigada a destinar para esse tipo de programa o valor que já foi definido por autuações anteriores da fiscalização do MTE.

Na tentativa de combater o argumento da falta de qualificação profissional, o MPT tem agido dessa forma145. Entretanto, não se pode deixar de observar que a verdadeira inclusão trabalhista, isto é, aquela que efetiva a dignidade do trabalhador com deficiência, só é realizada por meio da convivência entre trabalhadores com deficiência e trabalhadores sem deficiência, respeitando a diversidade humana. Assim, se o programa de capacitação profissional não é realizado no próprio ambiente de trabalho empresarial, as pessoas com deficiência continuam segregadas, ainda que de forma velada e discreta.

Ainda quanto à primeira pergunta, qual seja, a das razões para o aumento das contratações, há atualmente a possibilidade da contratação como aprendiz, como se verá a seguir.

O MTE e o MPT, em oito Estados do Brasil, estão autorizando a inclusão de pessoas com deficiência no trabalho por meio da capacitação de aprendizes nas empresas.146 Assim, os contratados como aprendizes com deficiência (conforme artigo 428 da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT) poderão ser incluídos no cômputo da percentagem da Lei de Cotas. É uma forma de permitir a “acumulação” da cota aprendiz (artigo 429 da CLT) com a cota deficiente (artigo 93, caput, da Lei 8.213/91), ainda que provisoriamente (já que o contrato de aprendizagem é por prazo certo).

Com isso, já se pode responder à segunda pergunta levantada, qual seja, a que custo está ocorrendo o aumento das contratações. A ideia parece polêmica, tanto que a fiscalização do MTE e MPT não é unânime em todo o país. Aliás, o próprio MTE editou recentemente um manual específico sobre a questão da aprendizagem, trazendo como diretriz (negrito do autor):

144 Notícia disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/empregos/ce1412200814.htm>. Acesso em: 18.12.09.

145 Outras medidas adotadas pelo MPT nos TAC‟s estão expostas no capítulo terceiro desta dissertação.

146 Notícia disponível em:

<http://www.valoronline.com.br/ValorImpresso/MateriaImpresso.aspx?tit=Lei+de+Cotas+pode+ser+cumpr ida+com+aprendizes&dtmateria=26/11/2008&codmateria=5285910&codcategoria=197>. Acesso em: 16.12.08.