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RECURSOS TECNOLÓGICOS E ESTRATÉGIAS DE DESENVOLVIMENTO As mudanças observadas no cenário de georreferência e de redes sociais digitais nos

Questão 17: Há marcações georreferenciadas que você realiza numa rede social mas não realiza em outra?

6.1.1 RECURSOS TECNOLÓGICOS E ESTRATÉGIAS DE DESENVOLVIMENTO As mudanças observadas no cenário de georreferência e de redes sociais digitais nos

levam a sublinhar, inicialmente, três pontos de discussão. Em primeiro lugar, as subfases do terceiro momento (item 4.3) só puderam ser distintas uma das outras por conta da proposta central de utilização de certos aplicativos, serviços e redes. Essas transformações indicam que o desenvolvimento das aplicações precisou dialogar com metáforas e prescrições de ação que, de determinadas maneiras, “ensinassem” às pessoas o que fazer com aquele serviço. A rigor, não existe nenhuma utilidade imediata na realização de um check-in na antiga versão do Foursquare nem na atual versão do Swarm, tampouco na atribuição de localização de fotografias e vídeos no Instagram ou no Facebook – a finalidade última em torno de tais ações, como vimos, é pautada numa satisfação pessoal, se considerarmos a perspectiva dos utilizadores. Apesar disso, essas redes angariaram êxito em termos numéricos e paradigmáticos, tornando-se, por vezes, metonímias sobre aquilo a que se propõem.

O segundo ponto de discussão diz respeito à imprecisão dos próprios sites de redes sociais – tanto em termos de referência e proposição (para que servem?), quanto em termos de acesso (como alguém chega até eles?). Se num momento precisamos dessa expressão para definir um novo ambiente eletrônico que surgia no início dos anos 2000 (e que, ao mesmo

tempo, não era nem “comunidade virtual” nem um blog pessoal), agora caminhamos rumo a uma dissolução de fronteiras desses ambientes. Falar em termos de sites de redes sociais só faz sentido enquanto os acessamos por meio de um navegador web. Mas e quando esse acesso se dá diretamente por aplicativos instalados em dispositivos móveis (ou por qualquer outro meio ainda não criado), o que temos, afinal? Isso nos leva a outra pergunta: onde essas redes se encontram? No fundo, é necessário perceber que redes sociais digitais são representações e modelagens de elos sociais. Num só passo, essa dupla imprecisão ressalta o dispositivo móvel como um meio de acesso a informações e de interação social que lidam não apenas com quem se encontra próximo ou distante, mas, de maneira inédita, acessa uma ambiência que é etérea, com grandes repercussões interacionais, porém.

O terceiro ponto diz respeito à outra imprecisão, dessa vez relacionada às redes sociais móveis ou baseadas em localização. Aquilo a que se atribuiu tais termos é um produto de um tempo que, por mais próximo que esteja dentro do momento atual, dá pistas de já ter se transformado. Se nomenclaturas diversas foram dadas a esses objetos é porque, em suas temporalidades, foi preciso que se cunhassem expressões para identificar o que não estava identificado, descrito ou classificado – em outras palavras, para demarcar e deixar claro algo que até então não estava conceitualmente bem definido. Mais do que assumir uma postura classificadora, pareceu-nos mais promissor realizar uma investigação sobre o como, os porquês e os modos de utilização do recurso de georreferenciamento em rede. E o encaminhamento das marcações, da geolocalização, da referência locativa para outros objetos (fotos, vídeos, textos), parece ser um exemplo, afinal, do espraiamento dessa sensibilidade espacial para outras dimensões, conteúdos e formas de interação.

