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2.2 Sustentabilidade

2.2.3 Sustentabilidade sob a ótica econômica e o desenvolvimento sustentável

Falou-se neste trabalho anteriormente sobre a relação entre estrutura e ação, espelhada (ou refletida) na relação entre pessoas e organizações e nas inter-relações entre as organizações. Estes atores possuem diferentes interesses e atribuem diferentes significados à

‘razão de ser’ do fenômeno organizacional. Organizações existem sempre envolvidas em um determinado ambiente macroeconômico e se relacionam umas com as outras em um ambiente microeconômico. Estas ideias que aqui são apresentadas de forma sucinta são necessárias não apenas para deixar transparecer com que linhas do pensamento econômico este trabalho se alinha, mas também para apresentar o ideário atual, bem como tendências futuras que acabam por influenciar a maneira de pensar e agir de todos os envolvidos na discussão que aqui é apresentada.

A lógica econômica ainda é colocada, mesmo que de forma velada, como ponto mais importante do tripé da sustentabilidade, sem que seus pressupostos sejam profundamente questionados. Trata-se da questão do lucro como principal objetivo organizacional a serviço da sociedade, em uma lógica neoliberal ligada, por exemplo, ao pensamento de autores como Friedman (1970), sendo o lucro considerado apenas à partir da relação entre vendas e custos e despesas, ambas monetizadas, de bens e serviços. Como afirmam Hawken, Lovins e Hunter-Lovins (1999, p. 287) estas definições baseadas apenas em moeda corrente são reducionistas,

pois, “As necessidades humanas básicas podem ser satisfeitas por uma combinação de produtos e serviços com formas de organização social e política, normas e valores, espaços e contextos, comportamentos e atitudes”.

Antes de falar de desenvolvimento sustentável, tema mais adiante abordado no nível organizacional, é necessário entender o termo desenvolvimento em si. Este é frequentemente tratado como sinônimo de crescimento econômico (VEIGA, 2010). Foi, no entanto a partir dos anos 60 do século passado, que passa a ser sentida com clareza a necessidade de distinguir crescimento econômico de desenvolvimento. Arrighi (1997) já apontava para o fato de que crescimento do Produto Nacional Bruto (PNB) de modo nenhum implicava maior acesso das populações pobres a bens materiais, sociais e culturais. A argumentação de Arrighi (1997), no entanto, “comete o simplismo de usar o PNB per capita para medir o desenvolvimento”

(VEIGA, 2010, p. 22). Outros autores críticos do ‘mito do desenvolvimento’ não têm esta visão quantitativa do mundo, típica dos gurus da economia neoclássica. Uma visão que ignora

“[...] processos qualitativos histórico-culturais, o progresso não linear da sociedade, as abordagens éticas e até prescindem dos impactos ecológicos” (ibid).

Desenvolvimento econômico não implica, portanto, desenvolvimento da sociedade como um todo. Veiga (2010, p. 18) sugere que foi para por fim a esta ambiguidade que a o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) lançou o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), como uma forma de “[...] evitar o uso exclusivo da opulência econômica como critério de aferição.” O autor sugere que por trás do pensamento econômico tradicional talvez esteja uma maneira ‘mecânica’ de pensar, apoiada na física, que isola o pensamento econômico de assunções históricas e condicionantes ecológicas.

Ainda segundo Veiga (2010, p. 51) “A prevalecente suposição de que o sistema econômico poderia atingir um ‘ótimo’ sempre ignorou a união entre sistemas econômicos e bióticos, além de desdenhar a existência de limites naturais”. Propõe então o autor brasileiro que sejam rejeitadas as duas respostas simplórias, que traduzem o desenvolvimento como crescimento econômico ou como ilusões utópicas e aponta a obra de Sachs (2002, 2004) como a que melhor consegue evitar “[...] as tentações enganosas do otimismo ingênuo e do pessimismo estéril.” Alerta antes para o fato que renunciar à ideia de desenvolvimento e usar apenas o termo sustentabilidade pode ser “[..] uma armadilha ideológica inventada para perpetuar as assimétricas relações entre as minorias dominantes e as maiorias dominadas, nos países e entre países.”

Jacobi (2006, p. 4) entende que o termo DS surgiu no contexto do enfrentamento da crise ambiental, configurada pela degradação sistemática de recursos naturais e pelos

impactos negativos desta degradação sobre a saúde humana. DS diz respeito também, além das preocupações ambientais, a um esforço de geração de novos conceitos no âmbito da ciência econômica, como o de ‘eficiência social’ e ‘ecoeficiência’ dos mercados. Segundo Sachs (2004), estes novos desafios transcendem às eficiências alocadoras, inovadoras e keynesianas, associadas a Adam Smith, Schumpeter e Marnard Keynes. “Não resta dúvida que o capitalismo é muito eficiente em termos de alocação, porém deficiente em termos da eficiência social e ecoeficiência” (SACHS, 2004, p. 42). Seria exatamente a introdução destas eficiências que geraria um desenvolvimento includente, fundamentado no trabalho decente para todos. Vale aqui lembrar o pensamento de Giddens (1984) e suas reflexões sobre a relação entre estruturas e indivíduos: mercados estruturalmente ineficientes provocam a

‘reação’ e a ‘ação’ de indivíduos, que se esforçam para mudá-los e, se for o caso, destruí-los.

