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2.4 – Relação entre crises e reputação

De acordo com o Institute of Crisis Management (2007), crise é todo evento negativo relacionado a uma organização e que recebe cobertura intensa da mídia. Esses eventos podem ser os mais diversos, como catástrofes, acidentes, acontecimentos envolvendo o meio-ambiente, defeitos técnicos em produtos ou serviços, problemas financeiros, assédio sexual, assédio moral, violência física no local de trabalho, entre muitos outros.

Uma crise, dependendo de sua intensidade, da cobertura da mídia, e de como é encarada pela organização, pode comprometer toda uma reputação que levou anos para ser construída. Isso porque é um evento que coloca em prova a maneira como a organização lida com os seus públicos, com problemas, ou mesmo é negligente em relação aos seus produtos e serviços. Durante uma crise, a empresa deve manter os colaboradores, clientes, acionistas, fornecedores, imprensa, grupos de pressão, sociedade e governo informados sobre o problema ocorrido e as ações que estão sendo tomadas para solucioná-lo. Qualquer falha nessa comunicação pode gerar novas crises ou destruir a imagem da corporação (RODRIGUES, 2007).

Toda grande empresa, por mais organizada que seja, não está livre de enfrentar crises ao longo de sua história. O que permite a manutenção ou não de uma boa reputação não chega a ser a crise, mas a maneira como ela lida com a crise. A maneira de enfrentar a crise poderá proporcionar cobertura positiva da mídia, gerando boa vontade dos diversos stakeholders em relação

às atitudes da empresa, podendo a empresa sair ainda mais fortalecida de uma crise (LYON; CAMERON, 2004).

Este foi o caso de Tylenol, medicamento da Jonhson & Jonhson, que em 1982 teve sete consumidores mortos ao ingerir o produto. Isso aconteceu, por que esses exemplares do remédio tiveram sua fórmula adulterada por um sabotador que introduziu veneno, motivo que causou a morte dessas pessoas. A postura tomada pela empresa foi de assumir o problema publicamente e cooperar com todos os meios de comunicação interessados no assunto, mantendo-se inteiramente transparente em todas as suas ações (MORAES, 2001). Além disso, a Johnson & Jonhson:

- Solicitou à população que o uso do Tylenol em versão cápsulas fosse suspenso;

- Recolheu todo o estoque do medicamento dos hospitais, farmácias e demais pontos de venda;

- Deu subsídio aos hospitais caso algum caso de envenenamento fosse registrado;

- Ofereceu aos consumidores a opção de trocar o medicamento em cápsulas que tivessem em casa pela versão em tabletes, que não podia sofrer sabotagem;

- Ofereceu prêmio em dinheiro a quem pudesse dar informações sobre o adulterador.

Estas ações surtiram um efeito positivo na imprensa, que recebeu ampla cobertura favorável à empresa no caso. Por conseqüência, os diversos públicos também reagiram bem às atitudes tomadas pela empresa, que saiu com a imagem fortalecida da crise. Apesar de o episódio ter custado cerca de 50 milhões de dólares, a empresa conseguiu ganhos incalculáveis em imagem.

Porém, podemos citar uma série de crises sofridas por outras companhias e que lhe causaram perdas incalculáveis de imagem. Casos que envolveram gigantes norte-americanos como a Enron e a Worldcom, que publicaram balaços financeiros falsos, e a empresa de consultoria e auditoria Arthur

Andersen, não sobreviveram à crise de 2002. Elas desapareceram e ainda tiveram seus principais executivos presos. A Enron era uma empresa de prestação de serviços públicos nos Estados Unidos (usinas hidrelétricas, companhias de água e saneamento, e unidades de distribuição de gás). Tornou-se conhecida quando passou a negociar no setor de energia comprando, vendendo e fazendo apostas financeiras muito maiores do que os negócios diretamente realizados pela companhia. Com a ajuda de bancos e de outras empresas (como a Arthur Andersen) conseguiu maquiar os balanços de 2000 e 2001, escondendo cerca de 25 bilhões em débitos. A farra financeira acabou quando a empresa foi à falência e deixou milhares de pessoas com um imenso prejuízo.

