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2.3 Análise da captação de recursos por parte dos fundos de investimento

2.3.1 A relação captação líquida performance

De acordo com Berk e Green (2004), uma das primeiras abordagens utilizadas no estudo da captação líquida de recursos foi a análise da relação retornos passados-captação. Segundo os autores, o interesse pelo estudo dessa relação baseia-se em três fundamentos teóricos:

• A captação de recursos determina o patrimônio líquido sob administração e, consequente- mente, as taxas que serão cobradas aos investidores;

• A existência de uma relação convexa entre a captação e a performance dos fundos pode incentivar comportamentos mais arriscados por parte dos gestores com o objetivo de serem fundos ganhadores ou winners;

• O comportamento da captação de recursos em relação ao desempenho passado influência diretamente a persistência da performance do fundo. Isso porque essa relação afetará a influência do tamanho do fundo no desempenho futuro do fundo.

Sanvicente (2002) afirma que o estudo do comportamento dos fluxos de recursos nos fundos de investimento pode também ser uma alternativa ao estudo da eficiência de mercado no nível semiforte. De acordo com autor, caso se constate que a entrada (saída) líquida de recursos ajuda a determinar a ocorrência de taxas de retorno positivas (negativas) os administradores de fundos poderiam utilizar essa informação, publicamente disponível, para gerir as aplicações de suas carteiras. Logo, se tal relação fosse constatada teria-se evidência de que o mercado não seria informacionalmente eficiente no nível semiforte.

Neste contexto, podem se detalhar diversas explicações para a ocorrência desse fenômeno. Warther (1995) afirma que a causa é a chamada “imprensa popular”, que costuma citar declarações de profissionais de mercado que acham que os fluxos líquidos aos fundos de investimento fazem o mercado subir ou cair e que, por sua vez, os fluxos em questão decorrem do “sentimento” dos investidores em relação ao mercado.

Sanvicente (2009) apresenta uma explicação baseada na hipótese de revelação de infor- mação pelos fluxos de investimento. De acordo com o autor, se for imaginado que os quotistas de fundos possuem informação ou, simplesmente, transacionam na mesma direção de outros investidores que consideram bem informados, os dados de fluxo de captação, sendo indicativos do volume líquido de suas transações, estarão divulgando informação sobre sua opinião quanto ao mercado, e os preços, assim, reagirão eficientemente a essa informação.

Shleifer (1986) argumenta que esse fenômeno é produto do chamado efeito do “sentimento do investidor” (investor sentiment). Segundo o autor, pode-se considerar que aqueles que investem em quotas de fundos tendem a ser investidores menores e menos sofisticados. Portanto, se seu sentimento se tornasse favorável em relação ao futuro do mercado ficariam interessados em adquirir novas quotas de fundos. Como não são investidores sofisticados, tendem a ter noção muito limitada do valor justo do novo investimento que estão fazendo, assim, suas compras não estão muito relacionadas a um processo de avaliação estrita. Com isso, a relação existente seria provocada por um efeito de pressão sobre os preços causada pelas variações no sentimento dos investidores.

Uma explicação amplamente estudada desse fenômeno é o chamado “efeito smart money”. Os primeiros estudos sobre ele (GRUBER, 1996; ZHENG, 1999) evidenciaram que os fundos que apresentaram maiores captações de recursos obtiveram retornos superiores em comparação àqueles que receberam menores quantidades de recursos. Portanto, esses resultados evidenciariam que os investidores possuiriam capacidade de selecionar os melhores fundos.

Keswani e Stolin (2008) definem o efeito smart money como o estado pelo qual o dinheiro investido é suficientemente “inteligente” para ser aplicado em fundos que no futuro terão performance positiva. Tal fato ocorreria porque os investidores possuem uma habilidade genuína para a seleção de fundos.

No contexto brasileiro, o estudo pioneiro sobre o tema é de Costa e Eid Jr. (2006) cujos resultados evidenciaram a existência do efeito na indústria de fundos brasileiros. Os autores identificaram retornos superiores nos fundos de maior captação líquida, o que sugere uma habilidade dos investidores em decidir pelos melhores fundos. Esses resultados iniciais têm sido validados por posteriores estudos (FONSECA e MALAQUIAS, 2012).