O desenvolvimento sustentável seria, então, uma maneira de pensar ligada a conceitos de desenvolvimento econômico, uma expressão que provém do edifício intelectual da economia do pós-guerra, em contraposição a um simples conceito de crescimento econômico.

Alguns autores críticos, pautados naquela compreensão de desenvolvimento ligada a aspectos quantitativos da economia, consideram o termo impregnado de noções da economia neoliberal (BANERJEE, 2003). Este autor entende que da mesma forma que se deu com o termo

‘desenvolvimento’, ‘desenvolvimento sustentável’ possui práticas, políticas e significados que resultam em prejuízos para a maior parte da população mundial, em especial, para as populações rurais do Terceiro Mundo. Para Banerjee (2003), termos como sustentabilidade e desenvolvimento sustentável continuam sendo construídos no âmbito do pensamento colonialista e explorador.

Söderbaum (2008) entende que o conceito de DS pode ser atrelado a três lógicas. A primeira, estritamente econômica e técnico-científica que propõe a articulação do crescimento econômico e a preservação ambiental sem grandes mudanças de base na sociedade ou nos sistemas produtivos. O autor sueco chama esta lógica por trás do DS de business as usual, e entende que os atores que abraçam esta ideologia como crentes de que não há na realidade grandes problemas ambientais e sociais acontecendo e que eles são exagerados. Esta maneira de pensar faz com que não sejam necessárias grandes mudanças no paradigma dominante e que se possa continuar a ênfase em crescimento econômico e inovação tecnológica, deixando a regulação de problemas ambientais aos mecanismos de controle já existentes na sociedade.

Uma segunda maneira de pensar sobre o DS segundo Söderbaum (2008) é a de que tanto a humanidade quanto as organizações enfrentam problemas ambientais e sociais sérios e inéditos e que exigem respostas criativas. Esta visão reconhece que ação imediata é

necessária, mas entende que o paradigma atual, em sua ideologia, maneira de produzir e escopo institucional precisa apenas ser modificado e alterado para dar conta da situação. A terceira corrente de pensamento segundo Söderbaum (2008) é a interpretação radical do DS, que prega e exige uma mudança em larga escala, de paradigmas, ideológica e institucional.

No âmbito desta terceira corrente estão aquelas ideias que apontam o neoliberalismo e a economia neoclássica como raízes do problema. Ainda é uma corrente marginalizada, uma vez que “Companhias transnacionais e políticos com uma orientação neoliberal tem sido bem sucedidos há algum tempo em definir problemas e influenciar o diálogo sobre desenvolvimento” (SÖDERBAUM, 2008, p. 17).

As grandes corporações e os governos, ao menos em suas ações discursivas e em suas práticas comunicativas, admitem a situação de ‘insustentabilidade’ da sociedade e da espécie humana, caso permaneçam no mesmo rumo, fazendo exatamente como fazem. A questão aqui é que, para colocar em prática as novas maneiras de agir apregoadas pelas grandes corporações, será exigida uma série de mudanças: novas formas de trabalho, novos conhecimentos, novas habilidades, novas atitudes. O grande desafio é que possivelmente sejam necessárias novas reflexões, novos significados sobre o que seja trabalho, novas concepções sobre o que seja uma empresa e sobre sua importância e papel na sociedade.

Neste trabalho opta-se pelo uso da expressão sustentabilidade, pois é esta que se tornou uma ideia-força no nível organizacional. Não se deixa de lado, no entanto, a noção de DS. Este termo é o que serve de pano de fundo para os que defendem avanço econômico, social, cultural, tecnológico e político sem degradação ambiental. Uma ideia-força, portanto, alinhada com as necessidades de países menos desenvolvidos. Como propõe Söderbaum (2008, p. 18-19) a busca é por um conceito ‘razoável de DS, uma vez que “progressivamente se reconhece a necessidade de algo novo para lidar com os desafios da sustentabilidade”.

Barbieri (2007, p. 104) afirma que muitas organizações “individualmente ou em associação, estão procurando encontrar um modo de se tornarem atores relevantes de fato no processo de desenvolvimento sustentável”. (BARBIERI, 2007, p. 104), ou seja, se tornando elas mesmas organizações sustentáveis. É neste processo de busca das organizações por se desenvolvimento de competências organizacionais pata a sustentabilidade que se trata aqui do tema de desenvolvimento de competências gerenciais.

Söderbaum (2000) explicita a maneira de pensar econômica que norteia este trabalho assumindo que quando desempenhando um determinado papel social, qualquer indivíduo ou organização se guia pelas suas ideologias. Ideologia é utilizada aqui como uma noção ampla sobre relações entre meios e fins. Não apenas em referência aos ‘ismos’ como o ‘socialismo’,

o ‘capitalismo’, ‘feminismo’ ou ‘conservacionismo’, mas mesmo em atitudes mais próximas do dia a dia, como uma ‘ideologia dos cuidados com saúde’ (health care ideology). O autor ressalta que a maior parte dos economistas reluta em aceitar ideologias em seus modelos, reafirmando que na sua visão “Ideologias no tempo presente são baseadas em crenças. Estas crenças não são elementos factuais, mas também expectativas sobre possíveis resultados de se agir conforme uma determinada ideologia em vez de outra” (SÖDERBAUM, 2000, p. 3).