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3. A formação inicial de Francês da FLUP: modelos e contextos de formação, papel do

3.1. Modelos de formação utilizados de 1991/1992 a 2008/2009

3.1.1. Ramo Educacional

Após um período de regime transitório, em que o estágio pedagógico era efectuado no sexto ano, a seguir a uma licenciatura de quatro anos e a um ano intermédio para frequência de disciplinas relacionadas com a Didáctica Específica e com as Ciências da Educação, a licenciatura passa a contemplar a formação científica e pedagógica, sendo o estágio pedagógico ―uma unidade curricular dos planos de estudo, que se realiza ao longo de um ano lectivo - o 5º - constituído por duas partes: um seminário semanal, realizado na Faculdade, e a prática pedagógica, realizada num estabelecimento do ensino secundário sito na área geográfica do estabelecimento do ensino superior.‖ (Braga, 2006: 317). O relatório do CRUP define esta modalidade de estágio pedagógico como o exercício de prática lectiva remunerada numa Escola (do Ensino Básico e/ou do Secundário), num determinado grupo de docência para o qual o curso superior habilita, que culmina, de forma integradora, os saberes de natureza científica da especialidade, a formação didáctica disciplinar e a formação em Ciências da Educação, saberes obtidos em anos anteriores (CRUP, 2001).

Os objectivos do estágio pedagógico do Ramo Educacional são ―a) Integrar, de forma progressiva, orientada e apoiada, o aluno no exercício da docência; b) Estruturar o processo ensino/aprendizagem; c) Integrar a função docente numa perspectiva

42 interdisciplinar; d) Desenvolver a capacidade de direcção e orientação educativa da turma; e) Desenvolver competências nos domínios da observação e da avaliação, reconhecendo esta como um processo contínuo; f) Desenvolver a capacidade de relacionamento com todos os elementos que integram a comunidade escolar; g) Contribuir para que a acção educativa desenvolva a interacção escola/comunidade.‖ (Portaria nº 659/88 de 29 de Setembro: 3987).

De acordo com o artigo 16º da portaria nº 659/88, de 29 de Setembro, aos estagiários competia participar na planificação das actividades do núcleo de estágio em que estavam inseridos; prestar o serviço docente que lhes foi distribuído (e também assistir a aulas do orientador e dos colegas); participar em actividades de direcção de turma e em actividades educativas no âmbito da escola ou da relação escola/comunidade; participar em sessões de natureza científica e pedagógica realizadas no núcleo; relacionar-se activamente com toda a comunidade escolar; elaborar o seu dossier de estágio pedagógico, incluindo um relatório crítico do funcionamento do estágio e da sua inserção no núcleo de estágio. Posteriormente, o Despacho Reitoral de 6 de Agosto de 1991 veio acrescentar que ―no dossier de estágio devem ser incluídas, desde o início, as planificações realizadas, assim como os trabalhos escritos, individuais e colectivos, que o aluno tenha elaborado ou em que tenha participado durante o estágio pedagógico‖ (in D.R. II série nº 193, de 23 de Agosto de 1991: 8597).

Durante os catorze anos da vigência do Ramo Educacional em que desempenhámos o cargo de orientadora de escola, a área da supervisão pedagógica foi objecto de muitas investigações noutros países mas também em Portugal e na FLUP25.

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No âmbito da sua tese de mestrado, Fátima Braga realizou um estudo de caso com resultados conclusivos referentes à necessidade de se fazerem reajustes no ramo educacional da FLUP: ―Os dados a que fomos conduzidos mostraram-nos que a estrutura curricular dos Cursos de Licenciatura em Língua e Literaturas Modernas (Francês) da FLUP e a regulamentação em vigor para o estágio pedagógico não estão adaptados às exigências actuais do sistema educativo nem às necessidades do público-alvo (…) Dos desencontros entre as duas entidades formadoras – uma que diminuiu a qualidade por falta de tempo, outra por não saber o que e como fazer – resulta uma formação empobrecida do professor principiante, porque dividida entre uma teoria – ministrada durante quatro anos na universidade – e uma prática – finalmente facultada na escola, mas cujo trabalho versa essencialmente os aspectos técnicos do ‗aprender a ensinar‘, aqueles que facilitam a sobrevivência na sala de aula.‖ (Braga, 2001: 125-126)

43 Na sequência de um encontro sobre formação de orientadores, com supervisores de vários países da Europa, duas supervisoras da FLUP apresentaram este trabalho, de que transcrevemos um excerto:

Voilà donc le cadre de formation que nous préconisons :

1. Que le professionnel soit situé et qu‘il accepte de se situer lui-même, dans une perspective de recherche-action ;

2. Que l‘on instaure une collaboration entre les institutions de formation et les institutions d‘enseignement, afin que les enseignants en formation puissent, de manière progressive (avant le stage pédagogique qu‘ils réalisent pendant une année, dans une école secondaire) observer des phases d‘enseignement/apprentissage et contribuer au dialogue , dans l‘institution de formation, par l‘apport de questions pratiques et pat leur confrontation aux données théoriques ;

