• Nenhum resultado encontrado

O Regime Noturno do Imaginário

No documento Download/Open (páginas 45-53)

CAPÍTULO 1 MITOANÁLISE DAS NARRATIVAS DOS ORIXÁS (BACIA

1.1 ALGUMAS NOÇÕES USADAS POR DURAND NO ESTUDO DO IMAGINÁRIO

1.1.4 O Regime Noturno do Imaginário

oposição ao “regime diurno” (e vice-versa), revelando uma organização dicotômica do imaginário. Por isso abordamos rapidamente, neste item, também o regime diurno – embora nosso foco seja o regime noturno, aplicado à mitologia dos orixás (e extensivo ao Candomblé e à Umbanda de tendências não cristãs).

Antes de subdividir os regimes em dois, Durand define o que ele designa por regime. Estudando o imaginário e a mitologia em diversas culturas (europeia, semítica, assíria, egípcia, mexicana, tropicais, equatoriais, etc.), Durand (2002) organizou os sistemas mitológicos em dois regimes, o regime diurno e o regime noturno, definindo regime a partir do isomorfismo constatado em agrupamentos dos símbolos (formando relações entre estruturas, constelações, esquemas, arquétipos). Para esse estudioso, o isomorfismo de constelações simbólicas das culturas apresentou duas características marcantes: a coincidência estável do imaginário simbólico em determinadas culturas; a possibilidade de agrupar, organizar e definir o imaginário simbólico dos povos em dois grupos bem demarcados.

Enfim, este isomorfismo dos esquemas, arquétipos e símbolos no seio dos sistemas míticos ou de constelações estáticas levar-nos-á a verificar a existência de certos protocolos normativos das representações imaginárias, bem definidos e relativamente estáveis, agrupados em torno dos esquemas originais e a que chamaremos estruturas. [...] Esses agrupamentos de estruturas definem o que chamaremos de Regime do imaginário. [...] De momento, contentemo-nos em definir uma estrutura como uma forma transformável, desempenhando o papel de protocolo motivador para todo um agrupamento de imagens e suscetível ela própria de se agrupar numa estrutura mais geral a que chamaremos Regime (DURAND, 2002, p. 63-64).

A noção de regime parte da constatação da existência de núcleos semânticos no processo simbólico – pois “os símbolos tendem para um mesmo ponto” (PITTA, 2005, p. 20), formando as constelações e os esquemas, de onde surgem os arquétipos dominantes. Cada cultura cria o seu próprio “trajeto antropológico” (Durand), organizando de acordo com o seu psiquismo e seu ethos os seus mitos, que são expressos por meio de pulsões, sensibilidade e visão de mundo próprias. Formam-se então os núcleos mitológicos, ou seja, nichos que congregam símbolos e imagens comuns. Assim se chegou à estruturação em dois regimes, cada um (diurno e noturno) congregando mitos com semelhanças tipológicas e ideológicas, de modo a definirem perfis próprios que permitem sejam identificados como conjuntos de forte coesão em torno de um núcleo. Dessa forma, representando ideias psíquicas profundas, é o próprio imaginário, na organização

dos mitos e imagens antropológicas, que cria os dois regimes, apresentando duas intenções diferentes: uma que divide o universo em opostos (o regime diurno), e outra que une os opostos do universo (o regime noturno) – aos estudiosos resta somente recolher e tentar decifrar esse material psico-antropológico-cultural criado pela mente coletiva simbólica dos povos.

O regime diurno é caracterizado pela luz do dia, que permite as distinções, acentuando opostos. Contrariamente, o regime noturno ignora os opostos, amenizando-os e neutralizando-os, sendo, por isso, caracterizado pela noite, que unifica, encobrindo as diferenças. Portanto, opostamente, ao invés da divisão, o regime noturno é de complementação, harmonização e unificação. Dessa forma, na análise das estruturas antropológicas do imaginário, que revelam aspectos psicossociais e o ethos de um povo, a dicotomia durandiana regime diurno versus regime noturno resume-se em outra dicotomia: dualidade/antítese versus unidade/síntese. Sendo o regime diurno dual (duplo), e uno o regime noturno. Assim, as estruturas antropológicas e psíquicas do imaginário expressam simbolicamente a alma humana de dois modos: ou dividida em luta interna ou equilibrada e apaziguada consigo mesma. Durand acrescenta ainda um elemento básico fundamental subjacente aos dois regimes: “Os dois Regimes da imagem são, assim, os dois aspectos dos símbolos da libido” (DURAND, 2002, p. 197).

