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REGULAÇÃO E REGULAMENTAÇÃO DO SERVIÇO DE TRANSPORTE FERROVIÁRIO

2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DAS FERROVIAS NO BRASIL

REGULAÇÃO E REGULAMENTAÇÃO DO SERVIÇO DE TRANSPORTE FERROVIÁRIO

Com a gradual desestatização das ferrovias, o Estado brasileiro buscou novos mecanismos de prestação dos serviços públicos, afastando de si a prestação direta, ao transferir à iniciativa privada a operação do transporte ferroviário. Conferiu então para si, renovadas funções de coordenação, informação, fiscalização, avaliação, mediação e monitoramento, tendo em vista as repercussões da atuação dos diferentes agentes econômicos na sociedade e no próprio desempenho da economia. Decorre dessa situação a necessidade de consistência do liame concessão-marco regulamentar, no qual também devem ser incluídos os recursos administrativos que comporão estruturas gestoras, reguladoras e de arbitragem da concessão para o sistema privatizado (MARQUES, 1996).

Pela lei, os mecanismos de regulamentação da atividade são funções de Estado, de forma que se torna importante conceituar os termos regulação e regulamentação. Oliveira (2005) afirma que a confusão desses termos se origina no termo regulation, utilizado em países de língua inglesa para designar a intervenção do Estado na atividade econômica e sua tradução literal seria regulamentação. Logo, regulamentação corresponde ao exercício de uma das faces da atividade executiva: a de editar regulamentos que especifiquem condições e propiciem a fiel execução das leis, ou seja, a produção de normas jurídicas complementares à lei de natureza regulamentar deve ser atribuída, pela Constituição Federal, ao Presidente da República.

Regulação, entretanto, segundo Aragão5 (2002) apud Oliveira (2005) envolve todo o conjunto de medidas legislativas, administrativas e convencionais, abstratas ou concretas, pelas quais o Estado, de maneira restritiva da liberdade privada ou meramente indutiva, determina, controla ou influencia o comportamento dos agentes econômicos, evitando que lesem os interesses sociais definidos no marco da Constituição e orientado-os em direções socialmente desejáveis.

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ARAGÃO, Alexandre Santos de. (2002) Agências Reguladoras e a evolução do direito administrativo econômico. Rio de Janeiro: Forense, p. 37.

Diferentemente da definição apresentada por Aragão, Figueiredo6 (1999) apud Martins (2005) conceitua regulação como “atividade administrativa desempenhada por pessoa jurídica de direito público consistente no disciplinamento, na regulamentação, na fiscalização e no controle do serviço prestado por outro ente da Administração Pública ou por Concessionário, Permissionário ou Autorizatário do serviço público, à luz de poderes que lhe tenham sido por lei atribuídos para a busca da adequação daquele serviço, do respeito às regras fixadoras da política tarifária, da harmonização, do equilíbrio e da composição dos interesses de todos os envolvidos na prestação deste serviço, bem como da aplicação de penalidades pela inobservância das regras condutoras de sua execução”.

Anteriormente a criação das agências, foram criados dentro da estrutura do MT, com papel transitório, dois órgãos: a Secretaria de Transportes Terrestres - STT e Comissão Federal de Transportes Ferroviários – COFER. A primeira foi a grande responsável pela formulação do marco regulatório ferroviário, tendo produzido diversas Normas Complementares. O segundo teve papel relevante realizando Reuniões Ordinárias, nas quais eram democraticamente discutidas, com os agentes do setor, as normas propostas pela STT, como também pelos usuários e pela ANTF (OLIVEIRA, 2005).

O marco regulamentar nacional do transporte ferroviário foi estabelecido pelo Regulamento dos Transportes Ferroviários (RTF), aprovado pelo Decreto n° 1832, de março de 1996. O novo RTF foi publicado às vésperas do primeiro leilão da RFFSA. Segundo Castro (2002), embora esse decreto tenha o mérito de retirar os vários aspectos irrelevantes dos anteriores, concebidos para um serviço com características monopolísticas, pouco avançava no sentido de detalhar os critérios de regulamentação dos pontos críticos do setor como: tarifas, desativação de ramais antieconômicos, interpenetração7 e tráfego mútuo8.

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FIGUEIREDO, Pedro Henrique Poli de. (1999) A Regulação do Serviço Público Concedido. Porto Alegre, Síntese.

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Interpenetração é a integração de duas malhas que pode ocorrer por mecanismos de tráfego mútuo ou direito de passagem.

