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CAPÍTULO IV – AMAZÔNIA(S) NA PERSPECTIVA DE CADA VEÍCULO

4.1. Visibilidade da região pela Amazônia Real

4.1.2. Quem fala e o que fala?

Todo veículo de comunicação, independentemente da plataforma (rádio, jornal, TV, etc.), determina suas editorias de acordo com sua linha editorial e os assuntos que interessam publicar.

Na agência Amazônia Real, as editorias são denominadas de eixos temáticos, temas de interesse, conforme denominou Kátia Brasil. São elas: Questão Agrária, Economia & Negócio,

Povos Indígenas, Meio Ambiente, Cultura e Política. Essas editorias envolvem os temas

“desmatamento e mudança climática, violação dos direitos indígenas, direitos humanos, regularização fundiária, tráfico de pessoas, exploração de crianças e adolescentes, defesa das mulheres indígenas e não-indígenas, desvios de recursos públicos e contas públicas [...] São prioridades, por exemplo, a questão do reconhecimento do território tradicional, a preservação da cultura, a educação, a saúde, etc.” (BRASIL, 2017).

As editoras consideram assuntos importantes na temática Questão Agrária a cobertura dos “conflitos da regularização das terras das comunidades ribeirinhas, as ameaças aos defensores de direitos humanos, a mobilização das populações em defesa de seus direitos, entre outros”. Na editoria Economia & Negócios, “as iniciativas das populações tradicionais nos negócios sustentáveis”. Em Povos Indígenas, “matérias sobre violação de direitos indígenas, invasão de seu território, etc.”. E, na editoria Meio Ambiente, “matérias que falam sobre desmatamento, mudanças climáticas, seca, cheia”.

A editoria de Cultura visa temas que promovam a prática, preservação da cultura e tradições dos povos considerados prioritários na cobertura do portal: indígenas e comunidades ribeirinhas.

Em Política, “as irregularidades nas contas públicas, abuso de autoridade, violação de direitos, imigração, a defesa da liberdade de expressão e de imprensa, além da segurança [...] matérias sobre imigrantes, refugiados ou algum tema específico que envolve uma ação política da Presidência da República”, exemplificando a cobertura feita pela agência nos casos da escolha do novo presidente da FUNAI e a crise penitenciária na região Norte19.

Na explicação de Elaíze Farias, o enfoque deste caso foi mais regional, falando sobre o problema dos presídios na Amazônia, consulta aos relatórios de investigação da Polícia Federal sobre a facção criminosa. “Assim mostramos que o massacre era algo previsível e o governo não tomou medidas para evitar a barbárie que aconteceu. Também ouvimos especialistas e familiares dos mortos, humanizando a cobertura”20. A rotina de trabalho desta reportagem seria

a rotina esperada por qualquer veículo que se propusesse a cobrir este fato. Acontece que, com o deadline cada vez mais curto e a mão de obra menor, para não perder audiência para concorrentes, alguns veículos de comunicação não se aprofundam nos fatos.

A característica das narrativas da Amazônia Real ressaltada por Kátia Brasil é iniciar seus discursos com a história de suas personagens. “Essas personagens invisíveis é que nos levam a apurar e investigar as reportagens”. Sobre as fontes de informações consultadas pela

Amazônia Real, a agência classifica como fontes primárias as personagens “invisíveis” para a

grande mídia.

“Esses personagens invisíveis é que nos levam a apurar e investigar as reportagens. Isso foi possível porque criamos um projeto com autonomia e liberdade nas escolhas dos temas abordados, respaldadas na honestidade e no comprometimento com os grupos sociais com os quais escolhemos dar prioridade em nossas reportagens” (BRASIL, 2017, grifo nosso).

O portal também conta com outras fontes diretas, conforme citou Kátia Brasil, referindo-se ao “contato diário que temos com lideranças indígenas, ribeirinhos, os pesquisadores, as organizações da sociedade civil, os leitores. Esse contato, em sua maioria, é feito pelas redes sociais, WhatsApp e celulares”. A Amazônia Real considera personagens

19 Reportagem sobre a presidência da FUNAI. Disponível em http://amazoniareal.com.br/governo-temer-nomeia-

pastor-a-presidente-da-funai-e-inclui-um-general-do-exercito-na-equipe-ambos-do-psc/

20 Reportagem sobre a crise penitenciária. Disponível em http://amazoniareal.com.br/massacres-em-presidios-

invisíveis (para imprensa e para o poder público) as populações indígenas e as populações residentes em comunidades no interior da Amazônia.

