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Shrivastava (1994) apontava para uma ‘castração’ de assuntos ligados ao meio ambiente nos estudos organizacionais, no sentido de que a natureza não era levada em consideração nas pesquisas organizacionais. Apesar do reconhecimento de que os estudos organizacionais até então haviam dado pouca importância às questões da relação homem-natureza no sentido de ambiente biológico, as propostas de solução oferecidas por este autor e outros de correntes mainstream do pensamento em gestão e teoria organizacional, são prescritivas e simplistas.

Lentamente no início e com grande impulso posterior, as preocupações com o meio ambiente e com a miséria de largas partes da população começaram a descer do nível macro, do planeta e da sociedade, para o nível das organizações. Como exemplo pode-se citar a visão baseada em recursos (VBR), que no final do século passado estabelecia suas bases como pensamento estratégico dominante. Hart (1995) propunha incluir as questões ambientais neste escopo estratégico das organizações, criando uma VBR Natural, como uma solução para os problemas ligados à sustentabilidade. O autor afirmava que os próximos 40 anos, a partir de então, apresentavam um desafio sem precedentes, pois neste período, a partir de 1995, a população mundial iria dobrar aritmeticamente e o uso de recursos naturais tendia a aumentar em proporção geométrica. “Ou se altera a natureza das atividades econômicas ou se arrisca causar danos irreversíveis aos sistemas ecológicos básicos do planeta” (HART, 1995, p.

991).O autor usava aqui a palavra ‘natureza’ em outra acepção, mas este uso mostra a profunda ligação da mesma com o que há de mais essencial e ontológico no homem.

No quadro de ações abaixo, no entanto, o autor sugere como escopo conceitual para a implementação destas medidas ‘soluções paliativas’, pouco concretas e absolutamente dentro dos padrões de atuação das empresas da época, sem maiores desafios e com um linguajar absolutamente digerível pelas grandes corporações.

Quadro 3– Uma Visão Baseada em Recursos – Escopo Conceitual leque de soluções apresentadas por Hart (1995), acima, são ‘minimizar e melhorar’. Remetem aos trabalhos da mesma época, ligados à Qualidade Total ou melhoria contínua. Não há propostas radicais nem ameaçadoras para as organizações. Este texto pode ser tomado como base para entender a percepção vigente no mundo corporativo sobre o tema e serve de base para outros trabalhos posteriores deste autor que, de forma funcionalista, pragmática e inofensiva - para as grandes empresas - propõe o que chama de Portfólio de Sustentabilidade (HART, 2000, p. 113).

Como aponta Snell (2000), estudos realizados nos anos 80, nos Estados Unidos da América, mostram que algumas organizações parecem dirigidas internamente por forças que divergem consideravelmente dos valores esposados pela sociedade. De algumas, poder-se-ia dizer que, sob a superfície, suas normas são “[...] a desonestidade, a injustiça, o saque, a brutalidade psicológica e a instrumentalidade a serviço dos próprios interesses (SNELL, 2000, p. 269)”. A utopia e o desejo de que haja hoje organizações seriamente esforçadas em mudar a situação e se colocar a serviço desta definição acima e da realização do sonho de um mundo melhor não deve, no entanto, ser descartado cedo demais. Existem hoje casos considerados exemplares de organizações e de políticas, consideradas sustentáveis para a sociedade como um todo. São casos que levam em consideração os saberes atuais, mesmo com o risco intrínseco de que as propostas de ação um dia se revelem infrutíferas ou insuficientes.

Uma das dificuldades que as organizações enfrentam é que no sistema capitalista tradicional são usados princípios contábeis dogmáticos para definir o que é lucro e sustentabilidade econômica, princípios estes pouco acessíveis aos leigos. É usada uma contabilidade que não atribui valor a alguns dos maiores volumes de recursos que as empresas usam na produção, como é o caso de custos indiretos de recursos naturais, oxigênio consumido e ar devolvido sujo, depleção de aquíferos etc. Entende-se hoje que é irreal atribuir a estes insumos apenas os valores de mercado, associados à sua colocação à disposição, como

no caso da água, sem considerar, por exemplo, o custo do esgotamento futuro ou outros custos ambientais envolvidos na sua produção, como a liberação de metano em determinados reservatórios. Em uma experiência conduzida entre 1991-93, no Arizona, chamada Biosphere 2, os cientistas descobriram que não podiam manter os níveis de oxigênio necessários para a vida de oito pessoas que viviam no projeto de US$ 200 milhões, enquanto a Terra faz isso sem nada cobrar (HAWKEN et. al., 1999). A tecnologia parece não poder substituir alguns dos serviços oferecidos pelos sistemas biofísicos do planeta, da mesma forma que máquinas vêm se mostrando incapazes de substituir plenamente a inteligência, o conhecimento, a sabedoria, a cultura e as habilidades organizacionais dos seres humanos.

Muitas vezes, no nível organizacional, o discurso da sustentabilidade é, por vezes, extremamente focado na questão da inovação tecnológica como solução para todos os problemas. A ‘inovação sustentável’ é aquela “[...] que traz benefícios econômicos, sociais e ambientais, comparados com alternativas pertinentes” (BARBIERI et al. 2010, p. 151) e aparece segundo o autor hoje como preocupação de muitas organizações sempre que ocorre a introdução, produção, assimilação ou exploração de produtos, processos produtivos ou ainda métodos de gestão.

Springett (2005), no entanto, afirma que muitas das estratégias de gestão empresarial chamadas de sustentáveis são focadas no ‘o que fazer’ e ‘como fazer’: produção mais limpa, operações ecoeficientes e supostamente benignas e organizações e ações socialmente responsáveis. Apesar de fornecerem respostas ao que os empreendimentos devem fazer, carecem de sugestões sobre o que os negócios devem ser na sociedade em que queremos viver.

A proposta de Murdoch e Clark (1994) é a de que o conhecimento local deve ser investigado e, se possível, estudado na ação em suas consequencias práticas nas comunidades e suas organizações. Formas locais de conhecimento, mesmo que originárias das comunidades e do bom senso, ainda sem fundamentação científica, devem ser consideradas com seriedade.

Podem, à primeira vista, parecer em desarmonia com o meio ambiente ou insustentáveis em termos econômicos tradicionais, mas podem ser sob outros aspectos, vitais para aquela comunidade e as organizações que dela fazem parte e sustentáveis para a sociedade como um todo. Práticas culturais, sociais, políticas e suas manifestações agrícolas, industriais e tecnológicas em geral, não devem ser imediatamente descartadas em detrimento de alternativas ‘verdes’ criadas em centros de estudos distantes e de ‘manejo’ proposto pela ciência tradicional e que seguem uma lógica baseada, em primeiro lugar, na ‘verdade’

econômica predominante.

A ciência tradicional valeu-se sempre da busca por aplicações práticas e esta afirmação deve valer para a ciência social, precisando esta ser passada por severo escrutínio antes de ser aplicada em qualquer ambiente, seja este econômico, social, cultural, político, tecnológico e biológico. Este escrutínio deve sempre buscar os interesses que podem estar por trás de seus postulados, prescrições e possíveis consequencias para as populações envolvidas.

A indústria do turismo e a hotelaria vêm sendo cobradas desde os anos 60 do século passado por uma postura mais ‘verde’ em relação ao seu entorno (KNOWLES et al., 1999).

Apesar de se tornar cada vez mais comum uma busca por conscientização do consumidor, tratamento adequado de resíduos e treinamento dos funcionários, uma série de problemas ligados a uma hotelaria mais sustentável também emergiram desde então.