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4.3 Encerramento dos estágios da pesquisa: reflexão do grupo sobre os resultados

4.3.7 Reflexões dos gestores sobre seu próprio desenvolvimento

A seguir abriu-se um espaço na reunião para, a partir de tudo que tinha sido dito e ouvido, fosse feita uma reflexão grupal sobre o que havia mudado ou permanecido igual nas concepções sobre sustentabilidade e no desenvolvimento dos gestores. O pesquisador lembrou que as reflexões podiam ser sobre aspectos externos, mas deveriam levar em conta também as mudanças de concepção sobre o trabalho do gestor ligado ao tema.

A primeira grande reflexão que o grupo fez girava em torno de como uma mentalidade do “cada um faz a sua parte” era prejudicial para alcançar este tipo de objetivo.

Reconheceram que até antes do início do projeto de sustentabilidade haviam trabalhado de forma isolada e que apesar de serem da mesma rede se encontravam menos e trocavam menos do que a partir do início do trabalho de pesquisa. Com o início do trabalho passaram a troca informações e marcar reuniões entre eles de forma mais ativa e não aguardando que a empresa o fizesse. Decidiram que isto era uma conquista que devia ser mantida, mesmo sem a presença do pesquisador no futuro. Referiam-se neste ponto não apenas à questão da sustentabilidade, mas ao fato do projeto os ter “empoderado” (expressão de um deles) a fazer reuniões e desenvolver ideias sem a participação direta dos diretores ou acionistas. Este aspecto do que os gestores chamam empoderamento, e que se refere a uma maior autonomia é relevante.

Mostra que a reflexão sobre o desenvolvimento das suas competências para agir em prol da sustentabilidade ia além da criação de um espaço para comunicação e replicação de ações do dia a dia, se estendendo à atuação política, engajada e coletiva, no espaço em que atuam.

Outra grande reflexão foi sobre o fato de que ao longo do trabalho havia ficado claro que duas grandes restrições estruturais foram impostas aos gestores. A primeira pelos clientes, na forma de um mercado que compra principalmente por preço. Quando as considerações sobre a escolha do hotel não são estritamente financeiras, o que parece ser levado em consideração é a localização como segundo vetor de escolha entre hotéis do mesmo padrão.

Não foram observados nos últimos dezoito meses comportamentos por parte dos clientes que levem a crer que no âmbito de atuação da HZ haja uma ‘compra verde’ ou ligada a uma reflexão sobre sustentabilidade por parte dos clientes. A outra restrição é a imposta pelos investidores e acionistas, que espelhando a tendência acima, não colocam entre suas reflexões o aspecto do sustentável, seja ele do social em termos de uma possível responsabilidade corporativa, ou do ambiental em aspectos que ultrapassem a aderência a normas legais.

Neste sentido os gestores reconheceram que haviam mudado de concepção, ao serem confrontados com suas frases e propostas iniciais do trabalho. Reconheciam agora que antes estavam mais focados em ações educativas para as arrumadeiras, faxineiras e pessoal de recepção. Neste ponto, após observação feita por um dos colegas, os gestores perceberam uma ligação entre conscientização e poder. Falaram abertamente sobre a consciência que havia surgido ao longo da investigação, de que no começo pensavam tanto nas arrumadeiras, porque tinham certo poder sobre elas. Podiam ‘mandar’ este público fazer determinadas coisas. Mas em relação a clientes e investidores, as relações de poder eram de outra ordem, os obrigando a lidar com negociações mais complexas. “Podemos treinar a camareira, mas não podemos

treinar o investidor” foi a frase usada. O trabalho com as arrumadeiras em relação ao lixo havia mostrado que, quando é necessário obter resultados por meio de conscientização e diálogo, isto é muito mais difícil. Exige outras habilidades que não as de um gestor com poder meramente hierárquico. São aqui necessárias as competências de uma gestão do significado proposta por Sandberg e Tagarma (2007) e as competências políticas apontadas por Brunstein e Boulos (2011).

Um ponto unia as duas discussões feitas até então, que os gestores chamaram de

‘cultura do territorialismo’. Na visão deles cada um dos stakeholders cuida de seus interesses dentro de determinadas fronteiras. Nas palavras dos próprios gestores o que se observou foi a ideia de ‘levar vantagem’ dentro de seu espectro de ganhos possíveis. Ou seja, a noção tradicional de maximização dos próprios interesses. Os gestores entendiam que os interesses de outros stakeholders, eram vistos como conflitantes ou, por vezes, se opondo aos dos acionistas. Este comportamento era apresentado sob a justificativa de que eles estavam em uma empresa de baixo custo e que vive em um ambiente muito competitivo

Os gestores continuaram abordando o ponto de que haviam implantado muitas ações práticas, respeitando as limitações de cada unidade. Reconheciam que, por meio do projeto, eles como profissionais haviam aprendido muitas outras maneiras possíveis de atuar, fruto do aprofundamento da consciência sobre sustentabilidade. Este ponto reforça as ideias de Sandberg (2000), de que mudanças no significado sobre o trabalho impactam diretamente o desenvolvimento de competências. Usaram a expressão “no macro o que conta é consciência e conhecimento” (frase de um dos gestores), dando a entender que ao menos consideravam que haviam lançado bases para um aprofundamento do tema.

Outro grande dificultador apontado pelos gestores foi a pressa com que eles têm de fazer as atividades diárias. Pressa que tem duas origens, uma externa e outra interna. Segundo eles, os ‘BO´s’ (Boletim de Ocorrência), expressão oriunda do jargão policial, os obrigam a agir rápido e a estar sempre focados nas urgências do dia a dia. Por outro lado, passaram a compreender vivencialmente que de certa forma sua mentalidade e a compreensão de seu papel profissional os faz procurar as urgências em vez de atuar em cima de outros aspectos, que podem trazer ganhos de médio e longo prazo.

Como última reflexão os gestores afirmaram que o tema sustentabilidade parecia a eles agora ainda mais complexo e que demandava tempo e energia para ser abordado. Não viam o assunto como algo que podiam atacar como no início do trabalho, com listas de coisas ‘a fazer’ e checklists do que foi feito.

Neste momento final, em um depoimento profundamente emocionado um dos gestores afirmou que o trabalho com sustentabilidade, de um lado, os havia trazido para mais perto uns dos outros, mas, de outro o deixava pessoalmente com um ‘sentimento de abandono e solidão’. Isto no sentido de que não via parceria nos acionistas, clientes e mesmo na maioria dos colaboradores. O silêncio do grupo e os olhares de respeito e gestos de concordância em direção a este gestor mostraram que não havia sido a expressão de um sentimento isolado e pessoal e sim algo do grupo.

Esta observação fez o pesquisador depois do encontro refletir sobre como conduzir uma saída do campo que não aprofundasse esta sensação de abandono. Apesar de ter ficado claro que a frase não se referira ao pesquisador e sim às estruturas decisórias e possibilidades de ação, trabalhos desta natureza geram vínculos e confiança. O pesquisador decidiu então manter, mesmo ao fim da pesquisa, o trabalho de compartilhamento de informações com o grupo por um período, se colocando à disposição para participar de novos encontros.