Além de ter membros da diretoria e responsáveis pelas finanças presos, o escândalo causou a dissolução da Arthur Andersen e o surgimento de uma série de medidas regulatórias ao longo de 2002, tanto nos Estados Unidos quanto no mundo, inclusive no Brasil. Dentre essas medidas, destaca-se a Lei Sarbanes-Oxley, de 30 de julho de 2002, cujo objetivo é manter a confiabilidade das informações divulgadas por meio de balanços, atribuindo à Alta Administração a responsabilidade pelas informações financeiras fornecidas ao mercado. Os princípios dessa lei passaram a vigorar nos principais mercados internacionais, também interessados em manter a confiabilidade dos balanços divulgados por suas empresas.

Para O´Rouke (1997)6, citado por Almeida (2005), existem algumas circunstâncias que deixam a crise mais séria e ainda mais difícil de ser controlada. A primeira delas seria a surpresa. Muitas vezes acontecem eventos que não foram previstos de maneira alguma, e a organização tem certas dificuldades de elaborar uma resposta rápida e eficaz para a situação. A Nike surpreendeu a população norte-americana com a utilização de trabalho infantil na produção de vários de seus artigos na Ásia. A mobilização de ONGs e ativistas divulgando imagens e informações sobre esse acontecimento rapidamente se espalharam por todo os Estados Unidos e pelo mundo, nos

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O´ROUKE, R. Managing in Time of Crisis. Corporate Reputation Review, London, v1, n.1 e 2, p. 120-125, 1997.

anos 1980 e 1990. Esse evento causou forte impacto na reputação da empresa, o que manchou a sua imagem e causou reveses financeiros à companhia nos anos de 1993 a 1995 (SPAR, 2002).

A segunda situação é a falta de informação confiável disponível aos afetados momentos após o acontecimento de um evento como um acidente. A empresa não sabe muito bem o que dizer e isso deixa o processo de comunicação lento e a opinião pública sem uma resposta oficial. Esse foi o caso ocorrido com o acidente aéreo da TAM ocorrido em 2007, em que 199 pessoas morreram após a colisão de um avião com um prédio da própria companhia em São Paulo. A falta de informações confiáveis fez com que muitas informações chegassem até o público através de fontes não-oficiais como rádios, emissoras de televisão e jornais. A primeira lista com as vítimas do acidente, por exemplo, foi divulgada por uma rádio e não pela própria empresa.

A terceira situação existe quando o aumento progressivo de eventos deixa a situação extremamente grave. Uma progressão de falhas das mais diversas, que vão transformando uma situação inicialmente controlável em um evento incontrolável. Almeida (2005) cita como exemplo o episódio do transatlântico Valdez, da Exxon, em que ativistas e agências não-governamentais estavam presentes no local do acidente antes mesmo da empresa, dando declarações à mídia, o que pioravam ainda mais a situação da empresa. No caso brasileiro, o caos aéreo e a omissão da ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil), da Infraero (Empresa Brasileira de Infra-estrutura Aeroportuária), e das companhias aéreas nacionais geraram problemas de reputação irreparáveis para o setor.

A quarta situação é quando o público externo aponta as ações que devem ser tomadas sem que haja um posicionamento da empresa. Nesses eventos, a companhia deve ser rápida, assumir o problema, e propor uma série de ações que serão tomadas diante da crise. Essa velocidade na comunicação conforta seu público, que enxerga a preocupação da empresa com o evento possibilitando a comunicação de medidas corretas antes mesmo de uma pressão pública por medidas que talvez não sejam as mais aconselháveis.

Para Orduña (2004), as empresas devem desenvolver uma postura pró-ativa em relação às crises: criar um manual interno contando um plano de crises; treinar profissionais aptos a gerenciar crises; treinar pessoas nos mais diversos níveis (operacionais e estratégicos) para que a informação sigla um fluxo veloz e confiável. A informação é um fator-chave no momento de crise, e a maneira como ela é gerenciada pode definir o sucesso ou fracasso da empresa num momento como esse.