A agência destina espaço para colunistas que desempenham algum tipo de produção científica na região amazônica. São estes: Carlos Durigan (geógrafo, ambientalista e diretor da WCS-Brasil - Associação para Conservação da Vida Silvestre), Carlos Potiara (jornalista e cientista político), Eduardo Góes Neves (arqueólogo e um dos fundadores do primeiro projeto de arqueologia da Amazônia Central e professor na Universidade de São Paulo - USP), o indígena da etnia tukano João Paulo Barreto (antropólogo e um dos fundadores do Movimento Indígena do Amazonas), Lúcio Flávio Pinto (jornalista), Renan Albuquerque (jornalista e professor na Universidade Federal do Amazonas – UFAM, desenvolve estudos relacionados a conflitos e impactos socioambientais entre índios e pessoas atingidas por barragens); Philip Fearnside (ecólogo e pesquisador no Instituto Nacional de Pesquisas na Amazônia - INPA); Fátima Guedes (educadora e pesquisadora de conhecimento popular na Amazônia); Patrícia Sampaio (historiadora que desenvolve pesquisas em história indígena no Brasil e escravidão africana na Amazônia) e Marco Antônio Oliveira (geólogo e superintendente regional do Serviço Geológico do Brasil – CPRM no AM).

“A escolha [dos colunistas] se deu com base na relevância dos autores e na sua contribuição para a pesquisa e para o conhecimento sobre a região amazônica [...] Queríamos, desde o início, pessoas com uma trajetória irrepreensível e cujo conhecimento sobre a Amazônia sejam fundamentais para a compreensão da região” (FARIAS, 2017, grifo nosso).

O conhecimento sobre a região, conforme consta no enunciado proferido pela editora, é prioritariamente do conhecimento científico. Uma única representação das “personagens invisíveis” neste espaço é o indígena tukano e antropólogo João Paulo Barreto.

Os parceiros da Amazônia Real são: InfoAmazonia; EFE, agência espanhola de notícias; agência A Pública; Mídia Ninja; Uma Gota no Oceano e Aliança pela Água.

Na avaliação das editoras, a cobertura pela imprensa local dá mais espaço para notícias de assuntos nacionais e policiais, enquanto as questões locais que envolvem a Amazônia são deixadas de lado ou ganham pouco espaço. Segundo elas, esse é o motivo da falta de conhecimento da população em relação à região.

Já em relação à cobertura sobre a Amazônia pela imprensa nacional, as editoras caracterizam as notícias como sensacionalistas e, de acordo com elas, a falta de interesse das empresas jornalísticas em falar da Amazônia é justificada pela ausência de correspondentes de jornais nacionais nos noves estados da Amazônia. Justamente a falta de proximidade com a

região é apontada como problema para entendê-la. No entanto, elas acreditam que a nova geração de jornalistas está mais engajada.

As duas editoras concordam que a falta de mais colaboradores nos demais estados da região amazônica é um dos desafios; desta maneira, seria possível uma boa apuração do fato. Segundo Kátia Brasil,

“a mídia, em geral, tem que investir na Amazônia, que é uma região única no mundo, onde vivem centenas de pessoas que falam línguas diferentes e que têm culturas diferentes. Temos uma rica biodiversidade. Então o desafio da mídia é mostrar essa floresta sem estereótipos, sem sensacionalismo. Dar voz às pessoas que moram na floresta sem discriminá-las” (BRASIL, 2017).

Elaíze Farias completa:

“eu considero cobrir a Amazônia um desafio. É uma região maior que muitos países. Outro desafio é encontrar mais investidores para que possamos ampliar nossa cobertura, ter mais pessoas trabalhando, para que possamos atender todas as demandas que nos chegam e muitas vezes não conseguimos cobrir com o tempo que a questão exige”.