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De acordo com a Resolução No. 433 da ANTT, define-se tráfego mútuo como “a operação em que uma concessionária, necessitando ultrapassar os limites geográficos de sua malha para complementar uma prestação de serviço público de transporte ferroviário, compartilha recursos operacionais, tais como material rodante, via permanente, pessoal, serviços e equipamentos, com a concessionária em cuja malha se dará o prosseguimento ou encerramento da prestação de serviço, mediante remuneração ou compensação financeira”.

No tocante a regulação, foi promulgada a Lei n° 9.986/2000 que contêm as disposições genéricas sobre a gestão de recursos humanos das agências reguladoras e disciplinam a relação jurídica mantida com os trabalhadores da agência, com as relações trabalhistas regidas pela CLT (OLIVEIRA, 2005). Dando continuidade a essa necessidade de um melhor planejamento e gestão da infra-estrutura de transportes, o Governo Federal reestruturou o setor por meio da Lei 10.233, de 05/06/2001, que estabelece, entre outros órgãos, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).

No entanto, a ANTT somente começou a ser efetivamente implantada em fevereiro de 2002 após a edição do Decreto nº 4.130, de 13/02/2002, que aprovou seu Regulamento. Durante esse tempo nenhuma fiscalização foi exercida sobre as operadoras. Os conflitos entre operadores, clientes e investidores ocorreram e foram resolvidos ou não, sem a intermediação de um ente regulador. Mudaram-se as composições acionárias de algumas concessionárias e faltaram as análises técnicas dos movimentos de compra e venda entre grupos financeiros e industriais, bem como as medidas necessárias para que fossem coibidos abusos do poder econômico (CAVALCANTI, 2002).

A ANTT é uma autarquia vinculada ao Ministério dos Transportes encarregada da gestão e operação dos modais terrestres e da implementação das políticas formuladas pelo Conselho Nacional de Integração de Políticas de Transporte - CONIT e pelo MT. A agência deverá regular as atividades de prestação de serviços e de exploração da infra-estrutura de transportes exercida por terceiros e harmonizar o interesse público com os objetivos dos usuários, das empresas concessionárias, permissionárias, autorizadas e arrendatárias, que exploram os serviços.

Dentre as atribuições específicas pertinentes ao Transporte Ferroviário, cabe à ANTT “administrar os contratos de concessão e arrendamento de ferrovias celebrados até a vigência desta Lei”, e “fiscalizar a prestação dos serviços e a manutenção dos bens arrendados, cumprindo e fazendo cumprir as cláusulas e condições avençadas nas outorgas e aplicando penalidades pelo seu descumprimento” (Lei 10.233). No entanto, existe uma forte carência no mercado de profissionais com conhecimento técnico sobre ferrovias, de forma que a atuação da ANTT nessa área é deficitária. Os técnicos da ANTT na área ferroviária ou são oriundos da RFFSA ou outras empresas de transporte ferroviário,

ou, no caso dos atuais contratados, são profissionais sem o conhecimento necessário para trabalhar com transporte ferroviário.

Desde 2002, a ANTT vem elaborando relatórios sobre o desempenho das empresas concessionárias, com dados sobre volume de investimentos, produtividade, segurança operacional, grau de satisfação dos usuários, e outros aspectos. Em síntese, os dados registram dois pontos importantes. O primeiro é que a ANTT está cumprindo adequadamente uma de suas funções básicas, de manter atualizados os indicadores de desempenho do setor. Esta tarefa facilita a atração dos investimentos que eventualmente poderão elevar a participação das ferrovias na matriz de transporte de carga do país (ARAÚJO JR, 2005).

Para garantir que as agências reguladoras estejam cumprindo seu papel o Tribunal de Contas da União – TCU faz a fiscalização das entidades administrativas estatais sob os enfoques da legalidade, economicidade e eficiência em matéria de receitas e despesas (OLIVEIRA, 2005). O mesmo autor afirma ainda, que não cabe ao TCU “se manifestar sobre opções político-administrativas implementadas pelas Agências Reguladoras, no desempenho de suas atividades fins, notadamente quando referente ao cumprimento de padrões técnicos decorrentes do viés normativo do órgão regulador em face do setor regulado, o que nada tem a ver com gestão de recursos públicos”.

A atuação do TCU vem sendo demandada na busca da eficiência, pois exerce sobre os órgãos e entidades estatais encarregadas o poder de regular a prestação de serviços públicos delegados. Segundo Martins (2005), “o TCU tem primado pela melhoria dos controles e dos instrumentos legais, a fim de permitir a harmonia entre as malhas existentes. Assim, a atuação desse Tribunal diante da regulação do setor de transporte tem ocorrido no âmbito das suas competências constitucionais voltada à legalidade e a efetividade das ações promovidas pela Agência Reguladora e pelos concessionários de serviços púbicos, inclusive em consonância com diretrizes estabelecidas por organismos internacionais que cuidam do controle externo da administração pública”.