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3 O POVO POTIGUARA E A CULTURA CORPORAL: SUAS VOZES COMO

3.2 SEQUÊNCIA DIDÁTICA INTERATIVA COMO POSSIBILIDADE DE

3.2.5 Quinto encontro: avaliação dialogada

A última etapa da Sequência Didática Interativa proposta por nós está voltada para a avaliação das etapas anteriores. Para tanto, propus uma avaliação coletiva dialogada, a fim de que todos pudessem exprimir suas impressões, suas aprendizagens, de forma que se sentissem à vontade para falar o que quisessem, da forma que eles achassem melhor.

Comecei o momento de avaliação solicitando que eles respondessem o questionário para a pesquisa antes de começar o momento de avaliação, para não interferir nas respostas. Assim, atendendo o meu pedido, eles responderam as questões propostas. Terminada esta etapa, foi o momento de avaliarmos o que tinha acontecido nos quatro encontros anteriores.

A princípio, eles estavam envergonhados, não queriam falar, mas aos poucos e, com alguns “empurrãozinhos”, tomaram coragem e começaram a soltar a voz. Perguntei, então, o que significava ser Potiguara para eles, obtendo as seguintes respostas: “ser índio é se pintar”, ser Potiguara é caçar a própria comida”, “ser Potiguara é ter avô índio, a família”. Ao final, um aluno, de 14 anos, diz: “ser Potiguara é um orgulho de ser indígena, quem é índio de verdade dança o Toré. E sou índio com muito orgulho”. Para complementar, deixei claro para

eles que a marca do povo Potiguara está gravada no sangue que correm em suas veias, na expressão do seu corpo, está em todos os cantos desta aldeia.

Para a professora Maria da Penha Silva, que estudou o Povo Xucuru do Ororubá-PE em sua pesquisa de mestrado, trazendo as questões de identidade e diferença apresentadas por autores como Stuart Hall (2000; 2015) e Homi Bhabha (1998),

As identidades não se constituem como algo dado natural, mas como uma construção discursiva e de prática de poder, o que significa que estão constantemente em processo de mudança e de transformação. Essa concepção de identidade tem se apresentado profícua nos estudos em educação, sobretudo os que questionam os discursos e as práticas pedagógicas que representam as identidades indígenas como fixas e estereotipadas. (SILVA, 2015, p. 110).

Nesse contexto, a educação escolar indígena cumpre seu papel de ligar o conhecimento científico aos saberes tradicionais, e, nesse processo, a Educação Física contribui de forma singular ao oferecer possibilidades didático-pedagógicas que aguçem o envolvimento com a cultura corporal indígena, através de um currículo centrado na decolonialidade e na interculturalidade.

Muitas observações foram feitas e os alunos disseram que tinham brincado de algumas brincadeiras ou jogos que eles conheceram na aula. Sugeri, então, que eles poderiam refazer as atividades encontradas na pesquisa que fizeram e todos concordaram sem hesitação. Assim, nasceu a ideia da culminância da Sequência Didática Interativa.

Ao levar a ideia ao professor Anderson Padilha e ao Gestor Daniel Silva, os mesmos me informaram da existência de um projeto denominado Semana Cultural, que é realizado na semana do dia 19 de abril, dia do índio. Segundo o PPP da escola, “durante essa semana são realizadas várias atividades relacionadas à cultura com objetivo de revitalizar e revivenciar as práticas culturais indígenas Potiguara” (Projeto Político Pedagógico, Escola Cacique Iniguaçú, 2019, p. 14 – Itálico nosso). Sendo assim, propuseram-me incorporar as brincadeiras nas atividades deste evento.

Então, foi hora de planejar como seria desenvolvida a Semana Cultural 2019. O período da realização das atividades se deu entre 15 a 17 de abril, as atividades foram distribuídas conforme o Quadro 6. As atividades envolveram toda a escola, ou seja, o que antes era um trabalho realizado apenas como possibilidade metodológica com o 6º ano, agora foi levado para as outras séries e os outros componentes curriculares.

Quadro 6 – Planejamento das atividades da Semana Cultural

PLANEJAMENTO SEMANA CULTURAL – 2019

DATA ATIVIDADES

15/04 – segunda-feira

Manhã (Abertura) Palestras, pinturas e Toré Tarde (Confecções de

materiais)

Balaios, cestas, aninais com bucha de coco

16/04 – terça-feira ATIVIDADES

Manhã Corrida de canoa – cata de marisco – pesca de siri

Tarde Arco e Flecha – arremesso de lança – cabo de guerra – corrida com tora – brincadeiras

17/04 – Quarta-feira ATIVIDADES Manhã Conversa de roda com Seu Zé

Paulino – Toré

Fonte: Elaborado pelo pesquisador

Na perspectiva da atividade, o corpo tornou-se elemento constitutivo do processo, de modo que, através dele, as vivências se tornaram experiências para os alunos, os professores, a família e a comunidade. Neste contexto, Soares (2011, p. 121) destaca:

São as nossas expectativas, problemas, experiências, desejos e aspirações do presente que mobilizam nossas incursões sobre os fragmentos do passado, sobre a descontinuidade da história, buscando concede-lhe um sentido. Um sentido que só o presente pode dar, pois é ele que determina as escolhas dos lugares, das pessoas, das ações humanas que vamos tomar, no tempo, como síntese de sonhos, de realizações de desejos, de frustações, de tiranias e de redenção de sociedades inteiras.

No cenário das atividades propostas, o corpo busca (re)significar suas práticas como inscrições de um tempo presente, permeado, costurado, enraizado de movimentos inscritos no passado, de forma a contextualizar a cultura corporal como elemento da história singular do povo Potiguara.

Nesse sentido, quando professor considera que a cultura corporal faz parte da construção histórica, cultural e social dos povos indígenas, terá melhor condição de estreitar o trabalho da Educação Física com a educação escolar. Ou seja, quando o professor proporciona em suas aulas momentos de reflexão sobre a história cultural e corporal dos Potiguara, estará contribuindo para um processo de (re)significação identitária, de forma mais íntima às inscrições do movimento corporal como marca de tradições e costumes.

A atuação do professor, mediante os saberes da cultura corporal, e a perspectiva de curiosidade dos alunos frente ao contexto social, precisam ponderar o currículo oficial e os conhecimentos advindos dos saberes tradicionais. Deve considerar a dimensão intercultural na construção de um ensino escolar e um currículo que valorize a ancestralidade como premissa

para um espaço de diálogo entre o conhecimento, as tradições, a história e a cultura indígena, como forma de ressignificação da cultura corporal.