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Rearranjando a pós-modernidade: a desterritorialização da construção moderna e a reterritorizalização pelo vínculo (social) afetivo

NEGRI E WARAT

5.1 À GUISA DE INTRODUÇÃO: PENSAR O FAZER PARA NÃO FAZER SEM PENSAR 413 – REFLEXÕES SOBRE O CAMPO DE ANÁLISE: A PÓS-

5.1.1 Rearranjando a pós-modernidade: a desterritorialização da construção moderna e a reterritorizalização pelo vínculo (social) afetivo

A pós-modernidade, cuja constituição social é não mais a da Sociedade Industrial, mas da Sociedade da Informação precisa ser captada à luz dessa característica. Daí que qualquer trabalho crítico precisa ser construído ao modo proposto por Lash, o qual defendia que a perspectiva fosse endógena. Quer ele dizer com isso que a crítica à informação deve se dar na informação, dentro dela, pois não há espaço fora dela e nem tempo de suspensão.414 É um testemunho humilde e um complemento que pode dar um modesto aporte à reconfiguração das formas materiais, humanas, biológicas e sociais de vida. Um testemunho humilde que não pretende ocupar a esfera de liberdade de quem julga nem a esfera de necessidade de quem é julgado. Somente pode ocupar o espaço do "e"415 - alusão à lógica do rizoma416.

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Expressão empregada pelo historiador do direito Ricardo Marcelo Fonseca para designar a necessidade de se conhecer o campo epistemológico no qual se operará a pesquisa, de tal forma que o fazer do pesquisador não seja um fazer impensado. A propósito, conferir: FONSECA, Ricardo Marcelo. Introdução teórica à história do direito. 1. ed. Curitiba: Juruá, 2012.

414

LASH, Scott. Crítica de la información. trad. Horacio Pons. Buenos Aires: Amorrortu, 2005. p. 335.

415

LASH, Scott. Crítica de la información. trad. Horacio Pons. Buenos Aires: Amorrortu, 2005. p. 336.

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O conceito de rizoma é extraído da obra Deleuze-guattariana: “Um rizoma como haste subterrânea

distingue-se absolutamente da s raízes e radículas. Os bulbos, os tubérculos, são rizomas. Plantas com raiz ou radícula podem ser rizomórficas num outro sentido inteiramente diferente: é uma questão de saber se a botânica, em sua especificidade, não seria inteiramente rizomórfica. Até animais o são, sob sua forma de matilha; ratos são rizomas. As tocas o são, com todas as suas funções de hábitat, de provisão, de deslocamento, de evasão e de ruptura. O rizoma nele mesmo tem formas muito diversas, desde sua extensão superficial ramificada em todos os sentidos até suas concreções em bulbos e tubérculos.” (DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil platôs – Capitalismo e esquizofrenia.

v. 1. Trad. Aurélio Guerra Neto e Célia Pinto Costa. Rio de Janeiro: Editora 34, 1995. p. 15.). Não obstante, os supramencionados autores identificam seis princípios (características aproximativas) do rizoma, quais sejam: 1° e 2° Princípios de conexão e heterogeneidade; 3º Princípio de multiplicidade; 4º Princípio de ruptura a-significante; 5º e 6º Princípio de cartografia e de decalcomania. Deixa-se de

É nesse contexto que se pode perceber que a pós-modernidade pode também indicar um caminho em busca de um viver mais solidário, de uma reaproximação com a humanidade, ainda que aparentemente distancie as pessoas com todo o aparato tecnológico que lhe concerne. O que se quer com tanta tecnologia é conectar, embora, muitas vezes, o que se presencie seja a desconexão entre as pessoas. Eis a tensão entre o conectado e o desconectado417.

Como reação ao momento histórico precedente, "A busca do interesse próprio, antes identificada com a busca racional de ganhar e acumular riquezas, tornou-se a busca do prazer e da sobrevivência psíquica."418 Isso autoriza que se diga que as tradições da modernidade vão aos poucos sendo abandonadas. O que conta é o agora, importando sentir e vivenciar o momento. O clímax e a catarse subordinam a eficiência e a produtividade tanto na vida pessoal quanto na vida social. Nessa nova época, o "princípio de realidade", que governava a conduta humana desde a Reforma Protestante até a Revolução Industrial, passa a ser abandonado pelo "princípio do prazer", que agora impera.419

No mesmo sentido é que Luis Alberto Warat afirma que é na pós- modernidade que se coloca, pela primeira vez, a questão da dimensão política do amor. Segundo ele:

começa a pensar-se o amor como uma dimensão simbólica emancipatória: seria uma mudança do valor dos valores que pode permitir a preservação da condição humana pela conservação dos desejos. Eles compensariam, como condição de sentido, o declínio do mundo suprassensível com poder

explicar de modo minucioso cada um dos referidos princípios a fim de tornar demasiado longa esta nota de esclarecimentos. Ademais, à contracapa da aludida obra, os autores explicam que: “Um

rizoma não começa nem conclui, ele se encontra sempre no meio, entre as coisas, inter-ser, intermezzo. A árvore é filiação, mas o rizoma é aliança, unicamente aliança. A árvore impõe o verbo ‘ser’, mas o rizoma tem como tecido a conjunção ‘e… e… e…’ Há nesta conjunção força suficiente para sacudir e desenraizar o verbo ser. Entre as coisas não designa uma correlação localizável que vai de uma para a outra e reciprocamente, mas uma direção perpendicular, um movimento transversal que as carrega uma e outra, riacho sem início nem fim, que rói suas duas margens e adquire velocidade no meio.” (Grifo nosso).

