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Do regime da comunhão universal de bens

O conjunto de normas específicas, que orientam o regime da comunhão universal de bens, está previsto nos artigos 1.667 a 1.671 do Código Civil de 2002 e conforme disposição geral contida no parágrafo único do artigo 1.640, classifica-se como um dos regimes para o qual há necessidade de elaboração de contrato pré-nupcial, ou seja, de escritura pública de pacto antenupcial.

Em regra, no regime da comunhão universal há comunicação de todos os bens, presentes e futuros, do casal, bem como dos ativos e dívidas passivas, salvo exceções previstas no artigo 1.668 do estatuto civil, a seguir esclarecidas.

Com a união do par através do enlace matrimonial e a escolha, de comum acordo, pelo regime ora tratado, bem como, preestabelecidas na escritura de pacto antenupcial as coordenadas acerca da relação patrimonial naquilo que não ferir as normas impostas por lei, ocorrerá uma fusão entre os acervos trazidos pelo homem e pela mulher para o casamento, o que formará um único condomínio de bens ao qual se acrescentará tudo aquilo que já existe no patrimônio dos cônjuges, bem como tudo o que for adquirido onerosamente e recebido por qualquer um deles a título de doação e herança, na constância do casamento.

Nessa senda, Dias (2005, p. 226) relembrando o que foi dito por Sílvio Rodrigues e Sílvio Venosa, assevera que:

Os patrimônios se fundem em um só. Comunicam-se todos os bens presentes e futuros, bem como as dívidas passivas contraídas por qualquer dos cônjuges durante o casamento. Instaura-se o que se chama de mancomunhão, ou seja, propriedade em mão comum. Cada consorte é titular da propriedade e posse da metade ideal de todo o patrimônio, constituindo-se um condomínio sobre cada um dos bens, dívidas e encargos. Cada cônjuge torna-se meeiro de todo o acervo patrimonial, ainda que nada tenha trazido e nada adquira na constância do casamento.

Assim, compreende-se que a regra nesse regime de bens é bem simples, tudo se comunica entre os cônjuges, tudo faz parte de uma única universalidade de bens, salvo as exceções previstas no artigo 1.668 do diploma civil, a saber:

Art. 1.668. São excluídos da comunhão:

I - os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar;

II - os bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva;

III - as dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum;

IV - as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com a cláusula de incomunicabilidade;

V - os bens referidos nos incisos V a VII do art. 1.659. (VADE MECUM, 2011, p. 305, grifo nosso)

Não obstante, a regra ser a da comum união dos bens, presentes e futuros, que compõem o acervo patrimonial do casal, o legislador brasileiro tratou de eliminar alguns da esfera condominial. Por conseguinte, excluíram-se da comunhão universal todos os bens recebidos a título de doação ou herança, cujo título originário de tal direito esteja gravado com a cláusula de incomunicabilidade em desfavor de um ou de outro consorte, e também, os bens sub-rogados ou recebidos em lugar destes.

No que tange ao inciso II do artigo supra, para melhor compreender o preceito contido na norma, há que se esclarecer, precipuamente, o significado do instituto do fideicomisso e das figuras do fiduciário e do fideicomissário.

No entender de Silvio Rodrigues, citado por Dias (2005, p. 226), entende-se que

Fideicomisso é a instituição de dois herdeiros de modo sucessivo (1.951 a 1.960). O testador institui o primeiro herdeiro ou legatário (fiduciário) e já escolhe quem irá herdar esses bens quando da morte do beneficiário (fideicomissário). A propriedade do fiduciário é resolúvel (extingue-se com

sua morte). A propriedade do fideicomissário está sujeita à condição suspensiva (a morte do fiduciário).

Poderá, portanto, o testador, no documento que assim lhe intitula, designar sucessivamente dois herdeiros/legatários seus, sendo que o primeiro será denominado fiduciário e o segundo (aquele que herda o bem quando da morte do primeiro), denominar-se- á fideicomissário. O fideicomissário só herdará o bem objeto da herança/legado, depois de atingida a condição suspensiva que vincula esse direito, qual seja, depois da morte do fiduciário.

Nesse contexto, portanto, entende-se que fica excluído da comunhão universal qualquer bem que esteja gravado de fideicomisso em favor de qualquer dos cônjuges, como fiduciário; bem como, exclui-se da comunhão o direito que este cônjuge herdeiro possua como fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva, ou seja, a morte do fiduciário.

De outra sorte, falecendo o fiduciário, ter-se-á por realizada a condição suspensiva em favor do fideicomissário que se tornará proprietário do bem; ou, hipoteticamente, falecendo o fideicomissário antes do fiduciário, consolidada estará a propriedade do imóvel nas mãos deste e, assim sendo, depois de realizada uma ou outra situação, aludido bem passará a constituir o patrimônio comum do casal.

“Haverá comunicação de bens, portanto, se, com o advento da condição, os bens passarem para o patrimônio do fideicomissário, ou se a propriedade se consolidar nas mãos do fiduciário, em virtude da pré-morte daquele.” (GONÇALVES, 2008, p. 433).

Prosseguindo, também não farão parte do condomínio patrimonial do casal, as dívidas contraídas antes do casamento, salvo aquelas provenientes ou vinculadas com a realização deste e as que retornarem algum benefício de proveito comum ao casal.

Ainda, ficam excluídas da comunhão as doações antenupciais feitas, ou seja, estabelecidas na escritura de pacto antenupcial, em favor de um cônjuge ao outro, contemplada com a cláusula de incomunicabilidade. No mesmo sentido, segundo previsto no inciso V do artigo 1.668, não serão objetos de comunhão entre o par (assim como acontece no regime da comunhão parcial), os bens de uso pessoal, livros, instrumentos de profissão,

proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge, pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.

Segundo leciona Gonçalves (2008, p. 436), “os frutos dos bens incomunicáveis, quando se percebam ou vençam durante o casamento, comunicam-se. [...]. Assim, embora certos bens sejam incomunicáveis (art. 1.668), os seus rendimentos se comunicam.”

Quanto à administração dos bens, aplicam-se as mesmas regras estabelecidas para o regime da comunhão parcial. Os bens comuns serão administrados pelo casal em conjunto e os excluídos da comunhão (nesse regime entende-se que não existem bens particulares), pelo cônjuge proprietário, salvo, tenham ambos convencionado de forma diversa na escritura pública de pacto antenupcial. Aplica-se, também, a regra geral do artigo 1.647 e seus incisos do Código Civil, a qual prevê a necessidade de outorga uxória do outro cônjuge para a realização dos atos previstos naquele preceito.

Quanto à regra disposta no artigo 1.671 do estatuto civil, a responsabilidade de cada cônjuge para com os credores do outro cessará no momento em que for extinta a comunhão e efetuada a divisão do ativo e do passivo.

Para melhor compreender o enunciado do artigo acima, Dias (2005, p. 227) explica que:

‘Extinta a comunhão’ só pode significar fim da comunhão de vidas, e não extinção do casamento, que só ocorre quando do trânsito em julgado da sentença do divórcio, pela morte de um dos consortes ou com a decretação da invalidade do matrimônio.

Nessa concepção, a separação de fato resulta no fim da vida em comum e põe fim à comunhão, acarretando o rompimento do estado de condomínio dos bens e dívidas do casal, responsabilizando-os apenas pelas dívidas contraídas durante o relacionamento conjugal. Assim, “mesmo antes da partilha dos bens, descabido impor a um o ônus por dívidas contraídas pelo outro depois de findo o convívio.” (DIAS, 2005, p. 227).