Devemos entender, assim, que as tentativas iniciais, visíveis principalmente na fase de experimentação, criaram um chão novo sobre o qual as pessoas puderam pisar sem tanto temor e de modo que pudessem experimentar tanto os serviços quanto a si mesmos, criando novas possibilidades de expressão. De fato, a disponibilização da própria localização em tempo real se mostrou uma ocorrência inédita, trazendo consigo várias indagações sobre as razões, as circunstâncias e decorrências. Contudo, as sistematizações e as explicações vistas nesse momento, notadas principalmente por meio dos termos que descreviam os respectivos cenários, também não parecem fazer mais tanto sentido. Podemos dizer que os sites de redes sociais terão uma tendência a se “deslocar” para os dispositivos móveis, as informações serão acessadas primordialmente a partir de suas telas (e não as de computadores fixos) e o próprio

conteúdo produzido vai lidar, em distintos graus, com a localização enquanto mediadora de sociabilidade. Em vez de falarmos em “sites de redes sociais”, podemos falar em networked publics ou redes sociais digitais, dada a articulação tecnológica que os laços sociais encontram na persistência dos dados digitais.

Quando sistematizamos o histórico de desenvolvimento e das transformações de serviços baseados em localização, pudemos observar como o transcorrer tecnológico tem uma implicação direta nas proposições de uso e nas utilizações factuais dos devidos produtos. Dizer isso não significa que as pessoas estão “presas”, simplesmente, ao que cada momento histórico oferece, condiciona ou dispõe, mas sim que a sociedade dialoga, dentro de seu horizonte cultural, com aquilo que ela mesma tem a proporcionar tecnicamente – o que provoca, supostamente, reconfigurações na cultura como um todo. Nossa proposta de classificação de momentos, embora propositalmente não dê conta de estágios anteriores (como a situação bélica da Guerra Fria, a criação do GPS e a disponibilização pública do seu sinal), permite visualizar as rotas que a georreferência tomou ao ser disposta em aplicações diversas. De uma fase de experimentações repleta de atividades performáticas até o momento atual com a integração da localização a redes sociais digitais, as diversas etapas que distinguimos mostram serviços que se deparam com limitações (e também oportunidades) diante do cenário técnico em que se encontram. O fato de, em certo ponto, alguns serviços baseados em localização funcionarem tendo em vista o uso de mensagens de texto, por exemplo, é sintomático quanto às escolhas possíveis naquele período. Na medida em que os smartphones e suas interfaces ricas ainda não eram amplamente utilizados, as ações possíveis precisaram encontrar um elemento mediador dentre aqueles disponíveis. Igualmente, não parece fazer mais sentido, no momento atual, que interações baseadas em localização tomem o SMS como esse elemento de mediação entre indivíduos em rede – especialmente tendo em vista a alocação da georreferência a outros tipos de conteúdos midiáticos. Há de se perceber, assim, que recursos tecnológicos ora se condensam, ora se diluem em outros objetos técnicos: o primeiro movimento cria dinâmicas catalisadoras e paradigmáticas (como o check-in) e o segundo estabelece um espraiamento daquela tecnologia em outras atividades diversas.

Os aplicativos, suas marcas e suas dinâmicas de uso devem ser compreendidos como parte das empreitadas comerciais de seus criadores. No nosso estudo, esses aplicativos não representam atividades artísticas, performáticas ou experimentais, e precisam ser vistos como

um meio-termo entre produto e serviço em busca de rentabilidade96. As empresas desenvolvedoras, assim, buscam lucros, traçam estratégias de negócios, modificam a natureza dos seus produtos, dentre outras resoluções possíveis em busca de readequações. Por vezes, os acontecimentos fogem completamente aos seus planos e toda a estratégia precisa ser repensada – seja porque o público com o qual lidam não responde da maneira desejada, seja porque seus modelos de negócios fracassam diante de seus concorrentes.

Essas transformações sublinham a natureza dialógica que existe entre os momentos de planejamento, criação e disponibilização para download e os momentos de uso factual – desafiando teorias da comunicação que lidam com deslocamentos diretos da mensagem (Modelo Matemático de Shannon e Weaver, Teoria Hipodérmica etc.) ou ainda aquelas que lidam com um viés de desconfiança a priori em relação ao capital (Teoria Crítica). Nesse caso, nem estamos lidando apenas com mensagem, nem com a produção de produtos, senão com o projeto, desenvolvimento e readequação de produtos-serviços que possibilitam a criação de novos contextos interacionais e novas produções midiáticas. As (múltiplas) formas pelas quais as pessoas usam tais aplicativos frisam esse aspecto difuso, desconcentrado e maleável que tais tecnologias apresentam.