4.2. “Tudo que você quer saber...” no Portal Amazônia

O Portal Amazônia se propõe a mostrar tudo que seu público quer saber sobre a Amazônia. A coordenadora do Portal, Izabel Santos, afirmou que o objetivo do portal é mostrar ao seu público o que está acontecendo na Amazônia. Veremos mais adiante que a constituição deste tudo se baseia em filtros de informação. Ora, sabemos que veículos só divulgam o que está em acordo com a linha editorial e a política comercial da empresa. Então, é impossível que um veículo faça essa ampla cobertura, não por conta da dimensão geográfica da região que é um grande desafio, mas pela significação de “tudo” que se altera de acordo com a linha editorial e os temas prioritários de cada veículo de comunicação.

Com quase 16 anos de existência, o Portal Amazônia tem a proposta de realizar cobertura jornalística de acontecimentos de toda a Amazônia, inclusive, a internacional. Na entrevista realizada para esta pesquisa com Izabel Santos e Diego Oliveira, repórter mais antigo no portal, ambos ressaltaram a “vocação” do portal: publicar notícias sobre a Amazônia21.

O Portal Amazônia, criado em 5 de julho de 2001, é sediado em Manaus (AM). Seu endereço eletrônico é www.portalamazonia.com. Pertence ao Grupo Amazônia Cabo. Faz parte do conglomerado de comunicação do grupo Rede Amazônia de Rádio e Televisão, repetidor do sinal da Rede Globo para os estados da região Norte, exceto Pará e Tocantins, além de possuir sucursal em Brasília, criada em 1990. O Grupo Amazônia Cabo possui também o canal de TV Amazon Sat, com transmissão em sinal aberto para os estados do Amazonas, Acre, Rondônia, Roraima e Amapá e para demais estados brasileiros por meio da TV por assinatura e via satélite22.

Além do canal de TV, o grupo Amazônia Cabo possui a Rádio Central Brasileira de Notícias (CBN) Amazônia, transmissora da rádio CBN nacional. A sede do portal funciona no mesmo espaço físico onde estão outras empresas do grupo: a TV Amazonas, a rádio Amazonas FM, o portal G1 Amazonas, a TV Amazon Sat, a rádio CBN Amazônia e o Portal Amazônia.

Com o funcionamento do portal G1 na região, o Portal Amazônia migrou para o canal Amazon Sat, mudando a cobertura de acontecimentos factuais com a missão de realizar matérias mais aprofundadas sobre as questões da Amazônia, caracterizando-se, segundo avaliação dos entrevistados, como um veículo especializado na Amazônia. Os sujeitos que compõem esse meio (jornalistas, editores, diretores), pelos mecanismos de antecipação (PÊCHEUX, 2014b), formulam formações imaginárias projetando imagens de seu próprio lugar (especialistas em Amazônia), do lugar do interlocutor (o que seu público deseja saber) e do objeto discursivo (algum assunto relacionado à Amazônia). Nas antecipações, o sujeito

22 Informações disponíveis no site do portal no link www.amazonsat.com.br/canal-amazon-sat/.

interpreta e nessa interpretação atribui sentidos e dizeres para cada um deles (para si, para o interlocutor e para o objeto).

Além de Manaus, o portal tinha correspondentes em Rio Branco (AC), Boa Vista (RR), Porto Velho (RO) e Macapá (AP). Mas com a redução das praças (filiais) há dois anos, atualmente, a equipe conta com três repórteres (um no expediente da manhã e dois à tarde) e mais a coordenadora do portal, Izabel Santos.

Apesar da redução do quadro funcional ocasionando a ausência de correspondentes em outros estados, o portal ainda tem uma grande estrutura a seu dispor que permite diversidade e interatividade nas notícias. Como empresa jornalística, vive principalmente de publicidade, tanto que tem uma editoria específica para fazer propaganda (transfigurada em notícias), de suas empresas parceiras.

O Portal Amazônia mudou seu layout em setembro de 2016. Desde de sua criação, essa

é a quarta vez que o portal passa por uma reformulação. A mudança de layout e plataforma aconteceu, principalmente, para o veículo se adequar ao orçamento financeiro da empresa e ao quadro atual de funcionários, segundo explicação da coordenadora. Como esse processo de mudança ainda está em fase de execução, alguns conteúdos produzidos anteriormente à mudança não estão disponíveis no portal23.