Ele escreve sobre o regime diurno: “O Regime Diurno da imagem define- se, portanto, de uma maneira geral, como o regime da antítese” (2002, p. 67). No “maniqueísmo das imagens diurnas”, encontra-se o homem em luta agônica, debatendo-se na “antítese luz-trevas”, enfrentando suas duas partes contraditórias: a física (orgânica) e a espiritual (mental), e ainda o bem e mal. Trata-se do homem dividido. Por isso o homem do regime diurno é atormentado, tentando colocar ordem na desordem, já que possui duas faces, uma negativa e outra positiva. Daí ser dualista e polêmico, pois vive em conflito e digladiando-se, ontologicamente, consigo mesmo.

Representando o homem dividido, o regime diurno é também dividido em duas partes, trazendo imagens diferentes nos mitos. Na primeira parte do regime diurno vêm os símbolos negativos (teriomórficos, catamórficos e nictomórficos), expressando a noção geral do terror do homem diante da passagem do tempo e da morte, trazendo monstros, animais, seres e imagens aterrorizantes e tenebrosos, que revelam as noções de trevas, escuridão, sofrimento, queda, finitude. Na

segunda parte do regime diurno (símbolos diairéticos, espetaculares e ascensionais), a simbologia é aposta, os símbolos são positivos, significando luta, vitória, subida, ascensão, luz, glória – indicando que o homem venceu arquétipos profundos (medo, terror, destino, tempo, morte). Durand conclui sobre o regime diurno:

Vimos que todo o Regime Diurno da representação, pelo seu fundamento diairético e polêmico, repousava sobre o jogo das figuras e imagens antitéticas. Pode-se mesmo dizer que todo o sentido do Regime Diurno do imaginário é pensamento “contra” as trevas, é pensamento contra o semantismo das trevas, da animalidade e da queda, ou seja, contra Cronos, o tempo mortal (2002, p. 188).

E escreve introduzindo o regime noturno (DURAND, 2002, p. 193-374), de teor positivo diante do tempo, com os ciclos da natureza, do ritmo, da intimidade e com as constelações da libido, da alimentação, da fertilidade femina (que são forças vitais do devir – e não destruidoras):

Diante das faces do tempo, desenha-se, assim, uma outra atividade imaginativa, consistindo em captar as forças vitais do devir, em exorcizar os ídolos mortíferos do Cronos, em transmutá-los em talismãs benéficos e, por fim, em incorporar na inelutável mobilidade do tempo as seguras figuras constantes, de ciclos que no próprio seio do devir parecem cumprir um desígnio eterno. O antídoto do tempo já não será procurado no sobre- humano da transcendência e da pureza das essências, mas na segura e quente intimidade da substância ou nas constantes rítmicas que escondem fenômenos e acidentes (2002, p. 193-194).

Para o autor, “o Regime Noturno da imagem estará constantemente sob o signo da conversão e do eufemismo” (2002, p. 197), pois os símbolos desse regime constituem uma “inversão do valor afetivo atribuído às faces do tempo” (2002, p. 197), havendo uma eufemização do destino e da morte, em uma “inversão radical do sentido afetivo das imagens” (2002, p. 197). Por ser uno, o regime noturno não tem subdivisões, trazendo um conjunto único de símbolos. Pitta (2005), uma estudiosa de Durand, apresenta os três símbolos primordiais do regime noturno: símbolos de inversão (expressão de eufemismo, encaixamento e redobramento, hino à noite, à mãe e à matéria); símbolos da intimidade (com as imagens da moradia, túmulo, taça, repouso, alimentos e substâncias); símbolos cíclicos (ciclo lunar, a espiral, o simbolismo ofidiano).