417

RIFKIN, Jeremy. A era do acesso: a transição de mercados convencionais para networks e o nascimento de uma nova Economia. Trad. Maria Lucia G. L. Rosa. São Paulo, MAKRON Books, 2001. p. 179-192.

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RIFKIN, Jeremy. A era do acesso: a transição de mercados convencionais para networks e o nascimento de uma nova Economia. Trad. Maria Lucia G. L. Rosa. São Paulo, MAKRON Books, 2001. p. 166-167.

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RIFKIN, Jeremy. A era do acesso: a transição de mercados convencionais para networks e o nascimento de uma nova Economia. Trad. Maria Lucia G. L. Rosa. São Paulo, MAKRON Books, 2001. p. 159.

de obrigação e gozo (gratificação idealizada). É o triunfo do desejo como inscrição prévia da subjetividade.420

Vê-se, pois uma importante observação acerca reconstrução da subjetividade em plena pós-modernidade que, por concepção, destroi identidades. Warat acrescenta que somente se criam espaços de transformação social se previamente forem criados espaços simbólicos a serviço do desejo: uma capacidade de construir laços amorosos contra a informatização da barbárie. E aqui está o viés positivo da pós-modernidade.421

Outrossim, Pierre Lévy faz uma proposta para além das divisões sociais, superando até mesmo a ideia de luta de classes. Para ele:

Todos aprendemos na escola que era bom exercer o espírito crítico. Mas também aprendemos sobre a vida que precisávamos amar. Não entendemos senão o que amamos. O mundo não precisa de crítica, o mundo precisa de amor. É somente quando amamos o mundo que ele se rende a nós e nos entrega o seu sentido. O amor é o microscópio mais potente. O amor é o telescópio mais sensível. O amor é a maravilha observada. O amor é o olho que olha.422

Por certo há inúmeras formas de manifestação do amor, não cabe aqui apresentar um rol, nem seria possível um que se desse a contento, mas de fato o registro de que a pós-modernidade, de algum modo, constitui um meio para fomentar a solidariedade e, mesmo, a alteridade, ante a viabilização da pluralidade.

De qualquer maneira, e a despeito de possíveis pieguices, é necessário também o cuidado para que, tal como o excesso precedente culminou numa importância efêmera para a informação, que não se faça o mesmo no tocante às relações humanas, sempre permeadas e atravessadas pelos fluxos sociais. Há que se recorrer àquilo que Luis Alberto Warat chamaria de "ética do Vínculo. É dizer, uma ética que assume a psicanálise do vínculo como método, resposta e sentido.

420

WARAT, Luis Alberto. O amor tomado pelo amor: crônica de uma paixão desmedida. In: _____. Territórios desconhecidos: a procura surrealista pelos lugares do abandono do sentido e da reconstrução da subjetividade. v. I. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2004. p. 306.

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WARAT, Luis Alberto. O amor tomado pelo amor: crônica de uma paixão desmedida. In: _____. Territórios desconhecidos: a procura surrealista pelos lugares do abandono do sentido e da reconstrução da subjetividade. v. I. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2004. p. 306.

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LÉVY, Pierre. A conexão planetária: o mercado, o ciberespaço, a consciência. Trad. Maria Lucia Homem e Ronaldo Entler. São Paulo: Ed. 34, 2001. p. 157-158.

Seria uma ética que permite Eros, recuperando o sentimento pelo Outro com o sentido da vida."423

Tal se dá, principalmente porque, diante da ambivalência e da liquidez que a pós-modernidade tem produzido, é indispensável não ceder ao movimento de fragilização dos laços humanos, tal como denunciado por Zygmunt Bauman ao falar do "amor líquido"424.

Diz-se que o saber pós-moderno é ambivalente: novo instrumento de poder, mas abertura às diferenças; a unidade deve dar lugar à tolerância e à polissemia.425 E embora seja imperiosa a necessidade do vínculo no que tange aos laços tão frágeis na pós-modernidade, não há que se falar em um retorno à modernidade e nem a qualquer postulado jurídico-político-filosófico fixo e embrutecido pelo racionalismo. Mais do que buscar o "ser" das coisas, das pessoas e das relações, talvez a proposta pós-moderna esteja muito mais na dimensão do devir426, pois a cada desterritorialização há um territorialização427.

5.1.2 A luta por reconhecimento em Honneth e a resposta ao problema da

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