3. Que l‘on forme des tuteurs capables de voir, de se voir et de se laisser voir, capables de participer – et de faire participer – à la formation ; capables d‘organiser des rencontres régulières, dans chaque établissement d‘éducation, qui soient de vrais lieux d‘échange, où les tuteurs contribuent à l‘analyse des pratiques et à l‘organisation de leurs cadres d‘analyse ;

4. Que l‘on continue la formation après le stage, en mettant en place des programmes de socialisation professionnelle, en collaboration entre les universités et les écoles‖ (Braga & Ramos, 1999 : 41) Fruto desta confluência de sinergias, favorável ao desenvolvimento da investigação em ensino e, particularmente, em supervisão, a FLUP aprovou, em reunião de 24 de Setembro de 2001, outros critérios de avaliação dos estagiários, assentes no querer (a capacidade que o estagiário revela em consciencializar o papel que desempenha na sociedade e no contexto educativo, ao nível do ser e do fazer) e no poder (a capacidade que mostra de acompanhar as exigências e as transformações sociais, económicas, científicas e tecnológicas que caracterizam a sociedade do século XXI, ao nível do ser, do saber e do fazer).

A formação dos estagiários passa a fazer-se em cinco dimensões – desenvolvimento pedagógico; desenvolvimento do conhecimento e da compreensão de si; desenvolvimento cognitivo; desenvolvimento teórico; desenvolvimento profissional – e pressupõe o desenvolvimento das seguintes competências: a) competências empíricas (capacidade de diagnosticar e descrever situações, processos, causas e efeitos); b) competências analíticas (capacidade de interpretar dados segundo teorias aprendidas); c) competências de avaliação (formular juízos de valor a propósito de resultados); d) competências estratégias (planificar a acção e antecipar problemas de operacionalização e respectivo tratamento); e) competências práticas (pôr as teorias ao serviço da prática); f) competências de

44 comunicação pedagógica (estratégias de credibilidade e de sedução). Valoriza-se o trabalho cooperativo, a mentalidade aberta, a responsabilidade e o entusiasmo. Face a este enquadramento teórico, o dossier de estágio deu progressivamente lugar ao portefólio26.

Neste sentido, e como referem Bizarro e Braga, o Ramo Educacional teve muito de inovador e proporcionou ao estagiário assumir-se como sujeito da formação, graças aos progressos feitos na orientação das actividades dos estágios:

O Ramo Educacional de Francês assentou numa perspectiva conceptual e organizativa

inovadora, que defendeu a partilha da formação entre profissionais dos diversos graus de ensino – básico, secundário e superior. Tratou-se de uma perspectiva criadora de sinergias entre diferentes estruturas do sistema educativo, propiciadora, para o formando, de um espaço de acção que o tornou sujeito da formação e não apenas objecto. Sucessivos ajustamentos da orientação das actividades de estágio foram permitindo a aproximação da estrutura da formação ao estabelecido para a supervisão clínica, com destaque para a discussão prévia da planificação, seguida da observação de aulas e posterior discussão. (Bizarro & Braga, 2004: 104)

O próprio seminário de investigação e reflexão sobre a prática docente, no caso do Francês, foi aberto aos orientadores de estágio, permitindo a articulação dos dois mundos em que os estagiários se desenvolvem profissionalmente (a FLUP e a escola), ―consubstanciando-se numa lógica de formação com três vertentes – a investigação, a reflexão e a acção‖ (Bizarro & Braga, 2004: 104).

No entanto, o relatório do CRUP de 2001 continua a revelar problemas relativos à dificuldade de articulação entre as instituições de ensino superior e as escolas e reforça a importância do estágio para as instituições de ensino superior, pelo facto de as ―obrigar‖ a relacionarem-se com outros níveis de ensino, com os quais, antes de elas assumirem legalmente a formação inicial de docentes, as relações eram quase inexistentes, ―apesar de as Universidades já há muito formarem professores, sem disso se darem conta (o que quer dizer que o faziam com alguma falta de responsabilidade) ‖ (CRUP, 2001). E conclui, advertindo: ―As Escolas são imprescindíveis comunidades de aprendizagem e motores de mudança, que as Universidades têm de tomar em conta‖ (CRUP, 2001).

De qualquer modo, ―o tempo e a actuação do Ramo Educacional da FLUP consubstanciaram uma mudança conceptual da profissão docente‖ (Bizarro & Braga, 2003:

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Só na sequência da reunião conjunta de supervisoras da FLUP e orientadoras de escola, em 27 de Março de 2006, é que os critérios para a elaboração e a avaliação do portefólio do professor em formação inicial viriam a ser aferidos.

45 503), segundo a qual ficou claro que ter competências científicas no âmbito da disciplina a ensinar é imprescindível, mas não basta:

(…) a competência profissional de um docente exige também outros conteúdos curriculares, como sejam os inerentes às várias Ciências da Educação, à Didáctica e ao estágio pedagógico, encarado como um processo de ensino-aprendizagem, contextualizado, que passa, necessariamente, pela aquisição de competências reflexivas e profissionais e por hábitos de pesquisa e desenvolvimento da apetência para a formação contínua. (Bizarro & Braga, 2003: 503)