do sofrimento, do tempo, do destino e dos aspectos aterrorizantes expostos no regime diurno; valorizam a ciclicidade do tempo a partir de símbolos cíclicos, símbolos de inversão e símbolos da intimidade – que têm caráter harmônico. Os símbolos cíclicos garantem a continuidade da vida, por isso não se teme nem o devir nem a morte, já que o caráter harmônico desses símbolos ressignificam a morte e o sofrimento. Portanto no regime noturno “o trajeto psíquico é contínuo” (DURAND, 2002, p. 195) – isso significa que o psiquismo não entra em contradição consigo mesmo, estando em total harmonia com a natureza e a vida, eufemizando todo o contexto físico (biológico, carnal, material, temporal, sexual), em busca de conjugação e harmonia.

Todas as constelações e metáforas do regime noturno se referem à natureza, perante a qual o ser humano mantém total aceitação. Uma delas é a constelação da água, com o culto às grandes mães e deusas aquáticas. Água límpida, calma, benéfica, em figuras e forma de rios, fontes, mar, oceano, chuvas, espelho da água. A figura feminina garante retorno e regresso para a grande mãe, que representa aconchego, colo e calor. No regime noturno há uma recuperação total dos valores femininos e da mulher. Há o retorno ao lar materno; a feminilidade é divinizada; cultuam-se as grandes mães; promove-se o “culto da Virgem-Mãe” e o “culto da mulher exorcizada e sublime” (DURAND, 2002, p. 195).

Durand faz diversas afirmações positivas sobre a questão sexual no regime noturno: a queda temporal torna-se “uma constelação feminina e em seguida sexual e erótica” (2002, p. 195); há “uma doutrina do amor que vai eufemizar o contexto carnal” (2002, p. 194); realiza-se a cortesia e o “culto da Dama” (2002, p. 195). Uma imagem relacionada é o simbolismo do peixe, ao redor do qual constelam outras imagens, chegando-se à fecundação, à gravidez, ao parto, ao nascimento, “sendo a mulher inteira assimilada a um peixe” (2002, p. 218). Assim, a libido é vista como prazer, energia e símbolo materno, como quietude e gozo.

Quanto à morte, Durand declara: “Entre nós, apesar de alguns estremecimentos de horror sagrado, herança do Regime Diurno, a morte eufemiza- se até a antífrase das imagens inumeráveis da intimidade” (DURAND, 2002, p. 241). E, por isomorfismo, da morte eufemizada chega-se ao culto dos funerais, aos ritos de enterramento, à paz do sepulcro, à necrofilia. O homem passa a enxergar o abismo com outros olhos e realiza a penetração em um centro, realizando uma lenta e tranquila descida para o mundo íntimo físico e psicológico, que não se apresenta

mais como um abismo e sim como um local acolhedor, morno, macio, sendo a queda vista com prazer. A deglutição, a digestão, o intestino, o ventre já não amedrontam nem enojam o homem. Como melhores exemplos dessas constelações Durand cita a literatura romântica (o Romantismo).

Portanto, no regime noturno, o animal racional que é o homem não entra em luta interna consigo mesmo. O seu lado racional não digladia com o seu lado animal. O homem se aceita organicamente e vive de modo natural, integrado ao mundo e à natureza (da qual ele faz parte), sem angústias e questionamentos, cumprindo rituais criados pela tradição de seu povo e ancentrais. Esse regime sugere cadência do homem ao ritmo do tempo, junto com o qual ele se tranforma, não se deixando vencer nem pelo tempo nem pela morte. A presença dos antepassados nos símbolos desse regime garante que o homem permanece de alguma forma.

Também fundamentais ao regime noturno são as constelações digestivas e alimentares, com a presença de comidas, bebidas, beberagens, chás sagrados. Considerando que “toda a alimentação é transubstanciação”, Durand cita Bachelard, para quem “o real é antes de tudo um alimento” (2002, p. 257). Destaca-se a imagem da loba que alimenta os gêmeos na formação de Roma. E a partir do alimento e do leite chega-se ao sangue, que não é mais símbolo da morte e sim “pai dos objetos sensíveis” (2002, p. 263).