Berk e Green (2004) afirmam que os estudos sobre essa relação podem se agrupar em dois abordagens: a) aquelas pesquisas que analisaram a relação captação - performance com diversas características dos fundos; e b) estudos que analisaram a relação diferenciando os investidores em subamostras. Dessa forma, segundo os autores, as pesquisas da área realizaram uma análise abrangente do fenômeno, porém existindo ainda espaço para pesquisas relacionadas, assim como aplicações em mercados pouco estudados, como o caso dos mercados emergentes.

Na linha dos estudos que analisaram aspectos dos fundos de investimentos, Chevalier e Ellison (1997) focalizaram a relação captação - peformance para a subamostra de fundos novos e aqueles que já apresentavam longo histórico de participação no mercado. Os autores evidenciaram a existência de uma relação mais convexa nos fundos novos do que nos velhos. Esse fenômeno apresenta fortes incentivos para os fundos novos incrementarem o risco no encerramento do ano, com o objetivo de incrementar seu desempenho e evitar os saques de recursos.

Sirri e Tufano (1998) evidenciaram que os fundos que pertencem a uma família de fundos maior cujas taxas de administração são maiores e que recebem maior atenção por parte dos meios de comunicação captam maiores fluxos de recursos. Dessa forma, o tamanho da família do fundo, a taxa de administração, os custos de publicidade e a atenção mediática estão negativamente relacionados com os custos de procura (search costs) que os investidores têm que assumir no processo de seleção do fundo no qual investir.

Del Guercio e Tkac (2002) encontraram evidência de diferenças significativas na conve- xidade da relação nos fundos de investimento comparativamente com os fundos de pensão. Os autores descobriram maior convexidade nos fundos de investimento devido ao efeito "winner takes all", pelo qual os gestores têm grandes incentivos para aumentar os patamares de riscos dos fundos para captar os novos fluxos de recursos. Porém, esse comportamento não foi evidenciado nos fundos de pensão, devido, principalmente, às limitações que esses fundos têm em relação ao risco assumido.

Na linha dos estudos que analisaram o comportamento de diferentes amostras de in- vestidores, James e Karceski (2006) analisaram o comportamento dos investidores retail e os institucionais. Os autores evidenciaram que a relação positiva existente entre performance e captação é determinada, em grande medida, pelos investidores retail. De acordo com os autores,

esse fenômeno não foi evidenciado nos fundos institucionais, o que sugere que esses investidores utilizam medidas diferentes no processo de avaliação da performance dos fundos. De outra parte, os autores descobriram que os investidoresretail reagem com maior ênfase ao bom desempenho dos fundos, mas com muito menor intensidade no caso de desempenho ruim.

Clifford et al. (2007) encontraram resultados similares aos do James e Karceski (2006) além de evidenciarem que os fundos institucionais apresentaram uma relação quase linear entre a

captação e a performance, o que poderia explicar-se pela maior capacidade desses investidores de punir o desempenho ruim dos fundos. De outra parte, os autores descobriram, adicionalmente, que a procura pelos fundos com maiores retornos passados por parte dos investidores retail é caracterizada pela desconsideração do risco assumido, já que a variável risco (desvio-padrão dos retornos mensais) não resultou significativa.

Huang et al. (2007) analisaram também as diferenças encontradas entre os fundos voltados ao público geral (retail) e os fundos institucionais. Eles demostraram que os custos de participação (participation costs) como os custos de transação e os custos de coleta de informação, influenciam a significância da relação entre captação e performance. De acordo com os autores, a medida que os custos de participação aumentam o retorno exigido pelos investidores é também maior. Adicionalmente, Huang et al. (2007) encontraram que os investidores tendem a focar mais a sua atenção nos retornos passados dos fundos que apresentam maiores custos de participação.

Salganik (2015) comparou os critérios de seleção de fundos por parte dos investidores retail e os institucionais, evidenciando resultados que confirmaram que as diferenças nos perfis dos investidores influenciam seus processos de tomada de decisão de investimento. De acordo com o autor, os investidores institucionais utilizam medidas mais quantitativas e sofisticadas, tais como medidas ajustadas ao risco (alfa de jensen) e o tracking error em comparação aos investidores retail. Adicionalmente, apresentam insensibilidade à taxa de administração dos fundos.