Nesse regime eufemizam-se todos os símbolos (com suas constelações, esquemas e arquétipos), como a casa (o abrigo), que também representa calor, aconchego e repouso; a libido e o sexo, que garantem a procriação; a natureza e a terra, que promovem a vida, a imortalidade; a mandala e o círculo mandálico, que trazem a magia; o frasco, que guarda essências e poder. Pitta (2005, p. 30) afirma: “para atingir tal objetivo, o procedimento vai ser o da eufemização (modo de minimizar uma expressão muito “crua” e chocante) e a inversão dos significados simbólicos”. Eufemizar significa inverter o aspecto negativo dos símbolos, transmudando-os, dando aos símbolos uma face positiva.

A busca da vida, com a descida ao colo, à mãe, ao ventre morno, possui diversas fases, expressas nas imagens noturnas de encaixe, intimidade, quietude, repetição, que “incitam a imaginação a fabular uma narrativa que integre as diversas fases do retorno. [...] É assim que se passa insensivelmente do simbolismo místico da taça ao simbolismo cíclico do denário” (DURAND, 2002, p. 279). Nesse contexto,

destaca-se o mito do denário e do pau, símbolos cíclicos, que representam o eterno retorno na natureza, significando a perenidade do tempo. Durand escreve:

Escolhemos, para simbolizar estes dois matizes do imaginário que procura dominar o tempo, duas figuras do jogo do Tarô que resumem reciprocamente o movimento cíclico do destino e o ímpeto ascendente do progresso temporal: o denário e o pau. O denário12, que nos introduz nas imagens do ciclo e das divisões circulares do tempo, aritmologia denária, duodenária, ternária ou quaternária do ciclo. O pau, que é uma redução simbólica da árvore com rebentos (2002, p. 282).

Os símbolos dessas constelações expressam a “repetição infinita de ritmos temporais e o domínio cíclico do devir”; por sua vez o devir cumpre um papel genético e progressista; e os símbolos biológicos mostram evolução e renovação contínua da vida. Trata-se, pois, dos esquemas da repetição e do domínio cíclico do devir. Os símbolos sazonais e cíclicos (presentes na natureza em fenômenos que se repetem de tempo em tempo, indicando reinício e continuidade no tempo) mostram a permanência no movimento e são representativos do devir porque ensinam que a morte é necessária para que haja renascimento na multiplicidade da natureza. Daí os arquétipos da regeneração e da perenidade. Dessa forma, o homem também se sente protegido, porque ele também se renova e não morre.

No regime noturno estão ainda as constelações das cores, da melodia, do ritmo, que também propõem harmonia, paz, tranquilidade, aceitação, normalidade. Sobre o simbolismo da melodia e das cores, Durand expõe:

O simbolismo da melodia é, portanto, como o das cores, o tema de uma regressão às aspirações mais primitivas da psique, mas também o meio de exorcizar e reabilitar por uma espécie de eufemização constante a própria substância do tempo (2002, p. 225).

Em síntese, os esquemas, arquétipos e constelações do regime noturno são o eufemismo, a inversão, o encaixamento, o centro, a intimidade, a quietude, o redobramento, a gulliverização e os símbolos liliputianos, a descida, o processo cíclico, a repetição, a permanência, a perenidade, a regeneração, o renascimento, o processo digestivo, o alimento, a deglutição, o engolimento, a feminilidade, a

12

Denário (do latim denariu): Que contém dez. Antiga moeda romana que valia dez asses. O denário, que em outra tradução é um dinheiro, era a principal moeda romana de prata. Era, geralmente, o salário que um homem recebia pelo trabalho de um dia. Era moeda de grande uso por todo o império romano. Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. Verbete. E http://biblia.com.br/dicionario- biblico/d/denario/, acesso em 27/08/2016.

evolução, o progresso, a metamorfose, a tecnologia – e outros que, por isomorfismo, constelam com esses em núcleos semânticos.

Durand conclui a exposição do regime noturno com os “mitos e semantismo”, considerando o mito como narrativa mais adequado ao regime noturno. Segundo ele, para expressar semanticamente os valores positivos, não bastam os arquétipos e simbolismos internos. É necessário um “dinamismo extrínseco”, que é proporcionado pela narrativa épica. Portanto a narrativa épica é típica do regime noturno. Essa estrutura é o mito (como história narrada). Nesse sentido, mito é uma narrativa dramática ou histórica com uma tessitura, envolvendo personagens, enredo, tempo, espaço e ações, em uma composição devidamente contextualizada. Escreve o autor, expondo também o conceito de “mito” que ele emprega quanto a esse conteúdo:

Com efeito, verificamos que o Regime Noturno do imaginário fazia tender o simbolismo a organizar-se numa narrativa dramática ou histórica. Por outras palavras, no Regime Noturno, e especialmente nas suas estruturas sintéticas, as imagens arquetípicas ou simbólicas já não bastam a si próprias em seu simbolismo intrínseco, mas, por um dinamismo extrínseco, ligam-se umas às outras sob a forma de narrativa. É essa narrativa – obsecada pelos estilos da história e pelas estruturas dramáticas – que chamamos “mito”. Repetimos: é no seu sentido mais geral que entendemos o termo “mito”, fazendo entrar nesse vocábulo tudo o que está balizado por um lado pelo estatismo dos símbolos e por outro pelas verificações arqueológicas. Assim, o termo “mito” engloba para nós quer o mito propriamente dito, ou seja, a narrativa que legitima esta ou aquela fé religiosa ou mágica, a lenda e as suas intimações explicativas, o conto popular ou a narrativa romanesca (DURAND, 2002, p. 355-356).

Portanto, nesse sentido, o mito é, em sua estrutura, um discurso narrativo, com uma diacronia, com relações sincrônicas lineares, encadeamento narrativo, com mitemas (unidades de sentido) e sentido simbólico. Para Durand, “o mito, pelo seu diacronismo discursivo, é muito menos ambivalente que o simples símbolo: ele parece uma racionalização épica ou lógica” (2002, p. 373). O autor cita Lévi-Strauss (“a lenda introduz pelo seu diacronismo uma relação causal” (DURAND, 2002, p. 373) a fim de embasar o aspecto de causa e efeito presente no mito narrativo – detalhe próprio da narrativa literária. Dessa forma, Durand considera mito, na forma de narrativa, como um conjunto de schèmes, arquétipos e símbolos em forma de narrativa.

Esquemas são as relações anteriores que podem ser depreendidas dos gestos, demonstrando emoções, afeições, sensações. Durand define esquema

como “uma generalização dinâmica e afetiva da imagem” (2002, p. 60). E ele explica que os esquemas fazem a junção, mas não “como Kant pretendia, entre a imagem e o conceito”, e sim entre “os gestos inconscientes da sensório-motricidade, entre as dominantes reflexas e as representações”. Durand afirma: “São estes esquemas que formam o esqueleto dinâmico, o esboço funcional da imaginação” (2002, p. 60). Ele diz, por exemplo, que ao gesto postural corresponde o esquema da verticalização ascendente. Outro exemplo: “ao gesto do engolimento corresponde o esquema da descida e o acocoramento na intimidade” (2002, p. 60). Prosseguindo, Durand escreve: “Como diz Sartre, o esquema aparece como o “presentificador” dos gestos e das pulsões inconscientes” (2002, p. 60). E mais: “Os gestos diferenciados em esquemas vão determinar, em contato com o ambiente natural e social, os grandes arquétipos mais ou menos como Jung os definiu. Os arquétipos constituem as substantificações dos esquemas” (2002, p. 60). Dessa forma, qualquer gesto sensório-motor representa um ou mais esquemas – resta então definir quais esquemas estão subjacentes em cada gesto. Assim, esquemas e gestos entram na formação dos mitos.

De fácil entendimento, o mito como narrativa se presta melhor ao regime noturno, cujo pensamento é também mais simples, por não apresentar duelo ou conflito interno (na consciência do homem) e por revelar conformação harmoniosa com a realidade, a vida, o mundo, a natureza.

No documento Download/Open (páginas 45-53)